História Tipo Ideal Perfeito - Mais uma coisa pra me deixar estranho

Eu podia sentir várias mãos em meus ombros e ouvir varias vozes falando ao mesmo tempo. Meus hyungs pareciam surpresos, as garotas preocupadas perguntando se eu estava bem. A verdade é que eu ainda fervia de ódio. Não queria que Cecília tivesse interferido, ele que perde a calma e só eu que pago o pato? Eu queria quebrar a cara daquele magrelo pra ele parar de cercar a minha namorada e nunca mais me olhar daquele jeito. Como se eu não tivesse o direito de gostar de alguém como a Ceci, ou como se ela não pudesse gostar de alguém como eu. Quando encontro o olhar dela um pouco mais distante do que as outras pessoas, é que eu percebo que provavelmente era exatamente assim que ela se sentia diante da escola inteira. Meu peito pesa. Qual era o problema das pessoas afinal?

Cecília caminha até mim e assim que agarra minha mão me puxa daquela confusão toda sem ligar pra ninguém. Andamos apressados com nossas mochilas desajeitadas em nossos ombros deixando tudo e todos daquela escola para trás.

- Você está bem? – pergunta sem me olhar.

- Estou, não foi nada – eu a encarava enquanto ela me arrastava pelas ruas.

- Vamos pra minha casa.

Não trocamos mais nenhuma palavra durante o percurso até sua casa. Normalmente era um caminho de 10 a 15 minutos, mas Ceci praticamente corria me levando junto. Chegamos na metade do tempo se bobiar. Por sorte nenhum de seus pais estavam em casa, eu não queria deixar uma má impressão falando que eu tinha brigado na porta da escola. Cecília corre até a cozinha, mexe em algumas coisas na geladeira fazendo bastante barulho e quando retorna está com um saco de gelo nas mãos.

- Pressiona um pouco pra diminuir esse inchaço – coloca delicadamente sobre o meu rosto.

Sinto um desconforto bem no canto da boca e faço uma careta. Ela torna a me puxar escada acima até seu quarto, ainda em silêncio. Aquilo tava me incomodando, Cecília estava muito quieta e ao mesmo tempo agitada. Quase não me olhava. Ela estava brava comigo? Por que eu não me afastei, ou não quis ouvi-la quando me pediu pra irmos embora. Acho que não pensei direito nela no final das contas.

Me faz sentar na cama enquanto ainda seguro a compressa no machucado. Ceci começa a despir o uniforme e procurar por algo mais leve. Aquilo já era natural entre nós dois e eu gostava do fato de ficarmos tão confortáveis um com o outro. Por fim ela veste uma camiseta larga e grande dos Beatles e um short preto curto. Pega do fundo do armário uma caixa pequena e quando vem até mim se ajoelha no carpete entre minhas pernas. Nenhuma palavra enquanto mexe dentro da caixinha e prepara um algodão com um liquido transparente.

Eu reparo em cada movimento dela, o jeito como arrumou seu cabelo para que não a atrapalhasse, e o jeito como seu peito descia e subia rapidamente, a forma como comprimia os lábios vez ou outra. Se não a conhecesse ia achar que estava segurando o choro.

Cecília retira minha mão com a compressa e desliza o algodão bem divagar sobre meu machucado. Eu não sinto nada, não tinha sido nada de grave, devia estar só vermelho e inchado. Sem me olhar nos olhos ela finalmente se pronuncia com a voz bem baixa:

- Me desculpa Park Jimin...  – volta a comprimir os lábios.

Hein? Desculpas?

- Jahgi... do que está falando?

- É tudo culpa minha. Essas pessoas...  todo mundo falando da gente, e agora você está machucado... se não fosse pelo meu jeito... por eu ser assim.

- Você está pedindo desculpas por ser quem você é? – pergunto indignado, surpreso, consternado. Tudo ao mesmo tempo – E aquele papo de não mudar pra agradar ninguém?

- Aquilo foi antes... – ela abaixa a cabeça – Eu não ligo que mexam comigo ou falem de mim, eu me viro. Mas agora, você assim... machucado...  – parecia envergonhada, falando pausadamente – dói em mim...

Seguro sua cintura, a puxando pra cima e erguendo-a devagar como se fosse uma criança. Faço com que ela se sente em meu colo, com uma perna de cada lado do meu corpo. Quando levanto seu queixo para que me olhe, eu não pensava que pudesse gostar ainda mais dela... mas estava errado. Seus olhos estavam brilhantes, com água.

- Ceci, eu estou bem. Sério, aquilo não foi nada. O cara mal sabia o que estava fazendo.

- Não é só isso. – gesticula rápido – É a Mae, é a sua amiga, é esse cara esquentadinho, a escola inteira. E eu sabia que isso ia acontecer. Eu não posso gostar de você e você não pode gostar de mim. Sua amiga mesma disse hoje... somos de espécies diferentes.

Franzo o cenho.

- Que amiga?

- Não sei o nome – da uma risada sem humor – É a alta e esbelta que todo mundo quer pegar naquela escola.

- Seo Yeon? – pergunto surpreso.

- Deve ser.

- Não acho que ela falaria uma coisa dessas.

- Mas falou – me olha séria.

- É por isso que você tava daquele jeito na escola hoje?

- Na verdade começou com a Mae – ela suspira – Dizendo que eu mudei e que tava trocando minhas amizades por você... bla bla bla. Depois sua amiga veio encher o saco no corredor. Você sabe que ela gosta de você...

- Eu vou falar com a Yeon, ela não vai mais te encher.

- Não, deixa pra lá. Acho que ela não vai mais tentar nada de qualquer maneira.

- Então eu que devia pedir desculpas. Fazendo você e sua amiga brigarem, a Yeon te enchendo...

- Não... eles que deviam – envolve os braços nos meus ombros e logo em seguida esconde o rosto no meu pescoço – Todos eles.

Nunca ia imaginar Cecília daquele jeito. Ela sempre tão durona que tentava esconder qualquer sentimento. Ali na minha frente tava tão vulnerável. Tudo que ela fazia ou até mesmo a forma como ela falava, tinha alguma coisa que me deixava estranho na boca do estômago. Inconscientemente uma música vem a minha cabeça e eu a abraço apertado.

- Não vamos mais voltar pra aquela escola – fala abafado contra a minha pele e eu rio.

- Claro que vamos. Não vejo a hora de desfilar com você amanhã na frente de todo mundo. Vão ver que nada mudou.

Ceci acompanha meu riso, relaxando e se derretendo entre meus braços. Mais uma coisa pra me deixar estranho.

- Só não chora jahgi.

- Eu não choro por bobagens Park Jimin – ela ergue o rosto, se afastando levemente de mim. Meramente irritada.

- O que é esse brilho ai então??

- Não sei do que está falando – desconversa e pisca os olhos, fitando todos os cantos do quarto menos a mim.

Eu rio ainda mais das suas tentativas falhas de disfarçar e Cecília me da um soquinho no braço.

- Ai Ásia... você também?? – me esquivo brincando.

- Tá apanhando pouco pelo jeito Park Jimin – tenta esconder um sorriso.

Ignorando completamente o fato de que eu a chamei pelo primeiro nome.

- Ei, eu tava pensando... não consigo tirar uma música da cabeça agora. Daí vou ficar lembrando de você.

- Something? – pergunta prontamente e eu afirmo – Também fiquei assim desde hoje de manhã. Ninguém nunca dividiu meus fones comigo antes.

- Hm... acho que temos uma música.

Ela imediatamente abre um sorriso e seus olhos brilham. Eu rio balançando a cabeça, ainda sem acreditar nessa mania dela de ficar feliz com essas coisinhas. Mas eu adorava e era mais uma coisa pra me deixar estranho.

- A gente tem uma música – aperta os braços no meu pescoço e deposita um beijo calmo sobre meu machucado.

Cecília realmente tinha alguma coisa. Bom, tudo que eu tinha que fazer era pensar nela.

(...)

Na manhã seguinte passo na casa da Ceci pra pega-la e sem demora vamos para o colégio. Meu carro já tinha saído do concerto. Amém. Surpreendentemente ela não parecia estar nervosa ou constrangida, tímida, nem nada. Parecia um pouco empolgada na verdade e eu só a via assim quando saía um jogo de vídeo game novo que ela tava esperando, ou lançava algum livro que ela queria muito.

Ao segurar minha mão assim que saímos do carro no estacionamento do colégio, ela sorri pra mim.

- Seu machucado quase nem está mais vermelho.

- Eu disse que ele nem sabia o que estava fazendo – respondo debochado – da próxima vez deixa eu tentar antes de se meter no meio anãzinha.

- Da próxima vez??? – pergunta arqueando a sobrancelha.

- Brincadeira mãe – dou risada e ela acerta um soquinho costumeiro no meu braço.

Assim caminhamos pelo pátio de entrada balançando nossas mãos entrelaçadas. Ouvimos cochichos, vemos acenos e dedos sendo apontados, mas daquela vez Cecília se divertia.

- Não estou te reconhecendo jahgi.

- Acho que sou vingativa além de entediante Park Jimin – exibi um sorriso maldoso.

Ela tinha ficado empolgada com a idéia de mostrar que estávamos bem apesar de todo mundo se meter onde ninguém era chamado.

Assim que paramos no meio dos meus hyungs, eles começam a me encher.

- Cadê o ferimento de guerra? Assim não conta Mike Tyson – Yoongi me zoa – Ce ainda tem orelha.

- Jiminie hyung, tu apanhou mas foi com estilo – kookie batia palma empolgado – meu ídolo Rocky Balboa.

Eu era zoado, mas não conseguia conter as risadas. Cecília também me acompanhava, talvez rindo em publico pela primeira vez.

- Você está bem Jiminie? – Yeon pergunta sem humor nenhum.

Eu só afirmo que sim com a cabeça, olhando a reação da Ceci, que nem se abala com a presença das meninas ali. Até o sinal da primeira aula bater rolaram muitas piadinhas sobre boxe, com direito ao Tae me imitando em câmera lenta. Pois é, eu ia ter que agüentar aquelas por um tempo agora.

Levo Cecília até a porta da sala dela, me despedindo com um beijo calmo e sem língua.

- You know I believe and how ... – canto baixinho assim que nos separamos, fazendo-a rir.

- Park Jimin da onde saiu essa voz linda?

- Mais tarde eu te mostro – pisco malicioso.

- Mal posso esperar – sorri entrando em sua sala.

Quando ela falava assim, eu tinha mais uma coisa pra me deixar estranho.