ㅡ CACHORRO-QUENTE DO CLIFFORD!
Michael gritava de seu trailler, balançando seu mais novo sininho para chamar a atenção das pessoas. Como se estar vestindo a própria comedia que vendia não fosse o suficiente. O grande cachorro vermelho postado como placa ali a frente também o ajudava a vender seu lanche, fazendo a brincadeira mais idiota do mundo ao comparar seu próprio nome - Michael Clifford - com o desenho animado do Grande Cachorro Vermelho.
Sua barraquinha de cachorro-quente era pura ironia.
Aquela era a vida normal que Michael levava desde o início do ano passado, quando chegara ao segundo ano do ensino médio e sua mãe lhe disse que estava na hora de começar a trabalhar se quisesse pagar a faculdade de música que tanto queria. Não que a mulher já não tivesse guardado um dinheiro para auxiliar o filho, mas aquele dinheiro era específico para a faculdade de medicina de Clifford. Não para que ele "fosse atrás de um sonho impossível de se realizar" e sim para que "ele tivesse um emprego e um futuro de verdade".
Mike só não sabia que seu futuro estava prestes a mudar naquele mesmo dia. Naquele final de tarde que aparentava ser comum, com o vento levando embora as folhas das árvores do parque central da cidade, onde milhares de pessoas passavam alienadas a tudo que o universo poderia criar além do que elas já conheciam.
Aquela fora a tarde em que as coisas estranhas começaram a acontecer.
ㅡ Oi, gata, quer meu dogão? - Michael pergunta a uma garota que passa, e esta o encara com o canto dos olhos, acelerando os passos.
É, cada recusa daquelas, era uma pequena desmotivação para o pobre rapaz vestido de cachorro-quente.
Para sua surpresa, uma risada soa baixa próxima a ele, fazendo-o virar o rosto abruptamente.
Ele não percebeu quando o garoto sentou sob seu toldo, em um dos poucos bancos altos disponibilizados para seus clientes.
Os cabelos loiros, rosto delicado, ombros largos... Michael jurava já tê-lo visto em algum lugar.
ㅡ Você não é o cara que sempre fica depois da aula pra tocar guitarra? - Pergunta ele e o loiro ri baixo.
Ele ergue a cabeça, permitindo que Michael visualize seus olhos azuis, semelhantes a dois lagos cristalinos.
O garoto cachorro-quente franze o cenho pela sensação que invade seu peito.
Primeira coisa estranha. Estava perdido nas íris e orbes de um desconhecido.
ㅡ É. Sou eu mesmo. - O rapaz responde.
Por algum motivo que Michael não compreendeu, as bochechas do outro ganharam um tom rosado.
ㅡ Ahn... pode trazer um cachorro-quente pra essa princesa?
O loiro pergunta, e só então Michael percebe os dois olhinhos o encarando por trás da bancada. A garotinha era pequena, e muito parecida com o rapaz ao lado.
ㅡ Claro. - Mike responde, indo fazer seu trabalho. - Você quer com batata e Ketchup?
A garota fica de pé no banco, sendo segurada por seu responsável.
ㅡ Quero um completo, com duas salsichas! - Ela estende a mão, mostrando a quantidade de salsichas que deseja com os dedos.
Michael arregala os olhos, sem conseguir imaginar como tudo aquilo caberia numa boca tão pequena. De qualquer modo, ele prepara o lanche, o entregando a criança.
ㅡ Obrigada, tio Mike.
Ela diz de um modo adorável, pulando da cadeira. Michael franze o cenho, começando a murmurar a pergunta "Como você sabe meu nome, garota incrível que come o lanche completo?" mas mal tem tempo de terminar a frase.
Ali vinha a próxima esquisitice. Michael podia imaginar que qualquer coisa sairia da boca de seu cliente, menos aquilo.
ㅡ Escute a salsicha. Não recuse o poder dela. - O garoto loiro disse, antes de se afastar com a menina mais nova.
Michael observou-os com uma expressão totalmente confusa. Mas que diabos ele esta dizendo? Com certeza, aquele cara bonito estava discriminando sua bela roupa de dogão.
ㅡ Que ridículo. - Resmunga, limpando a bancada com seu pano cor de rosa, a violência demonstrando sua irritação por achar que as pessoas zombavam demais de seu trabalho duro.
Foi naquele momento que ele pensou estar completamente louco. O que ocorreu em seguida poderia fazer a mente de qualquer um virar do avesso. Contudo, Michael nascera para ouvir aquilo. E sentir.
ㅡ Michael... - ele escuta o sussurro, chamando-o, fazendo-o olhar de um lado para o outro sem encontrar ninguém.
Ele da de ombros. Foram apenas alguns segundos de silêncio enquanto ele observava o sol se pondo por trás dos prédios.
ㅡ Olhe para mim, Michael... - a voz repete, e a única coisa que ele identifica é o fato de ela ser feminina.
Aquilo o irritou ainda mais.
Ele bate a mão com força na superfície metálica.
ㅡ Mas que merda! Estou trabalhando pra pagar a droga da faculdade, então me diga logo o que você quer!
Ele berra, chamando a atenção de algumas pessoas que passam na rua. Aquilo faz com que suas bochechas corem e ele abaixa a cabeça, pensando precisar urgentemente de um psiquiatra.
ㅡ Não resista... você não pode recusar o meu poder...
Ele arregala os olhos ao ouvir aquilo.
Recusar o poder, recusar o poder... recusar o poder de quem? Onde já ouvi isso? Pensa Mike. Poder... poder da salsicha! Sim, sim, o garoto bonito. Mas ein?! Aquilo só podia ser uma brincadeira de muito mal gosto. Estaria o loiro ainda próximo e lhe pregando uma peça boba?
Clifford se vira com dificuldade por estar em um cubículo com uma fantasia enorme, e olha para o estoque de salsichas congeladas, pronto para gritar e esbravejar que estava ocupado demais para brincadeiras, ele queria mostrar a sua mãe que podia sim realizar seu sonho com a venda de cachorros-quentes.
Contudo, Michael se assustou ao ver que, ali, no meio de tanta carne suína, uma brilhava com uma luz intensa e esquisita, que fez o garoto duvidar outra vez de sua sanidade mental.
ㅡ Venha... venha para mim. Descubra os poderes incríveis que você é capaz de ter.
A mente do garoto transformou tudo ao redor da salsicha brilhante em um mero borrão. Suas pupilas dilataram, seus lábios entreabriram, inebriado com o poder que a salsicha exalava. Ele estende uma das mãos involuntariamente, pegando-a e a encarando mais de perto.
ㅡ Eu te concedo o meu fardo. Sou apenas uma salsinha. Mas você, você, Michael Clifford, pode salvar o mundo.
Michael assente com a cabeça, abrindo um sorriso de maluco.
ㅡ Eu posso salvar o mundo... - Repete. Aquele poder mexendo com seus neurônios.
ㅡ Agora me morda.
Mike obedece sem hesitar. Seu coração pulsava mais forte, como se sua alma avisasse sua ligação real com aquele poder estimável, mas que era inimaginável, e o garoto coloca praticamente toda a salsicha na boca, a mastigando.
No mesmo instante, sentiu um forte formigamento por todo corpo, e tudo girou ainda mais rápido, como se tivesse acabado de entrar em um portal que o sugou para outra dimensão. Várias minisalsichas dançavam a sua frente, ao som da música Crazy Frog.
Michael estava sendo abençoado pelo poder da salsicha. Seu destino havia finalmente começando a se manifestar.
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