Capítulo 8
As lágrimas corriam soltas pelo meu rosto – já vermelho, provavelmente – e eu não conseguia controlar meus nervos. Na verdade, eu não conseguia nem respirar direito. Tudo o que eu conhecia que não era derivado do meu pai ou da profissão dele era Aspen. Aspen era meu, eu o tinha conquistado. E agora, o homem que eu amava havia desligado na minha cara, e bem no fundo, a culpa era somente minha. Minha e do meu plano idiota. O que eu estava pensando quando coloquei a mim mesma e a Maxon naquela situação? Me esqueci totalmente da existência dos paparazzi e da péssima função que eles tinham. Tudo o que me importava naquele momento era vencer a pequena batalha que eu e Maxon havíamos travado, e agora eu havia acabado de perder Aspen. Talvez para sempre. Só o mais simples pensamento do rosto dele quando recebeu a notícia do namoro era mais que suficiente para quebrar meu coração em mil pedacinhos diferentes.
Eu não conseguia mais respirar o ar abafado a minha volta, então corri até as portas da sacada do meu quarto. Infelizmente, estava muito nervosa, e com a visão destorcida, e não consegui abrir as portas de vidro. Aquilo só piorou o meu estado, e meu cérebro só parecia conseguir processar um pensamento repetidamente: “Preciso sair daqui. ”
Saí em disparada do meu quarto, sem me importar com meu estado visual – uma camisola de cetim comprida e com um belo decote azul clara, seguida do hobby de mangas longas, aberto, da mesma cor, com os cabelos presos num coque frouxo e descalça. – e segui escada abaixo, pulando os degraus de dois em dois. Quando avistei as portas que davam para o jardim dos fundos da casa, meu cérebro até se aliviou. Ainda correndo, só percebi que já estava do lado de fora quando ouvi o barulho das portas duplas atrás de mim. Um segundo depois, já podia sentir a grama molhada de orvalho sobre meus pés descalços, e a vaga lembrança de uma série de escapadas durante a noite a procura de Aspen escondido entre os arbustos da mansão voltou com tudo à minha mente. As lágrimas pareceram aumentar. Sem outra alternativa, voltei a correr, agradecendo mentalmente pelo fato de a mansão da família Schreave possuir um ou dois hectares de campo em cada um dos seus lados, todos cobertos por grama verde, e uma arvore ou outra pelo caminho.
Desastrada como sou, percebi uma pedra bem a minha frente quando já era tarde demais, e no próximo instante, eu estava no chão, e provavelmente com um belo joelho ralado. A dor física se misturou com a emocional, e eu abracei meus joelhos, abaixando a cabeça logo em seguida, e começando a soluçar alto. Não sei quanto tempo fiquei naquela posição, mas após certo tempo, minhas pálpebras pesaram, e acredito que eu tenha cochilado enquanto chorava, porque a próxima coisa que me lembro foi sentir uma pequena pressão no braço direito, enquanto ouvia aquela voz inconfundível e rouca.
- America? America? – Maxon sussurrava. Pelo tom de voz, parecia que ele já havia falado comigo antes. – Hey? – Levantei minha cabeça, e fitei seus olhos de mel. A lua estava cheia, e sua luz fazia com que o rosto de Maxon assumisse um brilho prateado. Ele parecia preocupado.
- O que? – Perguntei, com a voz abalada pelo choro. – Veio tornar meu dia ainda pior, é? – Ironizei, enquanto assistia seu semblante se fechar. Para a minha surpresa, ele se sentou ao meu lado. Seu semblante continuava sério, e ele encarou a noite a nossa frente.
- Dia difícil? – Perguntou, com a voz mais calma que já o ouvira usar.
- O que você acha? – Fitei o nada também. – Meu namorado – comecei, e ele me olhou. Devolvi o olhar. – Meu verdadeiro namorado acabou de me ligar terminando tudo. – Maxon piscou, e eu soltei o ar pelo nariz, tentando esboçar um sorriso, mas falhando. – O quê? Ainda pensava que ele não fosse real? – Rompi o contato visual, e voltei a fitar o nada. – Bom, ele não existe. – O tom de amargura em minha voz era claramente visível. - não mais.
- Bem-vinda ao clube. – Maxon respondeu, alguns segundos depois. Minha primeira reação foi me virar para olha-lo, surpresa. Ele notou meu semblante confuso. – Só porque eu nunca apareci em público namorando alguém, não significa que não tinha ninguém.
- Você nunca mencionou namorada nenhuma. – Me defendi, sem muito ânimo. Maxon esboçou um sorriso irônico.
- Era mais complicado que um simples namoro. – No mesmo instante, a tela do celular dele se acendeu, anunciando o recebimento de uma mensagem de texto. Atraída pela luz forte, pude notar a foto que era usada pelo bloqueio. Uma garota morena, com o cabelo liso e olhos castanhos, linda. Ela sorria enquanto era abraçada por trás por um homem alto e musculoso, numa camiseta branca e sem mangas. O rosto do homem estava escondido no cabelo da garota, mas a cabeleira loira escura era inconfundível. Eu pisquei. Ele não podia estar falando a verdade. Maxon notou meu olhar.
- O nome dela é Arabella. – Explicou. – Nos conhecemos na faculdade. Ela cursa jornalismo, e eu arquitetura e urbanismo. Não namorávamos, mas passávamos mais tempo juntos que o resto dos “ficantes”. Eu já tinha as reservas no restaurante agendadas para fim de semana que vem. Ia pedi-la em namoro.
- Maxon.... – Eu estava sem palavras, diante daquela revelação. – Mas... você deu em cima de mim desde o dia em que nos conhecemos.
- Eu sou homem, America. – Ele disse, calmamente. – Você era nova, diferente, e eu queria abaixar esse nariz empinado que você tinha. Além do mais – Acrescentou – eu não era comprometido oficialmente, e achava que você também não era.
Eu sei que deveria estar cuspindo fogo com ele naquele momento, e era a minha vontade, mas a única coisa que se passava pela minha cabeça era o semblante desiludido que Maxon apresentava. Ele realmente parecia desorientado.
- Você não queria levar o relacionamento de vocês para outro nível. – Conclui alto.
- Provavelmente. – Foi sua única resposta.
- Mas você disse que ia pedi-la em namoro no próximo fim de semana. – Lembrei. A situação me deixava cada vez mais confusa.
- Ela estava me pressionando. – Ele começou. – Vivia dizendo que queria algo sério, ou então seria melhor que cada um seguisse o próprio caminho.
- E porque você não disse a ela que não queria namorá-la? – Perguntei o óbvio. Maxon suspirou antes de responder.
- Porque ela é uma pessoa legal, Ames. – “Ames”. O uso daquele apelido era apenas permitido à membros da minha família, ou amigos muito íntimos. Deixei passar apenas por que estava interessada na sua resposta. – Ela é uma pessoa legal e não merecia ver o meu pior lado, o lado que não é característico do polido e educado filho do governador do Rio de Janeiro. E ainda que minhas intenções fossem boas, o que ela recebeu? – Ele suspirou pesadamente. – Uma revista conceituada com uma foto minha e sua nos beijando na capa, anunciando o namoro. – Ele me fitou nos olhos. – Não consigo imaginar uma maneira pior de conhecer o meu outro lado, você consegue?
Enquanto o olhava nos olhos, percebi uma coisa importante o suficiente para fazer com que me aproximasse dele. Maxon Schreave sabia exatamente como eu me sentia naquele momento. Logo ele, causador de todo aquele alvoroço. Naquele momento, a máscara dele caiu completamente pela primeira vez logo a minha frente, e eu pude ver toda a culpa que ele carregava nas costas. Mesmo sob a luz do luar, pude ver seus olhos um tanto vermelhos, provavelmente cansados de segurar lágrimas que ele pensava que não deveria derramar. Abaixei meu olhar.
- Não foi apenas sua culpa. – Me peguei dizendo, baixinho. – Eu também te provoquei, Maxon.
- Nós dois sabemos que fui eu que comecei essa confusão, America. – Ele disse, num tom ameno.
- Eu sei. – Respondi, dando de ombros. – Mas eu segui com esse jogo até que fosse tarde demais para se voltar atrás.
- Eu não fiz nada que não quisesse ter feito. – Ele rebateu, simplesmente. Abracei meus joelhos, diante da revelação, enquanto tentava acalmar meu coração, que parecia bater cada vez mais rápido. – Pare de se culpar America.
- O que você veio fazer aqui no meio da madrugada? – Perguntei, desesperada para mudar o rumo daquela conversa. Maxon sorriu com os cantos dos lábios, enquanto se virava para o outro lado.
- Acredito que o mesmo que você. – Ele respondeu, calmamente. – Vim colocar a cabeça no lugar. – Quando ele se virou novamente para mim, segurava uma taça alta na mão esquerda, e uma garrafa de vinho tinto na direita. – Com uma pequena ajuda desse Cabernet Saivignon francês. – Eu ri.
- Eu poderia ter pensado nisso. – Admiti, enquanto me virava para fitar o nada novamente.
- Fico feliz que não tenha pensado. – Respondeu Maxon, enquanto despejava um pouco do líquido na taça. Me virei para ele novamente. – Assim posso ter ajuda para esvaziar essa garrafa. – Ele me estendeu a taça.
- Acho melhor não beber. – Recusei gentilmente, levando em conta o ocorrido da última vez que bebi na presença de Maxon. Ele entortou a cabeça para o meu lado.
- Depois do dia que tivemos, acredito que merecemos ao menos uma taça de vinho francês. – Ele insistiu.
- Ok. – Eu disse, dando de ombros, enquanto tomava a taça da mão de Maxon. Girei-a levemente, para que o líquido manchasse a extensão do vidro e liberasse o perfume das uvas. Em seguida, o cheirei, maravilhando-me com o perfume irreconhecível dos vinhos franceses de boa qualidade. Por último, tomei um único gole, fechando os olhos a fim de perceber os muitos sabores que faziam parte do mesmo.
- Você entende de vinhos. – Concluiu Maxon. Eu sorri.
- É uma das qualidades de ser filha de governador: Muitos e muitos jantares e aprovações de menu. – Eu finalmente abri os olhos. – É estranho, mas eu gosto dessa parte dos holofotes.
- Bonita, rica, boa ouvinte e conhece vinhos – ele listou. – O que mais você sabe fazer, America Singer? – Perguntou, divertido. E eu tive que agradecer a noite, pois minhas bochechas com certeza devem ter ficado vermelhas.
- Bom, eu sou péssima em demonstrar sentimentos. – Respondi a primeira coisa que me veio à cabeça, enquanto estendia a taça de volta a ele.
- Fique com ela. – Recusou Maxon, e em seguida colocou o gargalo da garrafa na boca e bebeu. – E você está errada.
- Como assim? – Perguntei confusa.
- Sobre ser boa em demonstrar sentimentos. – Ele esclareceu. – Você não faz ideia de como é transparente, não é mesmo? – Levei a taça a boca, dando outro gole.
- É mesmo? – Perguntei, ironicamente. – Então me diga, Maxon Schreave: Que sentimento eu estou demonstrando agora? – Ele me olhou novamente, por longos dez segundos. O mais estranho de toda a situação era que naquele momento o clima entre nós não era a necessidade de contato físico urgente sem escrúpulos de sempre, mas sim uma conversa agradável, sem restrições ou embaraços. Maxon sorriu para mim, e eu percebi pela primeira vez como os olhos dele brilhavam quando expostos a luz do luar.
- Você está relaxando. – Ele começou, calmamente. – Mas ainda se sente culpada pelo coração partido do seu ex-namorado. – Ele abaixou o olhar por um segundo, voltando a me olhar nos olhos em seguida. – Provavelmente foi um término repentino e não amigável. – Pude notar seu olhar culpado enquanto falava.
- Por telefone. – Esclareci, enquanto pousava a taça do meu lado esquerdo, e me deitava com as costas na grama. – Ele sabe ser muito irônico quando quer. – Concluí. Maxon tomava outro gole do vinho enquanto me ouvia falar. Assim que terminei, ele depositou a garrafa ao seu lado direito e se deitou ao meu lado.
- Eles sempre sabem. – Me lançou um olhar pelo canto do olho. – Acredite, nós passamos horas em frente ao espelho treinando todos os tipos de respostas irônicas possíveis. – Ele disse sério. Eu gargalhei, de verdade. Daquelas risadas longas, que esvaziam seus pulmões e não emitem nenhum som, até que você precise respirar novamente.
- Não acredito que você faz isso. – Disse, ainda sorrindo, enquanto olhava para o céu estrelado. Por incrível que pareça, não havia uma nuvem sequer no céu naquela noite. Pude perceber que Maxon também sorria.
- Eu sou uma caixinha de surpresas, não é?! – Ele disse, rindo logo depois. Eu o acompanhei, numa risada mais preguiçosa que qualquer outra coisa.
Eu fitava o céu, tentando formar desenhos com as estrelas mentalmente, quando Maxon se pronunciou outra vez.
- Aquele é o Cão Maior. – Ele parecia ter lido meus pensamentos.
- É mesmo? – Perguntei curiosa, mas sem desviar o olhar do céu.
- Sim. – Maxon se aproximou de mim, até que nossos braços se tocassem. E lá estava novamente a corrente elétrica que parecia passear entre nossos corpos. – Está vendo aquela estrela, a mais brilhante? – Ele apontou para uma estrela que formava o pescoço do animal imaginário, com o braço que não estava encostado ao meu.
- Aham. – Foi a minha resposta.
- Aquela é a Sírius. Ela é a estrela mais brilhante do céu, na verdade, ela é praticamente igual ao sol, só que mais longe da terra. – Ele explicou, e eu sorri.
- Minha mãe ama estrelas. Na verdade, ela estudava astronomia quando conheceu meu pai. – Eu continuava olhando para o céu, mas podia sentir o olhar de Maxon sobre mim. – o cargo de primeira dama faz com que ela não exerça a profissão, mas ela me ensina uma coisa ou outra de vez em quando.
- Deve ser divertido ter uma mãe astróloga. – Comentou Maxon.
- É sim. – Respondi sinceramente. Amava quando minha mãe me falava das estrelas porque ela sempre parecia muito empolgada falando do assunto. – Uma vez ela me disse que para os gregos antigos, o cão maior era um dos que seguiam Órion durante suas caçadas mitológicas. – Maxon se virou por completo para mim de repete, e eu olhei-o também.
- E você me deixou bancar o nerd durante todo esse tempo, quando na verdade, você já sabia tudo o que eu disse? – Perguntou, forçando um semblante indignado que me fez gargalhar novamente.
- Não é isso – Comecei, depois de me recuperar das risadas. – É só... você parecia tão feliz por saber uma coisa que eu não sei – agora foi a vez de ele gargalhar. – Eu não queria “cortar o seu barato”. Só isso. – Terminei rindo, e ele riu comigo novamente. Maxon continuava me olhando com os cantos da boca curvados num sorriso de menino, e eu me perdi por um segundo ou dois na beleza natural que ele provavelmente não sabia que possuía.
- Existem muitas coisas que eu sei e você não, America. – Ele disse, zombando de mim. – Por exemplo, como enlouquecer uma mulher na cama. – Nós nos olhamos por dois segundos, antes de cairmos na gargalhada novamente. Minha barriga já doía de tanto rir.
Devido as crises de riso, não percebi o quão perto estava de Maxon, e quando me dei conta, já estava meio que deitava em seu peito. Ele não se movimentou para que eu saísse de lá. Nem eu. O mais estranho era que o clima ainda não havia ficado pesado. Era como se nós dois estivéssemos acostumados a fazer aquilo o tempo todo. Definitivamente eu precisava tomar uma ou duas horas do meu tempo para tentar entender a conexão que havia entre mim e Maxon.
- Minha mãe ama cantar. – Ele disse, de repete. – Eu me lembro de quando era criança, cada vez que ela me colocava para dormir, era um show diferente. – Eu ri pelo nariz, enquanto a mão esquerda de Maxon passeava sobre as minhas costas preguiçosamente.
- Não consigo imaginar sua mãe fingindo ser uma estrela do rock, Maxon. Desculpe. – Eu disse, divertidamente. Não conseguia ver seu rosto, mas sabia que ele sorria.
- Oh, você precisa pedir a ela para cantar “It’s Time” uma hora ou outra.
- Eu prometo que vou – Disse, antes de rir novamente.
- Mas a minha preferida era “Life is Beautiful. ” Na verdade, acho que ainda é. – A mão dele desfez meu coque, e começou a passear pelas madeixas ruivas.
- Acho que não conheço essa. – Minha mão esquerda repousava no peito dele, e nenhum de nós parecia se importar com tamanha proximidade.
- É uma música bem lenta. – Disse ele – daquelas que se encaixaria perfeitamente em um daqueles filmes de romance.
Meus olhos começavam a ficar pesados, finalmente.
- É mesmo? – Balbuciei.
- Aham. – Ele respondeu. Em seguida, começou a cantar a letra baixinho. - Life is Beautiful,
We live until we die
When you run into my arms
We steal a perfect moment
Let the monsters see you smile
Let them see you smiling
Do I hold you too tightly?
When will the hurt kick in?
Life is Beautiful.......
O queixo de Maxon estava encostado no topo da minha cabeça, e sua voz rouca, porém suave, em conjunto com sua mão em meu cabelo me proporcionaram um ambiente delicioso, e foi impossível não fechar os olhos. Enquanto o ouvia cantar, imaginava passos de dança que combinariam com a melodia, e milhares de filmes românticos em que ela poderia ser usada. Com o tempo, os pensamentos foram se tornando mais difusos, e minha respiração mais calma, mesmo com a presença da corrente elétrica. Eu nem percebi quando peguei no sono.
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