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História Texas - Coisas sobre o céu e o inferno PT.01


Escrita por: littlezackary

Capítulo 18 - Coisas sobre o céu e o inferno PT.01


Gerard tinha um escritório bolorento. Até então essa era a única certeza de Frank. Nitidamente ele não gostava de abrir com muita frequência as janelas – que à propósito eram as únicas do casarão inteiro que tinham grades. O garoto era observador e esse fato não passaria despercebido por ele. Quando abriu a porta, se surpreendeu com a bagunça, pois no geral, Way não se mostrava alguém muito aberto a desorganização. Até mesmo por causa da sua personalidade um tanto centrada demais para os parâmetros comuns. Mas no final das contas, concluiu que toda aquela desarrumação era por sua causa. Seu tio estava completamente nas suas mãos, não se preocupando com mais nada. De certa forma estava orgulhoso desse feito, pois esse comportamento de Gerard fora completamente planejado e esperado por Frank.

Teve que organizar tudo. Mas lembrou das grades das janelas quando procurava por uma pasta para colocar a papelada espalhada na mesa do canto, dentro. Então pensou: "para que tantas grades?". Por conseguinte chegou ao único fato lógico e possível: Gerard guardava coisas importantes ali. Voltou-se em direção a porta, que deixara aberta para aquele odor de mofo sair. Deixou os papéis empilhados na mesa onde antes estavam bagunçados, logo ao lado da porta. Empurrou-a e fechou. Se inclinou um pouco e analisou a fechadura.

Sorriu de canto.

-Chave criptografada.

De fato, com esses detalhes notados, havia noventa por cento de chance de ter coisas importantes dentro daquela sala.

Frank percebeu que observação e análise são meios muito úteis de se construir uma boa vingança. Então olhou ao seu redor. Estantes abarrotadas de pastas e mais pastas. Olhou para uma em destaque, vermelha e um papel impresso com o ano anterior. Se aproximou mais, esticou o braço, porém não teve êxito. Tinha que ficar na ponta de pés para pegá-la. Fazendo-o, foi até a mesa e ficou parcialmente sentado.

-Documentação de 2009. – Falou analisando a pasta robusta. Depois a abriu, leu o que tinha na primeira folha e depois percorreu o olhar pelo resto. – Ofícios, recibos... E...

Sua atenção é interrompida por um Noah surpreendido e com uma xícara de chá em mãos. O empregado percorreu todo seu olhar por Frank, tentando entender o que diabos ele estava fazendo no escritório de Gerard.

-O que faz aqui?! – Perguntou afetado e cheio de reprovação.

Notando o quase desespero do amigo, buscou acalmá-lo:

-Calma. – Ergueu a pasta na altura do rosto para exibi-la. – É só trabalho. – Assegurou, não tendo muita confiança de volta.

-Parece que você está vasculhando. – Falou desconfiado.

-Não me olhe desse jeito. – Colocou a pasta na mesa e cruzou os braços. – É sério. Gerard me chamou para trabalhar com ele. Não estou vasculhando nada.

-...Ah... – Desviou o olhar. – Até isso você já conseguiu... – Noah tentou disfarçar, mas seu tom afetado e incomodado, no fundo, foi proposital.

Frank ignorou.

-Agora eu tenho acesso à documentos importantes. – Sorriu mau. Noah não entendia o que ele queria dizer com aquilo. Mas sabia que não era boa coisa.

-Vai fazer parte do seu plano. Os documentos vão fazer parte do seu plano?

-Exatamente.

De repente, Frank olhou para a xícara nas mãos de Noah.

-Isso é para mim? – Perguntou sem tirar o olho da porcelana clara.

-Seria para Gerard. Pensava que era ele quem estava aqui. Ele sempre toma chá no final da tarde. – Deu de ombros.

-...Hmmm. Sabe Noah. Eu tive uma ideia. – Seus olhos foram tomados por certa maldade.

"Advogado e chá"

-Que ideia? – Perguntou curioso. Mas Frank se lembrou do fator perigo que Noah representava. De ele poder dizer tudo à Gerard.

Desviou o olhar da xícara e de Noah:

-Eu sou um gênio.

***

Talvez repudiar as pessoas não fosse algo muito saudável. Mas era incontrolável. Algo o obrigava a manter todos longe. Com isso, a maior parte do tempo, seu rosto era antipático e sua expressão corporal pouco receptiva. Gente ali, circulando e ele só torcia para não ser notado. Longe de ser timidez, era algo de natureza muito mais sombria do que isso. Era realmente desprezo, nojo daquele pessoal. Eles não tinham culpa. Não mesmo. O culpado era Gerard, ele sempre fora o dono da culpa. Indiscutivelmente. Porém, como Frank não podia ainda direcionar sua fúria nele, canalizou suas energias e as filtrou para realinhá-las para outra direção: os colegas da escola.

De fato, frequentemente sentia seu ombros tensos. Seu pescoço estalava com qualquer movimento. Desesperado ele não estava. O pior já tinha passado. As sensações terríveis de medo; pavor; e impotência, haviam se liquidado. O que havia era um peso psicológico. Uma espécie de torpor pós-traumático, que o levou a agir como um zumbi e não como um jovem de dezessete anos. Acordar; comer; ir para escola; trabalhar; deitar com seu tio; dormir e começar tudo de novo. Mas pacientemente, mesmo se sentindo esquisito e entediado, esperava o momento exato para provocar uma agitação no seio da "família Way".

Tinha envelhecido alguns anos, tinha certeza.

Olhares significativos eram sempre lançados em sua direção nos corredores. Ao contrário do que pensava, isso acontecia não porque tinha chamado a atenção, mas por ser parente direto do cara mais esquisito de Cresson.

-Não entendo. – Disse agarrando as alças da mochila, um hábito corriqueiro dentro da escola. Odiava aquele vai e vem de sala em sala. Seria muito mais fácil se o período escolar todo fosse em apenas uma sala. – Eles ficam nos olhando como se fôssemos dois Et's. – Frank diz aborrecido.

Noah o olha de relance, enquanto tenta não esbarrar em ninguém. O que era meio difícil, já que aquele corredor parecia as ruas da Índia em horário de pico. Ele sim era tímido. Evitava as pessoas ao máximo por temer Gerard e suas paranoias. E claro, havia os valentões que até já tentaram infernizar ele, mas como sempre foi um mísero empregado, sabia muito bem como se fazer de invisível.

-Sempre foi assim. Mas tipo, o problema não é a gente. O problema é o Gerard.

-Claro. Sempre ele. Se finge de intocável e quem paga o pato é a gente. – Falou empurrando a porta para entrar. Quem estava lá dentro, já encostada na mesa era Lindsey. O sorriso feliz que ela lançou para ele, dizendo-o subliminarmente que era bem vindo, foi o suficiente para levar Frank até o inferno.

Pronto. Seu dia acabara de ficar ruim.

Bufou e se jogou na cadeira, lançando a mochila sobre a mesa e sentindo a delicadeza no qual Noah se sentava ao seu lado. Por azar – ou sorte, não se sabe, a professora de literatura era a diretora de turma.

Diretores de turma são usados para aulas de cidadania. Têm contato direto e mais familiarização com os alunos no qual são responsáveis. Geralmente são aulas diferentes, que tratam de assuntos importantes para a sociedade ou atividades externas.

Ou seja, pelo feitio de Lindsey, faria de tudo para ser íntima daquela turma.

-Bem, estão todos aqui, sim? Como sabem, hoje é dia de atividade obrigatória. Sei que muitos de vocês não gostam de agricultura...

-Agricultura?! – Frank sussurrou indignado para Noah. – É sério isso?! – Reclamou enquanto Lindsey continuava a falar.

-Shiu. Espera ela terminar de falar.

-...Depois disso, pediram para mudar as atividades. Disseram que era inútil, o que eu sou totalmente contra, já que artes é algo muito importante para formar um bom caráter...

-Gerard deveria fazer aulas de artes. – Frank sussurrou novamente para Noah.

-Para de colocar tanto veneno nas coisas que você fala. – Sussurrou de volta. E falou um pouco mais baixo. – ... Vai acabar engasgando.

-... E isso vai constar no extracurricular de vocês. Pesa muito quando vocês tentam entrar na faculdade. – Ela abriu outro sorriso. Ninguém dentro da sala mexia um músculo. Eram todos desmotivados. A maioria dali já trabalhava, era pai, mãe. A infraestrutura da escola era bonitinha, mas a motivação era horrorosa.

Frank sabia porque obrigavam os alunos a terem aulas de agricultura e noções de agronomia. Não porque iriam ter uma atividade extracurricular para colocar num histórico escolar e assim conseguir entrar na faculdade. Mas porque a maioria não iria sair de Cresson, muito menos do Texas. Iriam continuar trabalhando com criação de animais, plantações... E era uma ofensa tudo aquilo para ele. O Estado estava praticamente doutrinando todos dentro daquela sala, senão todos daquela escola, à uma vida predeterminada. Robôs agricultores e sem sonhos. Se questionava porque para esses caras de terno e gravata, uma pessoa que mora em uma fazenda não pode ser engenheiro?! Ou um médico. Ou quem sabe um artista qualquer, formado ou não.

Mas tudo se resumia à uma atividade obrigatória de agricultura.

Chegaram à horta que ficava nos fundos da propriedade da escola – que era uma baita propriedade. Havia uma pessoa virada, ajoelhada no chão e remexendo a terra. Noah e Frank eram os últimos da turma, andando desanimadamente. Estava distraído, até que o burburinho começou.

-Bem pessoal, esse será o orientador de vocês. – Lindsey disse animada.

Alguns olharam para Frank rapidamente, mas desviaram quando ele encarou nada amigável de volta. Queria, na verdade, entender porque todos estavam aparentemente tão desconfortáveis. Andou um pouco pelas laterais do grupo, com Noah o seguindo – também estava muito curioso. E quando chegaram à uma distância em que de fato dava para ver o orientador, houve uma surpresa.

-Ah. Fala sério. – Frank cruzou os braços, falando baixinho para ninguém ouvir.

-Tem alguma coisa errada. – Noah sussurrou, não conseguindo manter a cara de espanto. Ao contrário dele, Frank se mostrava um cubo de gelo.

Reconheceria aqueles cabelos vermelhos até no semelhante vermelho do fogo do inferno. Saberia distinguir como ninguém as labaredas e aqueles fios. Mas o pior de tudo era a cara lavada e aquele sorriso de quem não deve nada a polícia. Aquilo revoltou Frank. E amedrontou Noah.

Depois, Lindsey tentou tanger para longe o clima esquisito. Ela não estava entendendo nada. Logo, Gerard começou a explicar todas aquelas coisas sobre solos férteis, o básico e formas orgânicas para manter pragas longe... Coisas de praxe para plantar uma muda de planta no chão.

Algum tempo depois, Frank apalpava a terra para se certificar de que sua muda não iria ficar insegura e por conseguinte cair tristemente para o lado. Plantar era uma terapia e tanto, mas nada supera o sabor amargo da vingança que insistia em percorrer por sua boca. Isso lhe ocorria a cada toque que dava em Gerard e em cada beijo que o dava.

Vingança.

Era nisso que pensava quando ele se aproximou e se agachou atrás de si. Só pelo perfume já sabia que era seu tio. Aquela figura medonha e amedrontadora. Mas ao mesmo tempo incrível perigosamente e atraente.

Frank tinha consciência: Way era um demônio, da raça mais perigosa. Mas inevitavelmente bonito.

Tem-se a ideia de um diabo de chifres e pele vermelha, rabo pontudo e dentes mortais. Mas se ele quer almas, porque se mostraria tão assustador e repugnante? Para seduzir, ele se mostra na sua mais bela forma; perfumado; bem vestido. Assim como Gerard.

Ele passa seu queixo por sobre o ombro do garoto, posicionando as mãos sobre as suas, no falso e disfarçado intuito de lhe auxiliar na finalização da muda de planta na terra.

-Você deve apalpar assim... Sem muita força... – Gerard sussurra em seu ouvido.

O coração de Frank foi aos extremos dos batimentos cardíacos. Não porque seu hálito era de menta ou seu perfume aromatizava a atmosfera ao sei redor. Mas sim de medo. Medo do que ele poderia tentar ali, na frente de todos e ele não poder relutar. De certa maneira, vivia uma paranoia. Depois do que seu tio fez, passou a sempre esperar o pior das pessoas. Até mesmo de Noah, que era praticamente um anjo celeste morando na terra.

Mas infelizmente, uns semeiam o céu e outros o inferno.

Frank estava no meio termo. Nem céu, nem inferno. Pois o fato de ter sido vítima, o levaria a ser vilão. E levaria todos consigo.

-Seu cheiro está bom hoje. – Sussurrou de volta, olhando na direção contrária a seu rosto para não chamar atenção. Claro, o perfume era bom. Mas não era como se aquilo mexesse com ele de uma maneira legal. O objetivo de seu comentário era apenas manipular seu oponente.

-O seu também. – Sorriu minimamente e se levantou. Se continuasse perto daquele garoto seria capaz de tirar sua roupa ali mesmo. Porém, estava tentando controlar seus impulsos.

Uma semana depois.

Noah aborda Frank, enquanto este arruma seus livros no armário. Ainda se sentia fraco e sem energia. Perdeu peso e seus olhos pareciam mortos.

-Como está? – Pergunta se encostando, balançando folhas de almaço na mão.

-Péssimo. – Reclama, fechando a porta do armário com força.

-Bem, como faltou ontem, acabei pegando seu trabalho de literatura. – Estendeu o papel para Frank.

O garoto contraiu salmonela depois de comer uma omelete que Mary tinha feito. Pensou que iria morrer, mas depois de quase uma semana, os sintomas vergonhosos já iam passando. E como estavam perto da semana de revisões, não queria perder mais aulas.

Frank percorreu o olhar pelo seu trabalho, e na última folha viu sua nota.

- C?! Eu tirei um C? Essa droga tem oito páginas e eu levo essa porcaria de nota?! Quem aquela vadia pensa que é?! – Frank brada com fúria.

Noah se assusta recebendo a reclamação como se fosse a própria Lindsay.

-Mas Frank, é só uma nota... – Retrucou na tentativa de acalmá-lo.

-Porra Noah eu fiz isso doente! E ela sabe! – Diz com revolta.

Claro que o ódio dele não era só por sua nota. Seu tio e ela estavam muito próximos e isso estava o deixando possesso. A única coisa que atrapalharia seus planos seria mais uma pessoa envolvida ou se aproximando de Gerard. Ferraria com tudo.

-Mas ela não faria de propósito... – Mexeu nervosamente os dedos.

-Todo mundo acha ela uma santa, mas eu não! No final da aula, eu vou falar com ela. E a Srtª Ballato – Desdenhou. – Vai ter que me dar satisfações.

Saiu feito uma bala pelo corredor, esbarrando por pessoas de propósito e que nada tinha a ver com seu trabalho de literatura. Noah o encara partindo, com um olhar preocupado.

No dito final da aula, Frank caminha firme em direção à sua sala de descanso. Não havia quase ninguém mais na escola, haja vista que Gerard disse que queria levá-lo de volta para casa e teria que dar aula de "agronomia" para alguns alunos que ficaram na detenção. Determinado, Frank empurrou a porta.

Congelou.

A saleta estava escura, mas enxergou completamente aquela cena: Lindsay sentada sobre uma mesa, com as pernas entreabertas e a mão de seu tio lá no meio, mergulhada entre o tecido de sua saia, devorando seu pescoço. De início ficou enojado. Mas depois o seu sangue ferveu e logo a revolta o domou.

-Mas que droga é essa aqui?!



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