História The Dollhouse - As paredes escutam

  O tempo estava tão agradável naquele fim de mundo. Em meio às árvores e às montanhas, podia somente se ver a ponta do enorme casarão acinzentado naquele vasto verde. O vento que soprava fazia as folhas das árvores caírem e o cabelo do falso ruivo balançarem, seus pêlos do braço se arrepiaram não só pelo vento, mas também pelo medo de estar num lugar desconhecido e isolado.

  Depois de sair da trilha que levava até o casarão, o carro preto e antigo estacionou no cascalho. O garoto de cabelos ruivos e encaracolados saiu do veículo com receio. O motorista deixou sua bagagem -duas pequenas malas- ao lado do menino e entrou no carro novamente, partindo de volta para a trilha de terra de onde veio.

  Enquanto San Ha estava sozinho e em silêncio, numa luta interna se entrava ou não no casarão aparentemente sem vida, dentro dele tinha uma pequena agitação causada por cinco garotos: Moon Bin, Dong Min, MinHyuk, MyungJun e JinWoo.

  - Wa, é tão bom ter alguém novo aqui depois de tanto tempo! -Disse o mais velho deles. Os garotos estavam se espremendo na janela para conseguir ver o ruivinho no jardim.

  - Sim, hyung! Eu estou com tanto medo por sermos os únicos normais aqui... -MinHyuk disse, abraçando o mais velho e olhando discretamente para trás. Outros garotos e garotas passavam pelo corredor, quando seus olhares se encontravam no do castanho, um friozinho na barriga lhe tomava conta.

  - Todos nós estamos. -JinWoo, o loiro, se pronunciou.

  - Ei gente, ele está entrando, vamos lá! -Moon Bin alertou quando viu o ruivinho se dirigir para o portão do casarão em passos lentos.

  Os cinco garotos que até então estavam espiando pela janela do segundo andar, desceram a escada correndo, parando em frente a grande porta de madeira que logo foi aberta pelo ruivinho que se assustou ao ver os garotos o esperando.

  - Olá! Seja bem vindo! -O mais velho disse com um sorriso no rosto, mas o ruivo apenas ficou parado com aquela feição infantil e assustada. -Meu nome é MyungJun, mas deve me chamar de MJ. Como você se chama?

  - Me chamo San Ha, Yoon San Ha. -O ruivinho abriu um pequeno sorriso e tombou a cabeça para o lado, confuso. - MJ? Por que devo te chamar assim?

  - Porque esse é o nome que deram para ele. -O loiro disse e então a atenção do novato foi para ele. - Meu nome é Park Jinwoo, mas me chame de JinJin.

  - E eu sou Dong Min, mas agora me chamo Eun Woo. -O moreno falou.

  - Me chamo Moon Bin mas agora sou apenas Bin.

  - MinHyuk, Rocky agora.

  - Esses nomes são engraçados, não posso simplesmente chamar vocês pelo nome real? -San Ha riu baixinho mas se calou ao ver as expressões sérias e tristes dos garotos.

  - Não, se nos chamarmos pelo nome verdadeiro, eles vão saber que ainda estamos normais... -MJ sussurrou. Só aí que o novato percebeu que todos estavam falando baixo, como se alguém além deles pudesse ouvir.

  - Eles quem? E como assim ainda estão normais? Por que estão sussurrando? -O garoto questionou num tom de voz um tanto alto. Os meninos se entreolharam e MJ fez um aceno positivo com a cabeça para Rocky, este por sua vez entendeu o recado e tampou a boca do garoto com a mão.

  - Shh, você vai entender tudo, só fique calado e tente agir como nós. -Rocky sussurrou no ouvido do garoto assustado e retirou a mão da boca dele após ter assentido. 

  Os seis meninos de idade entre 12 e 16 anos seguiram pelo corredor com uma postura de robô e sem demonstrar nenhuma expressão. San Ha no início estranhou mas acabou imitando os hyungs quando percebeu que os outros garotos e garotas daquele lugar agiam como se não tivessem emoção, como se estivessem vazios.

  San Ha seguiu os cinco meninos até entrar num pequeno quarto com três beliches. Ele observou que os garotos suspiravam aliviados e Eun Woo trancou a porta. O ruivo ficou de pé no meio de duas beliches, encarando os garotos que estavam sentados em cada colchão, imaginou que cada um estava em sua cama então resolveu se sentar na cama que estava sobrando.

  - E então? Vão me contar o que está acontecendo aqui? -Viu os garotos se entreolhar novamente e então se levantou irritado. - Qual é? Eu devo ver o diretor, ele nem me recebeu, vocês são loucos!

  - Não! -Antes que pudesse fazer qualquer coisa, seu braço foi segurado por um Rocky assustado. - Você não pode...

  - Ah é? E por que? -Disse desaforado.

  - Não viu como eles estão?! Eles estão diferentes, não são normais como nós, algo está acontecendo aqui e precisamos descobrir o que é! Ou vai me dizer que não reparou que eles estão como robôs? Parecem estar vazios! -Moon Bin se exaltou, aquela situação estava assustando todos os garotos ali.

  - Algumas vezes, um caminhão vem aqui e depois disso várias crianças somem. Sem falar que quando o diretor te chama, você volta estranho. Todos eles foram chamados pelo diretor e voltaram diferentes. -Completou EunWoo calmamente, mas igualmente assustado. - Por isso temos de agir como eles, nunca sabemos quando vamos ficar diferentes.

  - Então devemos fugir! -O ruivinho se desesperou, estava quase chorando.

  - Não podemos. Eles nos pegariam... -Falou o loiro cabisbaixo. 

  - Mas quem diabos são eles?!

  - Não sabemos. Antes de você vir pra cá, tínhamos um outro companheiro de quarto, ele foi chamado pelo diretor e quando voltou não parava de dizer coisas como "Eles vão nos pegar", "Eles querem me transformar", "As paredes escutam e contam tudo para eles". Ele tentou fugir mas o diretor conseguiu capturá-lo, nunca mais o vimos depois disso. -Terminou de contar com um suspiro pesado. Logo um silêncio perturbador se fez presente, os seis garotos se olhavam com um semblante assustado.

  - Ya, ya, chega disso! -MJ balançou as mãos e a cabeça negativamente. -Vamos falar sobre algo diferente! Hmm.. San Ha, o que faz aqui? Eu e o JinJin estamos aqui porque nossos pais foram para o Japão, já os outros estão porque os pais não os suportam. -Soltou um riso fraco para disfarçar o clima tenso que tinha ficado no cômodo. 

  - Ah, eu não tenho pais, meu orfanato ia ser demolido então fui transferido pra esse colégio interno. -Coçou a cabeça e sorriu fraco. O ruivinho logo recebeu olhares tristes como se dissessem "sinto muito", sorriu largo e balançou as mãozinhas em negação. - Ya, tudo bem, isso já faz tempo.

  - Pff, colégio... isso está mais pra algum laboratório onde somos as cobaias. -Disse Moon Bin irritado mas logo recebeu um olhar de reprovação do hyung. - Que foi? Olha, acho que o melhor que podemos fazer por enquanto é dormir.

  Os garotos passaram tanto tempo conversando que quando foram perceber, já se passava das nove da noite. Disseram boa noite uns aos outros, como de costume, e se deitaram em suas camas depois de Eun Woo se certificar que a porta estava trancada. Enquanto cinco meninos dormiam tranquilamente num sono sem sonho, um deles estava tendo uma noite horrível de pesadelos.

  - O-olá? -Gaguejei. Meu sangue estava gelado, meus pêlos arrepiados, os olhos e ouvidos atentos em qualquer sinal de vida naquele lugar. Não sei que lugar é este, não consigo enxergar nada, está tudo tão escuro e silencioso.

  Respirei fundo e dei mais um passo, passo esse que me fez cair escada abaixo por não saber da existência de degraus ali, estava um completo breu! Gemi de dor e coloquei a mão na cabeça, senti algo viscoso, provavelmente sangue. Meus olhos já estavam se adaptando a escuridão, por isso pensei estar sonhando quando vi dois pontos vermelhos logo à frente. Me aproximei mais em passos lentos, minha mente estava constantemente me mandando parar de andar, me enviava sinais de alerta como se fosse perigoso eu prosseguir. Ignorando meu instinto de segurança, me aproximei dos pontos vermelhos, estava numa distância de uns 50 centímetros. Olhei atentamente e pude notar que aqueles pontos eram olhos. Um par de olhos vermelhos como o sangue, os olhos me encaravam com maldade, podia sentir perversão naquela criatura que não sabia se era humana ou não. 

  De repente minha visão foi se clareando, o lugar ainda era escuro e parecia não ter nada. Nessa altura já tinha dado vários passos para longe da criatura, criatura que consegui ver a silhueta esguia e magricela. Usava uma espécie de capa negra, não conseguia ver o rosto, apenas os olhos vermelhos me fitando. Meus olhos se arregalaram e meu coração disparou quando vi algo branco naquele rosto negro, era um sorriso largo, um sorriso amarelado que ia de uma ponta a outra do rosto. O ser parecia se divertir com meu medo, ele se alimentava dele. Quando o vi correr até mim na velocidade da luz, fechei os olhos com força, sabendo que morreria ali.

  San Ha então despertou do pesadelo. Os olhos arregalados e a respiração descompassada, o coração parecia que quebraria seu peito de tanto que batia rápido e forte. O ruivinho suspirou aliviado ao perceber que aquilo era somente um pesadelo, riu de si mesmo em pensar por um momento que aquilo era realidade, culparia seus hyungs por ter falado tantas bobagens à respeito daquele lugar. Se acalmou e virou-se para o lado, se aconchegou nas cobertas quentinhas e adormeceu novamente. Ah, se o ruivinho tivesse olhado pela janela do quarto e visto a criatura perversa de olhos cor de sangue, o observando do jardim no meio daquela madrugada, saberia que seu pesadelo não estava longe de ser realidade.