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História Solitudine - Redenção É Um Pecado - Veneza


Escrita por: remmielupin

Notas do Autor


Depois de um mês, eis mais um capítulo.

Capítulo 4 - Veneza


Going back to get away, after everything has changed.

Desaparataram em um beco da área central da cidade velha, os últimos raios de luz se esvaindo ao longe, trazendo consigo a penumbra que lhes serviria de esconderijo. Os olhos azuis e curiosos de Emmeline percorreram as paredes de pedra desgastada pelo tempo, construções que perduravam por séculos, naquela cidadezinha belíssima. Os canais estreitos de água brilhando sob a luz dos últimos momentos do dia. Fazia frio naquele início de noite, mas aquela aura mágica que Veneza tinha, fazia com que ele passasse quase desapercebido.

— É lindo aqui... – Comentou com a voz distante, presa em seus próprios pensamentos.

— Espere até conhecer o resto! – Disse Remus, com um leve sorriso. Pela primeira vez em dias, sua voz de trazia uma leve animação verdadeira.

Os olhos do rapaz passaram rapidamente pelo beco, ao que parecia, ninguém os havia visto. Tomou Emmeline pela mão, guiando-a para o Sul, pelas estreitas calçadinhas. De tempos em tempos, certificava-se de que não estavam sendo seguidos, pois a noite era a melhor aliada dos famigerados Comensais da Morte.

Emmeline agarrava firmemente sua varinha, dentro do casaco leve que tinha sobre o corpo. Não poderiam sofrer um ataque surpresa e morrer, era melhor estar sempre alerta e preparada para lutar. No entanto, a temperatura caia juntamente com a noite, o que a fez estremecer levemente.

— Está com frio, Emme? – Perguntou Remus, observando o nariz pálido da moça, adquirir um suave tom avermelhado.

— Um pouquinho. – Admitiu, sem graça.

Apesar dos últimos dias na Sede terem mostrado um Remus Lupin grosseiro e irritado, parecia a Emmeline que o bom e gentil rapaz alto, de cabelos castanho-claros, havia voltado. Num gesto displicente, ele retirou o paletó marrom que trajava e colocou-o gentilmente sobre os ombros da loira. Percebeu imediatamente as bochechas de Emmeline Vance corarem violentamente.

— Obrigada, Remmie. – Disse com a voz quase sumindo, tentando disfarçar o constrangimento que sentiu.

— Não por isso. – Ele disse sorrindo, com aqueles olhos tristes e cansados. – Agora vamos! Juro que falta pouco!

Caminharam por mais algum tempo. O caminho, por terra, era  mais longo do que seria se pegassem alguma balsa, porém a possibilidade de despistar alguém que os seguisse, era infinitamente maior. Quando os passos finalmente pararam, indicando que eles haviam chegado, o rapaz imediatamente soltou um longo e pesado suspiro, como se aquilo fosse um alivio e um martírio ao mesmo tempo. Seu olhar, instintivamente, se focou no céu noturno: estava a duas luas da transformação. Emmeline, por sua vez, observou que se encontravam em frente a um conjunto de antigos apartamentos venezianos, de pedra gasta, como o beco em que desaparataram. As janelas de madeira emolduradas por arabescos, dos tempos ilustres da cidade, com uma pequena sacada em cada andar. Era como se o tempo houvesse parado para aquele pequeno prédio de três andares e os houvesse transportado para a Era Vitoriana. O odor do mar se misturava ao de pedra úmida daquele lugar e a luz de cada apartamento parecia contar uma longa história.

Remus retirou do bolso, um pequeno molho de chaves, e rapidamente abriu a pesada porta de entrada. Adentrou o pequeno hall, seguido de Emmeline, que tinha os olhos e pensamentos em ebulição de tanta curiosidade. Indicou-lhe a longa escada de madeira que rangia a cada passo e eles começaram a subi-la tentando não emitir qualquer som. Os ouvidos de ambos estavam atentos ao menor sinal de movimentação. Haviam apenas três apartamentos naquele pequeno edifício. O primeiro andar exalava um delicioso cheiro de comida que estava a ser preparada e uma valsa baixinha escapava pelo pequeno vão da porta. No apartamento do segundo andar ouvia-se uma voz feminina que parecia discutir aos berros com uma voz masculina, enquanto eram embalados pelo choro de uma criança.

Finalmente chegaram ao terceiro e último apartamento. Uma pesada porta de madeira negra, com uma maçaneta cheia de arabescos, os aguardava. Emmeline sentia as pernas doerem depois de tanto andarem e mal podia esperar para se sentar em uma confortável poltrona e massagear os pés, machucados pelo sapato.

O rapaz apontou sua varinha para a fechadura e murmurou “Dimenticare”, uma palavra italiana que significava “Esquecer” e que agora, mais do que nunca, fazia sentido. A porta abriu em um estalido abafado. A moça guardou, em sua mente, a palavra que era a senha para adentrar no refúgio de seu parceiro. No momento em que pôs os pés dentro de seu apartamento, uma lufada de ar parado o recebeu. A mente de Remus deu uma volta, como se finalmente se desse conta de que estava mais uma vez em Veneza e que sua vida nunca mais seria a mesma.

A loira o acompanhou e sentiu-se desapontada quando passou os olhos pelo pequeno apartamento. Caminhou pela diminuta saleta que nada continha, além de uma pequena lareira, uma cadeira e uma escrivaninha. As paredes eram nuas com a pintura antiga e desbotada, o que lhe pareciam uma sala de espera de um hospital. Não havia nenhum sinal que indicasse que alguém havia morado ali nos últimos meses.

— Fique à vontade. – Disse Remus evidentemente desconfortável com aquela situação. – Vou te mostrar nossa grande mansão.

Emmeline meneou a cabeça, se sentindo tão constrangida quanto rapaz e o seguiu em direção a antiga cozinha. Esta, inclusive, parecia nunca ter sido usada. Ele serviu-se de um copo de água e entregou outro pra ela. Em silêncio, sorveram todo o conteúdo em um único gole e seguiram para os últimos cômodos. Quando finalmente chegaram ao quarto, Remus sentiu o fugaz perfume de Donna e, como num soco, sentiu o peso de toda sua tristeza se abater sobre ele. Parecia que aquela saleta com uma cama de casal, um pequeno guarda-roupas, o banheiro conjugado e a porta balcão com cortinas de renda, traziam cada detalhe do corpo de Donna. Seu espírito não o abandonaria, ela o atormentaria até o último dia de sua vida. Suspirou profundamente, tentando manter o controle e tentou forçar um sorriso para a loira que estava atrás dele.

— Você pode dormir aqui, Emme. Eu durmo na sala. – Disse em um tom neutro.

A idéia de ficar naquele ambiente com a presença das lembranças de Donna o enlouquecia. Parte dele queria poder dormir abraçado ao último lençol em que ela dormira, sentindo o seu perfume, no entanto, sabia que se fizesse isso, perderia a razão. Doía o coração pensar que na única noite em que fora verdadeiramente feliz, nunca mais se repetiria. Podia lembrar de cada detalhe: do cheiro, do calor da lareira, do corpo dela sob o seu.

— Você tem certeza, Remmie? Posso dormir na sala...

As palavras de Emmeline o tiraram de seus pensamentos, fazendo-o se sentir um tanto perdido. Ele sorriu cansado.

— Não se preocupe. – Replicou com cautela. – Os lençóis estão na última gaveta do armário. Só temos esse banheiro, então espero que não se importe de dividirmos.

A garota soltou uma espontânea gargalhada quando pensou que teriam de dividir o único banheiro da casa, o que fez o rapaz rir também. Felizmente, naquele momento, parecia que ele estava visivelmente mais relaxado.

— Não! Vou me importar completamente em ter que dividir o banheiro com você. – Comentou com sarcasmo, sentando-se na cama. – Remus, esse é o menor dos nossos problemas, afinal dividir o banheiro, a casa, a cam...

Sua frase morreu quando se deu conta do que dizia. Sua face pálida ruborizou-se  e ela sorriu desconcertada. O homem sentiu que era o momento de resgatá-la, para não constrangê-la ainda mais e fez um gesto de que não importava.

— Está com fome? – Disse tentando soar o mais descontraído que podia.

 

Sentaram-se um em frente ao outro na pequena bancada de pedra na cozinha. O jantar não seria cheio de glamour, muito menos o que eles gostariam de comer. Mas depois de vasculhar os armários, Remus encontrou apenas duas latas de sopa de tomate. Com um aceno de varinha, os lacres se romperam e ele pôs a fervê-las. Emmeline, por sua vez, sentia-se envergonhada demais para dizer qualquer coisa e se resignou a procurar um par de colheres para que pudessem jantar. Um silêncio glacial pairava sobre os dois que evitavam se olhar.

— Amanhã podemos dar início a nossa busca, não acha? – Emmeline disse tentando quebrar o gelo.

— Claro. – Seu tom foi distante, como se não estivesse presente naquele cômodo e, muito menos, naquela conversa.

— Dumbledore mencionou sobre a morte de trouxas aqui... Que tristeza! Essas pobres pessoas não tem nem idéia do que está lhes acontecendo.

Quando percebeu que suas investidas na tentativa de conversar com Remus haviam sido solenemente ignoradas, a loira resolveu se calar de vez. Levantou-se, tentando não parecer indelicada e pegou as latas com as colheres e as colocou na pia.

— Desculpe, Emme.

— Deixa pra lá. – Emmeline deu de ombros. – Acho que é hora de nos prepararmos para dormir. Amanhã o dia começa cedo.

 

Remus deu uma boa olhada pela sala, antes de conjurar um colchão e cobertores, ajeitando-os de modo a deixá-lo confortável. A luz era fraca, mas era uma das poucas coisas trouxas que ele não se livrara, quando arranjou aquele apartamento. Despiu-se e colocou uma calça de pijama, deixando a mostra todas aquelas cicatrizes em seu peito. Metade homem, metade lobo. Apenas uma semana por mês se transformava naquela criatura terrível, mas a marcas em seu corpo e mente perdurariam até o dia de sua morte. Enfiou-se de baixo das cobertas, se sentindo vulnerável e com medo até de sua própria sombra, como uma criança. Mas ele era um monstro e sabia disso.

Repentinamente lembrou-se que ainda necessitava escovar os dentes e suspirou. Não entraria no quarto, além de parecer invasivo, poderia constranger e incomodar a garota. Levantou-se e pegou, em sua bolsa de couro, uma escova e seguiu para a cozinha. Quando entrou, suas faces foram violentamente tomadas por um rubor reluzente. Lá estava Emmeline, de costas para a porta, numa bela camisola de seda branca, encostada na pia enquanto se servia de um copo d’água.

Ao notar a presença repentina do rapaz, virou-se e deu de cara com um Remus só de calças, dentro do ambiente com uma escova de dentes na mão. A loira não se conteve e soltou um grito assustado. Seu corpo passou a tremer inteiro e seu rosto imediatamente foi tomado pela cor vermelha, a deixando parecida com um tomate.

— Pelo amor de Deus, me perdoa, Emmeline! – Exclamou, meio sem saber o que fazer.

Ele se aproximou da moça, ainda muitíssimo constrangido, pegando-a pelos ombros e a sentou na cadeira da bancada. Apressou-se em pegar outro copo d’água e colocou uma bela colherada de açúcar, antes de entregar nas mãos trêmulas dela.

— V-V-VOCÊ ME ASSUSTOU, REMUS, PUTA QUE PARIU! – Seu tom continuava elevado e agora estava cheiro de ira. Suas palavras saíram entrecortadas e ela deu um gole na água com açúcar.

— Eu não sabia que você estava na cozinha. Eu só vim escovar os dentes. – Disse tentando se justificar.

— Custava fazer algum barulhinho pra indicar que você estava entrando?

— Desculpa, Emme. De verdade! Eu ajoelho aos seus pés para ter o seu perdão e te juro que nunca mais farei nada para assustá-la! – Segurou as mãos dela no meio das suas, mirando-a seriamente. E, de repente, começou a rir, com se finalmente se desse conta da situação ridícula em que se encontravam. – A propósito, você fica muito bem nessa camisola.

— Seu idiota! – Emmeline disse, levantando-se furiosa e correndo em direção ao quarto, sentindo o rosto queimar de vergonha.

Adentrou correndo, no aposento, e bateu a porta atrás de si, ofegante. Não era uma longa corrida, já que aquele apartamento era minúsculo, porém a moça sentia-se profundamente constrangida. Esse era um lado de Remus que ninguém nunca tinha visto, muito mais parecido com Sirius do que qualquer um poderia suspeitar. Estava verdadeiramente surpresa com o comentário, pois, mesmo nos tempos de escola, enquanto ela investia romanticamente nele, sempre sentira que aquele rapaz tinha um desinteresse quase apático por contato físico. Vê-lo comentar de modo quase malicioso sobre sua camisola era algo novo e até assustador.

Seguiu para o banheiro e olhou-se no pequeno espelho do armário da pia, suas faces queimavam em um vermelho vivo. “O que está acontecendo?” Indagou-se, tentando acalmar a mente e fazer a pele voltar a sua temperatura normal. Respirou fundo duas, ou três, vezes e começou a rir nervosamente para seu reflexo. Remus não era tão apático, afinal.

 

O rapaz, por sua vez, escovou seus dentes na pia da cozinha, como ele pretendera o tempo todo fazer, e voltou a sala com um sorriso divertido no rosto. Desde quando ele fazia uma brincadeirinha dessas? Para falar a verdade, nem ele sabia, talvez desde... Donna. De um segundo para outro, seu sorriso desapareceu, transformando-se em um suspiro melancólico.

Sentou-se na cadeira da escrivaninha e observou a porta. Ela jamais passaria pelo batente de novo, com os olhos cheios d’água, chamando por ele. Sentiu um turbilhão de culpa tomar conta do seu espírito, como a ressaca quando atinge a praia. Lembrou-se de seus longos cabelos castanhos, que cheiravam a lavanda, e de sua voz dizendo, com aquele tom doce e baixo: “John, por favor...”. Ele podia sentir a pele dela tocando a dele, de um modo que parecia arder, enquanto, ele a tomava pelos braços e beijava aqueles lábios macios rosados. Aquilo tudo parecia tão real, como se ela nunca partira. Seu perfume era inebriante, uma mistura da brisa do verão com o cheiro do sabonete que ela usava. “Donna, não me deixe, bella mia.” Disse sentindo-se sufocado, entretanto, ela partira a muito e a culpa era apenas dele.  

Abriu os olhos, ofegante, sentindo o suor e lágrimas escorrerem por seu rosto. Ele adormecera na cadeira e tivera mais um daqueles seus sonhos com Donna. Sentiu todos os músculos de seu corpo retesados, como se tudo aquilo não fosse fruto de sua imaginação. Tentou se acalmar, regulando sua respiração, levantando lentamente.

— Por que faz isso comigo? – Perguntou em voz baixa para sala vazia. – Não te basta a culpa que eu sinto? Não te basta a minha falta de vontade de viver depois que você se foi?

Ajoelhou-se próximo ao colchão em que ele deveria dormir e chorou. Os soluços travavam sua respiração e ele podia sentir as lágrimas molhando seu peito magro. Aquela casa estava tão impregnada da presença dela, parecia que seus olhos castanho-esverdeados estavam por toda parte, observando-o.

— Por que você é tão fraco? – Perguntou-se, entre os soluços. – Você foi o único culpado da morte dela...  

Sentiu seu coração apertar mais um pouco – se é que isso era possível – e virou o rosto em direção a porta, pois sentiu como se ela o olhasse do batente. Levantou-se e se encaminhou para lá, com os olhos fixos naquele ponto em que ele acreditava se encontrar Donna e sussurrou:

— Se um dia você for capaz de me perdoar, pois eu jamais serei...

— Remus, está tudo bem? – A voz de Emmeline surgiu, as suas costas, preocupada, seguidas de um toque em seu ombro nu.

A mão da moça era tão fria quanto aço e ele estremeceu ao senti-la em sua pele quente. Tentou se recompor da melhor maneira que pode, respirando profundamente, antes de virar-se para olhá-la. Mas seu rosto estava inchado e lavado pelas lágrimas. Ele simplesmente não tinha forças para lhe responder, se sentia tão pequeno e vulnerável, quanto uma criança.

Os olhos azuis miraram-lhe com espanto, pois em todos esses anos, Emmeline, nunca vira Remus chorar. Naquela madrugada, quando acordou com o barulho que vinha da sala, empunhou sua varinha, com força e seguiu fazendo o maior silêncio que conseguia. Encontrou, porém, o rapaz parado próximo a porta falando sozinho, com sua voz parecendo nasalada e triste. Não foi capaz de ouvir o que ele dizia, mas quando o chamou e tocou seu ombro, sentiu uma onda de eletricidade percorrer seu corpo. Enquanto encarava o rosto choroso dele, ocorreu a moça que algo de muito ruim acontecera com Remus enquanto ele estivera na Itália, mas para ela não parecia o momento correto de um interrogatório.

Alguns segundos se passaram enquanto eles se encaravam, esperando que um dos dois iniciasse aquele diálogo doloroso. Entretanto, Emmeline preferiu o silêncio e o puxou para um abraço, sem dizer uma única palavra. Remus já se preparava para as perguntas que ele temia responder, mas aliviou-se ao sentir a cabeça dela sobre seu peito. Envolveu-a com seus longos braços em um abraço apertado e aninhou sua cabeça sobre os cabelos loiros dela. De olhos cerrados, não soube quanto tempo passara assim, mas sentia seu coração se acalmar a cada batida.



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