História Thirsty - Homem Frio.

/ Niall Horan /

Vejo-os através da escuridão onde estou escondido. Apesar da distância e graças à minha visão aperfeiçoada, consigo ver cada pormenor do que fazem mesmo estando eles iluminados apenas por uma fraca luz proveniente de um poste de iluminação.

Cerro os punhos com força.

Eu deveria ter adivinhado que ela não me ia escutar. Porque é que simplesmente não escutou o que eu disse? Eu tentei avisá-la, impedi-la, e de nada valeu porque aqui está ela aos beijos com um maldito lobisomem.

Agora entendo o porquê de o Simon não ter conseguido ver o futuro de Kathie durante todo este tempo.

O Simon só consegue ver o futuro de vampiros e humanos, porque anteriormente foi um humano e agora é um vampiro, então quando uma das suas visões envolve um lobisomem é como se a pessoa não existisse. Tudo o que vê é uma profunda escuridão, como se a pessoa não tivesse futuro e, por isso, é como se estivesse morta.

E bem, foi isso que aconteceu algumas vezes ao longo do dia, o que significa que ela esteve com lobisomens diversas vezes, apenas hoje. O Simon, na primeira vez que não conseguiu ver nada, entrou em histeria e quase nos matou a todos acusando-nos de não termos feito o nosso trabalho como deve ser. Todavia, o Zayn saiu para se certificar que ela está bem e quando voltou contou-nos que ela continua viva mas que estava na lanchonete com um lobisomem. Aí entendemos tudo e, na minha cabeça, tudo fez sentido.

Desde que descobrimos que Kathie será uma humana-vampira daqui a umas semanas que o Simon vasculha no futuro dela várias vezes por dia para se certificar que nada lhe acontece até ao seu aniversário, porque é provável que quando a mesma despertar o seu lado vampiro que Simon deixe de conseguir ver o seu futuro. Passara de humana, para mestiça. Ninguém é capaz de lhe dizer, mas todos pensamos que está um pouco obcecado com a garota e não sabemos se isso é bom.

E porque é que estou eu aqui? Porque o Simon voltou a ter uma visão e não vê nada há diversas horas.

Uma raiva bastante conhecida para mim começa a subir-me à cabeça, ao ver o seu sorriso enquanto se afasta do lobisomem. Consigo cheirar a euforia que exala do seu corpo e que me deixa ainda mais enraivecido mas ao mesmo tempo bastante embriagado com o seu odor maravilhoso.

Isto não podia estar a acontecer, não com ela.

O que raio quer ele com a Kathie? Ele estava muito bem com a garota que também é loba, todos no seu canto, sem criar problemas. E agora, de repente, decide investir nela. Logo nela!

Tenho de impedir que isto progrida mais. Eles não podem ficar juntos, especialmente quando ela for uma mestiça. Vai contra qualquer regra. Vampiros e lobisomens são inimigos há décadas, desde que existimos! Estamos destinados a ser inimigos mortais para sempre. Nada vai mudar isso.

A minha atenção desvia-se dos dois para a porta da casa que se abre revelando Heather e Emily com uns sorrisos felizes nos rostos ao verem os dois juntos. Kathie afasta-se do lobisomem e entra na casa depois de se despedir do mesmo mais uma vez. Fico mais aliviado quando a porta se fecha atrás dela, longe daquele idiota.

Estou longe, mas mesmo assim consigo sentir o cheiro de cão molhado que emana dele.

Antes de ir embora na sua moto, o garoto lobisomem vira o rosto precisamente na minha direcção. Ele sabe que estive aqui o tempo todo. Ele sabe que eu vi tudo. Controlo-me para não ir atrás dele quando mostra um sorriso presunçoso e logo em seguida acelera para longe.

Maldito!

Não duvido que ele e o seu grupo de amiguinhos não tenham reparado na nossa mudança de comportamento desde a chegada de Kathie. Não são tão idiotas quanto aparentam. E se eu sei que isto é algum género de vingança para connosco, vou acabar com todos eles. Um por um, até estarem todos mortos.

Isto não vai ficar assim.

 

/ Kathie Quinn /

Sonhei com homens que se transformavam em lobos e um casal de olhos vermelhos que destruíam uma tribo. Pelos vistos aquelas histórias que o pai do Justin contou afectaram-me mesmo, só não entendo o porquê. São apenas histórias, lendas.

- Estamos atrasadas! - É a primeira coisa que digo ao ver as horas no meu celular. – Meninas, por favor, acordem! Agora! – Balanço-as pelos ombros.

Emily é a primeira a despertar e levanta-se de um pulo quando volto a dizer que estamos atrasadas para a escola. Heather só acorda quando Emily a destapa e faz-lhe cosquinhas nos pés. A sua risada cessa quando eu e a morena gritamos para ela sair da cama e despachar-se. Sem tomar banho, apenas de dentes escovados e vestidas com as nossas roupas para a escola, saímos do quarto de Heather que ficou completamente desarrumado. Não temos tempo de comer e logo corremos para o carro de Heather, a mesma conduz a 100 km/h até à escola e chegamos no instante em que o sinal toca. Por sorte!

Entramos a correr na sala de aula, que já se encontra lotada. Todos olham para nós, mas não nos importamos e apressamo-nos até aos nossos lugares. Uns segundos depois da nossa entrada a professora de Geografia entra na sala, fechando a porta.

Suspiro quando me sento na cadeira, ofegante da corrida que tivemos de fazer desde o estacionamento até à sala na esperança de chegarmos antes da professora. A Sra. Silverstone não deixa nenhum aluno entrar na sala depois dela, nem com uma razão bastante plausível. A Heather tem sorte por não termos Geografia como primeira aula, se não teria muitas faltas para justificar – apesar de ultimamente já não chegar atrasada por causa de Emily que a obriga a ir buscá-la a casa. Apesar de ser uma mulher jovem, a Sra. Silverstone, de trinta e poucos anos, é bastante rígida e adora disciplina e boa educação. Acho que ela e o professor de Educação Física fariam um belo casal, não fosse a Sra. Silverstone casada.

- Depois desta aula não nos escapas, Quinn! – Heather sussurra, inclinada na minha direcção.

- Queremos saber como foi o encontro, com todos os pormenores. – Emily sussurra do meu lado direito.

- E sim, nós vimos a vossa sessão de marmelada em frente da minha casa. – Heather pisca-me um olho e volta a recompor-se na sua cadeira.

Oiço a Emily a soltar uma risada baixa e eu nego com a cabeça enquanto sorrio.

Ontem à noite, depois de o Justin me ter deixado em casa de Heather, a primeira coisa que estas duas garotas fizeram foi bombardear-me de perguntas intermináveis assim que fechei a porta. Tive de esperar, pelo menos dois minutos até que elas se calassem. Não lhes contei nada, fiquei inesperadamente cansada e só queria dormir. Elas bem me tentaram convencer mas assim que me deitei na cama de Heather, cai no sono.

Apesar do sonho estranho que tive, dormi como um bebé, talvez devido ao cansaço ou talvez porque o final do dia foi bastante agradável. Ok, muito agradável.

O Justin conseguiu despertar em mim algo que me fez mudar de opinião assim como um estalar de dedos, rápido e de forma quase imperceptível. E eu pensava que isso era impossível. Sempre fui muito decidida, nunca fui de mudar o que quero assim como quem muda de blusa.

E como se o destino estivesse a tirar sarro da minha cara, vejo o meu celular a vibrar em cima do tampo da mesa e um sorriso abre-se no meu rosto ao ler o seu nome.

 

“Vejo-te daqui a pouco.”

 

Decido não responder à mensagem de Justin, apesar da grande vontade de o fazer. Não quero ficar sem o meu celular caso a Sra. Silverstone me apanhe com ele na mão. Se tal acontecer, não só fico sem o aparelho como vou parar à sala do director. Não seria a primeira a quem isso acontece, especialmente nas aulas de Geografia, a Sra. Silverstone não perdoa ninguém. Duvido que poupasse a garota nova.

A aula dura o que parece uma eternidade, tento prestar atenção ao que a professora diz mas as suas palavras não parecem fazer sentido na minha cabeça que está distraída com outras coisas. Aliás, com outra pessoa.

- Até lhe saem corações dos olhos! – Escuto a voz de Heather, mas parece estar distante. – Está mesmo apaixonada!

- Não sejas assim, Heather.

Porquê que as vozes delas parecem tão distantes?

- Vais dizer-me que é mentira? Olha o sorriso dela!

- Kathie, está na hora de acordar!

Pisco os olhos, voltando lentamente à realidade. Dou de caras com os rostos de Emily e Heather, ela estão em frente da minha mesa e inclinadas na minha direção. Ambas estão a rir, provavelmente da minha cara.

- O que aconteceu? – Pergunto confusa. Olho à volta e vejo que todos já se foram embora, menos nós. - A aula já terminou?

Nem ouvi o sinal a bater! Aliás, eu não ouvi nada desta aula.

- Estiveste noutro mundo durante toda a aula, se não te tivesse chamado sabe-se lá quanto tempo irias ficar aqui sentada a olhar para o nada. – Emily esclarece-me.

Levo uma mão aos meus cabelos, puxando-o para trás com os dedos.

- Distraí-me um pouco.

- Um pouco? Estavas a sonhar acordada, isso sim! E aposto que o Justin estava nesses sonhos. – Olho para Heather a tempo de ver o seu sorriso sugestivo. – Não é preciso dizeres nada o teu sorriso, neste momento, diz tudo.  – Pisca um olho e ri.

Abano a cabeça negativamente, claramente com as bochechas a fumegarem de tão quentes, e levanto-me da minha cadeira. Ela tem razão, eu estava a pensar nele. É estranho como o Justin ainda não saiu da minha cabeça. O que aconteceu ontem à noite foi mais intenso do que eu julgava. Atiro todos os meus materiais para dentro da minha bolsa sem me importar se tenho o meu estojo aberto.

- Vamos, agora conta-nos como foi o teu encontro com um dos garotos mais desejados desta pacata cidade! – Heather entrelaça os nossos braços enquanto andamos lentamente pelo corredor principal, praticamente vazio.

Há quanto tempo é que o sinal bateu?!

Viro o rosto para Emily que caminha do meu outro lado, com uma expressão tão curiosa quanto a de Heather. Estas garotas… Não podiam ser menos curiosas? Suspiro e começo a contar. Elas escutam tudo de olhos levemente esbugalhados, inclinadas na minha direção por estar a falar baixo. Contenho-me para não rir das caras delas.

E então calo-me a meio de uma frase. As duas viram os rostos para onde estou a olhar e voltam a olhar para mim com sorrisos de canto.

Encostado aos armários, precisamente onde fica o meu, está ele. Justin.

Tem os braços cruzados, as costas encostadas ao alumínio dos armários e o seu rosto está inclinado para baixo, com os olhos focados no chão. Está sozinho e as pessoas que passam por ele não evitam fazer uma cara de desentendimento. Normalmente é raro vê-lo pelos corredores, passa a maior parte do tempo no parque de estacionamento com os seus amigos. Então, percebo a desconfiança de quem passa por ele.

E como se sentisse a minha presença, levanta o rosto e os seus olhos encontram os meus de imediato. Um pequeno arrepio passa-me pela coluna.

- Oh, ele está à tua espera! – Heather exclama um pouco alto de mais, mostrando o quanto está animada com essa ideia.

Não consigo desviar o meu olhar do seu, tal como aconteceu na festa quando ele estava a cantar. Sinto-me a ser puxada na sua direcção e percebo que já não sou eu que comando as minhas pernas, são elas que me comandam a mim levando-me a ele.

- Bom dia, meninas. – Cumprimenta-nos quando chegamos perto, ainda com os seus olhos nos meus e então quebra o olhar para sorrir para Heather e Emily.

É claro que Heather respondeu logo, com o seu sorriso enorme e brilhante, exibindo a sua felicidade. Já Emily, apenas exibe um pequeno sorriso simpático.

- Heather, estou com fome. Vens comigo ao refeitório? – Emily pergunta olhando para a loira, que assente quase no mesmo segundo.

- Até já. – Disfarçadamente, Heather aperta-me o braço e descruza-os, sorrindo antes de virar costas e atravessar o corredor com Emily ao seu lado.

Elas deixaram-me sozinha com ele, de propósito. Não me estou a queixar, mas não sei ao certo como agir ao pé dele depois do que aconteceu ontem. Como já disse, não me arrepende e foi muito bom… Mas… Há sempre um “mas”!

Desvio os meus olhos e atenção do corredor para o garoto à minha frente. As minhas bochechas ficam coradas ao deparar-me com ele a olhar para mim com o seu sorriso que me deixa fraca.

- Dormiste bem? – Ele pergunta-me, desencostando-se dos armários para eu puder abrir o meu.

- Muito bem, estava cansada. – Respondo-lhe enquanto tento meter, com alguma dificuldade, a mochila com as minhas roupas de ontem e que está um pouco pesada. – E tu? – Pergunto com a voz um pouco esganiçada pela força que estou a fazer.

Justin percebe o meu esforço e dá-me uma ajuda. Suspiro e agradeço-lhe quando vejo a mochila dentro do armário. Pego nos livros que vou precisar para a próxima aula, Inglês. Fecho o armário.

- Sonhei contigo, então dormi perfeitamente.

Num movimento rápido viro o rosto e encaro-o. Ele disse aquilo que eu ouvi? Como é que ele consegue ser assim, tão doce e tão diferente daquele Justin que eu conheci na primeira semana de aulas?

Não digo nada, limito-me a encarar os seus olhos cor de âmbar. O Justin tem esta coisa de me deixar sem palavras.

Com os livros prensados contra o meu peito sinto duas mãos na minha cintura, baixo o meu olhar os segundos suficientes para ver que são as suas. O mesmo puxa-me para ele, encostando os nossos corpos e encara os meus lábios, aproximando o seu rosto do meu. A sua respiração bate no meu rosto com a proximidade.

Ele vai beijar-me. Tal como ontem à noite.

Nem me importo com o facto de estarmos a ser observados por aqueles que ainda estão no corredor. Não me importo com os rumores que já circulam pela escola ou com aqueles que vão circular depois disto. Só me importo com o Justin e nos seus lábios nos meus. Entreabro ligeiramente os lábios, pronta para receber os seus que estão a milímetros de distância, a provocar-me, levando-me quase à loucura. Contenho-me para não terminar com o espaço entre nós, deixando-o tomar o controlo da situação.

- Kathie, podemos conversar?

Acordo do transe afastando-me automaticamente de Justin e viro-me para trás. O Niall está logo à minha frente, com as mãos nos bolsos da frente dos seus jeans e os olhos postos em mim.

- Niall. – Sussurro, envergonhada e surpreendida pela sua presença inesperada.

Os braços de Justin envolvem a minha cintura e puxa-me para ele de forma delicada, encostando as minhas costas ao seu peito. Vejo os olhos de Niall a desviarem-se dos meus, para o Justin e depois para as suas mãos pousadas na minha cintura.

- Não vês que estamos ocupados? Podem conversar depois. – Afirma Justin e sinto o seu corpo extremamente quente, mais do que o normal.

- Ninguém falou contigo. – Niall responde de forma rude e depois olha para mim.

Como resposta, Justin fica tenso.

- Tudo bem, não faz mal. – Toco numa das mãos de Justin e ele relaxa quase de imediato. - Podemos conversar, mas é assim tão importante? – Questiono.

- De certa forma. – O loiro responde olhando de forma desprezível para o garoto atrás de mim.

Por conta da proximidade do meu corpo com o do Justin sinto a sua respiração a acelerar pelo movimento do seu peito.

Desde o que aconteceu no balneário feminino que percebo que existe uma certa rivalidade entre eles os dois, e que adorava compreender. Agora que eu e o Justin somos… O que é que nós somos mesmo? Nem eu sei, mas enfim… O que quero dizer é que vou perguntar ao Justin o que se passa entre eles. O Niall já deu a sua desculpa – Justin é uma má companhia -, então agora quero ouvir o que o Justin tem a dizer.

- O sinal vai bater daqui a uns minutos mas de certeza que a sala onde vamos ter Inglês está vazia, podemos conversar lá.

Assinto positivamente mas sinto as mãos de Justin a segurar-me com a mesma intensidade, como se não quisesse que eu me vá embora. Eu também quero estar perto dele, mas o que o Niall tem para falar comigo parece importante.

Viro-me para ele mas os seus olhos continuam focados no loiro que de certeza que também o está a encarar da mesma forma. Toco-lhe no braço esquerdo, chamando-o à atenção. Por estar apenas de t-shirt sinto a sua pele tatuada e quente contra a minha mão.

- Não te importas, pois não? 

Justin olha para mim e aquele desprezo que via nos seus olhos desaparece quando encontram os meus. Agora vejo uma certa ternura nos mesmos.

- Não, não me importo. – Diz calmamente e sorri, mas apesar disso vejo nos seus olhos que está incomodado. – Vemo-nos depois, sim? – Coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha e pousa-a de seguida no meu rosto.

Mordo o lábio inferior e assinto. Quando dou por mim, Justin junta os nossos lábios e beija-me. Um beijo de verdade, calmo mas intenso. No meio do corredor. Oiço alguns assobios e piropos, mas não ligo a nada disso. Apenas me concentro na sensação quente da mão de Justin no meu rosto, dos seus lábios nos meus e de como as nossas línguas encaixam tão bem uma na outra.

Terminamos o beijo e Justin sorri, aproximando-se novamente para beijar a minha testa. Então lançando outro olhar mortal para Niall, atravessa o corredor com o seu caminhar confiante e extremamente sensual até ao exterior da escola.

Sem dizer nada, o Niall começa a andar na direcção oposta, até à sala onde vamos ter Inglês. Dou uma pequena corrida para o acompanhar, olho-o de lado e vejo que mantém uma expressão séria e as sobrancelhas levemente franzidas enquanto olha em frente.

Porque é que está a agir de forma tão estranha? Costuma sorrir e ser mais brincalhão quando estamos juntos… Não entendo.

Suspiro baixo e reparo então que toda a gente à minha volta está em silêncio – o que não é normal -, paradas e a olhar para mim. Nunca estive em plena marmelada no corredor de uma escola. Com alunos a verem! Oh Jesus Cristo, devo ser a maior galdéria desta escola! Baixo a cabeça até à sala, sentindo-me extremamente envergonhada.

- Kathie, vou ser bem directo com aquilo que quero dizer-te. – Niall diz assim que entramos na sala.

Vejo-o a encostar a porta e eu caminho para perto das mesas, sentando-me em cima de uma das primeiras. Poucos segundos depois, Niall está encostado na mesa ao lado.

- Podes dizer. – Olho para ele e sinto-me ansiosa por conta do seu olhar extremamente sério. – Estás a deixar-me preocupada, Niall.

- Antes de dizer alguma coisa, vou fazer-te uma pergunta. – Olha-me nos olhos. – Escutas-te alguma coisa do que te disse acerca do Justin, depois do que aconteceu no vestuário feminino?

Franzo o cenho, sem saber onde ele quer chegar. Porquê que ele está a falar disso, assim de repente?

E porquê é que eu já sabia – mesmo que inconscientemente - que ele queria falar sobre o Justin? Começo a pensar que ele nos interrompeu de propósito.

- É claro que escutei. Onde queres chegar com isto? – Cruzo os braços.

- Se escutaste porque é que estás com ele? Eu disse-te para ficares longe dele, ele não é uma boa companhia para uma garota como tu. Nunca será.

- Não Niall, é ai que te enganas, tu não me disseste para ficar longe do Justin ou dos amigos dele, tu aconselhaste-me a fazê-lo. – Suspiro. - E eu escutei o teu conselho, mas queria ver com os meus próprios olhos que ele não seria uma boa companhia. E também te digo que estás enganado quanto a isso, o Justin não é como tu pensas que é.

Espero alguns segundos pela sua resposta mas ele está apenas a encarar-me, avaliando-me atentamente.

- E o que raio queres tu dizer com “uma garota como tu”? – Pergunto.

- Não podes estar com ele.

- E porquê? – Começo a sentir-me realmente chateada com ele. – Gostava que me explicasse, concretamente, o porquê de não puder ser amiga dele.

- Amiga? Pelo que vi vocês são bem mais do que amigos. – Niall arqueia uma sobrancelha de forma sarcástica, julgando-me com o olhar.

- Niall, isso não vem ao assunto. - Suspiro. - Se me deres uma boa justificação talvez eu consiga perceber-te. Então, diz-me, porquê?

Sei que ele está a esconder alguma coisa e não quer dizer, mas eu já estou um pouco farta de joguinhos. Entendo que ele esteja preocupado, porque é meu amigo, mas isso não lhe dá direito de me questionar desta forma ou afirmar que não posso estar com o Justin.

- Já disse o porquê! – Desencosta-se da mesa de forma repentina e anda alguns passos para a frente, ficando de costas para mim. – Não podes, é assim tão difícil de entender?! – Grita.

Arregalo os olhos com a forma como fala comigo. Reparo que tem os pulsos fechados, praticamente brancos pela força que faz. Ele está irritado.

- Quem devia estar a gritar seria eu, não tu! Quem pensas que és para me dizeres com quem posso ou não posso estar?! – Levanto-me da mesa e encaro a sua nuca, realmente chateada.

Vejo-o a respirar fundo e então, calmamente, vira-se de frente para mim. Com um metro de distância entre nós. Encaro os seus olhos azuis, mais escuros que o normal. O azul que antes me fazia lembrar o mar num dia de sol, agora fazem-me lembrar de o mar agitado quando há tempestade. Mas nem por isso desmancho a minha expressão irritada. Ele não pode falar comigo desta forma!

- Sou um amigo que te está a tentar ajudar.

- Pois bem, eu agradeço, mas não pedi ajuda de ninguém.

Ele está a agir tal e qual como o meu irmão e isso não é uma boa observação. O meu irmão é demasiado protector e controlador, e essas são as suas características que mais odeio nele até porque com o mau humor dele posso conviver bastante bem. Não consigo acreditar que o Niall esteja a agir desta forma. O problema é o facto de ele estar a agir como se pudesse mandar em mim, que no caso não pode.

Viro-lhe as costas e pego na minha bolsa e nos meus livros, pronta para me ir sentar na minha cadeira e ignorá-lo pelo resto do dia.

- Kathie, desculpa-me… Eu não queria…

A sua mão gélida pega na minha, impedindo-me de dar mais algum passo, e então a imagem do homem de olhos vermelhos do meu sonho vem-me à mente. Viro-me bruscamente para trás e encaro a mão fria e dura de Niall em contacto com a minha.

- Frio… Homem frio. – Sussurro, quase inaudivelmente.

- O quê? O que disseste?

Levanto, vagarosamente, os olhos até encontrar os seus que me encaram confusos. E então o sinal bate e começam a entrar os alunos. Solto, bruscamente, a minha mão do aperto de Niall e sem dizer-lhe alguma coisa vou para o meu lugar. Ao sentar-me, apoio os cotovelos no tampo da mesa e levo as mãos à cabeça.

Ainda sinto a minha mão gelada. Eu já estava fria, mas o frio da pele de Niall é completamente diferente. Como gelo. Fecho os olhos e vejo imagens do homem de olhos vermelhos e pele pálida a matar dezenas de indígenas. E então eles aparecem… Os lobos.

- Kathie! Outra vez no mundo dos sonhos?

Levanto o rosto sobressaltada e deparo-me com Heather, sentada – como sempre – na cadeira à minha esquerda.

- Já ouvimos falar do teu beijo com o Justin. – Ela faz uma cara pervertida e eu franzo a testa ainda confusa com as imagens que me passaram pela cabeça.

Jesus, parece que a minha cabeça vai explodir! De onde veio esta dor de cabeça infernal?!

- E que depois vieste com o Niall para aqui. – Olho para Emily.

Oh, ela também está aqui. Bem, é claro que está. Ela é da minha turma e costuma sentar-se do meu lado direito. Porque é que me assustei quando ouvi a sua voz? Algo de errado está a acontecer comigo. Olho para onde estive a falar com o Niall e já não o vejo lá, onde o deixei. Não me viro para trás para confirmar a sua presença nos lugares atrás de mim.

Só posso estar a ficar louca… Aquelas histórias, são lendas. Não são reais.

Não são reais.

Repito umas mil vezes para mim própria na tentativa de acreditar nelas. Todavia, algo dentro de mim diz-me o contrário. Não, não posso estar sequer a pensar na possibilidade de algo assim ser verdade! É impossível, é só a minha cabeça a pregar-me uma pegadinha, tenho a certeza!

Uma pontada de dor trespassa o lado esquerdo da minha cabeça, levo as mãos à região e gemo baixinho.

- Kathie, está tudo bem? – Sinto o pânico na voz de Emily e mãos sobre os meus ombros – que deduzo que são de Emily e Heather.

- Kathie?! – Heather grita.

- O que está a acontecer? – Oiço aquela voz e encolho-me inconscientemente. – Kathie…?

E mais uma vez, sinto aquela sensação gélida, desta vez em ambos os meus pulsos.

- Não, afasta-te de mim! – Grito, afastando-me do seu toque. – N-não me toques! - Olho para ele.

Encaro, por breves segundos, os seus olhos que neste momento estão sem expressão nenhuma ou brilho. Pego nas minhas coisas, passo por Emily que está em pé com cara de quem não está a perceber nada e quase aos tropeções saio da sala.