A linha tênue entre amizade e amor é tão envolvente, perigosa, satisfatória, idiota, irritante e abundante em felicidade que se eu pudesse voltar no tempo seria uma telespectadora de mim mesma, da minha história e do nosso amor, observando cada palpitar e mudança na linha de minha vida...
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O menininho, de belos olhos verdes, observou com estranheza a garotinha cabisbaixa ao seu lado, e se incomodou com a aparente tristeza dela.
- você quer?
Ele estava lhe oferecendo um bombom de chocolate, e mesmo querendo, ela negou com um leve aceno de cabeça. Para surpresa dela, ele puxou levemente seu pulso e depositou o bombom em sua mão.
- eu me chamo Felipe, qual seu nome?
Atônita, ela pareceu demorar em entender a atitude dele, mas na realidade só estava com vergonha.
- Raquel...
Pronunciou baixinho e pela primeira vez, mesmo que timidamente, ela sorriu. E já não se sentiu tão estranha no novo e distinto ambiente cheio de outras crianças.
Sete anos e um bombom, além de se tornar o ponto de ligação entre os dois, isso marcou o inicio de uma bela amizade.
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Quando eu era criança os meus pais me encheram de conselhos, “isso é bom”, “isso não é bom”, “isso pode”, “isso não pode”, “faça isso”, “não faça aquilo”.
O bombardeio de informações e ordens que recebi instigaram a curiosidade e o medo. E as minhas grandes dúvidas pareciam nunca ter respostas. As principais dúvidas eram sobre as pessoas, seus erros e sentimentos.
E minha mãe sempre teve razão ao dizer que as respostas, eu só teria ao decorrer do tempo.
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- vamos Raquel, vai ser divertido.
Ele havia passado a semana lhe importunando, tentando convence-la a lhe fazer companhia no passeio escolar.
- já disse que a mamãe não deixou.
- você pode dar um jeito de convencê-la.
Ele estava sentado na sua frente, os dois em sala de aula, e essa foi a primeira vez que ela reconheceu o brilho no olhar dele sentindo seu coração se agitar.
Mesmo assim era incapaz de compreendê-lo, de compreender-se...
- já disse que não, e você sabe muito bem que eu prefiro manter distância do mar.
O brilho nos olhos dele deu lugar à decepção, ter ela no passeio que prometia ser o mais legal do ano, era de fato importante para ele.
Ambos com dez anos, incapazes de compreender o que começava a se manifestar ali... Afinal até para os mais experientes o amor, quando presente, é incompreensível, complicado...
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Na pré-adolescência minha cabeça era um nó de conceitos e sentimentos, e esse foi um momento crucial na formação da mulher que sou hoje, meus ideais e sentimentos começaram a tomar forma nessa fase.
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- você bem que poderia prender essa juba de vez em quando.
Ele andava ao seu lado pelos corredores, rumo a sala de aula.
- de uns tempos pra cá, você anda extremamente irritante, sabia?
Ele ignorou por completa o comentário dela.
- vai acabar pegando piolho.
Podia até parecer apenas mais uma briguinha adolescente, mas a cada frase idiota dita por ele, uma nova magoa surgia dentro dela.
Ele sentia ela o afastar aos poucos, como se sua amizade fosse simples e irrelevante, o que crescia dentro dele era raiva e incompreensão.
Dois pré-adolescentes, tentando controlar de forma diferente o, recém descoberto, sentimento.
Resultado: impulsos incalculáveis, burrices indesejáveis.
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As minhas idiotices adolescente me fazem ter raiva e ao mesmo tempo sorrir, de min mesma.
Ainda bem que na juventude tudo se resolveu, quando Felipe, após três longos anos de distanciamento, voltou a fazer parte dos meus dias...
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Ele andava extremamente estranho, mesmo que tivessem passando um logo tempo sem praticamente olhar um pro outro, ele apenas cresceu e evoluiu, não mudou. E de longe ela conseguia reconhecer suas manias.
Felipe estava agitado, nervoso e distraído, parecia que quanto mais próximo as provas finais estavam, mais angustiado ele ficava.
- você ainda não decidiu que curso quer fazer não é?
O olhar dele estava diferente, o brilho se tornara tão intenso que fazia o coração de Raquel pulsar mais rápido e roubava-lhe o ar dos pulmões.
Tolos... Isso é o que eram, tentava ao máximo se controlar, quando, na realidade ambos eram unicamente o amor e descontrole um do outro.
- não.
A voz dele soou forte aos seus ouvidos, e ela se sentiu despertar de um transe. Então desviou o olhar do dele.
- por isso, você anda tão nervoso e angustiado?
Encara-lo havia se tornado algo extremamente perigoso.
-também não.
Até as respostas dele demonstravam o seu estado. Felipe sempre gostou de um bom e explicito dialogo, sempre odiou frases curtas.
O seu papel, como amiga, era fazê-lo desabafar, pois o conhecia a ponto de saber que ele não conseguia lidar com problemas em silêncio.
Mas como fazer isso, se não conseguia encara-lo?
- você quer deixar para fazer o trabalho amanhã? A biblioteca vai estar aberta até as três. – mesmo com o coração acelerado, ela voltou a olha-lo e sorriu de forma singela. – você não parece estar no clima para literatura hoje...
- realmente eu não estou nenhum pouco a fim de fazer trabalho...
- preguiçoso...
Ele riu e arrastou sua cadeira, sentando-se mais perto dela. Ele respirou fundo, já não sorria e seu olhar era baixo.
- o que você faria, caso se deparasse com a maior incógnita interna e pessoal de sua vida, sentindo-se incapaz de resolver?
Ela respirou fundo, ignorando suas reações e focando-se nele, no seu aparente problema.
- a solução é simples. – ele pareceu confuso. – você especifica a incógnita para a sua melhor amiga e mesmo que eu não possa simplesmente te ajudar, juro que resolvo para você.
Ela sorriu de forma brincalhona, tentando anima-lo, conforta-lo...
Ele levantou-se abruptamente coçando a nuca de forma nervosa e ela sentiu-se arrependida por ter brincado, com algo, aparentemente muito serio para ele.
- me desculpa, se você não quiser me contar, eu entendo. – ele ficou andando de um lado para o outro, deixando-lhe nervosa. – por favor, Felipe, se acalma.
- você não entende Raquel, eu quero falar. Eu já tentei te contar, mas... – ele se pôs a sua frente, o rosto corado e próximo ao seu. – droga... – ele resmungou baixo e voltou a caminhar, nervoso. Raquel também nervosa decidiu agir e se pôs na frente dele, encarando-o e segurando pelo ombro na intenção de acalma-lo. – Raquel...
Ela ia começar a falar, mas foi surpreendida. Felipe agarrou-lhe pela cintura, segurou sua nuca e colou a boca dele na sua.
Ela paralisou, e quando os lábios dele moveram-se com os seus, as pernas dela bambearam e seu coração... Agitava-se de uma forma que ela jurava ser impossível.
Na mente dela, tudo clareou. os mesmos sentimentos existente nela, eram sentidos por ele. O que ele tinha tanta dificuldade de falar era justamente tudo que ela nunca ousara dizer.
Suas mãos subiram para nuca dele e quando o beijo findou, ela não deixou o rosto dele se afastar. E assim continuaram colados pela testa.
- eu... você...
Os dois sorriram e ela iniciou um novo beijo.
Se caso a bibliotecária não os tivesse pegado e lhes dado um sermão, essa tarde de amor jovem não teria sido perfeita, pois enquanto ela lhes dava uma lição de moral, as mãos deles não se desgrudaram e não houve margem para dúvidas.
Pela primeira vez na vida, eles tiveram a certeza de ter acertado em algo realmente essencial.
O amor...
...
Hoje eu sou uma mulher que ama observar o meu melhor amigo, meu esposo e eterno namorado dormir...
- estou com frio...
Observei Felipe abrir os olhos e sorrir para mim.
- quem manda dormir sem camisa.
- durmo sem camisa por que gosto da sua respiração contra o meu peito...
Ele abriu os braços e eu sorri, me aconchegando a ele, recebi um beijo na testa e antes do aconchego me arrebatar ao sono, o ouvi dizer que me amava.
- também te amo...
Logo eu adormeci ouvindo o coração dele bater e sentindo o amor aumentar...
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