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História The Walking Dead: O Outro - O Palco


Escrita por: Vinibrazuka98

Notas do Autor


Mais um capítulo para vocês, pessoal. Espero muito que gostem. Considero esse o capítulo mais importante da história até agora. Grande abraço!

Capítulo 12 - O Palco


Capítulo 12: O Palco

 

  -Você!

  Vince não compreendia. O que ela queria dizer com aquilo? Qual era o sentido apontar tão desesperadamente para ele, de acusa-lo de algo que não fizera?

  -Victoria, eu não estou entendendo. Você... – Ele tentou dizer.

  -Não! Para! – Ela interrompeu com um berro selvagem.

  -Jake, o que tá acontecendo?! – Vince se virou para o irmão. – Você teve parte nisso?

  Porém, antes de esperar sua reação, Victoria interrompeu outra vez, ainda desesperada:

  -Você... você disse que foi o Jake, que era ele quem estava me torturando...

  -Victoria, se acalme. – Vince tentou dizer, firme.

  Ela fechou os olhos com força e se esforçou para acalmar o ritmo da respiração e dizer:

  -Vince... não existe nenhum Jake.  

  E o mundo pareceu travar por alguns segundos. O que aquela mulher estava dizendo? Jake estava ali do seu lado, naquele exato instante. Ele existia, e Vince tinha certeza disso.

  -Jake... do que ela tá falando? – Vince perguntou, tentando manter a calma.

  O irmão mais velho se aproximou, solene e frio.

  -Não ouça o que ela diz, irmão. É óbvio que ela é louca.

  -Foi você quem fez isso com ela?

  -Qual é, brother. Isso é ridículo.

  -Foi você? – Ele insistiu, impaciente.

  -Você realmente não devia estar fazendo essa pergunta pra...

  -RESPONDE A PORRA DA PERGUNTA!

  Com um berro, Vince investiu contra o irmão, agarrando-o pela gola da camisa e o pressionando-o contra a parede. Os dois se encararam por longos segundos. Todo o império de confiança que os irmãos haviam começado a construir parecia ruir rapidamente, como areia escorrendo pelos dedos da mão.

  -Bem... acho que você me pegou. – Jake disse por fim.

  Vince não teve ação. Não conseguia mexer um músculo sequer. Estava paralisado, dormente. Seu irmão, afinal, era mesmo o homem sádico e violento que provavelmente sempre fora, desde sua adolescência. Depois de longos segundos, que mais pareciam uma verdadeira eternidade, Vince, enfim, cedeu e largou o irmão, ainda incrédulo.

  -Por que? – O mais novo perguntou, sua voz miúda.

  -Eu sei o que parece, mas acredite, eu fiz isso pra te proteger, irmão; pra nos proteger.

  -Do que você está falando?

  -Ontem à noite, Victoria pegou uma faca na cozinha e depois foi até a sala pra te matar. Se eu não tivesse acordado a tempo, você teria morrido... e eu também.

  Jake encarava de volta o olhar incrédulo de Vince. Seus olhos eram vazios, enquanto sua mente era cheia de perguntas que sua boca não conseguia formular. Sabendo que o irmão estava confuso demais para dizer algo, resolveu prosseguir:

  -Ninguém além de você pode me ver, Vince. Mas eu lhe garanto... eu existo. Sou tão real quanto você. Sabe por que? – Ele deu uma pausa, antes de dizer – Porque eu sou você.

  -Por que você está me dizendo isso, Jake? Isso não faz o menor sentido. Você... você voltou pra mim, depois de todos esses anos. Você me contou a sua história, como você sobreviveu e acabou chegando até aqui.

  -Não, não. Aquilo foi só o seu cérebro imaginativo criando uma história que fizesse sentido. Você é muito esperto, Vince, mas não consegue ver o que está bem na sua frente: você me criou. Me criou porque você é fraco demais.

  -Eu não sou louco, Jake. Isso não faz o menor sentido. Você esteve comigo o tempo todo. Eu vi a mordida no seu braço. Você está infectado, não sabe o que está dizendo!

  -Bem, eu tive que inventar algo pra não deixar você descobrir a verdade sobre mim. – Ele lançou seu olhar penetrante para Vince, intimidando-o, enfraquecendo-o – Você quer saber a verdade, não é? Pois eu te digo a verdade. Você é fraco, Vince. Você se culpa pela morte da nossa mãe, pela morte da sua esposa, pela morte dos seus amigos. E o pior de tudo é que você não faz ideia de que é só uma putinha do seu próprio remorso. Uma putinha que ele fode até não aguentar mais.

  -Para, Jake! Para! – Vince tentou interromper – Você... você tá tentando foder com a minha cabeça!

  -Por acaso você se lembra da pilha de corpos que você encontrou na floresta lá embaixo? – Jake parecia saborear o olhar perplexo do irmão – Bem macabra, não é? E se eu te dissesse que foi você mesmo quem fez aquela obra de arte?

  -Não, não...

  -E ela desapareceu logo depois... da noite pro dia, não foi? Por acaso, você não acordou com cansaço e dor nos braços, acordou? Você deve ter pensado que aquilo não passava de uma noite de sono ruim, mas a verdade é que você passou a noite inteira enterrando os corpos daquelas pobres pessoas.

  -Quem... quem eram elas?

  -E agora chegamos à parte mais interessante. – Jake soltou uma risadinha sádica e começou a andar pelo porão – Eles eram gente como você, sobreviventes. Viviam em paz; até tinham uma certa estrutura social dentro do bando. Não faziam mal a ninguém além dos infectados. E eles precisavam de abrigo. Já estavam vagando há dias, sem comida, sem água, com frio. Sim, eles queriam compartilhar do seu chalé. Como alguém poderia negar abrigo a um grupo com mulheres e crianças indefesas e famintas? Bem, você negou. E não só isso, você se convenceu de que eles tentariam tomar o chalé de você de qualquer jeito. Então, você se adiantou e pegou todos eles de surpresa enquanto dormiam à noite. Um por um.

  -Meu Deus, por que eu faria uma coisa dessas?!

  -Ora, você já sabe a resposta pra essa... brother. Ela veio nos seus sonhos. – Ele passou a imitar a voz de Mary – “Você disse que íamos nos mudar pra algum chalé nas montanhas, no interior. Só eu, você e a nossa filha.” Isso soa familiar, Vince? Pra dizer a verdade, você fez o que fez com aquelas pessoas porque você deixou de novo o remorso te dominar. Você se perdeu do seu caminho, e a única coisa a qual você se mantinha agarrado era esse chalé; a sua última promessa para sua esposa... antes de ela morrer por sua culpa. Admita, Vince. Você se lembra de ter feito isso.

  -Eu não fiz!

  -Uma hora você vai parar de contar mentiras para si mesmo. Nossa querida amiga Victoria aqui também tem esse hábito. É mesmo uma pena que ela tenha descoberto isso tarde demais.

  -Mesmo que eu tenha feito essas coisas horríveis... nada justifica o que você está fazendo com a Victoria!

  -Ah não? Por que você não pergunta a ela sobre o que aconteceu? Tenho certeza de que você vai achar a história da vida dela fascinante. Anda, pergunta.

  Mas Vince hesitava. Olhava para Victoria e depois para Jake. A moça mantinha seu olhar fixo no chão, quase como se estivesse ausente daquele lugar.

  -Pergunta logo, porra! – Jake ordenou

  -Victoria.

  Ao ouvir a voz de Vince chamando-a, a moça levantou lentamente a cabeça e o encarou.

  -O que o Jake diz é verdade? Você tentou mesmo me matar enquanto eu dormia?

  -Não existe nenhum Jake. – Ela disse com a voz grogue e arrastada – Você é um louco que fica andando por aí falando com o vento, imaginando um irmão que não existe!

  -Você tentou me matar ou não? – Vince tentou se manter firme.

  Depois de hesitar por alguns instantes, ela respondeu, seca:

  -Sim, eu tentei.

  -Por que?

  -Eu já te disse ontem.

  -Não, você contou ao... esquece, eu só quero ouvir de novo.

  Ela fechou os olhos com força antes de prosseguir. Respirou bem fundo e começou:

  -Eu não queria você aqui. Esse chalé pertence a mim por direito. É a única coisa que eu tenho... a única coisa que sobrou do Tio Edgar.

  Foi como se um grande sino soasse na mente de Vince. Afinal, suas expectativas estavam se confirmando. Victoria era de fato a sobrinha “V” no bilhete sobre o santuário.

  -Eu menti pra você, assim como menti pra mim mesma durante anos. Eu nunca fui escritora, nem diretora, nem roteirista. Eu era só uma garota do interior do Canadá que se mudou pros Estados Unidos depois de ver a própria mãe ter uma overdose e morrer. – Um soluço interrompeu sua fala. Seus olhos já estavam repletos de lágrimas e a voz enfraquecida pela tristeza - Meu pai nunca ligou pra mim, então a primeira coisa que ele fez foi me mandar pra cá, pra morar com o meu tio.

  -Edgar J. Holland?

  -Sim. O irmão mais novo do meu pai. Meu nome completo é Victoria J. Holland.

  E mais uma vez, as peças do quebra-cabeças pareciam se juntar, uma a uma.

  -Quando vocês encontraram as fotos no porão, sabia que se vocês descobrissem toda a verdade iriam querer me matar. Foi por isso que eu segui vocês e acionei aquela armadilha na sala das celas.

  -Então, você sabe o que é aquele lugar. Me diz, que porra que a gente viu lá embaixo?

  -Aquilo... era o purgatório.

  Victoria já chorava tanto que mal conseguia falar. Tinha a impressão de que suas palavras soavam mais como um gemido sem sentido do que como palavras propriamente ditas.

  -Eu tinha dezesseis anos quando me mudei pra cá. – Ela disse – Nos primeiros meses eu odiei esse lugar. Sentia falta do frio do Canadá, das pessoas de lá, da minha vida, de tudo. Mas Tio Edgar me ajudou muito com isso. Graças a ele, com poucos meses, eu passei a amar esse chalezinho sobre a colina.

  -E, então, o que aconteceu?

  -Tio Edgar trabalhava na estação de energia lá embaixo. Era o diretor da instalação. Um dia ele teve de viajar para comprar material e... – Ela limpou o rosto com as costas da mão, seu choro ficando ainda mais alto – E eu fiquei sozinha. E aqueles homens que trabalhavam com ele... eles fizeram coisas horríveis comigo. Disseram que... odiavam ficar presos no meio daquela floresta; que não viam nenhuma mulher fazia meses; que não conseguiam se segurar perto de mim... Eu não consigo falar mais disso!

  O coração de Vince estava partido. Sem saber direito a razão, sentia-se como algum tipo de monstro. Se aquilo tudo fosse mesmo verdade, estava destruindo alguém que já tinha o espírito destruído.

  -Quando o Tio Edgar voltou... – Ela resolveu prosseguir – Ele descobriu o que aconteceu. Ele ficou com ódio, queria vingança. Mas não queria simplesmente matar seus colegas. Ele planejou por muitos meses o que ia fazer, fingindo para todo mundo que não fazia ideia do que tinha acontecido enquanto ele estava fora. Tudo começou aqui, nesse porão. Ele aproveitou o túnel de uma antiga mina e o transformou numa passagem secreta, e criou um calabouço subterrâneo. Num almoço de Natal lá na estação, ele drogou e colocou todos os homens que me atacaram lá naquelas celas. E assim, Tio Edgar... passou a torturar eles. Fazia eles passarem fome e sede. Empurrava eles até o limite. E ele sempre me dizia que tudo ia ficar bem; que eles teriam o castigo que mereciam; que eles nunca mais me fariam mal de novo. Tio Edgar me protegeu, me vingou. Ele me amava e eu o amava muito. Mas um dia ele teve um infarto fulminante e, sem mais nem menos, sem nem se despedir, ele morreu. E ele está enterrado aqui até hoje. – Ela limpou outra vez as lágrimas no rosto, respirando fundo para se acalmar e tentar esboçar um sorriso nostálgico – Ele adorava me divertir com charadas. Ficávamos o dia todo inventando e resolvendo elas. Escrevíamos pelas paredes, pelas árvores da floresta... e eu não podia perder esse lugar. É tudo o que restou do meu tio.   

  -Se esse lugar é tão importante pra você, por que você só apareceu agora? Eu já estou aqui há dias. O lugar parece abandonado faz tempo. – Vince questionou

  -Eu tentei deixar ele igualzinho do jeito que estava quando meu tio morreu. Eu saí por alguns dias pra buscar suprimentos nas cidades mais próximas. E quando eu retornei... você estava aqui. E eu simplesmente não conseguia suportar alguém invadindo esse lugar!

  Sua voz se elevou rapidamente de um tom melancólico e nostálgico para um verdadeiro grunhido de puro ódio e sofrimento. Em seguida, se amiudou quase que por completo, passando a soar como um grunhido quase animal, mas ainda extremamente triste:

  -Eu sinto a falta do Tio Edgar... eu sinto a falta dele... – Ela choramingava baixinho.

  Jake, então, se aproximou calmamente do irmão, passando pela pequena clareira que vinha da abertura do piso da cozinha. Somente ali Vince percebeu uma terrível mudança em Jake. Sob a luz, sua pele parecia pálida, quase transparente. Sua aura era completamente fantasmagórica, ameaçadora.

  -Agora você vê, meu irmão? – Ele disse, parando a dois passos ao lado de Vince – Isso é o que acontece quando você sucumbe ao medo e à culpa. Você para de pensar, e começa a agir só por impulso. Juntos, nós podemos impedir que isso aconteça. Sim, você está mesmo ficando louco. Mas há um jeito de revertermos isso. – Ele respirou fundo, como se estivesse prestes a fazer uma grande revelação – Você só precisa me deixar tomar o controle. Eu vou te consertar... eu vou nos consertar.

  -Se você não é o verdadeiro Jake... – Vince disse, encarando o chão – Então isso significa que...

  -Sim, Vince. Jake nunca fingiu sua morte. Seu corpo está enterrado no cemitério de Montgomery há mais de vinte anos. Mas isso não significa que seu espírito tenha morrido. Pense só, você o imaginou mais velho, imaginou-o voltando para você num dia frio de inverno. E foi pensando nele... que você me criou.

  -Eu não te criei!

  Com o berro, Vince tentou socar o rosto de Jake, porém sua mão simplesmente atravessou o corpo de seu irmão. Era como se aquilo não passasse de uma imagem projetada, como se não houvesse na ali para acertar, na realidade.

  Tentou outra vez. Chutou a virilha do irmão e mirou o soco seguinte em seu braço. Mas o resultado foi o mesmo; todos os golpes falharam. Jake continuava em pé, completamente indiferente aos socos e chutes que Vince disparava.

  -Parece que vamos ter de fazer isso do jeito difícil. – Jake disse, sorrindo – Minha vez.

  E num movimento rápido, Jake acertou uma cotovelada poderosa contra o estômago de Vince, que se contorceu violentamente de dor, e depois um soco em seu rosto, fazendo-o cair no chão.

  Vince estava completamente atordoado. Como poderia não ser capaz de acertar de Jake se ele podia acertá-lo? Sua cabeça estava confusa, seus pensamentos uma verdadeira bagunça.

  -Isso é tudo o que você tem? – Jake provocou, erguendo os punhos à altura do rosto, como se montasse guarda numa luta de boxe – Nem parece que veio da mesma mãe que eu.

  Furioso, Vince resolveu deixar de lado suas dúvidas e seus desconcertos. Concentrou toda sua força na fúria, no ódio no manuseio da violência, e investiu contra o irmão novamente, e outra vez seu corpo pareceu atravessar o de seu adversário.

  Jake calmamente revidou com um forte soco no rosto de Vince, que caiu novamente no chão, já sangrando. A sensação era de puro caos dentro de Vince. Seu corpo, sua mente, seu espírito, tudo parecia ter sido destruído. Sua confusão dava lugar à raiva e à decepção. Sendo Jake ou não, aquela coisa estava fazendo com que se tornasse o monstro que sempre tentara evitar ser.

  -Eu não sou louco, Jake. – Vince disse, limpando um filete de sangue que escorria pela boca com as costas da mão – Você não vai me derrotar.

  O fantasma apenas sorriu maliciosamente e levou a mão à cintura. De trás de suas costas, tirou um objeto metálico escuro e comprido. Vince gelou por alguns instantes após entender do que se tratava.

  -É hora de eu assumir o controle. – Jake disse – Eu não posso deixar esse corpo morrer por causa da sua fraqueza. Não é nada pessoal. Espero que você entenda.

  -Não! – Vince protestou – Você não real, e nem essa arma é!

  -Não é?

  Jake agilmente ergueu sua pistola 9mm e disparou contra Vince. O rapaz berrou de dor quando a bala atravessou sua coxa direita. Aquilo não era possível. A dor era real, aquele sangue era real, não podia ser sua imaginação. Jake mantinha a pistola erguida, encarando fixamente o irmão caído. E ele deu alguns passos, se aproximando dele.

  -Para abraçar o futuro, é preciso largar o passado primeiro. – Ele disse - Suas memórias, seus arrependimentos, seus erros e acertos, tudo... tudo deve queimar, para que, das cinzas, uma nova fênix se erga. – E ergueu um pouco mais a arma, mirando na cabeça de Vince - Foi muito bom passar esse tempo de irmão pra irmão.

  E nesse momento, Vince se sentiu mais indefeso do que nunca. Estava prestes a ser derrotado por sua própria mente. Não por algum homem perverso, não por infectados, não por alguma doença, mas por ele mesmo.

  Como costumam dizer nos filmes, Vince viu flashes rápidos de sua vida. Não entendia muito bem as situações, mas definitivamente podia ver e se lembrar dos rostos. Mary, Beth, Athena, James, Gustav, Harry, Carol, Anthony, Amy, Anna e Samantha eram apenas algumas das aparições que pareciam ter voltado para assombrar Vince, logo em seus últimos momentos de vida.

  E, então, o tiro veio. Tudo ficou escuro rapidamente. Vince não conseguia mais sentir seus músculos, sua respiração, seu coração batendo. Estava dormente para tudo, apenas esperando sua consciência desaparecer por completo durante aquelas frações de segundo que pareciam uma verdadeira eternidade.

  Não sentiu tristeza e nem dor. Tudo e todos o haviam abandonado, estava completamente sozinho. De nada haviam servido aqueles anos de sobrevivência ao apocalipse zumbi. Todo o sofrimento, as privações, as limitações, não adiantaram em nada, pois tudo aquilo o levara àquele momento, onde o cano de uma arma terminaria sua vida.

  Vince não teve escolha a não ser se despedir daquele lugar, daquela vida. Como uma folha seca caindo de uma árvore no outono, Vince deixou sua cabeça cair para trás e fez seu corpo se juntar às incontáveis outras folhas secas que havia deixado para trás no caminho.

  Ao menos, estava livre... finalmente livre.

         ...

  -Ele está acordando, meu Deus, ele está acordando!

  -Alguém chame o Doutor Turner!

  A visão de Vince continuava escura. Não conseguia dizer o que estava acontecendo ao seu redor. Conseguia apenas escutar as vozes, femininas, apressadas. Soavam um tanto distantes, como se ecoassem pelas paredes um túnel até chegarem aos seus ouvidos.

  Segundos depois, a voz de um homem irrompeu do silêncio:

  -O que aconteceu?

  -É o paciente. – Outra voz feminina disse - Ele está acordando do coma.

  Vince pôde ouvir passos se intensificando, vindo apressadamente em sua direção.

  “Coma? Do que eles estão falando? E onde eu estou”?

  -Vince? Vince, consegue me ouvir? – A voz masculina disse – Se consegue, balance a cabeça ou pisque duas vezes por favor.

  A visão de Vince parecia estar começando a se desembaçar. Já conseguia ver figuras ligeiramente humanas, três para ser mais exato. E os três tinham uma cor branca, que reluzia com a luz do dia. Com todas as forças que Vince conseguiu juntar dentro de seu ser, balançou levemente a cabeça para baixo, e depois de volta para cima.

  Pôde ouvir um leve risinho de satisfação e alívio vindo do homem. Onde estava, afinal? Em um hospital?

  -Vince, você se lembra de mim? – O homem perguntou – Meu nome é Harry, sou seu médico.

  “Harry? Como isso é possível? Só pode ser uma coincidência...”

  -Me escute com atenção, Vince. Você esteve em coma por três meses depois de sofrer um terrível acidente de helicóptero. Foi um milagre você ter sobrevivido, suas chances eram muito baixas. Só você e o piloto conseguiram escapar.

  E aquelas palavras pareceram pairar no ar, como se algo ainda sustentasse aquele som. Elas ecoavam dentro de sua mente. Acidente de helicóptero, coma por três meses... aquilo era muito para processar de uma vez.

  -Nós já contatamos a sua família. Estarão aqui dentro de alguns minutos. Você teve três costelas quebradas, vários cortes nos braços e nas pernas e uma fratura no ombro. Acreditamos que o acontecimento que o induziu ao coma foi uma pancada muito forte que você levou na cabeça durante a queda. Infelizmente, isso vai deixar uma cicatriz permanente.

  -Pi... – Vince tentou dizer, mesmo com sua garganta seca e dolorida. Sentia como se quase houvesse esquecido como se fala – Pi...lo...

  -O piloto? - Harry completou – Ele já saiu do hospital. Infelizmente, tivemos de amputar uma perna. Mas ele está bem.

  -No... nome...

  -O nome do piloto? Você não consegue se lembrar? – O médico perguntou – O nome do piloto é Gustav Svenson.

  Vince pôde sentir seu coração acelerando. Primeiro Harry, depois Gustav? Afinal, nada do que vivenciara nos últimos anos era verdade? Será que tudo não passara de um sonho de coma?

  Seus pensamentos foram interrompidos pelo barulho de uma porta se abrindo, seguido pelo som de passos se aproximando apressadamente. Podia ouvir uma respiração acelerada, um miúdo choramingar, e então, sentiu algo tocando sua mão.

  Podia sentir a leveza da pele que o tocava, a suavidade dos dedos que se enroscavam nos seus. E por fim, uma voz soou e trouxe a Vince a vontade de viver que há muito não sentia.

  -Meu amor... eu estou aqui.

  E naquele instante, Vince tinha certeza de que era a voz de Mary que ouvia.



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