POV PIPER
Os filmes ensinam que a primeira vez de uma mulher é mágica e especial, dolorosa talvez, mas com certeza inesquecível
A minha perfeita, até o momento em durou
Minha irmã perdeu a virgindade ainda na escola, ela dizia “esse é um carma que não quero carregar por muito tempo” e se livrou dele com sua primeira namorada, se é que um “relacionamento” de duas semanas pode ser considerado namoro
Enfim, quando bati meus olhos na Alex senti algo diferente, quando ela me levou pra jantar e principalmente quando estávamos no topo da Torre Eiffel, a companhia era confortável, a voz suave e o corpo dela era um ímã que me atraía, mas a certeza eu só tive mesmo quando dormimos juntas, nossos corpos se encaixando e sendo aquecidos pelo calor da lareira, ali, naquele instante abraçada e deitada na cama ao lado da Alex depois de me entregar completamente pela primeira vez, eu sabia que estava vivendo o meu sonho adolescente
Pena que nos sonhos nós acabamos acordando na melhor parte e foi exatamente isso que aconteceu, uma voz feminina ecoava abafada e distante até que foi aumentando, aumentando ao ponto de me fazer perceber que não era mas um sonho, era real e naquele momento eu aprendi que às vezes a realidade pode ser dolorosa
A porta se abriu e por dois segundos ouve silêncio até ela esbravejar
- Que porra tá acontecendo aqui?
Uma mulher de baixa estatura, pele clara e cabelos castanhos na altura do ombro estava furiosa com a cena, Alex e eu abraçadas e nuas na cama, pela surpresa imaginei que fosse a tal amiga dona do apartamento
- Calma, eu posso explicar! – Alex foi se levantando e vestindo a primeira coisa que encontrou pelo chão
- Explicar o que porra? – ela apontava o dedo indicador bem no rosto da minha Alex, meu coração batia mais forte a cada segundo que se passava – E você sua vagabunda levanta da minha cama – puxou os lençóis me deixando completamente sem reação
- Desculpa... Eu – não tive tempo de dizer mas nenhuma palavra, ela veio na minha direção puxando meus cabelos de forma agressiva e me acertando com vários tapas ela estava completamente descontrolada
- Para com isso! Deixa ela! – me vi livre da amiga louca quando Alex a puxou por trás me dando a chance de sair da cama me enrolar em um lençol enquanto juntava minhas roupas
- Por que você fez isso comigo Alex? Por que? Eu vivo aqui! – apontou para o chão, como se delimitasse seu território, aproveitei que a atenção dela se voltou a Alex e sai do quarto correndo enquanto ouvia os gritos histéricos da mulher misturados com soluços – Eu te amo Alex – parei um instante pra entender o que elas conversavam, será que elas tinham algum relacionamento? A resposta veio assim que me aproximei da porta e vi o que eu menos esperava, elas estavam se beijando, senti minhas pernas ficarem fracas, minha respiração falhou foi então que enfim a ficha caiu, elas eram um casal e eu a intrusa, não sei como mas vesti minhas roupas o mais rápido que consegui, peguei o que era meu, inclusive o presente que ganhei mais cedo, sem fazer barulho saí dali
Nunca me senti tão magoada, tão ingênua e tão frágil quanto aquela noite
Desci as escadas como se estivesse em fuga, a chuva caía densamente dissipando as lágrimas que a essa altura brotavam incessantemente, ao chegar do lado de fora do prédio fiz questão de olhar para a janela do apartamento, talvez eu ainda tivesse um pingo de esperança que fosse de ver Alex ali gritando o meu nome pedindo pra que eu voltasse que era só um engano, ou talvez eu só quisesse a ver para registar cada traço de seu delicado rosto, não a vi, ela não estava lá
As ruas de Paris estavam movimentadas apesar da chuva mas ninguém se arriscava a andar pelo meio delas sem proteção, exceto eu, nunca em toda minha vida senti tanto frio, talvez não fosse apenas físico, meu coração estava em pedaços e todos os sentimentos ruins que até então estavam guardados vieram a tona
Chorei como nunca durante os minutos de caminhada que levaram até a pequena pousada em que estava hospedada, não só pelo que aconteceu mas por tudo, por ser sempre tão fraca, por deixam que as circunstâncias me levassem, por não conseguir ser a protagonista da minha própria história
Sentei em uma sarjeta, comecei a tentar calçar meus sapatos em meio aos soluços, quando pensava que estava conseguindo controlar, aquela maldita sensação voltava, sufocante e deprimente então eu me entregava a minha própria angústia
Eu não aguentava mas ser definida pelos outros, para os Chapman eu era o fruto de um deslize que eles esconderam embaixo do tapete, para os Reznikov Nicky e eu éramos o sinal de fracasso da nossa mãe, uma jovem que saiu de casa cheia de sonhos e voltou solteira com duas filhas na bagagem, pra mamãe e pra minha irmã eu sou a caçula frágil e indefesa que precisa de cuidados
Talvez essa tenha sido a melhor experiência da minha vida, o que eu fui pra Alex além de uma conquista exótica? Nada! Então seria assim que eu me lembraria de Paris, uma experiência exótica e sem significado
Levantei decidida a mudar tudo na minha vida daquele momento em diante, nunca mas eu alguém vai fazer com que eu me sinta assim, eu vou ser a dona da minha própria história
Quando cheguei Nicky estava na recepção com nossas malas em uma ligação
- Piper onde você tava porra? – se aproximou de mim segurando meu rosto – Você tava chorando... Piper o que houve? – nos abraçamos e enfim senti meu coração aquecer um pouco – Eu te liguei mil vezes só deu caixa postal – se afastou – Você foi assaltada? – neguei com a cabeça e voltei a chorar, Nicky estava visivelmente preocupada e séria como a vi poucas vezes – Nós precisamos ir, mas se você não estiver pronta eu posso inventar alguma coisa pra mamãe – limpou minhas lágrimas e beijou a minha bochecha, eu amava tanto aquele leãozinho – Ei não chora mana, eu tô aqui, pode não ser grande coisa mas eu sempre vou estar – ela sorriu e consegui retribuir
- Preciso me trocar – ela assentiu e falou com o doce senhor que assistia toda aquela cena, ele nos levou até um vestiário, enquanto eu tirava as peças Nicky escolhia o que tinha de mais confortável na mala para mim
- O que eu faço com suas roupas molhadas?
- Não pretendo levá-las
- Nossa bagagem não passaria na alfândega mesmo com tanto peso, vou te esperar lá fora e chamar um táxi
ALEX POV
- Eu te amo Alex – Sylvia se sentou na beira da cama pôs as mãos no rosto
- Sylvia... – me aproximei dela e pude ver o quão magoada ela estava comigo, seus olhos vermelhos já não tinham mas todo o ódio que vi minutos atrás, agora eu enxergava a tristeza que ela sentia – Eu sinto muito pelo que viu aqui hoje, eu fui imprudente e...
- Não fala mas nada – me falou passando seu indicador pelos meus lábios – Me beija!
- Sylvia, eu não... – ela puxou meu rosto de forma agressiva, beijava com tanta intensidade que doía, eu retribuí o beijo tendo em mente que aquela era uma despedida, os lábios de quem eu queria eram os de Piper é isso não mudaria, me afastei e encostei nossas testas uma na outra – Isso não precisa ser um adeus
- Eu posso conviver com as suas traições Alex, mas não dá pra viver sem você
- Você sabe que dá, nós estamos nos enganando e nos privando de conhecer outras pessoas, eu realmente não queria que acabasse assim mas eu não posso mais adiar o inevitável
- É só por causa dessa escrota? – alterou o tom apontando em direção a sala
- Não é SÓ por causa dela, mas posso te dizer que sim, ela é um dos motivos
- Eu não acredito! Você tá mentindo! Alex eu volto pro EUA com você, eu mudo o que você quiser mas para de falar que vai me deixar – voltou a se jogar em cima de mim e antes que alcançasse minha boca a afastei
- Já chega! Se cuida Sylvia! – sai do quarto batendo a porta e pude ouvir algum objeto sendo jogado contra a parede – Piper? Chérie?
Ela não estava na sala, nem sus coisas estavam mas ali, senti meu coração palpitar, saí correndo em direção ao corredor, nada ali também, meu desespero aumentou quando cheguei ao térreo, amaldiçoei o fato de que o prédio não possuir portaria
Voltei até meu apartamento, precisava vestir alguma coisa e de dinheiro pro táxi, o cheiro de fumaça estava presente
Quando entrei no quarto Sylvia estava de costas para a porta com uma tesoura terminava de cortar alguma coisa, minha mala estava aberta pegando fogo
- Que porra você acha que tá fazendo? – ela se virou e me mostrou o que estava cortando, era meu passaporte – Você tá doida Sylvia? – antes que eu conseguisse tomar, ela o jogou no fogo, minhas roupas, meus cartões e meu passaporte estavam queimando e ela via com toda satisfação enquanto eu tentava controlar as chamas, por sorte obtive sucesso
- Agora você vai ficar aqui comigo? – sorria sarcástica deitada na cama, nunca pensei que pudesse sentir tanta raiva de alguém como senti naquele momento
- Eu quero você fora do meu apartamento, eu não queria ver a merda dessa tua cara cínica – puxei ela pelo braço e a levei para fora do quarto aproveitando que as malas que ela trouxe de viagem ainda estavam na sala às joguei no corredor – Me devolve a chave!
- Eu não vou devolver, você me deu!
- E agora estou pedindo de volta! Olha quer saber, que se foda essa chave e que se foda você também! Não volta mas aqui tá entendendo? Se pensar em colocar os pés no meu apartamento eu te denuncio por invasão – bati a porta e voltei para o quarto, eu precisava ir atrás da Piper, precisava explicar tudo o que aconteceu
- Infelizmente as únicas peças de roupa descentes que sobraram das chamas e que couberam em mim foi a blusa branca que tirei da mala para que Piper escrevesse, estava embaixo do travesseiro e um jeans velho que estava guardado no apartamento há pelo menos dois anos
Eu não tinha um só centavo, todo dinheiro que eu trouxe havia se tornado cinza mas eu não desistiria, iria atrás dela
Eu ainda lembrava da fachada de onde ela estava, mas não sabia se acertaria voltar lá, eu precisava tentar e fui, não era muito longe, por sorte estávamos no mesmo bairro o que realmente atrapalhou foi a chuva mas ela não me deteve, eu corri pela ruas de Montemartre as pessoas me olhavam de forma questionadora, será que era tão estranho assim andar pela chuva?
Quando parei e olhei para meu corpo obtive a resposta daqueles olhares, minha blusa estava toda manchada
- Merda!
Como esperado não acertei o pequeno hotel de primeira, a chuva atrapalhava minha visibilidade e ter perdido uma das minhas tentes de contato também não ajudava, mas eu não desistiria até poder ter a oportunidade de me explicar tudo, talvez ela não me entendesse mas eu precisava tentar
Parei por alguns segundos, estava exausta de tanto correr, coloquei as mãos na cintura e olhei ao redor felizmente consegui visualizar a discreta fachada a poucos metros de mim, eu havia passado por ela sem nota-la
Caminhei tentando ser o mais casual possível, quando entrei no simples lugar logo avistei uma pequena recepção e um senhor sorridente me olhava curioso
- A chuva está forte não é mesmo? – conversamos no idioma local
- Sim, está! Olha desculpa por estar molhando todo seu chão
- Não se preocupe, mas me diga, em que eu posso ajudar uma linda moça como você?
- Bom eu acho que uma amiga está hospedada aqui, ela se chama Reznikov
- Deve ser uma das russas
- Isso isso! São duas irmãs, Piper e não lembro o nome da outra
- Nicole! Duas belas meninas!
- O senhor poderia anunciar que eu estou aqui?
- Oh minha querida eu adoraria, mas as irmãs Reznikov já saíram – olhou no pequeno livro que ele tinha em mãos – há meia hora
- O senhor sabe pra onde elas foram? – senti minha respiração pesar
- Aeroporto querida, elas estavam atrasadas se não me falha a memória o vôo sairia as 20h – olhei para o relógio na parede a minha frente, faltavam vinte minutos, eu precisava correr
- Obrigada senhor! – sai em disparada, eu tinha esperança de chegar a tempo. Parei o primeiro táxi – Pro aeroporto internacional por a favor
- Qual deles senhorita? – puta merda era só o que faltava
- Eu não sei... e só então me lembrei, eu não tinha como pagar
– O senhor aceita esse colar como pagamento? – ele parou bruscamente o carro
- Moça se a senhora não tem como pagar peço que se retire
- Eu posso pagar o senhor depois, mas eu realmente preciso chegar ao aeroporto – tirei o colar – olha só ele é muito valioso
- Se ele vale tanto qual o motivo de você estar querendo se livrar dele?
- Eu preciso evitar que o possível amor da minha vida embarque para a Rússia essa noite – meus olhos se inundaram é isso pareceu bastar para o homem
- Você sabe a hora do vôo?
- Sim, ele sai às 20h, mas por que isso importa? – ele me estendeu o celular
- Ligue para a agência de viagens que está aí na agenda e pergunte em qual aeroporto vai sair um vôo para Moscou as 20h – sim, eu encontrei um anjo
(...)
(Atenção senhores passageiros, essa é a última chamada do vôo 668 com destino a Moscou, por favor compareçam ao portão de embarque, repetindo...)
- Merda!
O aeroporto estava lotado, provavelmente a chuva fez com que se atrasassem os vôos e agradeci mentalmente por isso
Novamente eu era o centro das atenções talvez eu não estava tão apresentável mas que se foda, eu não me importava
Procurei o tal portão que obviamente eu não tinha acesso e nem como chegar até lá, mas eu consegui, eu a vi, de perfil em uma passagem rápida, forcei minha visão o máximo que pude para tentar enxerga-la melhor, então fiz a única coisa que podia naquela hora, gritei
- PIPER! PIPER! OLHE PRA MIM!
A irmã se virou me vendo, elas conversaram alguma coisa e então ela olhou para mim, por um segundo ela olhou para mim, e diferente do que eu imaginava ela não voltou, não sorriu, e não houve aquele brilho no olhar, ela apenas sussurrou de forma compreensiva por leitura labial um “Adeus Alex” e voltou a andar na direção oposta a minha e sumiu, eu vi ela ir embora e não pude fazer nada, estava impotente e miserável, me sentindo derrotada como nunca havia me sentido antes
Fui para a vidraça a chuva já havia diminuído, agora eram só pequenas gotas fracas que molhavam a janela, e por algum motivo eu precisava ficar exatamente ali, olhando a pista, precisava ter certeza que ela iria, um airbus se preparava para decolagem, minutos depois ele deixou o solo e decolou
Eu não sei quantas pessoas estavam ali dentro e nem qual a história de cada uma, eu não sabia nada sobre a tripulação e sendo bem sincera eu sabia muito pouco sobre a Piper mas o pouco que eu sabia era que ali, naquele avião uma parte importante é que eu não sabia que existia em mim estava indo embora...
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