História Talvez minha eternidade esteja em você - Capítulo Único - A eternidade em seus sorrisos joviais.

Hoje eu passei o dia inteiro vadiando pela cidade. Estamos em tempo de férias, e a pequena cidade interiorana fica tão vazia. Só não mais vazia que eu. Nunca mais vazia que eu.

Mas, você sabe, isso nunca me incomodou. Estar sozinho foi, na verdade, muito conveniente. Meu coração gritava tão alto, que se as ruas estivessem cheias, eu acabaria por surdar as pessoas.

Então eu só segui as nuvens. Me sentia mais próximo ao céu que nunca, e gostei de me sentir de tal modo, pois acredito que é aí que você deve estar. 

Sinto sua falta.

É estranho sentir falta de alguém que nunca pertenceu a mim. Você pertencia ao mundo. Era de todos e de ninguém. E eu? Eu sou inteiramente seu. Sou seu o suficiente para não ter sobrado nenhum traço meu após você partir.

Por mais que ansiemos por despedidas bonitas, elas nunca serão. Despedida jamais foi sinônimo de beleza, muito menos quando parte de você é levada junto.

Lembra de quando éramos apenas vizinhos? Eu sempre esperava até certa hora da noite e me dirigia até a janela, onde observava, admirado, você saltar para fora de seu quarto. Você parecia tão leve. Talvez fosse o fato de que você realmente era. Mas não me refiro ao peso que a doença lhe tomou. Você era leve de alma.

Eu assistiria você atravessar a rua e rumar para seus diferentes destinos. Naquela época, com apenas 16 anos, você já desfrutava da liberdade.

E eu amava os observar. Você e a liberdade. Você tinha a sua, e com o tempo, se tornou a minha.

Tudo ficou ainda mais incrível à minha visão quando eu passei a ser um de seus destinos. Você bateu em minha janela e eu levei um susto, já me preparava para dormir e nunca havíamos trocado mais do que palavras de educação.

Três precisos toques. E isso foi o suficiente para eu abrir não apenas a janela, mas também meu coração.

E, todo dia, se repetiria. Na calada da noite você dava algumas batidinhas na janela do meu quarto. Eu abria a janela. Você resmungava algo sobre ela ser muito alta. Eu abria um sorriso.

Talvez tenha sido isso a me fazer continuar. Você. Você e suas conversas intermináveis. Você e seus doces sorrisos. Você e sua mania de não me deixar dormir, seja com sua presença tagarelando na ponta da minha cama, ou sua presença nos meus pensamentos, que conseguiam se prolongar mais que suas narrativas sem fim.

Na última vez que bateu na minha janela, você já ofegava e precisou que eu te puxasse para dentro, no lugar de apenas saltar, como o habitual. Mas eu nem possuía conhecimento de onde você havia tirado forças para escalar a janela, e você o fez. 

Você sempre arranjava forças em algum lugar. E este costumava ser seu próprio coração, o que te torna ainda mais incrível do que todo seu falatório inteligente sobre buracos negros ou seu abraço quente e reconfortante.

- Sehunnie? Abra logo a janela, não sei se serei capaz de me sustentar por muito tempo. - você suplicou, e eu abri com algo similar a desespero crescendo no peito. 

Era assim a  cada vez que eu me dava conta de suas condições. O que acontecia quase todo dia, considerando que eu fazia plantão em sua casa e não permitia que saísse sem que me tivesse em seu encalço.

- Você está bem? Eu já disse que aqui temos uma porta da frente bastante ampla, pode usar na hora que quiser. - eu disse, tentando descontrair. No entanto, você só suspirou cansado. Eu nunca fui muito bom com palavras, então deixei para lá e sentei ao seu lado.

- Eu me sinto mais exausto ultimamente. O médico disse que é normal, afinal, eu já não tenho mais muito tempo.

Engoli em seco. Eu sempre me impressionaria com a naturalidade que falava sobre as coisas. A morte não parecia nem um empecilho para você. Eu nunca saberia se você arranjava tanta força por faltar naqueles ao seu redor, ou simplesmente porque fazia parte da sua essência. Você não deixava as coisas lhe importunarem, apenas vivia como podia e isso era, de fato, saber viver.

Antes de pegar no sono, no meu colo, com minhas mãos acariciando seu couro cabeludo e minha alma pedindo por mais tempo ao lado da sua, eu te perguntei onde doía. Você então pegou a minha mão e não direcionou a alguma parte de seu corpo, como pensei que faria. Você direcionou ela ao meu coração.

- Se doer aí, também doerá aqui. Doerá como o inferno. - segredou. Depois riu um pouco das próprias palavras, e direcionou o olhar a mim.

- Quando partir, a dor será incontrolável. Pode me perdoar por isso? - perguntei. Aquilo de fato preocupava-me. 

- Você ainda não entendeu, Sehun? Eu não vou partir. - você disse e uma ingênua chama de esperança acendeu dentro de mim.

- O que você quer dizer?

- Eu vou estar sempre no seu coração. E se seu coração estiver doendo, vai ser como apanhar sem dó.

Abracei-te forte, e acho que meu coração escapou para ficar mais perto do seu. 

Espero que ele realmente tenha escapado. Assim a dor que estou sentindo nunca lhe atingirá.

Perder meu primeiro amor doeu. Porque, além de amor, você foi a primeira pessoa que eu vi viver de verdade. E juntamente a ti, se ia minha esperança na vida.

Desculpe-me por ser tão fraco. Eu te amo, está bem? E enquanto doer por amor, ele me dará as forças que eu mesmo não possuo para continuar. Me reconstruirei em fragmentos do que há de você em mim, e talvez assim, eu me torne uma pessoa melhor.

Porque se eu souber viver como você soube, a vida parará de ser uma questão de tempo. 

Você viveu por tão pouco, mas viveu tanto. 

E não importa quantas noites passarem, eu ainda abrirei a janela. Talvez um dia o vento lhe traga e eu que apanhe sem dó por não estar me alimentando devidamente. Ou descansando o suficiente.

Porque você estava morrendo, mas eu que te matava em preocupação. E eu te digo, ficarei bem. Por você, em grande parte. Mas também por mim. E pelos fragmentos que sobraram do que existiu de nós.

Seja onde você está agora, de algum modo consegue continuar aqui comigo. Se não fosse assim, eu já estaria em um caixão parecido com o seu, porém sem ter vivido metade do que você fez. E eu quero viver. Não iria querer se você não estivesse aqui, mas agora que percebi que está, eu quero viver para sempre 

Talvez minha eternidade esteja em você. E você disse que nunca vai partir.

Eu acredito.