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História Texas - A estrada de terra e o Chevy Malibu


Escrita por: littlezackary

Capítulo 4 - A estrada de terra e o Chevy Malibu


Noah balançava para frente e para trás, sentado no chão abraçado aos próprios joelhos. O dia estava quase amanhecendo lá fora, conseguia ver os primeiros raios de sol surgindo no horizonte alaranjado através das portas da varanda que estava aberta.

Quase não acreditava que aquilo também tinha acontecido com o seu amigo. Claro que Frank era meio atrevido às vezes, mas não merecia aquele final tão... Na verdade nem sabia como caracterizar aquilo tudo. Mas sabia, intimamente, o quão sofrido era a sensação da "primeira vez". Aliás, com ele, Frank era de uma maneira. Com seu tio ele era de outra, mas em geral, Gerard considerava qualquer pessoa que fizesse uma simples pergunta sobre sua vida, invasiva.

O empregado sempre se questionou sobre isso. Tendo tanta intimidade com ele, porque nunca teve coragem de perguntar algo a mais? Como, quando conseguiu ter tanto sucesso como empresário, como ele conseguia manter as pessoas perto e longe ao mesmo tempo... E outras coisas que ao longo do tempo ele foi desconfiando, mas nunca teve audácia o suficiente para indagar.

Talvez não quisesse morrer.

Frank se mexeu no chão. E murmurou alguma coisa. Os olhos de Noah ficaram atentos, mas o outro não acordou.

O empregado, tomou o cuidado de o cobrir com um lençol limpo. Afinal de contas não queria passar a noite olhando para aquelas coisas caídas para o lado direito e um Frank quase em coma. Claro que pensou em acordá-lo. Mas logo afastou essa ideia pois sabia que ele precisava descansar.

Ele não dormira nada. Ficou ainda mais alerta quando ouviu o motor do carro de Gerard fazer um barulho estranho e aquele arranque que Noah já conhecia deixou o frequente rastro de poeira no ar.

Também sabia que Way tinha ficado terrivelmente perturbado. Pra ele fugir daquele jeito...

Tinha a consciência de que se mencionasse esse fato para o Frank, bem, não iria botar muita fé. Nem ele mesmo botaria. Com certeza, pensou, o sobrinho estava apenas querendo trucidar Gerard das piores maneiras possíveis. Mas não sabia se teria coragem para tal.

O garoto no chão se mexeu novamente. Desta vez abrindo os olhos e aparentando estar confuso e cansado. Aquela face saudável parecia ter sumido. Os lábios avermelhados ficaram com uma cor estranha e a região ao redor de seus olhos estavam levemente arroxeadas - mas o suficiente para ser notada a diferença.

Gemeu de dor, e Noah mudou sua posição. Se sentou ereto e atento à todos os movimentos do amigo, que lentamente se dava conta do acontecido.

Frank desejou - e muito, que tudo que acontecera fosse apenas um de seus pesadelos. Mas ao que seus olhar se chocou com o de Noah, que parecia muito preocupado, aquele choque de realidade tomou conta da sua mente.

A mão de seu tio passeando no meio de seu tórax, os olhos dele no cós de sua calça...

Sentiu nojo.

-...Frank...?-Noah o chamou.

-Oi.- Respondeu com amargura.

Os olhos do empregado se arregalaram quando o sobrinho de Gerard pousou a mão no lado direito do quadril.

-Como, como está se sentindo? -Sua voz soou muito aflita. Ele estava torcendo os dedos sobre as coxas, e aquele jeito estranho que Frank acordou o deixava mais... Perturbado.

-O que você acha?!

Noah murchou. Baixou o olhar e voltou a posição inicial. Ele detestava quem agisse daquele jeito com ele, mas não era do tipo que dava o troco para ficar quite. Ficava quieto e esperava aquela sensação inicial e incômoda passar.

Frank, notando seu feito, se arrependeu. Até porque não foi culpa de seu amigo, quer dizer, não diretamente. Claro que o que Gerard fez não é aceitável, mas também, depois de tudo aquilo, ele pensou seriamente em economizar na sua curiosidade ou acabaria à sete palmos do chão.

Entretanto, na noite anterior, seu defeito lhe custou a própria dignidade. Mas futuramente, sua curiosidade lhe seria muito útil. Muito.

-... Ah, desculpa, eu estou meio...-Frank falou rouco.

Noah o olhou e completou:

-Desnorteado? Eu sei como se sente. Mas ontem...-Ficou meio envergonhado, mas tinha que perguntar para ter certeza.- Ontem você viu, não foi?

-Sim. Então foi por isso...

-É eu sei...

Os dois ficaram calados. Noah com os olhos fixos no piso e Frank começando a percorrer o olhar nos próprios hematomas. Uma onda de choro o tomou. Ele já tinha acordado com aquela ânsia, mas não queria mostrar sua fraqueza na frente dele. Não ali. Não naquele momento.

Mas esse tipo de coisa é inevitável. Era um choro de dor, de repugnância. De saber que se pudesse voltar à ocasião uma, duas ou até dez vezes, não poderia mudar o rumo. Iria acontecer de qualquer maneira. Era o tipo de coisa, que embora cruel, estava minuciosamente calculado para acontecer na sua vida.

Alguma coisa ele tinha que fazer com aquela situação. Cogitou ser um sinal... Não sabia direito.

Passou a soluçar ao que se sentou. Noah o abraçou na tentativa de consolar, mas tinha, lá no fundo do seu coração, aquela pontada de consciência de que um abraço ou um "eu te amo" de quem quer que fosse, seria incapaz de apagar essa dor.

É o pior tipo de ferida. Os anos se passam, mas aquele espinho fica ali, encravado e inesquecível.

-Anda... Vem...-Tentou levantar Frank. -Você precisa de um banho para renovar as energias...

Noah o agarrou por debaixo dos braços e o suspendeu. Com muita dificuldade conseguiu ficar de pé. O lençol escorregou e ficou jogado dramaticamente no chão. Vestiu a calça de moletom de Frank corretamente e olhou de relance a camisa rasgada no piso, que o fez sentir um arrepio macabro na espinha, apenas por ter uma breve noção de como tudo teria acontecido dentro daquele quarto.

Sairam do quarto - o sobrinho almejando nunca mais pisar lá, e foram em direção ao que pertencia a ele.

Ajudando Frank no banho de banheira, o empregado decidiu orientá-lo. Era essa a hora.

A hora em que a realidade de fato dava um tapa seco na cara.

-Olhe...-Passou a esponja pelas costas dele. Observou algumas espinhas vermelhas. Frank não respondeu. Apenas olhava um ponto fixo na água esbranquiçada de sabonete. - Ele te colocou em um caminho sem volta. Não há muito o que se fazer a partir de agora...

-É...-Ele concordou com o olhar ainda fixo naquele ponto.

Realmente não se importou em ficar completamente nu na frente de Noah. Aliás, quem se importava mesmo?

-Sabendo obedecer direito, a convivência se torna um pouco suportável.

-Eu não quero conviver com ele. Quero me livrar dele. - Frank comentou e Noah notou, pela primeira vez, aquela sombra estranha no olhar dele. Seria algo muito frequente dali em diante.

- Não sei se isso seria possível... Mas...-Pigarreou- existem algumas regras, sabe?

-Regras.-Frank balbuciou e voltou seu olhar para Noah.

-Não fale com ninguém sem a autorização dele. - Ditou a primeira regra ao que largou a esponja dentro da banheira.

Frank o olhou franzindo levemente o cenho, como que dizendo "qual a porra do sentido disso?!".

Suspirou e decidiu que seria melhor explicar cada regra, caso não o fizesse, correria o risco do outro não cumprir, o que culminaria em uma grande e espalhafatosa merda.

-Ele tem uma paranoia. Diz que é comigo, usando a desculpa que querem me tirar dele...-Deu de ombros.- Eu até acreditava nisso, tipo, até uns dois anos atrás. Mas depois eu me dei conta de que não era exatamente comigo. É algo que tem a ver com o seu passado... E essa fazenda. Ele teme muito por ela...

-Hm...-Frank gemeu pensativo e sombrio. - Conte mais...

- A segunda é: caso for inevitável, só falar com estranhos dentro da propriedade. Como quando, no meu caso, tenho que falar com os caras das cooperativas que vêm buscar milho e outros produtos. -Ponderou alguns instantes.- Ah, e se ele quiser você...

Frank interrompe:

-Como assim caralhos me querer?!-Quase saltou da banheira. Mas seu corpo ainda doía muito.

-Sim. Agora que ele meio que te... Você sabe, te provou... Com certeza vai querer de novo... E bem, continuando...-Notou o outro garoto ficar infinitamente inconformado com a notícia. E aquela cara que ele fazia... Parecia uma versão mais nova e mais raivosa de Gerard...- Se ele quiser fazer com você, não pode se negar. Se você se negar, vai ser muito melhor para ele.

-Mas o que?!

-Foi uma forma que eu achei de tornar as coisas entediantes para ele. O Gerard deve ter algum problema na cabeça, eu acho, daqueles de ter que tomar Rivotril e usar camisa de força, por que quanto mais você lutar, mais ele vai gostar...!-Seu tom soou abismado.

-Mas ele te amarra...

-Essa foi a brecha que ele achou para contornar meu escape. Então, ele pode até me amarrar. Agora finjo que sou uma boneca inflável e sem vida.

Frank olhava para Noah. Não sabia o que achava mais absurdo, a doença do seu tio, ou a naturalidade com a qual o empregado explicava todas aquelas coisas horríveis.

-Por fim... Só obedeça, ok? Seja o que for... E... Não tente fugir. Não é meio que uma regra. É um aviso. Você tentou fugir ontem, não foi? Olha no que deu? Não sei se você se atrever a tentar isso de novo, depois de... Você sabe... Do que aconteceu, ele vá ser tão bonzinho... É sempre bom evitar do que remediar. No seu caso... Er... É melhor evitar do que ser enterrado...

-Nossa, se sua intenção era me tranquilizar não funcionou.

No dia seguinte, Mary trouxe o seu café da manhã. Um mingau ridículo de aveia com um gosto estranho e origem duvidosa. Um suco de laranja e uma cartela de analgésicos. Como não havia nada melhor a ser feito - e ingerido, começou pelo tal mingau.

Não demorou dez minutos, e Frank apagou sobre a cama.

Mais tarde, às 2:12 p.m, veio o almoço. Mary o acordou com o garfo batendo na borda do prato, fazendo aquela cara rabugenta de sempre. O garoto tomou um susto, mas ao mesmo tempo se perguntou como o café da manhã sumiu de suas pernas e de repente era hora do almoço.

Comeu as asinhas de frango - que estavam deliciosas por sinal, e bebeu o suco de laranja.

Adivinhem?

Dormiu de novo.

Às 19:56 p.m, Frank que não era bobo nem nada, já estava sacando o que estava acontecendo. Mary estava drogando a sua comida, fazendo com que ele sequer saísse da cama. Isso, provavelmente, foi a mesma coisa que aconteceu com Noah, por isso que naquele dia, ele sequer apareceu pela casa, porque estava muito ocupado estando dopado.

Saiu do quarto decidido a não jantar. Se Mary estava fazendo com que ele ficasse dormindo direto, era a mando - inegavelmente, de Gerard. Ele queria manter Frank dormindo para que ninguém visse seu estado deplorável e não questionassem(assim como ele próprio quase fez com Noah) o porque de está mancando.

Com dificuldade, saiu da cama. Parecia que um caminhão de oito toneladas tinha passado por cima de suas costas e fraturado cada osso da sua coluna. Apalpou o pulso esquerdo com a mão direita, e observou a quase desaparecida marca de dedos que ali estava. Os dedos dele. Respirou fundo e percorreu o quarto até a porta, claro, mancando.

Saindo por completo de seu quarto, fitou o corredor e notou a ausência do vaso na mesinha pequena e quadrada perto da escada e ao lado da porta do quarto do seu tio. O rádio, no andar de baixo, estava ligado. Na verdade, Mary parecia gostar muito de música, e ele passava o dia todo ligado. De certa forma, preenchia o vazio daquele enorme casarão.

Afinal, porque Gerard comprou aquele lugar enorme para morar se ele era praticamente sozinho?

Seria megalomania? É... Ele tinha cara de ser desses...

Andou, chegou até o alto das escadas e se amaldiçoou - ao que lembrou da sua atitude estúpida de espiar pela fechadura. Se não tivesse o feito, estaria ótimo do seu jeito. Sem estar mancando, manchado e arregaçado até o hipotálamo.

Descendo, e ouvindo o rangido sofrido e envelhecido que seus passos causavam nos degraus, pôde ouvir mais nitidamente a música. Tears in heaven, Eric Clapton.

"Velha maldita. Ouvindo uma música boa dessas... Eu deveria te mandar direto para o inferno!" Frank pensou e agarrou o corrimão com mais força.

A música ecoava, com seus acordes nostálgicos e ao mesmo tempo alegres. Mas não havia nenhum sinal de Gerard. Ele definitivamente tinha sumido.

-Covarde.

Ouviu passos no corredor de baixo. Com certeza Mary estava limpando algo, como de costume. Ela não parava, era toda hora fazendo alguma coisa. E bem, ela estava velha e acabada. Mas parecia gostar de limpar aquele lugar enorme sozinha. Havia meio que um sentimento de posse por aquela casa.

Logo em seguida, o telefone fixo do escritório, onde ela estava limpando, tocou. Frank desceu as escadas um pouco mais rápido, e não importava a droga da dor que estava sentindo no meio das pernas. Iria ouvir a conversa.

Se aproximou da porta - hesitou, pois da última vez que tinha feito aquilo, certa parte do corpo de seu tio entrou nele sem consentimento. E tentou escutar. A música não era problema.

-Alô... -Mary falou cansada.- Ah sim. Fiz sim. Ele dormiu como você queria...

Mas é claro! Aquela conversa reforçava as suspeitas de Frank. A velha pigarreou, parecia estar ouvindo instruções.

-Ah, pelo amor de Deus Gerard. Não seja ridículo. Você tem muita sorte de ele não ter saído gritando. Ele é esperto. Veio da cidade, não é um imbecil manipulável feito Noah. Ele vai acabar com você...

"Ah... Vou sim...!" Sorriu consigo e maligno.

-Todo nosso esforço teria sido em vão se isso acontecer. Já está mais do que na hora de você aprender a se controlar, seu estúpido!

Um brilho estranho se formava no olhar de Frank. Que esforço era esse no qual Mary se referia? Será que era o fato de esconder os estupros de Noah, ou havia algo mais? Ou havia algo de muito errado no universo, ou aquela velha havia chamado o próprio patrão - que não era nada mais, nada menos do que Gerard Way, de estúpido?

Alguma coisa não encaixava.

Que relação era essa, que permitia uma empregada xingar o patrão?

-Sim, sim. Tomei o remédio da pressão... Vou deitar daqui a pouco. Estou muito cansada. Até depois... - Ela falou, e em seguida o barulho do encaixe do aparelho ecoou.

Frank correu - daquele jeitinho estranho, até a sala de jantar rezando para que ela não fosse para lá também. Olhou o relógio de parede e tentou recuperar o ar. Bem... Gerard não estava em casa... E o "até depois " de Mary, indicava que tão cedo ele voltaria certo?

Então Frank entrava num dilema dentro daquela sala escura.

O que valia mais à pena? A liberdade ou a vingança? A última, era amarga e fria. A liberdade tinha um toque especial de doçura, embora ela costumasse amargar vez ou outra. O que valia mais à pena? Sua dignidade de volta ou um futuro brilhante? Por que tinha que ficar escolhendo entre os dois? Por que não, fazer com que juntasse o útil ao agradável?

Ouviu o barulho do interruptor do corredor, e o último rastro de luz no andar de baixo se dissipou. Frank lembrou da sopa que deixou esfriando no andar de cima, que a velha não fizera questão de subir e pegar o prato. A porta dos fundos foi batida, e esperou alguns instantes até ter a certeza de que o ambiente estava seguro.

Era nítido que o garoto não iria abrir mão de se vingar de seu tio. Mas também não abriria mão de agarrar as oportunidades quando elas apareciam. Fugir. Era isso que aquela porta falava para ele. Fugir.

Fugir para bem longe.

Isso significava muita coisa, inclusive deixar Noah para trás.

Ponderou mais um pouco, enquanto caminhava até a porta. Era quase como estar de cara com um Deus mitológico. Como... Olhar a luz do dia depois de tempos na escuridão. Tocar aquela maçaneta seria como... Ele não tinha mais colocações quando se deu conta de que estava destrancada.

Ótimo. Mary e Noah estava dormindo. Gerard estava nos quintos dos infernos e ele estava acordado. Muito acordado. E com um monte de planos em sua cabeça.

-Alvorecer. Sempre adorei essa palavra...-Comentou pensativo e sombrio, ao que passeava a ponta dos dedos na porta.

Deu meia volta, sorriu consigo e subiu calmamente as escadas.

***

Gerard dirigia calmamente pela estrada. Segurava o volante com a mão direita, tinha entre o indicador e o dedo do meio da mão esquerda um cigarro. Seus lábios estavam ressecados, e aparentemente não descansou muito nos últimos dois dias que esteve fora de casa.

Na verdade, ele se bandeou para os lados mais urbanos de Cresson. Comeu em uma churrascaria, e foi duas vezes na mesma lanchonete. Alugou um quarto de hotel, daqueles de beira de estrada, mas só entrava para tomar banho.

A maior parte do tempo, passava dentro do carro. Sentado feito uma estátua de sal e um olhar congelado e distante.

Saiu correndo da fazenda, pois sentiu aquela sensação estranha no âmago. Um nó, um leve desespero. Era arrependimento? Bem, ele não sabia distinguir. Só sabia que teria muito trabalho dali para frente. Para esconder, para se preparar e para "adestrar" Frank.

Não que ele fosse se tornar seu mais novo cachorrinho de estimação - talvez sim, ou talvez... Bem, ele estava indeciso. Ninguém tomaria o lugar de Noah. Ninguém. E não. Não era como se ele amasse o seu empregado. Era algo mais... Material. Como quando você gosta muito daquela blusa preta no seu corpo. Ou daquele café que não foi feito por você e parece ser muito mais gostoso.

Mexeu os ombros e suspirou.

Cogitou ter que escutar os gritos de Frank. Ele parecia ser desse tipo. Que era valente, partia para o soco, mas apanhava mais do que qualquer outra coisa. Era atrevido demais também. E muito bonito. Inegavelmente bonito.

Mas, ainda era seu sobrinho. E até para Gerard o que ele próprio fez era meio... Asqueroso. Se pudesse, oh sim se pudesse, estalaria os dedos e puft! Frank não seria mais seu sobrinho. Seria apenas um garoto que parou na sua porta, assim como Noah.

Pensou seriamente em não fazer mais aquilo. "Foi a primeira e última vez". Oras. Isso se ele conseguisse se controlar.

Gerard era muito centrado. Controlado e astuto. Só que a coisa saía dos trilhos quando se tratava da sua sexualidade e dos seus "prazeres". Dizem que o sexo é a situação na qual o homem mais se mostra da maneira que ele realmente é. E bem... Gerard era mesmo aquele monstro?

Ele se questionou sobre isso quando dobrou à esquerda e entrou na estrada de terra.

Um arrepio tomou sua espinha quando lembrou de Frank saindo daquele carro no primeiro dia em que o viu. Ficou tão desconfortável - nunca soube explicar o porque, que optou por não olhar para o garoto. Chegou a conclusão de que qualquer pessoa que se aproximasse de seu sobrinho estava sujeito a três tipos de reação: constrangimento, encanto e desconforto. Não o negativo... Algo além do desconforto genérico que pode abranger outros tipos de sentimento. Como uma coisa mais relacionada a estranheza. Não que fosse estranho, não havia nada de errado com ele, mas era como se... Argh... Ele não sabia explicar para si.

Avistou as cercas brancas. Olhou alguns bois mascando capim na propriedade de frente a sua em um relance e depois tornou a olhar a estrada. O céu ainda tinha aquela mistura de cores, de um lado ainda era noite e de outro o reflexo do sol ainda tímido se espalhava alaranjado e rosado. Optou por voltar naquele horário porque não gostava de ser óbvio e nem de ser recepcionado. Mary tinha essa mania.

Reduziu a velocidade do carro, pois as janelas estavam abertas e ele não queria engolir poeira. Tinha que lembrar de mandar um e-mail para a secretaria de infraestrutura e urbanismo para asfaltar aquela via. Estava horrível aquele lugar. Asfalto não iria faltar, afinal, tinha muito petróleo no Texas.

Mas...

Freou bruscamente quando viu aquelas pernas curtas correndo. Reconheceria elas até no inferno.

"Ah não... Mas ele é um puta de um atrevido mesmo."

***

Alguns minutos antes...

Desceu as escadas tomando - desta vez, muito cuidado com sua mochila. Caminhou até o corredor e foi em direção ao escritório do seu tio em busca de dinheiro. Abriu lentamente a porta, andou até a mesa, contornou e abriu a primeira gaveta. Só havia alguns papéis. Puxou a segunda, e havia um grampeador, as chaves de algum lugar que pouco o importava naquele instante e uma fotografia.

Nela, estava Gerard e outro homem. O último era loiro tinha os cabelos alongados e de corte estranho. Seu tio aparentava ter... Hm... Não sabia especificar. Era apenas... Novo e tinha os cabelos pretos.

Pegou a fotografia e a virou para ver se tinha algo no verso, e por sorte...:

"Eu e Bert. Melhor Páscoa de todas"

Frank estranhou muito aquela frase. Muito mesmo. Era muito esquisito ver qualquer tipo de afeição ser esboçada por seu tio. Virou a foto novamente e memorizou bem aquele rosto.

-...Hm... Bert...-Balbuciou cerrando os olhos e fitando um ponto invisível na parede à sua frente.

Procurou mais um pouco, mas não achou a grana que precisava. Mas fugiria do mesmo jeito.

Já estava ofegante quando avistou a saída da propriedade. Seus tornozelos doíam, pois estava obstinado a sair dali de qualquer maneira, mesmo que aquilo culminasse em desrespeitar a sugestão de Noah de não fugir em hipótese alguma.

Oh... Noah. Voltaria lá para buscá-lo com certeza. Proporcionaria uma vida boa para ele, como ninguém jamais o fez. Mas por enquanto, todas as suas energias estavam concentradas em si mesmo. Para que saísse dali com vida.

Mesmo que estivesse mancando e fodido à quarta potência, soltava uns risinhos e pensava no quanto Gerard fora um otário em deixar a fazenda tão depressa, deixando um caminho livre e espaçoso para ele passar feliz e saltitante - não era para tanto, mas ele se sentia mentalmente assim, e repleto de esperança. Com aquela chama acesa, flamejante e estalando como uma fogueira.

Alguns grilos ainda cantavam escondidos em algum lugar e fora isso, apenas os passos pesados e rápidos de Frank ecoavam em meio aquele nada. Passando pela porta, ele se permitiu soltar o ar de alívio que estava o sufocando. Parou alguns instantes. Sorriu feliz.

Decidiu que seria melhor correr e sentir de fato a sensação de liberdade.

Então o fez.

Só que depois de alguns instantes, ele ouviu aquela freada.

Correu mais ainda, ouviu aquele arranque e a aceleração do carro. Não sabia quem era. Não tinha certeza.

Seria um azar da porra se fosse seu tio. E bem...

Era ele. À certa distância, mas era ele.

Foi a partir daquele momento, que começara a caçada. Um cão atrás do gato.



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