História Teus Olhos - Prólogo

A primeira coisa que falam a meu respeito é que meus olhos são estranhos. Deve ser por isso que minha mãe tentou queimá-los com ácido quando nasci. Foi bem inesperado, já que meus olhos são iguais aos do meu pai. Ele a impediu de terminar o serviço e me tirou dos braços dela, mas não foi rápido o suficiente para salvar meu olho direito, que perdeu completamente a visão. Dele, só sobrou um globo branco e sem vida dentro do meu crânio. Mas ainda vejo um pouco com ele, vejo números e nomes sobre a cabeça das pessoas. De qualquer jeito, optei por mantê-lo oculto sob um tapa olho para que ninguém veja a atrocidade que minha mãe cometeu, embora não tenha sido seu último atentado contra mim.

Quando tinha seis meses, ela tentou me asfixiar com um travesseiro e meu pai voltou a segurá-la no último minuto e ela passou dois anos e meio em uma instituição para doentes mentais. De nada adiantou, pois quando voltou para casa tentou me esfaquear. Eu devo ter feito algo realmente ruim para ela querer me matar tanto assim.

Aquele foi seu último atentado contra minha vida; meu pai tentou impedi-la e ela morreu na briga, espalhando sangue pela cozinha inteira. Acho que essa foi minha primeira lembrança concreta, o sangue espirrando pela cozinha, pela mesa, pelo meu rosto, pela blusa de meu pai e manchando a casa. Pensando bem, acho que ele gostou de fazer aquilo, em especial considerando que oito anos depois foi preso por como assassino em série.

Quando era pequena, eu ficava desenhando as pessoas com os nomes e números em cima. A primeira a estranhar foi minha professora, que me mandou conversar com o psicólogo da escola. Logo fui encaminhada para um psiquiatra e taxada de esquizofrênica e medicada, ou melhor dopada, mas os números nunca desapareceram. Eles ficavam lá, inexplicáveis. Mesmo criança, eu sabia que os olhos do meu pai viam as mesmas mensagens e que ele estava escondendo o significado daquilo tudo.

Dois anos antes de ele ser preso, quando eu tinha oito, um homem quase igual a ele me buscou na escola, me pegou pela mão e me levou para o orfanato que hoje em dia chamo de lar. Lá chegando ele me prometeu que nunca mais teria que tomar aqueles remédios horríveis, que teria uma vida nova, que era uma criança prodígio, que meu pai também tinha crescido naquele casarão. Eu acreditei nele e de certa forma fiquei contente por ele me tirar de casa. Na época, meu genitor já estava desaparecido e eu estava sob os cuidados dos pais de minha mãe, que me odiavam.

Enfim, foi então que cheguei ao Wammy's House.

Cresci cercada de crianças que estiveram lá desde bebês e com outras que chegaram já mais velhas que eu. Fui incentivada a desenvolver minhas habilidades com desenho e a procurar entender o que eram os números que via flutuando sobre as pessoas. Não demorou para que me apaixonasse pela arte. Sobre meus olhos, no fundo eu sabia que só entenderia ao conversar com meu pai