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História Teus olhos rubros - Ato II


Escrita por: Jude_Melody

Capítulo 2 - Ato II


— Perfeito — sussurrou Kurapika, aconchegando-se na cama.

O homem diante dele sorriu e estendeu o braço para tocar seus cabelos dourados. O Kuruta fechou os olhos, deleitando-se com o toque. Ele não sabia, simplesmente não conseguia imaginar o que fizera de tão certo nos caminhos tortuosos da vida para encontrar uma pessoa tão incrível quanto Leorio.

— Eu que devo dizer isso — disse o mais velho. — Foi muita sorte minha conhecê-lo.

Kurapika sorriu, os olhos ainda fechados.

— Eu que devo dizer isso.

O som da risada abafada de Leorio era mágico.

— Boa-noite, Kurapika.

— Boa-noite, Leorio.

 

Quando o Kuruta acordou, Leorio não estava por perto. A contragosto, Kurapika levantou-se da cama e preparou o café da manhã. Limitou-se a comer as últimas torradas do fundo do pacote e a beber um copo de leite puro, apesar de detestar a bebida. Durante horas, vagou solitário pelo apartamento. Até que ouviu o som das chaves.

— Leorio! — exclamou, correndo até a porta.

A pessoa que a abriu não era Leorio. Era uma garota de longos cabelos vermelhos e olhos castanhos tão profundos quanto os de Kurapika. Ela segurava uma maleta de formato estranho. Parecia pequena no hall que ligava o único apartamento do andar ao elevador.

— Quem é você? — perguntou Kurapika, cauteloso. Ele lançou um olhar ao molho de chaves. Era o de Leorio. — O que faz aqui?

A garota estendeu a maleta.

— Isto é seu.

Kurapika não reagiu.

— São olhos escarlates — disse a garota. — Eu os roubei. São seus agora. Você é um Kuruta, não é?

A pergunta era desnecessária. Os olhos de Kurapika incandesciam.

— Eu também tenho uma notícia ruim. É sobre o Leorio.

Kurapika pegou a maleta que sua visitante ainda estendia. Lançou outro olhar ao molho de chaves.

— O que aconteceu?

— Não aconteceu nada. Exceto que ele deve estar procurando suas chaves como um louco agora. Eu as roubei durante o intervalo das aulas. O idiota deixa seus itens de valor dentro da mochila quando sai da sala.

Kurapika ignorou a ofensa. Estava ficando impaciente.

— Então, você só veio aqui para me entregar os olhos?

— E para dizer para você se afastar do Leorio. Se você o ama, é o melhor a fazer.

— Posso saber por quê?

Ela arqueou as sobrancelhas.

— Não é óbvio? Quantos olhos escarlates você já roubou? Quantos poderosos da máfia acha que estão furiosos atrás de você? E quanto às Aranhas? Você já matou duas, não é? Acha mesmo que elas não vão querer vingança?

— Não entendo onde quer chegar. — Kurapika cortou-a, seco.

A garota prensou os lábios e revirou os olhos.

— Se algum inimigo descobrir que você ama o Leorio, pode usá-lo para te atingir.

Uma dor forte perpassou o peito de Kurapika. Ele nunca concebera aquela hipótese. Mesmo depois de quase três anos ao lado de Leorio, nunca cogitara que poderia ser um risco à sua segurança. Abaixou a cabeça. Os olhos ainda brilhavam escarlates. A maleta estremeceu em suas mãos.

— Foi o que fizeram comigo — prosseguiu a garota. — Eu gostava dele. Nós éramos companheiros. Acho que ele foi a primeira pessoa em quem eu confiei desde... — Ela prensou os lábios de novo. — Eu queria juntar os olhos também, sabe? Quando ouvi que você estava fazendo isso, quis ajudar. Mas eu roubei só um par, e veja só o que aconteceu! Eles pegaram meu amigo e o torturaram até a morte. Queriam que ele me entregasse, mas ele não entregou. Eu já estou triste por saber que ele morreu. Mas saber que ele morreu sendo torturado me destrói. Eu... não quero que você sofra o mesmo.

Kurapika não prestava mais atenção. Ele olhava fixamente para a garota. Examinava seus traços, seus cabelos vermelhos, seus olhos castanhos. O brilho do reconhecimento atravessou seu rosto.

— Tsubasa.

Ela sorriu.

— Kurapika.

— Como... como você...?

— Eu fugi do vilarejo antes do massacre. Não sabia que ele aconteceria. Eu só... queria ir atrás de você.

— De mim? — arfou o Kuruta.

Tsubasa sorriu.

— Você não era o único que não aguentava mais ficar preso naquele vilarejo. A diferença é que eu era burra demais para fazer o teste. Então, eu fugi. Forjei minha própria morte e fugi.

Kurapika balançou a cabeça. Lágrimas desciam por suas faces.

— Você é louca.

Ela gargalhou.

— Bom, a loucura me salvou. Mas... — O semblante de Tsubasa tornou-se sério. — Parece que a loucura está te consumindo.

Kurapika segurou a maleta com um dos braços e secou as lágrimas com o outro.

— Eu quero vingança, Tsubasa. Não vou descansar até acorrentar todos eles ao inferno.

Ela inclinou a cabeça de lado.

— Tem certeza de que não é a si mesmo que está acorrentando?

Ele trincou os dentes.

— Inferno! Por que todos me dizem isso?!

— Talvez porque seja verdade. — Ela fez uma breve pausa. — Izunabi.

Kurapika piscou sem entender.

— É o nome do seu mestre, não é? Eu o conheci por acaso. Ele me impediu de me matar.

Os olhos vermelhos encararam-na.

— Estava arrasada com a morte do meu amigo. Estava decidida a me matar. Acendi uma fogueira para me lembrar de quando acampávamos juntos e peguei o punhal que ele costumava usar. Antes que eu pudesse enfiá-lo em meu peito, Izunabi segurou meu braço. Nós lutamos até eu deixar a arma cair. Então, eu chorei. Chorei tanto que meus olhos ficaram escarlates. — Tsubasa fez outra pausa, uma pausa tão longa que Kurapika acreditou que ela desistira de falar. — Quando me acalmei, nós conversamos. Ele me contou sobre você. Decidi te procurar e finalmente te encontrei.

Kurapika engoliu em seco.

— Obrigado. Obrigado por se importar, Tsubasa. Obrigado por vir.

— Tudo bem. Obrigada por me receber.

O Kuruta pôs a maleta sobre o móvel mais próximo e puxou Tsubasa para um abraço. Ela tinha o mesmo cheiro de quando eles ainda viviam junto ao clã.

— Fique esta noite — sussurrou em seu ouvido.

— Não posso. Preciso ir embora.

Kurapika apertou o abraço.

— Quando nos veremos de novo?

Tsubasa empurrou-o de leve. Deu dois passos para trás.

— Eu que pergunto. Você escolheu um caminho perigoso, Kurapika. Se continuar nele, pode morrer.

Ele assentiu.

— Conheço bem os riscos. Eu não tenho medo de morrer.

— Só tem medo de que seu ódio desvaneça com o tempo, não é?

Kurapika trincou os dentes.

— Izunabi.

— Isso. Ele me contou isso também. Sabe de uma coisa? Que se dane o que você quer fazer da própria vida. A escolha é sua. Mas não se esqueça de que nossas escolhas afetam outras pessoas. A minha afetou meu amigo. E a sua? Afeta a quem?

Kurapika não soube como responder. Optou pelo silêncio. Tsubasa pôs o molho de chaves ao lado da maleta com os olhos escarlates e anunciou sua saída.

— Adeus — sussurrou Kurapika.

Ela apoiou a mão no batente da porta e lançou um último olhar ao Kuruta.

— Teus olhos rubros...

— O quê? — Ele indagou.

Tsubasa já havia desaparecido.

 

Quando Leorio chegou ao apartamento, logo se deu conta de que algo estava errado. A porta da sala estava aberta e uma maleta estranha repousava em um móvel próximo. A sala e a cozinha estavam escuras e vazias. Ele fechou a porta e caminhou lentamente até o quarto no final do corredor. Antes de entrar, examinou a penumbra com os olhos cansados. Distinguiu o contorno de Kurapika sentado na cama.

— Dezenove anos — sussurrou o Kuruta.

Leorio largou a mochila no chão e se sentou a seu lado.

— Foi o tempo que eu levei para te encontrar.

Leorio segurou sua mão. Ela estava fria.

— No começo, eu te achava um idiota egocêntrico que só pensava em dinheiro. Acho que nunca me enganei tanto.

Leorio encostou os lábios em seus cabelos dourados, roçou a face naquele rosto cálido que tanto adorava.

— Eu me apaixonei por você. Foi meu primeiro erro. Você me correspondeu, e eu permiti que você se aproximasse. Foi meu segundo erro.

Leorio beijou seu pescoço. Abraçou-o, puxando-o para perto de si.

— Quase três anos, não é? Foi o tempo que nosso amor durou.

— Não diga isso — implorou Leorio. — Por favor...

Kurapika olhou para ele. Mesmo na penumbra, era possível ver que seus olhos estavam vermelhos.

— Eu preciso ir.

Leorio fechou os olhos com força. No fundo, sabia que esse momento não tardaria a chegar. Kurapika nunca fora muito bom em demonstrar afeto. Sua partida era o maior gesto de amor que ele poderia oferecer.

— Se eles te encontrassem... Se eles te torturassem, eu...

Um soluço escapou de seus lábios. Leorio puxou-o mais para perto.

— Eu não posso! Não você! — As lágrimas caíam livres, umedecendo a mão de Leorio. — Não você...

Kurapika enterrou o rosto em seu pescoço. Todo o seu corpo estremecia. Ele estava destruído por dentro. Nunca tomara uma decisão tão difícil.

— Tudo bem... — murmurou Leorio. — Eu entendo. Tudo bem.

— Eu vou sentir sua falta — disse Kurapika com um fiapo de voz.

Leorio roçou a bochecha em sua testa.

— Eu também.

O Kuruta afastou-se, ainda chorando. Leorio não chorava. Um dos dois precisava se manter firme para que os dois não sucumbissem.

— Se você algum dia puder voltar...

Kurapika assentiu. Não precisava ouvir o resto da frase.

— Eu te amo, Leorio.

— Também te amo. Kurapika.

Quando Leorio acordou na manhã seguinte, Kurapika não estava mais ali. Todos os seus objetos haviam desaparecido. A única lembrança era um brinco solitário sobre o criado-mudo.


Notas Finais


Tsubasa é uma personagem original. Escreverei mais histórias sobre ela em breve.


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