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História The A club - Um


Escrita por: thifamorta

Notas do Autor


POR FAVOR, LEIAM ESTAS NOTAS ANTES DE PASSAR PARA O CAPÍTULO.
Se você está possui algum distúrbio alimentar, procure um profissional da saúde imediatamente. Caso não tenha acesso a um psicólogo ou psiquiatra, procure um clínico geral e ele saberá como lhe encaminhar. Se não se sentir a vontade com isso, por favor, fale comigo sobre.
Essa história não tem como objetivo promover a anorexia e/ou bulimia. Pelo contrário, essa é uma história sobre como o culto à magreza pode arruinar vidas.
Algumas das dicas e frases contidas na história pertencem a blogs sobre o assunto e são transcritas e encaixadas em um contexto. Elas estarão sinalizadas em NEGRITO. Não são minhas palavras, mas a de dezenas de pessoas que passaram por isso. Embora mostrar a origem das frases pudesse adicionar realidade à história, eu optei por não disponibilizar os blogs de onde elas vieram por conta de seu conteúdo de apologia a distúrbios alimentares. E, sinceramente, eu não recomendo que joguem as frases no google para achar os blogs. Enquanto os lia para fundamentar The A club eu tive pensamento que não gostaria de ter tido e não gostaria que meus leitores tivessem.
Sim, a cidade em que a história se passa não tem nome e não existe e o país não será mencionado. Pode ser qualquer cidade pequena, inclusive a sua.
Acho que é só. Enjoy.

Capítulo 1 - Um


Dominique tinha as pernas mais longas que eu já vira em minha vida. Eu ficava olhando ela cruzar e descruzar as pernas seguidamente e me perguntava se ela conseguiria cruzá-las até atar um nó. Talvez não fosse impossível, afinal era teria que ter aprendido algo minimamente útil ou esquisitamente inútil em todos aqueles anos que fora escoteira.

- Então... – ela tentou começar uma conversa – Por que sua família veio pra cá?

- Pra cidade?      

- Pro país – ela riu.

- A mesma razão de sempre: em busca de melhores oportunidades. E conseguiram.

- Arriba! – Dominique colocou os braços pra cima e sorriu.

Fui obrigada a fechar a cara. Logo quando eu havia começado a achar que talvez não fosse tão burra quanto parecia, ela me prova estar errada.

- Não se fala espanhol no Brasil, Dominique.

- Ah. – ela voltou a se concentrar na tarefa de cruzar e descruzar as pernas. Talvez fosse bem melhor assim, afinal.

Dominique era filha de um dos melhores amigos do meu pai e, honestamente, uma das garotas mais bonitas da cidade. Ela nunca comparecia aos jantares que minha família oferecia à dela e meus pais me obrigavam a participar, mas por algum motivo resolvera dar o ar de sua graça naquela noite. Estudávamos juntas há, no mínimo, 4 anos, mas nunca trocamos mais do que alguns “bom dia” e “cuidado com a bola”; não porque houvesse uma divisão entre os populares e os impopulares na escola, sabemos que não estamos em um filme da Disney ou um remake de Mean Girls, mas porque ambas sabíamos que possuíamos tão pouco em comum que qualquer tentativa de comunicação seria um grande desastre.

Minha mãe apareceu na sala e sentou-se no sofá marrom ao lado de Dominique.

- E aí, galera? Tudo de boa?

Minha mãe sempre virava este híbrido de “sou velha demais para falar assim com adolescentes” e “sou nova demais para sentir necessidade de falar assim com adolescentes” quando estava perto de alguém da minha idade. Eu costumava ficar envergonhada, mas agora apenas seguia a onda e fingia que as pessoas da minha idade realmente falavam assim só para fazê-la feliz.

- Tudo tranquilo – respondi.

Ela me deu um sorriso. Minha mãe ainda era muito bonita; sua pele de um tom eternamente bronzeado e os longos e cheios cabelos pretos cacheados lhe adicionavam um certo charme e um toque juvenil. Ela levantou a bandeja que trazia, como se nos oferecesse seu conteúdo.

- São os melhores bombons caseiros da cidade, fiquei disso sabendo por fontes seguras. Fiz esses aqui com muito carinho para vocês, migas.

A fonte segura provavelmente era meu pai, que podia devorar uma bandeja lotada de bombons de avelã se minha mãe permitisse. Peguei três deles e enfiei um inteiro na boca.

- Não, obrigada - Dominique recusou educadamente. Ela não tinha ideia do erro que acabara de cometer.

- Eu não aceito não como resposta, mana. Pega um, olha esse aqui tá enorme, tá perfeito. Você é tão magrinha, não vai me dizer que não quer meu bombom porque tá de dieta, né? Porque se disser eu não vou acreditar e vou até ficar bem zangada. Onde já se viu...

Eram tantas palavras por segundo que Dominique simplesmente aceitou. Assim que minha mãe saiu, ela me estendeu a mão com o bombom, enquanto mantinha os olhos grudados no corredor para se certificar de que minha mãe não estava voltando.

- Você tem certeza que não quer? Pode não ser o melhor da cidade, mas definitivamente é muito bom.

- Não, obrigada – ela balançou a cabeça – Eu sou... Alérgica.

Era bem óbvio que Dominique estava mentindo e eu tinha certeza de que minha mãe ficaria profundamente magoada se visse aquela cena. Mas aceitei, já que já havia devorado todos os meus bombons.

Não conversamos mais até o jantar. Dominique estava tão perdida em pensamentos que até esquecera de cruzar a perna mil vezes por minutos. Ela só acordou de seu estado de meditação quando meu pai nos chamou para a mesa.

O jantar correu tranquilo. Meu pai e o pai de Dominique, cujo eu nunca sabia pronunciar o nome e não me atreveria a tentar aqui, conversaram sobre o trabalho incessantemente e minha mãe e Dominique-Mãe falaram sobre tantas coisas que eu nem consegui acompanhar. Elas insistiam em integrar Dominique e eu a suas conversas, mas sempre falhavam miseravelmente. Dominique bebeu tantos copos d’água que eu perdi a conta. Ela passou mais tempo cortando a comida do que efetivamente comendo.

Minha mãe pediu ajuda para trazer as sobremesas à mesa. Sobremesa era seu ponto forte e digamos que ela sempre exagerava um pouquinho na quantidade. Mousse, pudim, sorvete, merengue e basicamente tudo que você possa imaginar que envolva chantilly, morango ou chocolate estavam naquela mesa. Se a família Davenport não tinha histórico de diabetes, definitivamente passaria a ter depois de comer tudo aquilo. Até Dominique provara um pouco de tudo, provavelmente porque não tinha mais a opção de cortar até que os pedaços de comida só fossem visíveis a microscópio.

Depois disso, minha mãe, em um claro episódio de “não sei quando parar de forçar a barra”, fez com que Dominique e eu subíssemos para o meu quarto para que eu pudesse mostrá-la minhas pinturas. Ela sabia muito bem que eu odiava mostrá-las às visitas, mas sempre me obrigava mesmo assim. Não que nesse caso Dominique fosse prestar qualquer atenção nas telas, já que pediu para ir ao banheiro no segundo em que entrou no quarto.

- Primeira porta a esquerda.

Eu estava percebendo milhões de defeitos que não percebera antes em uma das pinturas quando ouvi o barulho de algo pesado caindo no chão. Havia esquecido totalmente de Dominique.

Corri para o banheiro e, para a minha felicidade ou não, a porta estava aberta. Acabei soltando um suspiro quando vi que ela estava com uma das mãos apoiadas na parede tentando se levantar, mas foi só até meus olhos passarem pelo resto do banheiro. Era uma daquelas imagens fortes e nojentas que você dificilmente consegue esquecer.

Tinha vômito por todo o chão e também no vestido dela. Dominique provavelmente escorregara no próprio vômito. Não era daquele jeito que eu gostaria de lembrar de Dominique, mas essa imagem nunca mais saiu da minha cabeça.

- Meu deus! Você está bem? – fechei a porta atrás de mim. Eu sei que ela no gostaria de que ninguém mais a visse naquele estado. A ajudei a se equilibrar.

- Eu mereço isso! Eu sou fraca! Eu sou fraca e mereço isso! – ela não para de chorar e eu realmente não tinha ideia do que fazer – Alyssa vai me matar se souber disso. Ela sabe que eu sou uma fraca. Ela vai ficar com tanta vergonha de mim!

Alyssa era uma das melhores amigas de Dominique. Eu não sabia nada sobre ela, além de que sempre fora um pequeno gênio.

- Do que você tá falando? Eu não vou contar pra ninguém - fiz com que ela sentasse no vaso sanitário. Ela tremia tanto que eu tinha medo de que acabasse caindo de novo. Tirei o elástico que prendia meu cabelo e amarrei seus cabelos loiros para trás. Eles estavam sujos também. Eu já sentia as lágrimas no meu rosto – E, mesmo se eu contasse, todo mundo já ficou doente alguma vez. Não tem nada demais nisso. Vem cá, vamos limpar seu rosto – minha voz inspirava menos confiança do que eu pretendia.

Dominique segurou minhas mãos, impedindo-me de ajudá-la a levantar.

- Eu não tô doente! – ela praticamente gritava. Eu tentava não olhar para o seu rosto ou para qualquer ponto dela, na verdade. Era triste demais – Eu fiz isso porque eu quis! Porque eu faço o que a Mia manda!

Eu não sabia quem diabos era Mia, mas estava começando a entender o que acontecera ali.

- Ma-mas isso é uma doença tam-também... – eu não sabia o que dizer.

- Ela não é uma doença, é uma amiga – Dominique agora abaixara o tom de voz e encarava o chão.

- Domini...

- Por que eu fui dizer isso? Eu sou uma burra! Burra! Burra! – ela agora estava desesperada de novo – Você não pode contar pra ninguém, ouviu? Ninguém!

- Mas você precisa de ajuda.

- Você já tá me ajudando. Eu não preciso de mais do que isso. Pelo amor de Deus, não conta pra ninguém!

Ela chorava tanto que a única coisa que eu consegui falar foi sim.

- Obrigada! – Dominique parecia realmente agradecida.

- Agora vamos dar um jeito nisso aqui, ok?

Eu a ajudei a limpar o rosto, o cabelo e o banheiro. Ela me contou que estava vomitando na pia e já estava saindo do cômodo quando acabou vomitando de novo e caindo. E que Mia era um codinome para bulimia. Enquanto eu cuidava dela, perguntei se havia prometido a Alyssa que não faria mais isso – era a única explicação que eu encontrava para “Alyssa sabe que sou uma fraca”.

- Não. Eu prometi a ela que não comeria.

Ela disse isso com tamanha naturalidade que eu não consegui falar nada por um longo tempo. Dominique se recusou a responder qualquer outra pergunta e continuava repetindo que deveríamos focar na limpeza e que aquilo já era passado.

Emprestei minhas roupas e combinamos que diríamos a nossos pais que ela sujara a roupa de tinta quando tentara fazer uma tela comigo e achou melhor trocar de roupa para evitar alguma reação alérgica. Fiquei um tanto impressionada ao ver que ela ainda parecia uma modelo mesmo com uma das minhas camisas de banda e uma calça que nela ficava bastante folgada e curta (como eu disse, ela tinha as pernas mais longas que eu já vira).

Ver Dominique sair pela porta e acenar um tchau tímido e agradecido foi difícil. Eu acabara de ver seu lado mais frágil e vulnerável e só queria que ela ficasse segura de tudo. De algum modo, eu já me sentia responsável por ela.

Não consegui dormir naquela noite.


Notas Finais


Enfim, é isso. Espero que tenham gostado. Desculpa se alguma parte deu uma certa ânsia, mas é isso que eu quero provocar mesmo. Porque distúrbios alimentares são assim.
Me avisem se houver algum erro (sério, avisem), se vocês acharem que eu devo muda algo na escrita etc. Até o próximo. Eu espero.


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