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História Susie Q - A Perda


Escrita por: AleAndolini

Capítulo 3 - A Perda


Foi até o centro da cidade para compras básicas, mais como desculpa para não ter que olhar Eric. Entrou no mercado onde todos a olhavam com olhares maldosos e humilhantes. Numa cidade como Starbuck, qualquer que fosse o acontecimento todos estariam sabendo. E a fama de Eric já percorria quaisquer que fossem os cantos da cidade.

Muitas das mulheres pelas quais Susan passava a olhavam com um misto de desprezo, pena e riso - todas elas haviam se aventurado na viatura de Eric ou nas celas da delegacia. Muitas casadas. Susan queria abrir um buraco bem fundo a sua frente e se jogar, para nunca mais sair.

De repente, sua vizinha Nancy a viu. Ela fora uma das poucas que não resistiram ao "charme" de Eric, especialmente por respeito à amiga.

Nancy encontrou Susan no corredor de bebidas. Ela olhava atentamente para uma garrafa de uísque e se perguntando como Eric conseguia beber uma daquelas. O gosto era horrível. Pensava nas noites que Eric chegava em casa transtornado e fedendo a uísque quando Nancy a abordou. 

— Mãos ao alto, mocinha! – Nancy ria do susto que Susan tomou. 

— Você me assustou! Devia parar com esse tipo de brincadeira. 

— Desculpa, tava querendo te animar. Você anda muito triste. O que foi? Aquele idiota que você chama de marido esqueceu do aniversário de casamento? 

— Sim. Vamos sair daqui, não dá pra conversar com essas tolas olhando pra nós – Susan se referia às duas mulheres que a examinavam, cochichavam e riam dela por causa de Eric. 

— Ah, essas otárias aí? – Nancy disse em voz alta. – O que foi, nunca viram mulheres mais bonitas e gostosas que vocês?  

— Se fosse tão gostosa assim o marido dela não viria me procurar – disse a loira, Eva Blackwood, presidente da associação de moradores da cidade, em tom de desdém. Imediatamente a amiga de Eva riu. 

— Ele te procura porque é uma puta e dá pra qualquer um que cruze seu caminho. Agora sai da minha frente, tô com medo dessa sua falta de caráter ser contagiosa. – Nancy pegou Susan pela mão e saiu. Eva e sua amiga olharam com desconcerto as duas saírem. 

As duas foram para a Lafayette's, uma lanchonete em frente ao mercado que geralmente recebia caminhoneiros, visitantes e pessoas consideradas “de má conduta” na cidade. O ambiente era iluminado pela luz vinda de fora. Os caminhoneiros que comiam suas tortas olhavam Nancy como se quisessem comê-la com o olhar. Susan sabia que Eric saberia da estadia dela naquele lugar e começaria uma discussão, principalmente pela companhia de Nancy. Nancy era tida como a libertina da cidade, a vagabunda, a mulher com quem nenhuma mulher decente deveria ter amizade. Era uma sociedade estranha a daquela cidade: mulheres de pensamento livre e que se comportavam como livres de corpo e espírito, que faziam o que queriam sem se importarem com valores sociais eram tidas como “putas”; entretanto as mulheres casadas, travestidas de puritanas que mantinham relações sexuais com outros homens – especialmente casados – eram tidas como “santas”. 

Nancy era livre de tudo isso. Se vestia como queria, fazia o que queria. Usava batom vermelho, cabelos soltos e rebeldes e botas de couro. Só continuava naquela cidade porque tinha que cuidar da tia, moribunda devido a um câncer. Mary Russell era uma figura notável na cidade. Caridosa, sempre ajudava a todos que precisassem e era muito querida por todos, ao contrário de sua sobrinha. Tia Mary a acolheu quando ela foi execrada pelos pais por transar com seu professor do ensino médio na cama deles. O professor não sofreu nenhuma punição; já Nancy foi jogada para fora de casa, assim como suas malas. Ela também continuava ali por Susan, uma das poucas pessoas que a olhou com afeto quando todos a abominavam. 

Nancy fazia sexo com quem quisesse e tivesse vontade, sem culpa, desde que não fossem os mesmos “porcos imorais” que a julgavam e faziam chacota.  

A garçonete se aproximou, as duas pediram café. 

— E então Sue? O que houve? Você tá transtornada, parece um espantalho – disse Nancy. Susan a olhou como se não estivesse acreditando no que a amiga acabara de chamá-la. 

— Cala a boca, idiota – disse Susan, ofendida. 

— Tá bom, desculpa. Já que você não quer falar, vou pra casa – Nancy se preparava para levantar quando Susan a segurou pelo braço. 

— Espera! Senta aí. 

— Ah bom. Pensei que ia me colocar pra fora. Mas fala aí, o que aconteceu? 

— Ele chegou tarde de novo. Bêbado. 

— Grande novidade. Ele sempre faz isso. Foi a sobrinha do reverendo que deu um fora nele, eu vi. 

Nesse momento, a garçonete do Lafayette’s trouxe o café e as serviu. 

— E me pegou à força. 

— O QUÊ??????? – na hora Nancy se controlou para não arremessar o açucareiro da mesa na parede. A garçonete se assustou com a atitude, com medo de se tornar o alvo de Nancy. Todos que estavam na lanchonete a olharam, espantados. 

— Calma, Nancy! Senta! – Susan estava preocupada com os olhares dos clientes. Nancy sentou-se. 

— Como assim? E você não fez nada? Por que você não bateu nele?

— O que eu poderia fazer? Eu não sou tão forte quanto ele, ele manda nessa cidade e ele não fez por mal. Estava bêbado. 

— Ah, claro. E você cai nessa conversa de novo? Quando você vai se cansar e ir embora? Quando ele começar a te bater? Porque eu tô vendo que isso não vai tardar a acontecer. 

— Ele nunca faria isso. 

— Quando ele começou a te trair você também disse que ele nunca seria capaz de fazer isso. Abre os olhos, Sue! Ele só tá esperando a desculpa perfeita! 

— Você não entende, nós passamos por momentos muito difíceis. 

— E? Isso é desculpa pra ele enfiar o pinto na cidade inteira? Depois eu é que sou a puta. Quer dizer, ele pode afogar as mágoas bucetas de todas da cidade, e você é forçada a dar pra ele porque ele tá bêbado? Há quanto tempo você não faz sexo de verdade, que você também goze junto? Há quanto tempo você vem sendo estuprada por esse monstro?

— Eric não é esse monstro que você tá pintando. 

— Ah, claro. O santo xerife Eric Waters! Um sujeito que tá acima da lei. Claro. Ele te estupra e ainda é santo. Sue, abre o olho! Não é porque ele é seu marido e xerife dessa cidade de merda que ele é um ser supremo! – Susan olhou pela janela e viu a viatura de Eric estacionando. 

— Merda. Alguém disse pra ele que eu tô aqui. 

Susan acompanhava com o olhar Eric entrando na lanchonete.  

— E agora ele vai te mandar pra casa, como uma cadela. E você vai correndo, te conheço. – disse Nancy, indignada. 

Eric entrou, cumprimentou o dono do Lafayette’s e foi até a mesa onde as duas estavam. 

— Sue, o que eu te disse sobre andar com cadelas? – disse Eric olhando para Nancy. 

— Santo xerife Waters, tão santo que chama de cadela a única mulher nessa cidade que ele ainda não levou pro banco de trás da viatura – disse Nancy, com um sorriso de sarcasmo. 

Eric se sentiu ultrajado. Queria bater em Nancy, mostrar para ela que ele mandava naquela cidade e que não podia falar com um xerife daquela maneira. Olhou para Susan, apreensiva, esperando pelo pior. 

— Sue, vamos pra casa. 

Susan olhou atônita. Resolveu que já era hora de dizer não a Eric. 

— Tô conversando com a minha amiga. Mais tarde eu vou. 

— Levanta e vamos embora – ameaçou Eric. 

— Se ela não for, o que é que você vai fazer? Vai prender ela? – indagou Nancy. 

— Cala a boca, não é da sua conta. – respondeu Eric, com raiva. – Sue, Levanta. Vamos pra casa. Agora.

— Não. Eu não vou. Nancy é minha amiga, você gostando ou não. A gente tá conversando, se você não tá satisfeito é melhor voltar pro seu trabalho de merda.

Eric se revoltou com a forma que Susan falou sobre seu trabalho.

— Trabalho de merda que sustenta a casa e paga todas as suas contas enquanto você fica em casa coçando o dia todo! Já chega! Anda, levanta! Eu não vou deixar que você ande com esse tipo de gente! Você não tá vendo? Tá ficando igual a ela! Uma fracassada, sem qualidade nenhuma! - Eric esbravejava e a sua voz ecoava pela lanchonete, quase abafando "Me And Bobby McGee" que tocava ao fundo.

"Freedom's just another word for nothin' left to lose

Nothin', I mean nothin' hon' if it ain't free"*

 

Susan ouvia aquela canção com atenção. Era tão pessoal, tão condizente com sua vida, a vida que ela não aguentava mais viver. Ia responder à altura quando de repente foram interrompidos pelo oficial Jones, subordinado de Eric.

— Xerife, algo terrível aconteceu.

Jones tinha uma expressão apática. Quando olhou para Nancy, abaixou os olhos e se manteve em uma expressão triste. Nancy soube naquele momento que algo de muito ruim havia acontecido com sua tia.

— O que houve? -Eric perguntou.

— É a minha tia. O que houve com a minha tia? - Nancy olhava Jones com desespero. - O que houve!?

— A Sra. Shepard ligou para a delegacia, dizendo que foi até a sua casa e a Sra. Russell não respirava mais. Eu sinto muito.

Nancy viu seu mundo desabar. Suas pernas, trêmulas como bambolês, mal conseguiam sustentá-la. Não tinha forças. Não podia acreditar. Tinha que ser uma mentira. Era uma desculpa esfarrapada. Com certeza Eric ordenou que Jones fosse até lá para dizer isso, para que pudesse escoltar Susan até a casa.

— É mentira. É MENTIRA! Você é um mentiroso filho da puta, Eric! Tá fazendo isso só pra poder levar a Sue pra casa sem que eu faça um escândalo! - gritava ela, aos prantos. - MENTIROSOS! - gritava esmurrando o peito de Eric.

Saiu do Lafayette's transtornada. Não podia acreditar que sua tia tão querida, que a ajudou tanto pudesse ter ido tão logo.

Susan, que ficou perplexa diante a cena, saiu correndo para ajudar a amiga. Quando saiu da lanchonete, encontrou várias pessoas olhando com pena para Nancy e ela ajoelhada ao chão, chorando. De repente, Susan pôde ouvir um grito de Nancy.

—NÃÃÃÃÃÃOOOO!

Nancy desabou a chorar. Susan não podia acreditar que a Sra. Russell havia falecido, ela era uma espécie de ombro amigo para aquelas duas mulheres tão desamparadas. Mesmo com o câncer a matando por dentro, ela era mais forte que Nancy e Susan juntas e dava apoio a elas em momentos difíceis.

Eric e Jones se aproximaram e as levaram para a viatura, para que pudessem ir até a casa de Nancy. Quando as duas chegaram, viram o corpo de Mary Russell sem vida, jazendo em sua cama. Nancy correu e se jogou de joelhos aos pés da cama, em prantos. Susan não pôde conter as lágrimas e caiu de joelhos ao lado de Nancy. As duas se abraçaram.

No início da tarde o corpo de Mary Russell foi levado para o necrotério local. A causa da morte foi uma falência múltipla dos órgãos devido ao câncer. Mary foi velada à noite e enterrada no dia seguinte, em uma cerimônia repleta de moradores de Starbuck.

Nancy foi para casa chorar após o enterro. Susan a acompanhou e passou o dia todo com ela, a amparando naquele momento tão difícil. À noite, Eric foi buscá-la e juntos foram para casa.


Notas Finais


*"Liberdade é só outra palavra para nada a perder
Nada, não significa nada, querido, se não é livre"

Janis Joplin - Me And Bobby McGee (1971)


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