História Susie Q - O Casamento

28 de abril de 1974.

Susan acaba de acordar e virando-se para o lado se depara novamente com lençóis vazios. "É sábado, ele deve ter tido muito trabalho" ela pensava, mas no fundo sabia que ele estava bebendo, certamente acompanhado de uma garota de 20 anos, mais jovem e fértil que ela.

"Ninguém manda ter um útero tão podre a ponto de não conseguir segurar um filho", dizia ela em frente ao espelho. Tantas tentativas, tantos abortos que ela mal conseguia contar. A escova limpava seus dentes enquanto o que ela queria era enfiar para dentro de sua garganta, até não conseguir mais respirar. Após resistir a este impulso, se vestiu e desceu para a cozinha. "Um café não faria mal a ninguém".

Fazendo seu café, lembrava-se dos dias de felicidade que tivera com Eric. Um café da manhã após uma noite de amor. Uma vida repleta de felicidade. Lembrava-se da lua de mel, de como eram tão felizes há dez anos atrás. Agora nem do aniversário de casamento ele se recordava.

Susan era uma recém adulta, com apenas 18 anos. Estava pronta para ir para a faculdade de Oxford, faria Filosofia. Mas tudo mudou quando o amigo de seu irmão, dez anos mais velho, entrou em sua casa. Harry rapidamente o apresentava a ela, sem imaginar que um dia Eric pudesse ser seu cunhado. Estavam à mesa Susan e seus pais quando Harry trouxe seu novo amigo, um estadunidense que estava de passagem em Brighton.

— Mamãe, papai, trouxe um amigo para jantar conosco hoje. Este é Eric Waters, de Minnesota. Ele é policial.

Os olhos de Susan, que antes liam com atenção um exemplar de "Parerga e Paralipomena" de Schopenhauer fixaram atentamente o novo hóspede, com curiosidade. Eric também a olhava com admiração, não deixando de fitá-la nem para cumprimentar os pais da moça.

Sentou-se à mesa ao lado de Susan, que nunca estivera tão vermelha em toda sua vida. Seus cabelos castanhos caiam sobre sua face, cobrindo suas bochechas coradas.

— Então, diga-nos, senhor Waters. O que um policial americano faz aqui em Brighton? - disse Robert Smith, pai de Susan e Harry. Robert era um pai conservador e severo, que não aceitava o fato de sua filha questionar seu casamento e seu estilo de vida. Para ele, o fato de a filha ter sido aprovada para estudar em Oxford era o cúmulo. Mulher decente para ele era boa dona de casa, boa mãe e boa esposa.

— Harry e eu estudamos juntos em um programa de treinamento militar de verão em Minneapolis. Assim que voltamos para casa, entrei para a polícia e no próximo mês serei nomeado xerife de Starbuck, então pedi uma licença para visitar meu velho amigo.
Robert via aquele rapaz com certa desconfiança, principalmente pelo fato de Eric não parar de olhar sua filha. O encarava como um leão que encara sua presa. Seu grande bigode não parava de dar espasmos de nervosismo, pois via que Susan também correspondia aos olhares. Mas para ele, qualquer coisa era melhor que as ideias feministas de Susan.

Naquele dia, Eric passou a noite na casa dos Smith - mais precisamente na cama de Susan, sem que ninguém soubesse. Susan não se importava com castidade tanto quanto suas colegas na época; para ela, uma pessoa livre era muito mais feliz. "De que adianta me manter presa em um casulo? Eu construo minha própria felicidade, ninguém tem o direito de opinar sobre a minha vida. Não serei como minha mãe que se deixa dominar pelo meu pai", ela pensava. E por este pensamento que naquela noite se entregou aos braços de Eric.

Na semana seguinte Eric voltou a Minnesota, mantendo contato com Susan por telefone todos os dias até que se casaram três meses depois. Susan deixou a faculdade e se mudou para Starbuck, a cidade minúscula da qual agora Eric era xerife.

O tempo passou e também várias tentativas de gerar um filho. Todas as vezes Susan tinha sangramentos e não conseguia passar do primeiro trimestre de gravidez, o que mudou o comportamento de Eric drasticamente. Não se abraçavam mais, não olhavam nos olhos um do outro. Eric a tratava como uma empregada, disponível ali somente para lavar, passar, cozinhar e raramente sexo. Tudo isso regado a indiferença e descrença de que Susan fosse capaz de qualquer coisa. Todo o amor, a admiração e o carinho um pelo outro sumiram por causa de um filho.

Susan sabia que ele voltaria antes do trabalho para pegar seu uniforme devidamente limpo e passado e tomar seu café da manhã decentemente posto na mesa. Ela olhava pela janela da cozinha a viatura de Eric se aproximando da casa. Tomava seu café com a indignação de quem não aguentava mais aquela vida. 

Eric entrou na casa e a olhou. Ela já conhecia aquele olhar. Provavelmente alguma garota o havia rejeitado e ele precisava extravasar sua frustração.