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História Surpresa Irresistível - 1


Escrita por: BearPS

Capítulo 1 - 1



– Não vou dizer que aposto que ele tem pau enorme, mas também não vou negar.
– Pippa – eu disse, cobrindo o rosto horrorizada. Pelo amor de Deus, eram sete e meia da manhã de uma quinta-feira. Ela não podia estar bêbada tão cedo
assim.
Tentei jogar um sorriso de desculpas para o homem de olhos arregalados na nossa frente e fiquei desejando poder acelerar o elevador com o poder da minha
mente.
Quando olhei feio para ela, Pippa fez um movimento com os lábios dizendo “o que foi?”, e depois mostrou com as mãos o tamanho que ela tinha em mente.
Então, sussurrou: – Igual a um cavalo.
Fui salva de precisar me desculpar de novo quando paramos no terceiro andar e as portas se abriram.
– Você percebeu que tinha mais gente no elevador, não é? – eu disse num tom bravo, seguindo Pippa pelo corredor e virando em outro. Paramos na frente de uma porta com o nome Richardson-corbett gravado no vidro fosco.
Ela ergueu os olhos de sua bolsa enorme, onde procurava as chaves, enquanto os braceletes no seu pulso tilintavam como sininhos que balançam com o vento. Sua bolsa tinha uma forte cor amarela e era cravejada com metal brilhante. Debaixo da luz fluorescente, seu longo cabelo ruivo parecia feito de neon.
Meu cabelo era loiro-escuro e eu carregava uma bolsa bege: sentia-me um biscoito de caramelo ao lado dela.
– Tinha mais gente?
– Sim! Aquele cara do financeiro estava bem na sua frente. Tenho que ir lá mais tarde, e graças a você vou sofrer um momento constrangedor quando olharmos um para o outro e lembrarmos-nos de você falando pau.
– Eu também disse “igual a um cavalo”. – Ela se sentiu momentaneamente culpada antes de voltar a atenção para a bolsa. – Os caras do financeiro precisam relaxar um pouco, de qualquer maneira. – Então, com um gesto dramático mostrando o corredor escuro à nossa frente, ela disse: – Agora estamos sozinhas o bastante pra você?
Fiz uma reverência irônica para Pippa. – Por favor.
Você primeiro.
Ela assentiu, juntando as sobrancelhas como se estivesse se concentrando. – Quer dizer, logicamente ele tem que ser enorme.
– Logicamente – eu repeti, tentando segurar um sorriso. Meu coração batia loucamente como sempre fazia quando conversávamos sobre Niall Stella.
Especular sobre o tamanho do seu pênis seria a minha ruína.
Jogando o braço no ar num movimento vitorioso, Pippa sacudiu as chaves do escritório antes de enfiar a maior delas na fechadura.
– Ruby, você já reparou nos dedos dele? Nos pés? Sem falar que ele tem uns três metros de altura.
– Dois metros – eu corrigi discretamente. – Mas o tamanho da mão não quer dizer nada. – Fechamos a porta atrás de nós e acendemos as luzes do escritório.
–Muitos caras têm mãos grandes, mas não são especialmente dotados lá onde importa.
Continuei seguindo a Pippa pelo corredor estreito até uma sala cheia de escrivaninhas, num canto menor e menos opulento do terceiro andar. Apesar do aperto, nossa pequena seção do escritório era pelo menos confortável, uma sorte, considerando que eu passava mais tempo ali, trabalhando, do que no meu pequeno apartamento alugado em South London.
A Richardson-Corbett Consultoria podia ser uma das maiores e mais bemsucedidas empresas de engenharia da Europa, mas oferecia apenas poucas vagas de estágio. Logo depois de me formar na UC San Diego, fiquei extremamente animada quando consegui uma vaga na empresa. As horas eram longas e o pagamento acabou com meu vício de comprar sapatos, mas o sacrifício já estava valendo a pena: depois de completar os primeiros noventa dias do estágio, uma placa de metal substituiu a fita crepe com o nome Ruby Miller, e me mudaram – daquilo que não passava de um armário no segundo andar para um dos escritórios adjuntos do terceiro andar.
Passei sem problemas pelo colégio e sobrevivi à faculdade com apenas alguns surtos ocasionais. Mas me mudar para o outro lado do mundo e conviver com alguns dos melhores engenheiros da Inglaterra? Nunca trabalhei tão duro por nada em minha vida inteira. Se terminar o estágio tão bem quanto comecei, eu provavelmente conseguiria uma vaga dos sonhos na pós-graduação da Oxford. É claro, terminar bem significa não ficar falando sobre o pau dos executivos no
elevador… Mas a Pippa estava apenas começando.
– Lembro de ter lido que você deve medir do punho até a ponta do dedo do meio… – ela acrescentou, usando os dedos para medir a própria mão, depois mostrou para mim tentando ilustrar o argumento. – Se for verdade, o cara do seu
sonho deve ser muito
bem-dotado.
Eu confirmei, pendurando meu casaco no encosto da cadeira.
– Acho que sim.
Pippa deixou a bolsa sobre a cadeira e me olhou com uma expressão mordaz. – Adoro quando você tenta parecer toda desinteressada. Como se não ficasse
olhando para o pau dele sempre que ele aparece num raio de três metros de você.
Tentei fingir indignação. Tentei parecer horrorizada e argumentar qualquer coisa.
Não consegui pensar em nada. Nos últimos seis meses, joguei tantos olhares disfarçados na direção do Niall Stella que se alguém pudesse ser considerada uma especialista na topografia da sua virilha, essa seria eu.
Enfiei minha bolsa na gaveta debaixo da minha mesa e fechei soltando um suspiro resignado. Aparentemente, meus olhares disfarçados não foram muito eficazes no quesito “disfarce” como eu pensava.
– Infelizmente, tenho certeza que o pau dele nunca esteve, nem vai estar, tão perto de mim assim.
– Não se você nunca falar com ele. Quer dizer, olha só, assim que eu tiver uma chance, vou pular no pescoço daquele ruivo do RH. Você deveria pelo menos falar com ele, Ruby.
Eu já estava sacudindo a cabeça quando ela bateu com sua echarpe em mim. – Pense nisso como uma pesquisa para sua aula de Integridade Estrutural.
Diga a ele que você precisa testar a resistência à tração da barra de aço dele. Soltei um gemido frustrado. – Ótimo plano.
– Certo, então pense em outra pessoa. Tipo aquele loiro da sala de correspondência. Ele sempre fica de olho em você. Fiz uma careta.
– Não me interessa.
– Então o Ethan, do financeiro. Ele pode ser baixinho, mas é sarado. E você viu quando ele fez aquele truque com a língua no pub?
– Deus, não. – Eu me sentei, afundando sob o peso da investigação dela. – Estamos mesmo tendo essa conversa? Não podemos só fingir que minha enorme paixonite não existe?
– Não mesmo. Você não está interessada em nenhum dos outros caras, mas também não consegue ir atrás do
Sr. Certinho – ela suspirou. – Não me entenda mal. O Stella é realmente gostosão, mas um pouco certinho demais, você não acha? Passei minha unha sobre a beira da mesa.
– Eu meio que gosto disso nele
– falei. – Ele é estável. – Careta
– ela retrucou.
– Contido – eu insisti. – É como se ele tivesse saído de um romance da Jane Austen. Ele é o Mr. Darcy. – Achei que isso ajudaria no meu argumento.
– Não entendo isso. O Mr. Darcy é curto e grosso com a Elizabeth, quase chegando à grosseria. Por que você quer alguém que daria tanto trabalho?
– Por que você acha que isso dá mais trabalho? – perguntei. – O Mr. Darcy não fica jogando elogios baratos sem significado. Quando ele diz que a ama, é porque ama mesmo.
Pippa desabou na cadeira e ligou o computador.
Acontece que eu gosto de um pouco de flerte.
– Mas um flerte é igual com todo mundo – argumentei. – O Mr. Darcy é desajeitado e difícil de entender, mas quando você conquista seu coração, ele se torna apenas seu.
– Para mim, isso parece trabalhoso demais.
Eu sei que sempre fui um pouco romântica demais, mas a ideia de ver o herói contido se entregando por completo de um jeito que ninguém conseguia fazer – sem inibições, faminto, sedutor – tornava difícil pensar em outras coisas quando Niall Stella aparecia na minha frente.
O problema era que eu ficava totalmente idiota quando ele estava por perto. – Como é que eu posso pensar em ter uma conversa de verdade com ele?
–perguntei. Eu sabia que nunca daria o primeiro passo, mas gostei de finalmente conversar sobre isso com alguém que o conhecia, alguém que não fosse a London e a Lola, minhas amigas que estavam do outro lado do oceano.
Eu continuei:
– Sabe, uma conversa em que nós dois soubéssemos que era aquele tipo de conversa? Na reunião da semana passada, o Anthony me pediu para apresentar uns dados sobre o projeto da Diamond Square e eu estava arrasando até que ergui os olhos e vi que ele estava atrás do Anthony. Você sabe quanto tempo eu trabalhei duro naquilo? Foram semanas. Mas foi preciso só um vislumbre do Niall Stella para destruir minha concentração.
Por alguma razão, eu não conseguia falar dele usando apenas o primeiro nome. Dizer “Niall Stella” era um tipo de honra, como Príncipe Harry ou Jesus Cristo.
– Fiquei muda no meio de uma frase – eu continuei. –Quando ele está perto de mim, acabo soltando algo ridículo ou perco completamente a fala.
Pippa riu antes de cerrar os olhos e me olhar de cima a baixo. Ela apanhou o calendário e fingiu que estava analisando.
– Engraçado, acabei de perceber que hoje é quinta-feira – ela disse, quase cantando. – Isso explica por que o seu cabelo está particularmente sexy hoje e
você está usando essa minissaia devassa.
Passei a mão sobre meu cabelo curto e repicado que chegava até o queixo. – Está do jeito que fica todos os dias.
Pippa riu. Na verdade, passei tempo demais me arrumando pela manhã, mas eu precisava de uma confiança extra hoje.
Pois, assim como ela disse, hoje era quinta-feira, meu dia favorito da semana. Nas quintas-feiras eu me encontrava com ele.
No geral, as quintas-feiras não deveriam ser motivo para ficar animada. A lista de afazeres para hoje, em particular, incluía coisas mundanas como regar a pequena figueira que a Lola insistiu que eu contrabandeasse de San Diego à Londres, digitar um orçamento e enviar pelo correio e colocar o lixo reciclável na calçada. Uma vida glamorosa. Mas no topo da lista das quintas-feiras havia o encontro do grupo de engenharia do Anthony Smith, onde, por uma hora toda semana, eu tinha uma visão sem obstruções do Niall Stella, Vice-Presidente, Diretor de Planejamento e, meu Deus, o Cara Mais Gostoso do Mundo.
Se pelo menos eu pudesse incluí-lo na minha lista de “coisas” a fazer. Uma hora de observação privilegiada do Niall Stella era ao mesmo tempo uma bênção e uma maldição, pois eu estava interessada de verdade no que acontecia com a empresa e achava fascinante a maioria das conversas entre os sócios majoritários. Eu tinha 23 anos, não doze. Tinha um diploma de engenharia e seria a chefe deles, algum dia, se tudo desse certo. A ideia de que um único indivíduo possuía o poder de sequestrar minha atenção era mais do que horripilante. Normalmente, eu não era desajeitada ou medrosa, e eu namorava, sim. Na verdade, namorei mais desde que me mudei para Londres do que no tempo em que morava em casa porque, bom, Garotos Ingleses. Isso diz tudo.
Mas este Garoto Inglês em particular estava, infelizmente, além do meu alcance. Quase literalmente: Niall Stella tinha uns dois metros de altura e uma educação refinada, cabelos morenos perfeitamente arrumados, olhos castanhos cheios de vida, largos ombros musculosos e um sorriso tão lindo que, nas raras vezes em que dava as caras no escritório, fazia minha linha de raciocínio despencar num abismo.
De acordo com os rumores do escritório, ele terminou a faculdade ainda um menino, para depois se tornar um urbanista lendário. Mas só descobri que isso era verdade quando comecei a trabalhar com o grupo de engenharia da Richardson Corbett e testemunhei a maneira como ele aconselhava tudo, desde diretrizes de construção até a composição química de aditivos do concreto. Ele era praticamente a palavra final em Londres sobre todas as pontes e construções comerciais e de transporte. Para minha completa decepção, ele até sumiu no meio de uma quinta-feira para dirigir uma equipe de construção quando um trabalhador em pânico ligou dizendo que outra empresa havia errado no projeto da fundação e o concreto já estava sendo despejado. Nada em Londres era erguido sem uma opinião do Niall Stella em algum ponto.
Ele tomava seu chá com leite (sem açúcar) antes de qualquer coisa, tinha um escritório enorme no terceiro andar
– longe do meu –, claramente nunca tinha tempo para televisão, mas era torcedor fanático do Leeds United. E, apesar de ter sido criado em Leeds, fez faculdade em Cambridge, depois Oxford, e agora morava em Londres. Em algum ponto do caminho, Niall Stella adquiriu um sotaque muito elegante.
Além disso tudo: era recentemente divorciado. Meu coração mal podia aguentar. Enfim, seguindo em frente.
Número de vezes em que o Niall Stella me olhou durante as reuniões de quinta? Doze. Número de conversas que tivemos? Quatro. Número de eventos desses de que ele se lembra? Zero. Estive lutando contra minha paixonite pelo Niall Stella por seis meses, mas tinha certeza de que ele não sabia distinguir se eu era funcionária da empresa ou se estava lá apenas entregando comida.
Ele era sempre um dos primeiros a chegar ao escritório, mas hoje curiosamente ainda não havia chegado. E eu chequei – várias vezes – esticando meu pescoço para enxergar através das pessoas sonolentas que lentamente enchiam a sala de conferência.
Nossa sala de reuniões tinha uma parede de janelas, cada uma com vista para a rua movimentada lá embaixo. Minha caminhada matinal para o trabalho foi relativamente seca, mas, como quase sempre acontecia por aqui, uma garoa começou a cair do céu pesado com nuvens. Era o tipo de chuva que parecia uma névoa inocente, mas aprendi a não me deixar enganar: se eu demorasse mais que três minutos, acabaria encharcada. Mesmo se tivesse crescido em algum lugar mais chuvoso que o sul da Califórnia, eu nunca estaria preparada para o jeito como o ar londrino, entre outubro e abril, parece saturado com água, pesado e úmido. Como se uma nuvem de chuva envolvesse meu corpo e penetrasse até meus ossos.
A primavera havia apenas começado em Londres, mas a pequena praça na Southwark Street ainda estava vazia e decepcionante. Ouvi dizer que no verão a praça ficava cheia de cadeiras cor-de-rosa e mesinhas de um restaurante nos fundos. No momento, tudo que se via era concreto, galhos pelados e folhas marrons dançando pelo chão.
Ao meu redor, as pessoas continuavam a reclamar do clima enquanto abriam seus notebooks e terminavam seus chás. Tirei os olhos da janela a tempo de ver os últimos retardatários chegando apressados. Todos queriam estar acomodados antes que Anthony Smith – meu chefe e diretor de engenharia da empresa –descesse do sexto andar.
Anthony era… bom, certo, ele era um sujeito meio idiota. Ele ficava secando as estagiárias, adorava ouvir a si mesmo e nada que falava soava sincero. Em todas as manhãs de quinta ele gostava de fazer um exemplo da última pessoa que entrava, comentando rispidamente com um sorriso falso sobre suas roupas ou o cabelo para que todo mundo na sala ficasse olhando em silêncio, enquanto a pessoa buscava um lugar para sentar, toda envergonhada.
A porta rangeu enquanto abria. Emma. Mas ela ficou segurando a porta para outra pessoa. Ah! Karen. Vozes soaram do corredor, aumentando quando entraram na sala. Victoria e John. E então, lá estava ele. – É hora do show – Pippa murmurou ao meu lado.
Vi o topo da cabeça do Niall Stella quando ele entrou logo atrás do Anthony, e era como se o ar sumisse da sala. As pessoas e o burburinho se transformaram num borrão até sobrar apenas ele, com uma expressão neutra enquanto instintivamente analisava quem estava presente e quem não estava, os ombros cobertos num terno escuro, uma das mãos casualmente dentro do bolso da calça.
Aquela sensação urgente e fogosa em meu peito aumentou.
Havia algo no Niall Stella que fazia você querer olhar para ele. Não porque fosse chamativo ou espalhafatoso, mas porque não era. Havia uma confiança discreta nele, um jeito de se portar que exigia atenção e respeito, e a sensação de que enquanto não estava falando, ele estava observando, estudando cada pessoa.
Todos, exceto a mim.
Por ter crescido numa família de terapeutas que discutiam tudo, nunca fui do tipo silencioso. Meu irmão e até a Lola me chamavam de tagarela quando eu não parava de falar. Então, o fato de que eu, entre todas as pessoas, não conseguia articular uma simples palavra com Niall Stella por perto não fazia nenhum sentido. O que eu sentia por ele era um tipo de encanto que impedia qualquer concentração.
Ele nem precisava comparecer às reuniões de quinta-feira; ele apenas aparecia, pois queria ter certeza de que havia “consenso entre os departamentos”, então sua divisão de planejamento “poderia ao menos ter um vocabulário de engenharia em comum”, já que era sua responsabilidade coordenar a engenharia com as políticas públicas e seu próprio departamento de planejamento.
Não que eu decorasse tudo que ele dizia nas reuniões.
Hoje ele vestia uma camisa azul-clara debaixo do terno escuro. A gravata exibia um desenho hipnotizante em amarelo e azul, e meus olhos subiram pelo nó Windsor duplo até a pele macia do pescoço, passando pela curva pesada do pomo de adão, chegando ao queixo quadrado. Sua normalmente impassível boca estava curvada para baixo em consternação, e quando cheguei nos olhos… percebi, horrorizada, que ele estava olhando para mim – enquanto eu o comia com os olhos como se fosse meu trabalho. Oh, Deus.
Baixei os olhos para meu notebook, e a tela se tornou um borrão sob a intensidade do meu olhar. A cacofonia de telefones e impressoras do escritório lá fora invadia pela porta aberta, o volume aumentando até se transformar num caos sonoro, e então alguém fechou a porta, sinalizando o começo da reunião. E como se a sala fosse isolada a vácuo, todo o barulho silenciou abruptamente.
– Sr. Stella – Karen disse num cumprimento.
Cliquei em meu e-mail, tentando focar minha audição em sua resposta. Respirei fundo. Mais de uma vez. Digitei minha senha. Forcei meu coração a se
acalmar.
– Karen – ele disse, finalmente, em sua perfeita voz grave e discreta. Um sorriso se espalhou inconscientemente em meu rosto. E não foi um simples sorriso, foi um largo sorriso, como se alguém tivesse me oferecido uma fatia gigante de bolo. Meu Deus, estou profundamente perdida.
Mordendo o interior da minha bochecha, fiz força para endireitar a expressão. Julgando pelo toque do cotovelo de Pippa nas minhas costelas, tive certeza de que falhei. Ela chegou mais perto.
– Calma lá, garota – ela sussurrou. – Foram apenas duas sílabas. A porta se abriu e Sasha, outra estagiária, entrou rapidamente.
– Desculpe o atraso – ela sussurrou. Uma olhada para o relógio do notebook me disse que, na verdade, ela foi perfeitamente pontual, mas Anthony, claro, não deixaria passar.
– Tudo bem, Sasha – ele disse, observando enquanto ela se espremia entre a longa fila de cadeiras e a parede, sob um silêncio constrangedor. – Que blusa bonita. É nova? Azul fica bem em você. – Sasha tomou seu lugar, o rosto todo vermelho.
– E, a propósito, bom dia – ele acrescentou com um grande sorriso.
Fechei meus olhos, respirando fundo mais uma vez. Ele era tão babaca. Finalmente, a reunião em si começou. Anthony passou sua lista de questões
para cada um de nós, papéis foram distribuídos, e quando eu me virei na cadeira para entregar a pilha de papéis para a próxima pessoa, olhei para a mesa. E quase engoli minha própria língua.
Niall Stella estava a apenas duas cadeiras de mim.
Por debaixo de meus cílios, olhei para ele, para o ângulo de seu queixo – sempre perfeitamente barbeado, nunca nem mesmo um resquício de barba –, para seus olhos de cílios negros e perfeitos, as sobrancelhas castanhas, a impecável camisa e a gravata. Seu cabelo parecia tão suave sob a leve iluminação da sala de reunião. Acabei franzindo as sobrancelhas quando notei que provavelmente também era macio – tinha que ser, é claro – e imaginei pela centésima vez como seria passar minhas mãos ali, agarrar, puxar e…
– Ruby? Já recebemos notícias da Adams e Avery? –Anthony perguntou. Endireitei-me na cadeira e olhei para o notebook. Passei a noite em claro
trabalhando naquele arquivo.
– Ainda não – eu disse, minha voz quase normal. – Eles já estão com nossos planos prontos para a assinatura. Mas checarei de novo com eles se eu não
receber nenhum telefonema até o fim do dia.
E, sim, isso até que foi bem articulado, considerando a maneira como Niall Stella voltou toda sua atenção para o meu rosto.
Muito satisfeita comigo mesma, digitei um rápido lembrete e apoiei o cotovelo na mesa, puxando uma mecha de cabelo enquanto passava o olho em meu
calendário.
Mas algo parecia errado. Eu me sentava nesta cadeira por uma hora todas as semanas, e tinha quase certeza de que nunca tive a sensação de agora. Era uma
pressão na lateral do meu rosto, como se fosse o peso físico da atenção de alguém.
Enrolei o cabelo em meu dedo e casualmente olhei para Pippa. Não, nada. Com aquilo que eu imaginava ser uma sutil inclinação para frente, estiquei o pescoço olhando para a direita e imediatamente congelei.
Ele ainda estava olhando para mim. Niall Stela estava olhando para mim. Olhando de verdade. Olhos castanhos claros encontraram os meus, algo que não poderia ser descrito como uma simples olhada, mas sim como uma completa encarada. Sua expressão era de curiosidade, como se eu fosse um móvel novo que acabaram de deixar aleatoriamente na sala.
Meu coração disparou, martelando a pulsação em minhas veias. Dentro do meu peito, tudo parecia líquido e maluco, e se alguém gritasse “fogo!” eu acabaria explodindo, pois não conseguia controlar nenhum aspecto do meu corpo.
– Niall – Anthony disse.
Niall Stella piscou antes de desviar os olhos do meu rosto. – Sim?
– Você se importaria de nos informar a situação da proposta na Diamond Square? Quero que minha equipe tenha alguns parâmetros até o fim da semana, mas não sabemos a dimensão do espaço compartilhado…
Eu me distraí quando o Anthony, como sempre, fez sua pergunta de um jeito que era sete vezes mais complexo do que deveria ser.
Quando a questão terminou, Niall Stella sacudiu a cabeça.
– As dimensões – ele disse, depois começou a revirar uma pilha de papéis na sua frente. – Não tenho certeza se tenho os números aqui…
– Eles marcaram de terminar as dimensões hoje de manhã – eu respondi e expliquei que as permissões seriam entregues no máximo até amanhã. – Pedi ao Alexander para enviar uma cópia da planta à tarde.
A sala ficou tão silenciosa que pensei que tinha perdido a habilidade de ouvir. Acontece que todos estavam olhando para mim. Oh, Deus, o que foi que eu
fiz? Eu interrompi sem pensar.
Respondi a uma questão que claramente não era para mim. Respondi a uma questão que ele claramente sabia a resposta.
Senti minhas sobrancelhas franzirem. Mas por outro lado, por que ele não havia respondido? Inclinei-me para frente e olhei para ele.
– Bom – ele disse. Discreto. Profundo. Perfeito. Depois de se ajeitar na cadeira, olhou-me nos olhos e exibiu o vestígio de um sorriso agradecido. – Encaminha pra mim depois?
Meu coração voou completamente para fora do meu corpo. – É claro.
Ele ainda olhava para mim, claramente tão confuso quanto eu sobre o que acabara de acontecer, mas satisfeito, de um jeito misterioso. Não sei o que me fez falar aquilo. Em um minuto Niall Stella estava olhando para mim, no minuto seguinte ele estava todo atrapalhado procurando uma informação para responder a uma questão que eu tinha certeza de que ele poderia responder até mesmo
dormindo. Era como se sua mente estivesse viajando em outro lugar. Algo que nunca vi acontecer antes.
– E agora, a boa notícia – Anthony disse, olhando para uma pilha de papéis antes de passá-la adiante e se levantar. Ergui meus olhos, apreensiva por causa do seu tom de voz. Anthony adorava ter a atenção da sala e, pelo visto, estava se preparando para algo grande.
– O sistema de metrô de Nova York foi construído com a ideia de que tempestades perfeitas acontecem apenas uma vez a cada cem anos. Infelizmente, a realidade não é essa. Desastres como o furacão Sandy provam que aquilo que era esperado uma vez a cada século tem acontecido muito mais frequentemente. Os Estados Unidos estão gastando bilhões com projetos para entradas elevadas e comportas contra enchentes e, já que trabalhamos bastante com o metrô de Londres, eles também querem nossa opinião. Então, viajarei por um mês para participar da Conferência Internacional sobre Preparação Emergencial para transportes públicos, viagens aéreas e infraestrutura urbana.
– Um mês? – uma das engenheiras disse, ecoando aquilo que todos provavelmente estavam pensando. Imaginei se mais alguém estava ecoando minha comemoração mental com a ideia de ficar livre do Anthony por um bom período.
Ele fez um gesto na direção dela.
– Serão três conferências diferentes. Nem todos os convidados ficarão durante todo o tempo, mas já que nossa empresa é especialista tanto em infraestrutura
urbana quanto em transporte público, Richard decidiu que gostaria que nós ficássemos por toda a duração do evento.
– Nós? – perguntou um dos executivos do departamento do Niall.
– Isso mesmo – Anthony disse, inclinando a cabeça para sua esquerda. – Niall irá me acompanhar.
– Vocês dois vão ficar fora por um mês? – eu disse de repente, instantaneamente desejando poder agarrar minhas palavras e enfiá-las de volta na minha garganta. Eu era uma estagiária. Uma das regras veladas do Anthony era que nós não deveríamos falar nada, com exceção a perguntas diretas. Eu podia sentir o peso dos olhos de todos sobre mim novamente. E, pior do que isso, podia sentir os olhos dele pressionando minha pele, analisando.
– Hum, sim, Ruby – Anthony disse, claramente confuso. Ele deu a volta em sua cadeira para ficar de pé ao meu lado, com as mãos no bolso da calça. – Mas não se preocupe, sei que seu projeto da Oxford Street está quase pronto, minha ausência não irá afetar a liberação. Se você precisar de alguma coisa, é só ligar.
– Oh – eu disse, sentindo o calor lentamente sumir do meu rosto. – É bom saber disso, obrigada. – É claro que o Anthony pensou que minhas palavras vomitadas eram porque eu estava preocupada por ele – meu chefe – viajar, e que talvez sua ausência pudesse de alguma forma interferir no meu trabalho.
– Isso foi muito sutil – Pippa disse, enquanto suas longas unhas digitavam no teclado.
– Cala a booooca – gemi, afundando na cadeira.
Eu não sabia se o Niall Stella ainda estava olhando na minha direção, e a parte de mim que ainda tinha doze anos queria arrastar Pippa até o banheiro para que ela descrevesse a cena, segundo a segundo.
Mas eu sabia que isso seria um erro. Era o primeiro dia que ele reparava em mim de verdade e estraguei tudo, agindo como uma psicopata. Eu não aguentaria ouvir dela que ele fez aquela cara na minha direção, quando ele fechava o rosto como se alguém tivesse derramado chantilly em seu terno caro.
Eu achava melhor voltar para os tempos em que ele não sabia que eu existia.
Ao fim do dia, eu estava em nossa longa mesa compartilhada organizando uma pilha de permissões. Minha Coca diet já estava morna e eu contava os minutos para um banho quente e um livro (ainda mais quente) quando meu email piscou com uma nova mensagem.
– Finalmente – suspirei. Estive esperando pela confirmação do número o dia todo, e agora, talvez, eu poderia ir para casa.
Ou talvez não.
Pippa bocejou ao meu lado e espreguiçou os braços sobre a cabeça. Já estava escuro lá fora e a caminhada até o metrô seria fria e molhada.
– Podemos ir agora? Meus ombros caíram.
– Na verdade, é um e-mail do Anthony – eu disse a ela, franzindo as sobrancelhas diante da tela. – Ele quer me ver em seu escritório antes de eu ir embora. Posso pensar em pelo menos umas cem coisas que eu preferia fazer a
isso. – O quê? – ela disse, chegando mais perto para olhar meu monitor. – O que ele quer?
Eu sacudi a cabeça. – Sei lá.
– Ele não tem relógio? Nossa hora já passou faz vinte minutos.
Digitei uma resposta rápida, dizendo que estava a caminho, depois comecei a arrumar minhas coisas.
– Espera por mim? – eu pedi.
Parando antes de fechar a gaveta com violência, ela fez uma cara triste. – Tenho que correr, desculpa, Rubes. Esperei o máximo que podia, mas tenho
muito que fazer à noite.
Eu disse que estava tudo bem, mas senti um pouco de desconforto por ficar sozinha no escritório, tarde assim, com Anthony.
Os corredores estavam vazios quando peguei o elevador para o sexto andar.
– Ruby, Ruby, entre – ele disse, parando de arrumar algumas coisas sobre sua mesa e as colocando dentro de uma caixa de papelão. Será que ele foi despedido? Será que isso é um sonho?
– Feche a porta e sente-se – ele continuou. Senti minha boca querendo se curvar para baixo.
– Mas não tem ninguém aqui – eu disse, deixando aporta aberta e me sentando na cadeira em frente à mesa.
– Por que seus pais te deram esse nome, Ruby? – ele perguntou, analisando meu rosto lentamente.
Minha careta aumentou. O quê?
– Hum… não sei direito. Acho que eles simplesmente gostavam do nome. – Anthony tinha vários hábitos do mundo dos negócios, incluindo manter uma garrafa de uísque numa mesa atrás de sua escrivaninha. Será que ele tinha
bebido? – Eu já contei a você qual era o nome da minha avó? Olhei para o uísque, tentando lembrar o quanto estava cheio na última vez que estive aqui.
Anthony deu a volta na mesa e se sentou na beirada mais perto de mim. Sua coxa pressionou contra a lateral do meu braço e eu me ajeitei na cadeira.
– Não, senhor. Nunca me contou.
– Não, não me chame de “senhor” – ele disse, balançando a mão em protesto. – Isso me faz sentir como se eu pudesse ser o seu pai, lembra? Me chame de Anthony.
– Certo. Desculpe… Anthony…
– Não sou o seu pai, sabe? – ele disse, enquanto se inclinava na minha direção. Houve uma pausa pesada. – Nem perto dessa idade.
Tentei disfarçar o estremecimento que se espalhou por meu corpo. Tenho certeza que, se fosse possível, Anthony literalmente se derreteria numa poça aos meus pés. E depois olharia debaixo da minha saia.
– Mas não foi por isso que chamei você aqui. – Ele se endireitou e puxou um arquivo de uma pilha em sua mesa. – Chamei você aqui porque houve uma mudança nos planos. Acontece que surgiu uma coisa e não vou poder ir para
Nova York.
O que isso tinha a ver comigo? Ele achava mesmo que eu estava tão preocupada com sua ausência que precisava me atualizar pessoalmente?
Engoli em seco, tentando parecer interessada. – Não vai poder?
– Não – ele disse, sorrindo, tentando ser generoso, até mesmo indulgente. – Você vai.



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