Às vezes só conseguimos enxergar a realidade após a queda.
Aqui estava eu, na colina, onde está localizada a cabana dos anjos. Mais um dia de descanso que me servia apenas para pensar nas lembranças recentes. Escolhi não usar as minhas asas, subi até o topo andando e repassando cada segundo dos dias anteriores, tentando encontrar uma falha em meus planos, e, sim, eu encontrei a falha mais evidente, Viktor é ela. Ele não irá poupar esforços para conseguir o que quer. Contudo, não tenho medo dele, estou convicta que tudo que eu fizer dará certo.
Chegando ao topo da colina, percebo uma movimentação grande, outros anjos estavam lá. Não era comum muitos anjos em um único abrigo, especialmente naquele, no qual todos eles sabiam que é o que eu frequento. Obviamente uma desconfiança se atiçou em mim, cumprimentei com um singelo aceno os dois anjos que estavam na entrada da cabana e adentrei nela.
Abaixei o capuz, recebendo diversos olhares. Viktor estava ao fundo com um arcanjo ao seu lado. Encarei-os esperando se pronunciarem primeiro, eu suspeitava do que se trataria aquela conversa, mas não acreditava que Viktor queria me fazer mudar de ideia na marra.
— Anjo da morte Samaele, a Morte. — O arcanjo me chamou, pedindo que me aproximasse dele — Recebi um alerta de que você vem retirando a vida de pessoas que ainda não estão preparadas para a passagem de vida após morte. O que tem para dizer sobre isso?
— Arcanjo Mitzrael, é um enorme prazer revê-lo, quantos anos já se passaram desde a última vez? Uns cem? — O louro me encarou ríspido, esperando sua resposta, eu sabia que não poderia brincar com um momento desses, mas não é todo dia que encontramos um arcanjo prestes a te punir. Mudei minha postura ficando séria, e comecei a falar — Sabe, eu criei o jogo da morte, muitos estão cientes disso, talvez até mesmo você sabia disso antes do alerta — Olhei de relance para Viktor — todos os participantes deste jogo que criei são humanos que em beira de sua morte fora resgatados pelo que eu chamo de parceiros no jogo. Eles tinham suas datas para morrer, então, já estavam preparados para morrer. Agora em relação aos parceiros estarem correndo o mesmo risco no jogo pode ser um ato julgável.
— Você confessa o que fez sem ao menos resistir. Sempre fora incrível, Samaele, desta vez não foi diferente, minha visão sobre você continua a mesma. Todavia, você cometeu um erro, antes mesmo de cometê-lo sabia que não era o correto a seguir, agora terá que arcar com as consequências. Deixarei para que descubra por si o que te aguarda. — O anjo se preparou para sair, ele parecia estar com pressa, mas Viktor impediu que isso acontecesse. Seria fácil demais se acabasse desse modo tão simples meu julgamento, ele ainda teria que atrapalhar em algo.
— Por quê? Não vai fazer nada, além disso? Impeça ela, é o que deve fazer! O que você deveria ter feito. — Mitzrael olhou para Viktor, de longe poderia ser visto a diferença da hierarquia dos anjos entre eles dois.
— Não questione, as consequências virão. — O irritamento do arcanjo era evidente. Ele seguiu até a porta da cabana deu um aceno breve com a cabeça e voou longe, deixando os outros anjos para trás.
Alguns dos outros anjos começaram a sair também, abrindo as asas voando rente a colina, em seguida dando um avanço rumo ao céu.
Andei até a entrada da cabana, sentindo que Viktor me seguia. Completamente do nada, algo se atiçou em mim, parecia uma chama me queimando por dentro que subia repentinamente dos meus pés até a cabeça. A qualquer momento eu poderia cambalear e cair, porém, resisti. Não olhei para trás porque queria evitar deparar com ele.
Abri minhas asas que pareciam chumbo de tão pesadas que estavam, suspirei, segurando firmemente a foice e tentei voar.
Eu caí, e saí rolando na colina. Achei que chegaria até lá embaixo desse modo, mas, Viktor conseguiu me alcançar segurando-me em seus braços. Ele chorava, culpando-se do que estava acontecendo. Nesse momento eu entendi, aquele anjo, queria me proteger. Viktor preferia que eu fosse proibida de continuar com o jogo. Ele teria que compreender que essa é a ultima escolha que desejaria fazer. O arcanjo aceitou minha decisão assim como os outros, só faltava ele, que não conseguia apenas por me amar demais para me ver sofrer com as consequências que haviam começado.
— Nem tudo é como queremos, Viktor. — Antes que me respondesse, ali mesmo sobrevoando, enquanto estava em seus braços, puxei o seu rosto para perto do meu e fiz um esforço para beijá-lo. Ele aceitou, sabendo que esse talvez fosse o ultimo beijo entre nós. Nosso apetite pelo outro foi tão grande que esquecemos que ainda tinha anjos na cabana, eles poderiam ver, entretanto, mais nada disso importava para mim. Aproveitaria aquele momento como se não houvessem outras oportunidades.
***
Quarta-feira, 09 de março;
15:23 PM.
Lynn estava decidida a mudar graças à noite passada em que conversou com Rosalya, acordou decretando um basta para si mesma, não podia deixar as coisas como estavam. Ninguém mais podia morrer por sua falta de coragem, mesmo abalada com tudo que acontecia. Saiu de casa, sem chamar Castiel para acompanhá-la, ela queria começar encontrando sozinha os participantes e seus respectivos parceiros, um de cada vez. Pobre garota, tão determinada de uma maneira inacreditável. Mal ela sabia que já tinha encontrado e que andar sem seu companheiro por perto não ajudaria em absolutamente nada.
Ela foi em direção ao colégio Sweet Amoris, achava que, talvez por lá ter tantos envolvidos, encontrasse alguma mísera pista. Durante o caminho, avistou Melody no outro lado da rua, indo na mesma direção. Hesitou por alguns segundos seguir em adiante, deixou que Melody fosse à frente, esperando um pouco encostada numa loja próxima. Será que ela está indo à procura de participantes? Onde está Nathaniel?
Prosseguiu seguindo Melody, sem deixar ser vista. Apesar do “acordo de paz” entre as duplas, Lynn era desconfiada de nascença, dando grandes motivos para ela desconfiar do que estava fazendo Melody ir ao colégio. Poderia ser o mesmo motivo que o dela, mas não queria arriscar.
Seguiu a garota, ao chegarem no colégio foi como piscar e reviver o dia do incêndio ainda tão recente. Tentou se acalmar, agora que tinha chegado ali não podia deixar a dor e o medo tomar conta. Viu Melody na frente do portão, tentando abri-lo, estava trancado. A morena andou envolta do muro do colégio, indo para o lado do estacionamento. Lynn acompanhou, e percebeu que Melody parou no meio do caminho virando-se para trás, Lynn não teve tempo para se esconder e logo Melody deparou-se com ela à alguns metros de distância.
— Não deveria estar aqui.
— Nem você deveria, Melody. — Falou enquanto se aproximava.
— Porque veio para cá? Está me seguindo, Lynn?
— Ahn, meu objetivo era vim aqui, não sabia que também pretendia vir aqui.
— E qual é o seu motivo?
— Achar pistas. — Melody riu com a resposta de Lynn.
— Certo, Sherlock Holmes. Sinto muito informar, mas, acredito que tudo que poderia ser uma “pista” virou carvão.
— Nunca se sabe. — Falou dando de ombros — E você? O que veio fazer aqui?
— Deixar uma mensagem. Nada em que você precise se preocupar. — Melody voltou a andar na direção da porta do fundo que ficava no estacionamento, a mesma em que usaram para sair do colégio naquele dia de terror.
—Você tem a chave?
— Não.
— E como pretende entrar?
— Da mesma maneira que você. — Bem, Lynn não havia pensado nisso. Como ela entraria ali?
Ela ficou observando Melody verificar a porta e tentar abri-la com um grampo, o que não deu muito certo.
— Que tal arrombar? — Melody olhou para Lynn como se a garota fosse um E.T, em seguida considerou a possibilidade. Então as duas juntas conseguiram o feito e entraram.
— Não vá para muito longe, o cheiro de queimado ainda está forte, Lynn. — Ela apenas concordou com a cabeça e saiu olhando as coisas ao redor. Nada era como antes, a imagem que ela tinha do colégio estava completamente diferente. Lynn até se distraiu no corredor olhando os armários entulhados, certa de que nada poderia ser salvo naquele meio. Melody estava certa, não conseguiria achar pistas no estado em que as coisas se encontravam, mas de uma coisa ela suspeitava. Para que fim Melody deixaria uma mensagem no colégio? Provavelmente alguém viria aqui mais tarde.
Assustou-se quando Melody apareceu perto dela avisando que já estava saindo, ela acompanhou a garota, não tinha nada que ela pudesse fazer ali. Ao pisarem de volta no estacionamento viram que havia uma pessoa lá. Um cara negro que aparentava ter a idade das duas e tão alto que qualquer um julgaria como jogador de basquete.
As duas se entreolharam. Ele encarava elas, especialmente Lynn. O rapaz puxou algo de sua cintura, um revolver, quando perceberam, seguraram as mãos uma da outra e saíram correndo o mais rápido que podiam. O que menos Lynn podia esperar ver, era Kentin parado na entrada do estacionamento encurralando elas.
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