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História Surrender - Don't You Trust Your God?


Escrita por: Kitty-Batsky

Notas do Autor


Oi, como estão?
Voltei do Japão! Também a praxe já começou por isso estou bem cansada e vou ficar ainda mais cansada ^ ^`
Mas bem, continuando: esse cap eu escrevi em duas partes. Antes de ir para o Japão escrevi a cena do luto, depois de vir a cena depois dessa.
Eu ainda estou bem triste por causa de ter assassinado o Nathan!
Enfim, né, vida segue!

Imagem: NanFe (Devianart)

Capítulo 52 - Don't You Trust Your God?


Fanfic / Fanfiction Surrender - Don't You Trust Your God?

A vigília de Evangeline durou três dias. Nesse meio tempo não arredou do local aonde morrera Nathan. Recusou-se a comer, ainda que Sebastian lhe trouxesse regularmente alimento e bebida, e só tragava a água que ele lhe oferecia para não sucumbir à sede.

Chorava imenso a princípio. Todavia, à medida que o tempo se arrastava, menos horas dedicava às lágrimas e mais se perdia em melancólicas contemplações. O jejum dotara o seu cérebro de uma falsa calma.

Lembrou-se de Jesus, de como fora crucificado, de como todos o julgavam morto, de como ressuscitara ao terceiro dia. Manteve assim uma última esperança, a de que algo de semelhante sucedesse a seu irmão. Mas, oh, Evangeline, se todos os inocentes ressuscitassem não haveria isto de ser considerado milagre nenhum.

Ao acordar naquela manhã terceira, que quisera à força toda tornar especial, correu a ver o cadáver de Nathan. Quando o teve perante os olhos soltou um guincho atroz e por pouco não desfaleceu de desilusão. Os belos orbes azuis do anjo tinham sido comidos por insectos. Nathan não ia reviver. Não tinha olhos, os vermes haviam-no adentrado pela boca, estava arruinado.

Num acesso de raiva, Evangeline pisou todos aqueles bichos que se banqueteavam com o corpo do seu querido protector. E só não chorou porque os olhos tinham-lhe secado do sal e tanto haviam inchado que nenhuma lágrima conseguia escorrer deles.

Ao fim do dia, cedera finalmente à cruel realidade. Procurou terra macia, onde pudesse escavar com as mãos, e abriu a cova onde, ao despontar das primeiras estrelas, enterrou a alma de Nathan.

Ao arrastá-lo para o seu túmulo, reparou em algo que brilhava no seu pescoço exangue. Era um rosário, aquele que ela recusara, aquele que a teria levado para casa se ela tivesse desistido da sua missão. Retirou-o do pescoço do irmão e guardou-o. Sabia que Nathan, se ali estivesse, aprovaria o seu gesto. Afagou os cabelos loiros do seu anjo da guarda e murmurou:

- Ainda que já não existas, continuas a velar por mim. Muito te agradeço. Se Deus adivinha quantas saudades terei de ti, e se tiver um bom coração como sempre acreditámos… estará terrivelmente sensibilizado neste momento. – Beijou-lhe a bochecha, pousou penas que arrancou das suas próprias asas nos olhos carcomidos do defunto, escondendo-os. – Perdão porque não fui forte. – Abraçou-o uma vez mais antes de o atirar para a cova. – Perdão porque perdi a virtuosidade. – Lentamente começou a soterrá-lo. – Perdão por te ter feito sofrer com os meus erros, que cometi um após o outro. – Estava feito. Nathan repousava sozinho naquele cemitério. As partículas da sua alma rolariam por aquelas terras, habitariam os animais e seriam carregadas pelo vento. O anjo não existia mais.

- Consola-me que, ao menos, não me verás no pior de mim. – E tremeu com as suas próprias palavras. Lembrou-se da loucura de Alois e perguntou-se se um dia também acordaria insana.

Voltou para o local aonde Nathan fora assassinado. Lá estavam, pousados perto de uma silva, a costumeira bilha de água, um pão e um pedaço de bolo. Evangeline derramou todo o líquido na garganta sequiosa e atreveu-se a morder o pão. Estava tão macio, e ela encontrava-se com tanta fome, que o naco que mastigou lhe deu esplêndido prazer. O coração mirrou-lhe tal a culpa que dela se apoderou. A morte de Nathan pesava sobre os seus ombros. Ela tinha que fazer algo para se sacudir daquela opressão. Sofrer, para, no futuro, se conseguir achar merecedora de júbilos.

Regressou à mansão, noite cerrada, mas não avisou ninguém da sua chegada. Entrou na casa o mais discretamente que lhe foi possível. Como criada, tinha uma cópia da chave das portas traseiras e conseguiu não ser vista pelos outros servos enquanto atravessava o jardim. Desconfiava que Sebastian a conseguia pressentir nos limiares, mas esperava sinceramente que ele não viesse falar com ela naquele momento.

Não havia propriamente um caminho que quisesse conscientemente seguir, então os seus passos levaram-na para um corredor que lhe trouxe lembranças. Fora ali que Sebastian a confrontara, foi quando ele descobriu que ela era um anjo. Tinha-a encurralado numa sala e coagido a mostrar as asas. Evangeline encostou-se à parede e começou a deslizar as mãos por esta, procurando a tal divisão. Ela não se lembrava muito bem da exacta localização da porta que procurava, mas sabia que acabaria por encontrá-la. Espreitou para dentro de várias salas até encontrar a de poeirentas cortinas que arrastavam pelo chão e que nunca deixavam entrar a luz do sol. Aquele espaço abandonado contava apenas com a presença de um biombo oriental semi dobrado deixado num canto e de um espelho coberto com um pano da mesma cor azul lusco-fusco que coloria as cortinas.

Refez os seus passos naquele dia, reconstruindo na sua cabeça a conversa que tivera com Sebastian. Fora ali que provavelmente cometera o seu primeiro erro. Guardara um segredo tóxico.

Despiu o vestido negro, fez aparecer as asas. Outrora eram tão imponentes que mal cabiam no espaço exíguo, mas tinham mirrado, pareciam as asas de um pássaro que tinha sido mantido em cativeiro durante muito tempo e em más condições. Quase metade das penas tinha caído.

Evangeline descobriu o espelho e olhou-se nele. Odiou o seu reflexo. Os dias de luto em que se recusara a cuidar de si mesma tinham-lhe tirado qualquer beleza que antes tivera. Mas isso não a incomodava sobejamente. Eram as suas defeituosas asas que ela odiava. Qualquer um que a visse pensaria nela como anjo maltratado. Mas ela não se via assim. E tinha horror em estar na pele de alguém que ela já não reconhecia.

Ajoelhou-se e inclinou-se para a frente até as pontas das asas lhe chegarem às mãos. Começou a arrancar as penas que lhe restavam às mãos cheias. Não pensava em nada de concreto enquanto o fazia, e não sabia dizer se aquele acto a fazia sentir-se bem ou mal. Talvez nem uma coisa nem outra, só tinha que o fazer.

Cedo as mãos se tornaram insuficientes para puxar as penas, que se agarravam à carne firmemente. Então Evangeline puxou do punhal que tinha voltado a guardar no decote depois de ter esfaqueado Sebastian e começou a cortar esses bocados de asas. Assim doía a sério, já não era coisa que pudesse ignorar. Evangeline sufocou um grito e começou a chorar, mas as suas mãos já tateavam buscando mais um pedaço de asa que pudessem romper.

No final, havia sangue por todo o lado, sangue e penas, espalhadas pelo chão frio. Evangeline sentia-se como um cisne morto, de joelhos entre os seus próprios bocados de corpo, sentia-se diferente, não menos culpada, mas diferente.

A dor dos cortes era agonizante, extrema, as suas costas ardiam de tal forma que apenas sentia o líquido escarlate quente sobre a pele quando este escorria pela sua zona lombar.

Limpou as lágrimas com a face plana da pequena adaga, o que resultou na sua face pálida se ensanguentar. Tudo nela estava manchado: o vestido, o rosto, os cabelos loiros, a alma.

O sofrimento aumentava exponencialmente, como se o seu corpo estivesse somente naquele momento a entender o que tinha sucedido.

Queria mais dor, e, ao mesmo tempo, que a que sentia cessasse por completo. Era demais, queria gritar, mas não queria atrair ninguém para aquela sala.

Durante minutos inteiros deixou-se ficar completamente imóvel, esperando que algo acontecesse. Que um sentimento de alguma espécie a tomasse. Fosse raiva, ou tristeza, ou alívio. Mas tudo o que conseguia sentir era a culpa e isso estava a destruí-la. Tinha perdido tanto sangue que tinha dificuldade em manter os olhos abertos, só a dor a impedia de desmaiar.

O seu desejo de ficar sozinha não tardou a desvanecer-se. Estava gelada, por causa da massiva perda de sangue e queria que alguém a abraçasse e aquecesse. Que a curasse das feridas que infligira a si mesma e lhe dissesse que tudo iria ficar bem.  

Evangeline ouviu a porta a abrir-se, e Sebastian entrou em passos cautelosos dentro da sala. Cautela originada, em grande parte, por surpresa. Ele não esperava ver Evangeline tão desfeita. De facto, quando sentira o cheiro do seu sangue, ficara curioso e era por isso que a viera procurar. Ele não via em Evangeline o tipo de menina que se mutilava para esquecer as mágoas, portanto questionou-se sobre quais seriam as suas intenções, claras agora na sua frente. Ela sentia-se mal com a sua própria Natureza.

Evangeline não precisava de ver Sebastian para o reconhecer. Permaneceu imóvel, continuou a olhar para os joelhos nus com os olhos rasos de lágrimas, fez o possível para ignorar a criatura que a acompanhava.

Sebastian avançou até estar mesmo do lado dela. Acarinhou o coto das suas asas destruídas, o que a fez ciciar de aflição e logo se sentiu vexada.

— Que estrago que por aqui fizeste! - O demónio comentou sem se preocupar em disfarçar o tom deliciado da voz.

Evangeline conseguia imaginar o seu sorriso sádico e olhos rejubilantes, teve vontade de vomitar. Que nojo de si mesma por querer se atirar nos braços do mordomo e chorar desalmadamente como uma criança castigada. Porque havia de querer que ele a consolasse?

- O cheiro do teu sangue está por toda a mansão. – Continuou Sebastian, casualmente. – Pensei que poderias precisar de ligaduras, por isso fui buscá-las antes de te procurar. – E, finda a explicação, começou a enrolar as faixas em volta dos cotos ensanguentados, com uma delicadeza que fez Evangeline enrubedescer de vergonha e raiva.

- Podias ter vindo antes. – Sussurrou Evangeline. O momento em que Ash enterrou a espada no abdómen de Nathan voltou a atormentar-lhe a mente, passou por ela como um relâmpago e fê-la tremer. – Ele podia estar vivo.

- Ele era teu irmão, querido por ti. Não significava nada para mim. Porque haveria de o ter salvo?

Evangeline ficou calada, a pensar, durante muito tempo, até Sebastian ter acabado de fazer o seu curativo.

- Eu queria que tivesses impedido Ash de o matar…

- Estou a ver que sim… - Replicou Sebastian, num tom extremamente mordaz. – É triste, não é, minha anjinha? Estares a dizer que querias ter-me pedido, a mim, um demónio, para salvar o teu irmão uma vez que sabes que ninguém mais poderia fazê-lo. Que se soubesses que Nathan teria sido salvo se me tivesses chamado, gritarias o meu nome a plenos pulmões. Sabes o que isso significa, não é? – Sebastian colocou um joelho no chão, abaixando-se em frente a Evangeline e limpando-lhe as lágrimas do rosto. – Não confias mais no teu Deus, confias?

O mordomo pegou nela ao colo, tinham-se-lhe ido todas as energias, e carregou-a até ao quarto.

- Talvez não… Não, não confio. – Evangeline abanou a cabeça tristemente. – Mas não quero confiar em ti.

- Vocês são todos muito engraçados. – Comentou Sebastian vivamente. – Ciel, tu, os meus anteriores mestres, todos sabiam que não podiam confiar em mim, mas, lá no fundo, confiavam. – Um sorriso nada gentil bailou nos seus lábios.

Sebastian pousou Evangeline na cama, tapou-a e beijou-lhe a testa.

- Boa noite, querida anjinha! – Despediu-se, fazendo-a ter vontade de gritar. Ela não suportava aquela alcunha. Não era uma anjinha. Não mais. Não se sentia uma. Mas desmaiou antes de poder reclamar.


Notas Finais


Até gostei do capítulo.
A cena da Evangeline cortar as asas foi uma coisa que me veio nos primórdios da história, acho que ainda nem tinha começado a escrever. Portanto sempre foi uma cena bastante importante para mim.
O texto deve ter-vos parecido familiar, porque a sinopse é essa cena precisa, mas com algumas alterações. Ou devo dizer que as coisas que aconteceram nesse capítulo é que foram as alterações, porque escrevi a sinopse bem antes de escrever o capítulo.
Não interessa muito, de qualquer maneira.
Ah, o vídeo da música Fire and Ice da Within Temptation foi uma grande inspiração para isto. Foi de lá que me veio a ideia para esta cena, como disse, há muito tempo atrás.
https://www.youtube.com/watch?v=ve2pS-jxXz0

Kiss kiss, bye!
Até à próxima!


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