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História Tomorrow - Paciência é uma Virtude


Escrita por: ddaeclipze

Notas do Autor


ATRASEI SIM DESCULPA NAO FOI A INTENÇÃO PELO AMOR DE DEUS

hoje o dia foi bala e só consegui editar agora. sinto muito, bebês. mas o cap tem DEZ MIL PALAVRAS IRRA

Boa leitura <3

Capítulo 15 - Paciência é uma Virtude


Fanfic / Fanfiction Tomorrow - Paciência é uma Virtude

Oh Bonhwa 🐞 Point Of View

A madrugada deveria ser silenciosa.

Quer dizer, é legal estar em um rolezinho na casa dos seus amigos, na sexta a noite, ouvindo música no último volume e falando mal das inimizades. Nesse contexto, é bom que a madrugada seja barulhenta.

Agora

Na madrugada de sexta para sábado, quando você estudou o dia todo e tem trabalhos para entregar que precisam ser concluídos no dia seguinte, nada menos que silêncio absoluto é bem vindo. Sendo assim, e sendo eu, é tudo que eu não tenho agora.

- Ei, chega para lá. - Minha mãe, agitada demais para o horário, enfia o cotovelo com força nas minhas costelas, me despertando de vez ao me empurrar para fora do centro da cama.

Direto. para. o. colchão. gelado.

- O que foi…? - Balanço a cabeça contra o travesseiro, encolhendo os pés de volta para a parte quentinha. - Que horas são?

- Três e dezessete em ponto. - Posso ouvir a alegria incendiando suas palavras e odeio cada segundinho disso, agora. - Feliz aniversário, meu amor.

Ah.

É esse dia do ano, então.

- Por favor, não. - Resmungo, pegando o travesseiro e colocando minha cabeça embaixo dele.

Jeonghwa gargalha alto, me cutucando outra vez antes de me abraçar, deitando a cabeça sobre meu peito.

- Ah, sim… - Ela sorri contra meu pijama, apertando-me carinhosamente. - Vinte aninhos. Quem diria?

- Qualquer um dos meus documentos. - Respondo, apertando o travesseiro contra a cabeça porque, céus, eu sei muito bem o que vem agora. 

Todos os anos, no exato dia do meu aniversário, as três e dezessete (nem antes, nem depois), essa maluca invade minha cama. Ela deita do meu lado, coberta de energia porque não dormiu nem um segundo e está entupida de cafeína até os ossos, e me conta a mesma história.

- Começa logo… Eu quero dormir antes do sol nascer. - Parando de birra, coloco o travesseiro sob a nuca e aperto os olhos, tentando dormir enquanto espero ela falar, mesmo sabendo que não vou conseguir.

- Há vinte anos atrás, na madrugada mais fria do ano, com uma chuva terrível caindo do lado de fora, eu levantei para tomar sorvete de morango. - Ela começa e, mesmo que eu odeie qualquer coisa antes das 10h, não consigo odiar completamente a forma amorosa como sua voz soa pelo ambiente. - Minha barriga estava tão grande que poderia ser um planeta para Polly Pocket e meus pés estavam inchados como bolas de futebol. 

- Você escorregou duas vezes na escada e bateu o dedinho na quina do sofá, porque ficou com preguiça de acender a luz. - Completo o relato e sorrio um pouco ao pensar em sua desgraça, o que acalma minha fúria. Um pouco. - E o sorvete tinha acabado.

- Seu avô acabou comendo enquanto assistia o Super Bowl, você acredita? - Ela bate os punhos na cama, fazendo o colchão sacudir suavemente. - Você sabia que se a grávida fica com desejo, o bebê nasce com cara daquilo que ela queria? É por isso que…

- Que eu estou sempre com as bochechas rosadas. - Completo outra vez, sorrindo ao pousar o braço sobre os olhos. - Ouvi dizer.

- Pois é. - Ela concorda, mexendo as cobertas ao que continua gesticulando ao falar, mesmo que ninguém esteja olhando. - E você também queria sorvete. Tanto que decidiu nascer só para dar na cara do seu avô.

Dou risada. Essa é a minha parte favorita.

Ela continua.

- A primeira coisa que você fez ao que ele te pegou no colo, foi lascar uma dentada na bochecha dele. - Ela ri alto, se debatendo no colchão. Maluca. - Foi a vingança perfeita. 

- Foi ali que você percebeu… - Começo, mas a interrompida agora sou eu.

- Foi alí que eu percebi que seríamos melhores amigas. - Fala, sonhadora, e derreto sob seu toque ao que seus dedos escorregam para minha nuca, delicados. 

- Quando mordi a cara do seu pai. - Coloco, tirando o braço do rosto e, pela primeira vez na noite, abrindo os olhos para vê-la. - Que lindo.

- Não é? - Sorri, animada. Meus olhos doem um pouco com a luz que passa por um ponto aberto da cortina, e demoram a focar em sua figura amassada.

Ainda de pijamas e totalmente descabelada, exibe seus dentes perfeitos e olhos cansados no sorriso mais amoroso de todos os tempos. E é quando seus olhos começam a marejar, que sei o que vem a seguir:

- Todo mundo achava que eu ia te odiar, Bonhwa. Mas eu te amei desde o primeiro momento. - Seus dedos deslizam para minha bochecha, onde espreme com vontade, sorrindo ainda mais.

- Antes de eu morder o vovô? - Ela ri alto outra vez, chegando mais perto de mim e entrelaçando os pés nos meus.

- Muito antes de você ver a luz no sol, meu bem. - Carinhosamente, arrasta o toque pelo meu rosto, acariciando a ponta de meu nariz e queixo com cuidado. - Assim que vi seus olhinhos, decidi qual seria a segunda sílaba do seu nome*.

- Hwa, igual ao seu. - Sorrio, rodando os olhos como se estivesse debochando. Ela sorri até mesmo disso.

- Exatamente. - Fecho os olhos conforme seu toque volta aos meus cabelos em movimentos longos e suaves. - As garotas Hwa, eu e você.

- Há vinte anos. 

Não estou vendo, mas consigo sentir seu sorriso se abrir gloriosamente diante de meus olhos fechados ao que um beijo é deixado em minha testa descoberta. 

- Os melhores vinte anos, joaninha. - Esboço um sorriso, já presa naquele estado de semiconsciência ao que sinto a coberta ser puxada até meus ombros e meu corpo ser envolvido em seu abraço amoroso. - Eu amo você, Oh Bonhwa. Sem limite nenhum.

E ali, nos braços da mulher que me ama como ninguém nunca vai ser capaz de amar algo em toda a vida, me entrego outra vez ao sono, enquanto escuto seus relatos sobre a estadia no hospital e a indignação de meu avô por ela aprovar a minha mordida.

🐞

No centro do enorme pátio bem cuidado da casa de meus avós, onde estamos todos a pelo menos vinte minutos, a lataria branca do carro brilha gloriosamente sob os tons alaranjados do nascer-do-sol. A brisa fria que restou da madrugada gruda meus cabelos soltos contra meus lábios entreabertos e agita de forma delicada o grande laço vermelho sobre o veículo, enquanto meu queixo cai, aos poucos.

Um carro. É a porra de um carro novinho em folha estacionado na minha frente.

- Tá de sacanagem, pai? 

Engasgada com o próprio ar, mal consigo piscar ao ouvir minha mãe falar assim com meu avô. Ao invés disso, quem responde é minha avó, enquanto o marido cai na gargalhada:

- Claro que não, Jeonghwa. - Fala, entediada com a própria filha. - Ela tem vinte anos agora. Precisa de um carro.

- Pelo amor de deus… - É o que consigo balbuciar, com a voz trêmula, ainda congelada no lugar. - Eu nem sei que carro é esse.

- Como não sabe, Bonhwa? - Minha avó questiona, voltando sua confusão para mim. - É o modelo do ano. Tá na televisão o tempo todo e...

- Tenha misericórdia. - Minha mãe se manifesta, recebendo um olhar assassino por interromper a própria mãe. - Não sabe nem dirigir uma coisa dessas, a minha filha.

- Tirou a carteira de motorista, não? - Meu avô se manifesta, vincando as grossas sobrancelhas grisalhas. - Eu achei que sim…

- Tenho carteira, sim, senhor. - Esclareço, vendo sua expressão suavizar. - Mas para dirigir um fusquinha, no máximo. Um carro desse aí eu não me atrevo a abrir a porta.

- Eu mereço isso… - Serim vira os olhos, dando-nos as costas e entrando na casa. Meu avô, perto do horário de sair para sua caminhada de sábado, apenas balança a cabeça e desce os degraus, parando perto do automóvel.

- É tudo questão de prática.

- E eu vou praticar nisso aí? - Meu queixo cai e meus ombros amolecem só de pensar na possibilidade de conduzir um carro que parece uma aeronave. - Isso por acaso voa?

- Nas minhas mãos? - Meu avô sorri, brincalhão. - Com certeza.

- Como é, Doowon? 

- Nada, querida. - Ele apruma a postura, segurando a garrafa d'água com firmeza ao caminhar agitado em direção ao portão. - Vejo vocês depois.

Gargalhando, minha mãe também desce os degraus. Ainda alí de cima, observo os vidros escuros e as rodas cromadas. Tudo no carro parece gritar “sou muito caro sim, gostou?” e é claro que eu gostei.

É maravilhoso. A representação perfeita do tipo de carro que a dona da empresa tem em um filme americano. Por consequência, o tipo de carro que eu nunca deveria ter.

- Mãe… 

- É um presente, joaninha. - Ela repreende sem que eu precise protestar realmente. - Você vai ficar com ele.

- É um avião! - Rebato, cruzando os braços.

- Você é uma adulta, ok? Pode aprender a lidar com isso. - Ela vira os olhos, acariciando o capô com os olhos brilhando. Bandida. - Seu avô certamente gostaria de te ajudar nisso.

Pisco devagar, tentando processar a frase. 

- Como assim? - Com meu questionamento, apoia o quadril na porta, agora virada em minha direção ao cruzar os braços e encolher os ombros.

- Você sabe que ele pegou o caro mais caro, dentro do valor que eu estipulei, para ter uma desculpa para te ensinar a dirigir, certo?

- Tá brincando? 

- Não, senhora. - Ela balança a cabeça, negando ao encarar meus olhos. - Ele quer ter um tempo com a neta, Bon. Os dois querem, na verdade.

- Assim, do nada? - Franzo o cenho, descendo os degraus para podermos ter essa conversa em um volume mais discreto. Diante dela, puxo as mangas do pijama, escondendo as mãos ali contra o frio. 

- Não exatamente “do nada”... - Ela inclina a cabeça, se encolhendo de leve ao correr o olhar pelo meus rosto, evitando meus olhos. Oh-oh. - Olha, entra aí.

Ela puxa a maçaneta, abrindo a porta bonita do veículo e indicando o interior encouraçado. Por dentro, obviamente, é ainda mais bonito. O painel está apagado, mas tem cara de ser aqueles cheios de luzes e símbolos acesos, quando ligado. Enquanto minha mãe dá a volta no carro, me encolho no enorme banco escuro, aspirando fundo o cheirinho de produto novo alí dentro.

No mínimo, intimidador

Ela entra no banco do motorista, diante do volante de couro sintético branco, e sorri fraco ao fechar a porta e correr os olhos pelo interior também. 

- Ok. - Ao concluir a inspeção, assobia alto, completamente admirada. - A gente podia simplesmente desistir de reformar aquela casa e morar aqui dentro, mesmo…

- Nem me fala… - Resmungo, admirando o que posso de onde estou. - O que você queria me dizer?

Ela se encolhe ao perceber que minha curiosidade me venceu tão rápido e aperta o volante entre os dedos finos, como se estivesse sentindo ele enquanto pensa. Eu sei que, na verdade, está apenas se distraindo para me evitar. E tudo bem, por enquanto.

- Quando você nasceu, não foi no momento que seus avós esperavam, mas foi algo que eles esperavam muito, entende? - Questiona, ainda sem olhar para mim. - Eles queriam uma neta, mesmo que não quisessem a filha de 18 anos grávida. 

- Eu sei. - Coloco, diante de seu breve silêncio. - Vovó sempre me fala isso.

- Certo. - Ela limpa a garganta em uma tosse discreta e coça a nuca antes de prosseguir, toda atrapalhada: - Eu sabia disso, naquela época, e mesmo assim não voltei para Daegu quando tudo se acalmou. Não deixei que eles te criassem e participassem do seu crescimento, como sempre quiseram. - Finalmente, guia seu olhar ao meu, apertando os lábios finos ao fazer isso. - Não deixei que eles tivessem uma neta.

- Mãe… - Já sabendo onde isso vai levar, a interrompo de imediato. - Não foi bem assim…

- Eu sei que não fiz de propósito e que tinha o direito de fazer, mesmo assim… Mas não é assim que eles vêem. - Coloca, escorando-se no banco, agora encarando o jardim através do visor. - Para eles, eu tive uma filha e fugi para não deixar eles fazerem com você o que fizeram comigo.

O que fizeram com ela…

Apertando os lábios, escorrego no banco, deitando confortavelmente ao assentir, demonstrando que entendi seu relato. 

Crescer em uma casa grande e cheia de brinquedos é o sonho de toda criança, falar mais de cinco línguas antes dos 16 é a meta de muitos adolescentes e ter a melhor educação do país não é algo que alguém jogaria fora. No entanto, a vista de fora é diferente da de dentro.

Minha mãe teve tudo isso, mas se sentia sufocada. Por isso queria conhecer o mundo. Por isso não voltou para Daegu depois que foi autorizada viajar comigo, pelo médico responsável. 

- Eu nunca quis essa vida, Bon. - Ela encolhe os ombros, declarando de repente, da forma mais natural possível. - Infelizmente, nunca parei para pensar que você, talvez, pudesse querer ela.

-  Como assim? - Franzo as sobrancelhas, encarando-a sobre o ombros esquerdo. 

- A casa grande, a escola particular, o baile de debutante e o carrão aos dezenove. - Lista, levantando um dedo para cada item. - Eu fugi de tudo isso ao escolher ficar em Seattle, joaninha, e te levei junto comigo sem pensar na sua opinião.

Sem me conter, deixo uma risadinha escapar.

- Não acho que, com dois anos, eu pudesse opinar muito sobre querer um baile de debutantes.

Ela ri também, estalando um tapa na minha coxa ao virar os olhos, me chamando de engraçadinha.

- O ponto é… - Vira o corpo na minha direção, os braços apoiados no peito e os olhos atentos. - Seus avós nunca puderam fazer com você o que fizeram comigo. Nem as partes legais, entende? E eles sentem falta disso.

- Que partes legais? - Ao me ouvir, sorri doce, apoiando a cabeça no banco e desenhando as bolinhas de seu pijama macio. 

- Sua avó queria te dar festas de aniversário enormes, te ajudar a estudar línguas novas e a fazer compras. - Começa, citando cada item devagar, atenta às minhas reações. - Seu avô gostaria de te ensinar a nadar, a provar vinhos… - Lentamente, desvia o olhar para o volante, esboçando um fraco sorriso ladino ao concluir a lista: - Te ensinar a dirigir.

Levanto as sobrancelhas, sentindo minha mente se iluminar aos poucos. Todas a roupas novas, pagar a minha formação, fazer um quarto para mim na casa deles… O carro novinho para meu aniversário de 20 anos.

Uau...

- Ok, entendi… - Estico as costas, curvando-me ao apoiar as mãos nos joelhos e encará-la por entre os fios que escorregam para minha cara. - Vou pedir para ele me ajudar, mas vou trocar de carro mesmo assim.

- Bonhwa…

- A última vez que eu dirigi foi a dois anos atrás. - Viro os olhos, agitando os dedos para dispensar seu sermão. - Vou precisar de ajuda mesmo que ganhe um fusca, ok? Vou pedir um carro mais simples.

Ela parece exitar, mas se dá por vencida ao bufar alto, jogando as mão para cima.

- Você é mesmo a filha da sua mãe. - Estala a língua, abrindo a porta. - Teimosa pra caralho.

Rindo enquanto ela resmunga, saio do veículo também. Do lado de fora, sinto seus braços me envolverem pelas costas quando apoia o queixo em meu ombro. 

- Filha? - Quase consigo ouvir o sorriso em sua voz amorosa, e sorrio involuntariamente por isso.

- Hm?

- Eu amo você. - Declara, acariciando meus ombros ao me soltar, diante da porta de entrada. - Feliz aniversário, outra vez.

Sorrindo para seus olhos preguiçosos, abro os braços, encaixando-os ao redor de seus ombros ao envolvê-la carinhosamente.

Ninguém nunca amou alguém tanto quanto minha mãe me ama…

- Eu também amo você, chata. - Sussurro, sendo praticamente esmagada por seus braços magros. - Eu amo ser sua filha também, e não trocaria minha infância por carro nenhum nesse mundo.

- E por uma casa? - Questiona, risonha, embora seu tom pese de forma chorosa.

- Nem. - Dou de ombros, seguindo lado a lado com ela para a sala de jantar, onde o café ainda está posto. 

- Uma ilha? - Ela chuta alto, sorrindo de lado ao abrir as portas de vidro ao mesmo tempo que minha avó vem da cozinha com um prato enorme de torta de morango.

- Por favor, não me faça responder isso.

Com sua gargalhada alta, sento-me entre as duas, levando um tapa na nuca pela ousadia.

Mesmo com a brincadeira, sei que nenhuma ilha do mundo pagaria todo o amor que tive ao crescer. Com a boca cheia de bolo, encolho-me na cadeira, sorrindo como posso ao que ouço-as gargalhar alto enquanto compartilham vinte anos de histórias vergonhosas sobre mim.

🐞

Meu aniversário é, assim como todos os anos anteriores, um dia como qualquer outro (fora ganhar um carro que não tenho coragem nem de olhar agora, eu quero dizer). 

Meu avô voltou cedo de sua caminhada porque se recusou a andar o percurso completo e vovó brigou com ele por isso. Minha mãe ficou o dia todo na minha cola, o que foi bom de todas as formas possíveis:

Por um lado, porque faz tempo que não assistimos um filme juntas ou algo assim, e por outro, porque minha avó passa cada segundo livre tentando me convencer a ter uma festa enorme na semana que vem, e minha mãe espanta ela sem pena (algo que eu nunca teria coragem de fazer, mesmo que não me falte vontade).

Assistimos A Princesa e o Sapo duas vezes, e tentei não sorrir feito boba ao lembrar que Jimin tem um sorriso tão sedutor e charmoso quanto o príncipe tem, no início do filme.

Desgraçado.

Durante o almoço, falamos sobre a reforma de nossa casa, que já está no fim, e sobre minha performance no primeiro trimestre de aulas.

Metade do semestre já foi, meu pai. Falta só a pior parte, agora.

O início da tarde chega e, com ele, mais uma discussão de “por favor, só uma pequena festa para 150 convidados, Bonhwa”.

- Eu não estou sendo chata. - Serim rebate, fechando os punhos na cintura e afiando os olhos para minha mãe, que encara ela do meio das cobertas que amontoamos na cama para assistir uma série qualquer o dia todo. - Só quero entender porquê ela se recusa a comemorar o aniversário.

- Estamos comemorando, mãe. - Jeonghwa vira os olhos dramaticamente, espalhando-se na cama. 

- Essa é a coisa mais deprimente que você já me disse a vida toda, Jeonghwa. 

- Tenha dó… - Minha mãe reclama encarando a própria com certa revolta. - Eu com certeza já fiz algo mais depressivo do que isso.

Ao que minha avó bufa enfurecida pelo comportamento rebelde da filha, sinto meu celular vibrar no bolso do moletom. Rindo de sua confusão, sem pressa, puxo o aparelho para a mão, espiando o nome que brilha na tela.

Meu deus do céu.

- Só uma festinha… - Minha avó insiste, alheia aos meus olhos arregalados e coração disparado.

- Sai do quarto! - Ouço minha mãe gritar, e encolho os ombros ao ouvir meu abajur caindo no chão.

- Você me atirou uma almofada, Jeonghwa?

Misericórdia.

- Hm… Caras? - Chamo, recuando dois passos em direção a sacada e coçando a nuca, ainda de olho na tela iluminada. Socorro. - Tenho que atender isso aqui, já volto.

- Sua filha acabou de me chamar de “cara”?

- Você tá ficando surda, por acaso?

- Jeonghwa!

Agitada, bato a porta de vidro com força atrás de mim, encolhendo os ombros ao, em um pulso de coragem que nunca saberia dizer de onde tirei, atendo a ligação.

- Oi, garçonete…

Essa voz preguiçosa, meu deus…

- Oi, Ji.

- Nossa… Eu adoro quando você me chama assim. - Me arrepio dos pés a cabeça ao ouvir o sorriso na sua voz, sentindo minhas bochechas esquentarem imediatamente. O que faz comigo, meu deus.... - Você tá livre hoje a noite?

Sábado. Park Jimin quer saber se estou livre no sábado a noite.

Meu deus

- Ahn… S-Não! - Dou um pulinho ao sair do transe que ele me coloca sem nem estar na minha frente. - Hoje não posso.

- Ah, não, garçonete. - Seu tom emburrado revira meu interior enquanto esmago a sacada com os dedos. - Só porque a minha boca parou de doer hoje.

Como diria minha mãe: tenha dó.

Mordo a boca com força com o arrepio que sobe minha nuca sensível por seu tom de voz. Bandido.

- Bom para você, espertinho. - Em meio a todo esse desespero, aproveito que ele não pode ver minha cara e tento fingir estar inabalada por seu charminho. Que bela farsa. - Mas hoje não posso, mesmo, mesmo

- Jura? - Ele continua com a manha e quase consigo visualizar seu sorriso espertinho ao que articula cada palavra. - Mesmo sabendo que eu estou doidinho pra te ver?

Ele deve estar se divertindo muito ao brincar assim com a minha cabeça, mas não consigo resistir ao seu papinho manjado ao derreter que nem manteira contra a sacada, praticamente deitando sobre ela ao sorrir feito idiota. 

- Mesmo assim, Don Juan. - Dedilhando a madeira, decido revelar parte da verdade. - É aniversário de alguém na família.

- Quem?

- Alguém. - Uma pausa ocorre após minha fala escorregadia.

- Você tá inventando um aniversário para fugir de um encontro comigo? - Ele manifesta, finalmente. - Eu estou muitíssimo magoado agora, fique sabendo. 

- Vou tentar viver com isso. - Gargalho alto, impulsionando o corpo de volta para a porta ao ser chamada por minha mãe. - Te vejo na segunda.

- Vou beijar sua foto de perfil até lá. - Ele dramatiza, estendendo as palavras teatralmente. - Talvez eu até imprima uma, para facilitar.

- Tomara que Jungkook te escute dizendo isso e tire com a sua cara para sempre.

- Foi ele quem me deu a idéia, ok? - Ele ri, descontraído. Encolhida como uma idiota, exatamente como fico enquanto ele flerta comigo pessoalmente, apenas dou uma risadinha e mordo os lábios, sentindo meu coração disparado como um louco. - Te vejo segunda, vampirinha.

- Até. 

Antes que jogue tudo para os ares e saia para ver ele, desligo, vendo algumas mensagens que ele já começou a digitar, lamentando meu “fora”. Chorão.

Eu até poderia ter dito que é meu aniversário, mas isso levaria a uma sequência horrível de xingamentos por não ter contado mais cedo. Por algum motivo, algumas pessoas realmente ficam ofendidas com isso. Loucura, na minha opinião.

Correndo para o cômodo pouco iluminado, me empurro para baixo das cobertas e as puxo até os ombros, vendo que a escolha agora não podia ser pior:

- Mãe! - Grito um pouco alto demais ao ver o título na tela da televisão. - É meu aniversário e eu não vou assistir “Ela Dança, Eu Danço” nem que você me pague! 

Depois de muita briga e discussão, acabamos maratonando Grey’s Anatomy enquanto minha mãe desenvolve questionamentos sobre como minha vida vai ser depois que eu me formar em medicina. Sinceramente? Espero que nem um pouco com essa série, porque eu não to afim de morrer tão jovem, não.

No final das contas, minha avó conseguiu me convencer a deixar ela fazer um jantar especial - apenas família, para sua infelicidade. O cardápio é surpresa e o bolo (mesmo que eu já tenha ganhado um hoje) vai ser maior do que meu abdômen. Ela tem um problema com gastar dinheiro, essa mulher.

De qualquer forma, isso serviu para acalmar seus ânimos e mantê-la ocupada por horas a fio. Agora, perto do entardecer, enquanto estico as costas contra o banco de madeira no pátio frontal, consigo ver seus cabelos voando pelas janelas enquanto prepara o “evento”. 

Não vai haver nenhum convidado especial, e mesmo assim, toda a pobre casa está sendo preparada para um jantar. É ter muito tempo livre, mesmo.

Fecho o livro depois de cansar os olhos de tanto ler na sombra fresca, e puxo os cabelos em outro rabo de cavalo mais firme que o anterior enquanto bocejo, já sentindo o sono me pegar. Ganhar presentes é legal, mas ganhá-los às seis horas da manhã é sacanagem. Meu avô ainda me paga por isso.

Coloco-me de pé e, sem intenção, dou um pulo ao ver os portões se abrindo em um ranger suave. Como um foguete, a enorme moto preta acelera pátio adentro, acelerando também as batidas do meu coração ao reluzir sob o sol ameno. 

Minha cabeça vai tombando para a esquerda conforme meus lábios se separam e o ar fica preso na garganta ao ver Park Jimin, em toda sua glória e estilo impecável, tirar o capacete e agitar os cabelos compridos e escuros, que combinam perfeitamente com a moto que deixa para trás. 

Suas botas de combate estão tão lustradas como seus sapatos sociais costumam ser, e a calça jeans rasgada se agarra com força as coxas firmes. A camiseta preta agita ao vento, mas o que realmente me mata é a jaqueta de couro que cai sobre seus ombros. E, meus amigos, se esse homem em trajes sociais é um pecado, usando couro e roupas justas da cabeça aos pés não é nada menos que o próprio diabo encarnado.

Assisto, em silêncio, conforme equilibra o capacete no banco e apoia a moto antes de levantar o rosto, infelizmente, na minha direção. Um sorriso felino se abre em minha direção conforme seu olhar se torna divertido ao me analisar devagar. Ainda sem pressa alguma, o corpo magro, que já estava virado em direção a porta de entrada, passa então a seguir na minha direção, andando como um predador.

Minha nossa senhorinha… 

- Olha só quem estava me esperando. - Ele cumprimenta, tirando outra vez os fios do rosto ao levantar o queixo, correndo a língua vermelha pelos lábios bonitos. Desgraçado. - Está bastante informal para quem tem um aniversário essa noite.

Minhas bochechas fervem dolorosamente ao que me torno completamente consciente de estar descabelada e de pijamas diante de um homem esculpido pelos deuses. Ao mesmo tempo, sinto que elas queimam um pouco de raiva ao perceber o que está acontecendo aqui.

- Eu te disse não e você veio aqui insistir em sair comigo, mesmo assim?

Ele, que estava a dois passos, imediatamente recua um, parecendo ofendido ao deixar o queixo cair e perder um pouco a pose diante de meu ataque inesperado. 

- O que? Claro que não, Bonhwa. - Vira os olhos teatralmente, enfiando a mão bonita e coberta de anéis entre o peito e a jaqueta, tirando de lá uma pequena embalagem colorida. Oh-Oh. - Eu vim dar feliz aniversário para você, espertinha.

Encaro, estática, sua mão estendida em minha direção conforme seu sorriso se torna uma risadinha debochada. Percebendo que me deixou chocada demais, avança a distância entre nós e sorri vitorioso, pegando minha mão direita e deixando a embalagem alí. A pele que ele toca esquenta imediatamente por seus dedos morninhos, provavelmente da luva de couro que ele tirou mais cedo. 

- Te peguei no pulo, hm? - Seu tom se arrasta de forma amorosa, sorrindo a cada palavrinha pronunciada. Bandido. - Abre, vai…

- É… Ahn… - Limpo a garganta, piscando rápido ao fechar os dedos no pacotinho e afastar a pele de seu toque morno. - Q-Quem te contou que era hoje?

- Kim Taehyung, é óbvio. - Ele vira os olhos como se debochasse do questionamento. - Que outro fofoqueiro seria?

- É, faz sentido. - Sem que eu queira, a risadinha divertida me escapa, concordando com sua colocação. Enervada, atrapalho os dedos ao puxar a primeira fita adesiva, e me encolho de imediato ao sentir sua mão pousar em minha lombar.

- Vem aqui… - Ele chama, esperto, pressionando a mão alí para me guiar ao banco em que eu estava antes de sua chegada.

O livro que abandonei ao ouvir os pneus cantando ainda está alí, e Jimin o deixa de lado ao sentar-se comigo. Animado, levanta as sobrancelhas, gesticulando para a embalagem, que volto a manusear com seu sinal.

- Não era para você gastar com isso, ok? - Resmungo, tirando a outra fita, emburrada. 

- Eu sabia que você ia dizer isso, então não gastei. Tá bom? - Ele bufa em falsa irritação, apenas para demonstrar seu descontentamento. - Rasga isso logo, molenga. Quer atacar minha ansiedade, agora?

- Minha nossa… Quanta pressa. - Irritada, puxo o papel com força, abrindo o pacote de fora a fora.

Imediatamente, meu coração para de bater.

- E aí, você odiou?

Eu sabia que seria algo como uma pulseira ou colar, pois a embalagem era pequena demais para algo maior que isso. Infelizmente, não tinha como saber que seria algo tão bonito assim.

- Jimin… Isso é muito bonito! - Encantada pela delicada peça, a seguro pela ponta da correntinha dourada, sentindo o papel escorregar até o chão. - Onde você achou algo assim?

Nos meus dedos, a curta correntinha dourada brilha contra as luzes, servindo como um lindo adorno para a pequenina flor amarela pendurada no centro dela. O pingente mais bonito que eu já vi a vida toda.

- Achei no meu estúdio. - Ele começa, encolhendo os ombros ao que meus olhos voam para ele. Estúdio… - Ela estava incompleta, então fiz os acabamentos depois de falar com o Tae e peguei essa correntinha nas minhas coisas. - Seus olhos descem para os sapatos, que batem um contra o outro ao que suas íris brilham novamente em minha direção, tão inseguros que derretem meu coração. - Você gostou?

O sorriso que se abre em meu rosto quase rasga minhas bochechas ao que, sem cuidado algum, lanço meu corpo em sua direção, apertando-o com força em meus braços.

- É a coisa mais bonita que alguém já fez para mim. - Com o rosto em seu pescoço, arrepio-me dos pés a cabeça ao que ele suspira aliviado, abraçando-me carinhosamente. - Eu amei, Jimin.

Ele sorri de orelha a orelha contra minha pele sensível, e murmura um “graças a deus” baixinho antes de deixar um beijo contra minha bochecha quente. Rindo de sua insegurança boba, afasto o rosto apenas para, em um impulso, espalmar as mão em suas bochechas e encaixar a boca na sua.

Jimin suspira de forma tão satisfeita que me deixa com as pernas bambas e imediatamente leva as mão ao meu quadril, apertando os dígitos alí para me manter onde estou, meio inclinada sobre ele por conta do abraço repentino. Amolecido, abre a boca e aceita minha língua de bom grado, chupando-a para dentro da boca ao relaxar em meus dedos, subindo a palma direita para meu pescoço.

Arrepiada, deixo meu corpo voltar para a posição anterior, e ele, sem perder um segundo, firma o aperto ao inclinar-se sobre mim, enrolando a língua na minha de forma deliciosa. Meus dedos se embrenham em sua nuca ao que tento me equilibrar e acompanhar seu ritmo, que não se assemelha em nada com o beijo contido do outro dia.

O beijo desse homem, meu deus…

Resmungo quando sua mão sobe em minha cintura e toca minha pele diretamente. Ao que sente isso, grunhe com vontade e aperta os dígitos no local, afundando os dedos na gordurinha que fica ali sem exitar. Completamente mole sob seus toques, apenas deixo que guie o beijo e incline a cabeça em outra direção, subindo mais os dedos em minha nuca.

- Ei! - Protesto involuntariamente e gargalho ao que seus dedos ágeis soltam meu cabelo, que cai em uma bagunça amassada sobre meus ombros cobertos.

- Desgraça de amarrador. - Resmunga contra minha boca, logo chupando meu lábio inferior de volta para seu beijo quente. Desgraçado de um homem, isso sim. - Caralho. - Lambe os lábios inchadinhos, deixando-me extasiada com sua voz entregue desse jeito enquanto encara minha boca e, hipnotizado, apoia o polegar alí. - Eu senti tanta falta de te pegar assim, Bonhwa... Parece até loucura.

Pareceria mesmo, se eu não tivesse sentido falta também. 

Por conta dessa percepção, aperto sua nuca e puxo sua boca de volta para a minha, que vem de bom grado. Dessa vez, assim como no dia da festa, o beijo é lento e molhado, e cada estalinho que escapa me faz suspirar em satisfação absoluta ao que quase derreto sob seus toques vagarosos.

Como se estivesse me adorando com a ponta dos dedos, acaricia minha pele arrepiada, deleitando-se com meus arrepios e grunhidos entregues. Eu to tão ferrada, meu deus…

Quando sua boca se afasta da minha, imediatamente avanço outra vez, e chupo sua boca com gosto uma última vez antes de relaxar contra o banco. Ainda de olhos fechados, sinto sua testa se apoiar na minha enquanto seus dedos, em minha nuca, deixam todos os meus pelinhos eriçados. Corro a língua por minha boca, que formiga intensamente com falta da pressão macia, e sorrio ao que ouço sua risadinha rendida.

- Se eu soubesse que uma esculturinha de metal ia te deixar assim, teria feito uma para cada dia da semana. - Com sua colocação boba, gargalho em altas vozes, afastando o rosto do seu para olhar em seus olhos bonitos, que já estão esquadrinhando meu rosto atentamente, brilhando sem igual.

- Você ainda tem tempo de fazer isso. - Sorrio, devolvendo a brincadeira. Ele estreia os olhos para mim, mordendo o lábio inchado com vontade enquanto isso. 

- Não me tente, garçonete. - Levanta a sobrancelha, sorrindo torto do jeitinho que derrete meu coração. - Você sabe que eu faço.

- Você é um palhaço, isso sim. - Viro os olhos, tentando descontrair. Ele percebe e, finalmente, solta minha nuca. Olhando ao redor, arregala os olhos e ri baixinho, inclinando-se para mim ao sussurrar, divertido:

- Você percebe que acaba de me grudar contra um banco na frente da casa de seus avós? - Conforme minhas bochechas esquentam, ele cai na gargalhada, relaxando as costas contra o assento. - É uma safada, mesmo.

- Eu não ouvi nenhuma reclamação, ok? - Entro em sua brincadeira, dando de ombros de forma descontraída, mesmo que por dentro esteja pegando fogo. 

- E nem vai. Pode ficar a vontade, inclusive. - Depravado, lança um beijinho em minha direção, e se esquiva rápido quando, de supetão, pego a pulseirinha que havia caído no banco e ameaço acertá-la em seu rosto. - Eu, hein. Te dou um presente para apanhar com ele?

- Você bem que merecia.- Resmungo, dando de ombros. - Vai, coloca isso aí para mim.

- Chata. - Ele rebate, mas pega o objeto para prender em meu pulso.

- Irritante. - Resmungo de volta, virando os olhos ao que ele fecha o pequeno trinco, virando meu pulso para ver de todos os ângulos.

- Garçonete. - Provoca, sorrindo esperto.

- Mimadinho. - Ataco onde dói mais, mas ele não exita um segundo ao descer os olhos pelo meu corpo (ainda estou de pijamas, gostaria de lembrar) e lamber os lábios, sem um pingo de vergonha ao concluir:

- Gostosa do caralho.

- Park Jimin! - Agora, sem me impedir, dou um tapa em seu ombro, que estala alto contra o pátio vazio.

Caindo na gargalhada, encolhe os ombros, dizendo que fui eu quem começou. Como ele não está errado, apenas deixo passar e sento-me melhor ao seu lado.

Enquanto conversamos, estende um braço sobre o banco, abraçando-me de forma carinhosa ao falar sobre como fez a florzinha.

- É um crisântemo amarelo. - Ele sorri, girando o pequeno objeto em seus dedos. - Um dia, te digo o que significa. Não vale pesquisar!

Como estou ansiosa para escutar a sua explicação, apenas encolho os ombros e aceito sua colocação. Esperto como sempre é, aproveita a oportunidade para girar meu pulso e encaixar a palma macia na minha. 

Ele não entrelaça os dedos ou segura minha mão, não. Apenas descansa a palma alí, preguiçosa e quentinha, e a sensação é tão boa quanto nenhuma outra jamais foi.

Conforme a noite vai chegando, ele resmunga alto, pois tem que voltar para casa cuidar de sua irmã enquanto Jungkook estuda e seus pais saem para namorar.

- Eu queria te levar junto, para me fazer companhia. - Ele declara, levantando-se do banco duro e alongando as costas. - Jieun ia adorar você.

- Você acha? - Com minha pergunta, ri alto, agitando os cabelos.

- Tá brincando? - Estala o pescoço e puxa minha mão para que o acompanhe até a moto, divertindo-se com a possibilidade. - Com o apreço que vocês duas têm por me xingar, poderiam ser melhores amigas em dois dias.

- Ela parece tão inteligente. - Sorrio, acariciando seus dedos quando ele para ao lado da moto e, sem se importar com nada, apenas puxa minha cintura e apoia meu peito no seu. - Você gosta muito dela, não é?

- Uhum… - Murmura, acariciando meu rosto com a  pontinha dos dedos que, a essa altura, ficaram gelados. - E adoro você, também. Seria a combinação perfeita para minha felicidade.

Rio alto, tombando a cabeça em seu peito ao virar os olhos, divertida com seu flerte “discreto”. 

- Quem sabe outro dia. - Sorrio, me afastando de leve para olhar em seus olhos. Envolvida em um meio abraço, mordo o lábio ao encarar seu rosto bonito tão de perto. 

- Com certeza outro dia. - Me corrige e, descaradamente, prende os dedos em minha nuca ao inclinar a cabeça, roçando os lábios no meu, que fica formigando. 

- Agora vem aqui, vem…

Faço questão de rolar os olhos diante de seu chamado manhoso, mas aceito seu beijo suave de bom grado. Esse sim me faz lembrar da calçada de sua casa. 

Os lábios deslizam com carinho nos meus, puxando-os com cuidado entre os meus e roçando os dentes só para me provocar, tão delicado que mal parece estar me tocando de verdade. A eletricidade me agita por completo, e sua boca se afasta da minha quando minha mão acaricia seu pescoço.

Completamente abobada pela visão de seus olhos abrindo bem devagar e de suas bochechinhas ficando cor de rosa, toco seu rosto feito uma idiota, mas não me arrependo ao receber o enorme sorriso brilhante que ele exibe para mim.

- O que você faz comigo, garota… - Ele toca o nariz na minha bochecha, puxando-me para um abraço carinhoso, que me deixa na ponta dos pés ao que envolvo seus ombros. - Não pode ser normal, sabia?

- Consigo imaginar. - Encolho os ombros com o beijinho esperto que ele deixa contra meu pescoço exposto, e xingo ao que vira uma mordidinha “inocente”.

- Tchau, garçonete…

Odeio e amo essa voz arrastada com a mesma intensidade que não consigo explicar.

- Tchau, chato. 

- Eu amei o pijama, à propósito. - Ele pisca sedutor ao subir na moto, encaixando o capacete na cabeça, com a viseira aberta. Fecha a fivela sob o queixo e sorri provocador ao continuar. - Amarelo ovo é definitivamente a sua cor. 

- Ah, cala boca, Motoqueiro Fantasma. - Viro os olhos. - Pega essa sua jaqueta de Badboy dos anos 80 e some daqui.

Gargalhando alto, dá a partida no veículo, fazendo o motor rosnar contra a noite escura.

- Te vejo na segunda, garçonete. 

Conforme segue seu caminho, apenas dou as costas e subo as escadas saltitando conforme sorrio feito uma idiota porque, meu deus… É isso que ele faz comigo.

🐞

O jantar de minha avó, para o bem de minha sanidade, correu exatamente como planejado. 

O cardápio teve como prato principal massa com molho de camarão, o que parece estranho, mas na verdade é muito gostoso se preparado corretamente. O vinho serviço combinou perfeitamente e o bolo de mirtilo com amora silvestre e mel me lembrou da infância de forma que nada mais no mundo poderia.

Ganhei, de minha avó, um par de pequeninos brincos de pedras amarelas (que eu não faço idéia do que sejam, mas que são muito bonitos e brilham bastante) e, de minha mãe, um All Star branco novinho em folha (o que foi bom, porque o outro tênis “branco” que tenho dessa marca, já está encardido faz tempo).

Meu avô pareceu magoado quando pedi um carro mais simples, mas logo se animou ao que eu declarei, assim como minha mãe havia apontado, que queria sua ajuda para dirigir de qualquer forma. Na segunda a noite, vamos passar na concessionária.

Por suas carinhas espertas, soube que haviam me visto com Jimin lá fora (e como não teriam?), mas felizmente, decidiram não comentar. De qualquer forma, fiquei sorrindo feito idiota a noite toda, tocando a florzinha amarela e enrolando um cacho de cabelo no dedo indicador.

Tudo só piorou quando, na hora de dormir, fui checar as mensagens e:

| Vou dormir feito um bebezinho hoje, lembrando dos seus beijos 😳💞

| Boa noite, garçonete <3

| Pensa em mim também, para eu não ficar sozinho nessa hehehe

| Ah, e feliz aniversário! 🎉🎂🎈

|Cuida bem da minha/sua florzinha <3

Depois disso, o domingo chegou preguiçoso e - graças ao bom deus - sem ninguém invadindo minha cama de madrugada. O problema começou só depois do meio dia quando desci para almoçar (ei, no domingo, é tarde mesmo), e fui pega de surpresa logo na escada.

- Não esqueceu do jantar hoje, não é? - Minha vó estreitou aqueles olhos de dragão para mim e, tentando identificar alguma gotinha de surpresa em minha expressão, afiou a voz. - Na casa dos Min, às sete horas.

A partir daí, minha pressão despencou junto com a minha capacidade de raciocínio lógico, já que tudo que consegui pensar pelas horas seguintes foi na voz arrastada de Jimin dizendo que não, não foi Yoongi quem bateu nele naquela festa. Foi Kim Jennie, a prima bonitona e, aparentemente, sem muita paciência, de Min Yoongi.

Puta que pariu, mesmo…

Naquele dia, ao receber a notícia, estava contando com a carona de minha mãe, que estava doida para chegar em casa depois de um dia todo na obra de sua vida. Por conta de sua pressa, tive que voltar para casa sem saber dos detalhes, mas assim que botei os pés dentro do quarto, liguei para Jimin e exigi cada ponto possível da história - até então - muito mal explicada. Basicamente, aconteceu assim:

Jimin saiu da cozinha doido para irritar Yoongi (isso eu já sabia, mas enfim). Ao alcançá-lo na sala, encontrou ele com Jennie (e tá aí o que eu não sabia). Ele provocou Yoongi e viu ele cerrar os punhos, mas sabia que ele não ia fazer nada, então deu a última cartada da manga (aquela babaquice envolvendo eu e Taeyeon) e, para aprender a deixar de ser otário, levou um socão na boca.

Um socão muito bem dado, inclusive. Mas não de Yoongi, e sim de sua prima, Jennie, que ficou furiosa com a atitude de Jimin.

É estranho se eu falar que, agora que sei do nocaute que ela deu em um homem muito maior que ela, considero-a ainda mais atraente? Enfim

O ponto é que venho ignorando essa informação desde que a recebi já que, desde tal dia, não vi mais Yoongi em lugar nenhum. Lalisa disse, quando a questionei sobre isso, que Yoongi deve ter mantido segredo para os boatos não chegarem até os ouvidos dos pais de Jennie, que são diretores da universidade e pegariam fogo ao descobrir que ela se meteu em uma briga assim. Dessa forma, assumiu a culpa, já que, quando as pessoas ouviram o barulho e começaram a entrar, só viram ele fugindo e Jimin com a boca cortada. Nunca imaginariam que aquela princesa de salto alto e vestido esvoaçante tinha feito aquilo com o garoto.

Sendo assim, fui na onda e tratei Yoongi mal por algo que ele nunca chegou nem perto de fazer. E agora, depois de toda essa estupidez sem tamanho, vou jantar na casa dele.

Como vou olhar na cara dele, meu deus? Como vou agir como se estivesse tudo bem?

Ele deve estar magoado até os ossos com meu comportamento. 

Mas, de certa forma, isso não anula que ele foi babaca comigo e, assim como Jimin mereceu o tratamento duro que teve de mim no início, Yoongi também merece.

O único problema é que, assim como havia pensado a alguns dias atrás, meu relacionamento com ele tem muitas outras nuances a serem discutidas, como por exemplo, tudo que sei sobre ele, sem o mesmo nunca ter me contado.

E se eu fingisse desmaio antes de sair? 

Nah… Meus avós saberiam na hora, e minha mãe ia me zoar demais pela covardia.

Enquanto enrolo mais uma mecha de cabelo no babyliss, penso em mais algumas desculpas e saídas para a situação. Infelizmente, chego a conclusão óbvia: não tem nenhuma.

São os melhores amigos de meu avô, ele vai ficar furioso se eu não for e minha avó, por mais que odeie Min Yerim, odeia desfeitas ainda mais, e nunca me apoiaria a furar o encontro marcado.

Sendo assim, ajeito o casaco escuro de lã sobre os ombros, reforço o rímel e passo um perfume frutado qualquer ao ajustar a pulseira e seguir para a porta, onde sou aguardada por minha família já pronta. Quer dizer, parcialmente pronta. Minha mãe deixa para amarrar a sandália dentro do carro e vai ouvindo desaforos de minha avó o caminho todo, por conta disso.

Nada de novo sobre o sol.

A noite estrelada cintila nos prédios espelhados do centro de Seoul, e meu avô cantarola toda e qualquer música que toca na rádio enquanto as outras duas se xingam sem pena bem ao seu lado, inabalado. Quieta em meu canto, brinco com a barra do vestido azul escuro enquanto batuco os saltinhos no chão ao ritmo de Dynamite, de um grupo muito famoso, que meu avô parece adorar.

- Dy-na-na-na-na-na-na-na eh! - Ele cantarola, me fazendo rir baixinho ao acompanhá-lo, balançando o corpo com as batidas animadas.

Sorrindo, quase esqueço que estou indo direto para a forca conforme deslizamos pelas ruas iluminadas.

Todo esse breve sossego vai para o saco quando os enormes e imponentes portões ornamentados da mansão Min se estendem diante do veículo.

Perto de mim, meus avós são riquíssimos, perto dos Min, poderiam ser como eu.

A enorme casa branca e bem iluminada, com a pista circulatória ao redor de um chafariz que faz o nosso parecer brinquedo, se assemelha a um castelo com todas as gigantescas janelas escuras e sacadas decoradas.

As portas de entrada são de um mógno tão escuro quanto o vazio entre as estrelas noturnas, e quando estas se abrem, revelam tanto mármore que poderíamos, muito bem, estar dentro de uma escultura grega.

Enormes escadas cobertas por uma tapeçaria escura, presa por suportes dourados, se abrem para o segundo andar, que exibe lindas lâmpadas as paredes vermelhas como sangue. No primeiro andar, onde estamos, o chão é branco como a própria luz da luz da lua e as paredes não ficam longe, altivas e ornamentadas com suportes dourados para a iluminação.

- Chegaram bem na hora, Serim. - Ronwoo elogia, exibindo o belíssimo terno de veludo escuro e a gravata vermelho sangue ao parar ao lado da esposa, nos recepcionando, sorrindo largo para meus avós. - Como de praxe.

- Eu tenho a reputação a zelar, afinal. - Minha avó brinca, cumprimentando aos dois.

Deixo minha mãe ir na frente e então repito seus gestos, cumprimentando-os também. No caminho para a sala de estar, onde vamos esperar o jantar ficar pronto com alguns drinques, sou elogiada por minha boa aparência e educação, e agradeço da forma mais simpática possível ao lutar contra a ansiedade que me faz tremer sem parar.

Quando as portas de vidro se abrem, meu coração cai até o chão e volta com tudo, batendo contra minha garganta enquanto arregalo os olhos e paro de respirar, vendo ele ali.

Impecável em sua calça social e camisa de botões dourados, sapatos lustrados e franja clara cobrindo a testa, está Min Yoongi, tão chocado e congelado quanto eu. 

Ao perceber a reação do filho, Yerim interrompe, forçando delicadeza em sua voz de cobra ao alfinetar, “discreta”:

- Filho, cumprimente as visitas.

Min Yoongi 🎹 Point Of View

Ela é linda.

Durante todo o jantar preenchido com conversas sobre eventos da alta sociedade, arquitetura moderna e mercado de trabalho, permaneço em silêncio enquanto isso é tudo em que consigo pensar. Em como o cabelo dela cai delicadamente, em grossos cachos que parecem tão macios, e toca suas bochechas vermelhas.

Controlado como aprendi a ser sob o olhar afiado de minha mãe, apenas tomo meu lugar a mesa e como com os talheres certos, no tempo certo, falando apenas quando é certo. Ao passo que, enlouquecidamente, tento controlar o impulso automático de passar cada segundo possível olhando para Oh Bonhwa.

Porque ela está linda, e isso é tudo que eu quero fazer agora.

No entanto, mantenho a pose, sem olhar para ela ou pensar demais em como a distância da mesa é a mais curta que estivemos nos últimos dias, desde a festa.

A festa em que briguei com Jimin, encobri Jennie de sua impulsividade e fui castigado por me meter em encrenca. E claro, festa na qual, por estar com medo de minha mãe, gritei com Bonhwa sem que ela merecesse - mais uma vez.

- Filho… - Meu pai chama de forma cuidadosa, tocando meu pé por baixo da mesa, como sempre faz, chamando minha atenção. - Porque não leva Bonhwa para conhecer a biblioteca, huh? - Ele sorri simpático, olhando para  a garota citada. - Soube que gosta de ler.

- Gosto sim...

Engulo em seco, encarando seus olhos amorosos ao que dá um tapinha em minha mão, me encorajando a levantar. Ele toca meu pé duas vezes com a ponta do sapato, por baixo da mesa, indicando que tenho autorização (de minha mãe) para tal. Assim sendo, pela primeira vez de forma não discreta, dirijo minha atenção para Bonhwa, que está me olhando com as bochechas rubras e olhos arregalados.

Coisa linda

- Bonhwa, você aceita? 

- Ahn… Claro. - Ela sorri amarelo, colocando-se de pé. 

Sorrio disfarçadamente ao ver o olhar desaprovador de minha mãe diante da fala dela, e posiciono os talheres no prato vazio antes de pedir licença e, em passos controlados, guiar a garota para fora da sala. 

Por mais que seu comportamento seja educado e muito bem desenvolvido, ainda é atrapalhada e fala de forma engraçada, o que deixa minha mãe com os cabelos em pé. Eu acho divertido, de certa forma. Yerim deve achar até mesmo ofensivo que uma garota de família tão rica tenha menos porte do que eu.

Andando a uma boa distância dela pelo corredor amplo, sinto o estômago gelar ao que nos aproximamos das portas duplas da biblioteca.

- É… - Assim que libero a entrada indico o interior bem iluminado para ela. - Pode entrar. 

Dezesseis anos de aulas de etiqueta e oratória para parar diante de uma garota que estuda comigo e falar “é…”. O auge da minha carreira na comunicação.

Receoso, torço os dedos as minhas costas quando a vejo andar timidamente pelo local. Ainda sentindo meu estômago pesado, não consigo dizer nada ao acompanhar o movimento suave de seus cabelos que balançam em seus movimentos mais bruscos e me arrepio inteiro ao que a escuto chamar meu nome depois de tanto tempo. 

- Yoongi… 

Sorrio sem querer, divertido com a forma como sua pronúncia é engraçadinha. Ao invés de falar comos os outros coreanos e focar a sílaba tônica no “Yoon”, ela foca no “Gi”, pronunciando algo como “Yoongí”. O que poderia ser irritante na voz de qualquer outro, mas acaba sendo fofo quando ela faz.

- Sim? - Completamente retardado, questiono, ainda viajando na forma como pronuncia meu nome de um jeitinho diferente.

- É que eu queria falar com você. - Ela torce os dedos curtos, girando os anéis prateados que adornam sua pele pálida. - Ahn, sabe… Sobre aquele dia.

E, fácil assim, volto a ficar tenso e perco completamente o rumo de minhas atitudes controladas.

- Ah… Claro. - Limpo a garganta, indicando uma prateleira mais ao canto. - Vem comigo, por favor. 

Encantado pela forma que suas sobrancelhas se vincam em arcos perfeitos em sua confusão adorável, sigo na frente, balançando a cabeça para me livrar dessa atenção estúpida que dou a ela. Pelo amor…

Ao passar pela terceira prateleira ao fundo, enfio os dedos entre o espaço entre a madeira e a parede e a puxo em minha direção. Ouço um arfar de Bonhwa ao que a prateleira desliza para mim e então para a lateral, cobrindo a outra e revelando a porta de madeira que fica escondida atrás dela.

- Isso é um castelo, mesmo…

- Como disse? - Questiono, franzindo o cenho por sua voz ter soado baixinho demais.

- Nada, não. - Elas passa por mim, olhando ao redor.

A sala não é nada demais, para ser sincero. Bastante ampla, mas nada perto da biblioteca principal.

Ao fundo, tem uma enorme parede onde deixo meus livros favoritos e, na lateral uma grande mesa escura de mogno, coberta de papéis até as beiras. Perto de onde estamos, dois sofás grandes fazem canto na parede e um tapete fofo cobre o chão. Dois cobertores e alguns travesseiros estão sobre os estofados, organizados como deixei. Receoso, espero sua reação em silêncio.

- Essa é a sua Bat-Caverna? - Ela pergunta e, como a curiosa que é, passa a andar pelo local, correndo a ponta dos dedinhos pelos móveis ao prestar atenção nos detalhes.

- É, digamos que sim. - Coço a nuca, limpando a garganta para continuar. - É aqui que fico quando quero me esconder e não posso sair da casa.

Ela assente e o silêncio se instala outra vez. Além do meu coração pulsando nas orelhas, o único som vem da saída de ar, que ronrona baixinho ao fazer a circulação do ambiente fechado.

- Sua mãe não entra aqui? - Ela pergunta, mexendo em alguns papéis da mesa. No susto, cubro a distância em dois passos e tiro a folha de sua mão.

Graças a deus, é uma das vazias, que tem apenas o título no meio.

Tomorrow

Dobrando o papel em dois, coloco de qualquer forma na pilha e me apoio na mesa. Ela, obviamente, entende meu comportamento e se afasta dali, indo para as prateleiras.

- O que você perguntou, mesmo? - Tento disfarçar o clima, afrouxando a gola da camisa ao questionar.

- Se sua mãe não entra quando você está escondido.

É claro que ela sabe que me escondo da minha mãe aqui, então não dou atenção a isso, e respondo logo, tentando acabar de uma vez com essa tortura sem fim.

- Ela não tem força para puxar a prateleira, e os empregados fingem que não conseguem, também, para me defender.

- Ah… Então você prende a prateleira quando passa e ela não pode te alcançar até você deixar? - Assinto, estremecendo sob seu olhar atencioso. - Que bom. Fico feliz.

Ela fala de qualquer jeito, sabe? Como quem comenta sobre o tempo ou sobre um time de futebol, mas não preciso olhar duas vezes para saber que ela ficou genuinamente feliz em saber que eu tenho onde me esconder nos dias ruins. 

É claro que ela não precisa saber que, às vezes, sou pego antes de chegar aqui e fico trancado no quarto como castigo, ou que, uma vez, Yerim pregou a prateleira do lado de fora e me fez pedir perdão de joelhos antes de me deixar sair. Nem das vezes em que ela desliga o sistema de ar e me obriga a sair para conseguir respirar, conforme a sala fica mais e mais abafada e eu começo a sufocar aos poucos.

Balanço a cabeça, espantando os pensamentos enquanto a vejo guardar um livro na prateleira, andando até o sofá e sentando ali, em silêncio.

- Você pode sentar, também? - Ela questiona, baixinho. - Vou me sentir menos intimidada assim.

- Ah… - Minhas sobrancelha sobem rápido, e minhas língua enrola ao ouvir o que ela diz. - Claro, sento sim. 

Esfregando as palmas na calça social em um movimento que certamente seria reprovado por Yerim, sento-me no outro sofá, à sua diagonal. Ela sorri nervosa e aperta os dedos entre as coxas, o que me deixa ainda mais confuso.

Ela se sente intimidada assim perto de mim? Imagina se soubesse o quanto ela própria me intimida sem parar, cada vez mais…

- Ok, para começar: não vim pedir desculpas. - Ela limpa a garganta, endireitando a postura. - Você foi um imbecil comigo na sacada, e mereceu o tratamento frio que teve.

Assinto rapidamente, concordando. Então ela ficou brava comigo.

- Eu sei. Também queria falar sobre isso.

- Você primeiro. - Ela exige, para minha surpresa. Com a fala inesperada, pisco algumas vezes antes de endireitar a postura e conseguir falar.

- Certo, ah… - Limpo a garganta de novo e aperto a calça entre os dedos ao arrumar coragem. - Namjoon me contou que você já sabe sobre Jennie, certo? - Apenas para  ter certeza, questiono, e sinto alívio e desespero ao mesmo tempo ao vê-la concordar. - Certo… Ela bateu em Jimin, mas deixei que pensassem que a culpa é minha para que meus tios não castigassem ela, ou mandassem ela embora. 

Eles acham, que a convivência com Namjoon e eu a tornou ‘bruta’ e ‘pouco feminina’ e só estão esperando um escorregão desse para tirá-la da Kyungpook, mas Jennie ama estudar ali, e não quer ter que ir embora. Tampouco eu quero que ela vá, então deixei  todos pensarem que fui eu. Infelizmente, a história espalhou rápido para os pais dos alunos, e alguém contou para minha mãe. 

Eu sabia que isso ia acontecercedo ou tarde, e fui até a sacada para não ter um ataque na frente de ninguém até o carro chegar. Jennie saiu para chamar e, quando você chegou, fiquei ainda mais nervoso.”

- Por causa do que Jimin disse?

Minha respiração prende na garganta.

- O que?!

- É… Jimin me contou muitas coisas, Yoongi. Uma delas foi a babaquice que te disse. - Ela torce os lábios bonitos, encolhendo os ombros. - Eu sinto muito.

- Achei que ele não te contaria essa parte. - Digo, coçando a nuca nervosamente.

- Ele me contou todas as partes. - Ela rebate, apertando os joelhos. - Eu entendi porque você estava tão nervoso, então. Sua mãe te castigou?

Sim.

- Não. - Minto, mesmo que a verdade tenha pendurado na ponta da minha língua. - Ela só gritou um pouco, o de sempre.

Ela levanta apenas uma sobrancelha, claramente desconfiada de minha resposta.

- Certo. - Apenas do olhar, não questiona, assentindo ao aceitar a resposta que dei. 

- Mesmo assim, eu sinto muito. - Falo rápido, atropelando as palavras enquanto rezo para ela me entender. - Sei que não tenho culpa do que ela me faz sentir, mas você também não tem. Estou trabalhando nessas explosões estúpidas. Me desculpe, de verdade.

Quando curvo a cabeça para expressar meu arrependimento, sou puxado de volta quando, distraidamente, sinto seus dedos frios tocarem minha nuca.

- Sua raiz está aparecendo… - Fala, sorrindo doce. - Vai deixar crescer?

- Ah… - Enrugo a expressão, percebendo sua tentativa de esquivar o assunto. - Não sei, estou decidindo, ainda.

- Devia deixar. - Ela sorri, batucando os dedos nas coxas ao que continuo sentindo meu coro arrepiado por seu toque breve em meus fios claros. - Deve ficar bonito moreno.

Arregalo os olhos, sentindo meu interior se revirar em milhares de nós enquanto, sem dúvida, minhas bochechas esquentam. 

- Ah… Certo. Obrigado.

O silêncio se estende conforme ela começa a brincar com uma pequena peça amarela pendurada em uma correntinha no seu pulso. Distraído, foco em seus dedos girando a pequena florzinha, e não digo nada por longos segundos, também.

Infelizmente, o silêncio com Bonhwa não é uma coisa que consigo apreciar. Ainda não.

- Então… - Aperto os lábios, aprumando a postura ao limpar a garganta e inclinar a cabeça, chamando sua atenção. - Está tudo bem, agora?

- Sobre sábado, sim. - Ela coloca, me deixando entender que mais alguma coisa a incomoda. - No entanto…

Em silêncio, completamente congelado, escuto-a falar o que mais a incomoda tanto.

Ela fala sobre Taeyeon, sobre meu trauma de infância e sobre meu relacionamento complicado com Jimin. Ao final, me dá a última facada ao dizer:

- Eu quero ser sua amiga, Yoongi. - Ela encolhe os ombros ao coçar a nuca, lambendo os lábios vermelhos. - Mas só posso fazer isso se começar a ouvir histórias sobre você, vindas de você, entende?

E entendo, é claro que sim. Depois de toda essa enxurrada de informações, me sinto até meio zonzo ao olhar em seus olhos achocolatados e ver ali toda a atenção que deposita em mim. Por isso, me sentindo seguro para ser sincero com ela, justamente por toda a sinceridade que acaba de ter comigo, amoleço na poltrona ao pedir encarecidamente:

- Existem muitas coisas sobre mim que você ainda não sabe, e mais ainda que não sei sobre você. - Aperto os lábios, buscando as palavras que sempre me sobram, mas agora parecem ter desaparecido. - E eu gosto de você, Bonhwa, mas não estou pronto para ter essas conversas agora.

Ela confirma, agitando a cabeça de leve. Assisto quando se levanta e, com seu jeitinho todo atrapalhado, para diante da porta, pedindo silenciosamente que abra para ela.

O faço, e quando fechamos tudo e voltamos para a entrada da biblioteca, ouço a voz alta de sua mãe anunciando que está vindo buscá-la para irem embora. Apavorado, seguro seu pulso, bem sobre a pulseira que me pinica de leve e, olhando fundo em seus olhinhos confusos, toco sua bochecha macia ao dizer:

- Seja paciente comigo, ok? - Escorrego a mão pela pele que esquenta sob meu toque, e sorri ao perceber isso. - Se não fugir de mim, vou deixar você me conhecer.

Desesperado, tremo dos pés a cabeça ao que sua mãe aparece na entrada do corredor, e olha confusa para nossa posição. Bonhwa segura meu pulso e o afasta de seu rosto, e com isso solto seu outro braço, vendo o pingente escorregar a balançar delicadamente contra sua pele.

Entendendo isso como o “não” que ela tem direito de me dizer, me afasto dois passos e puxo as mãos para cruzá-las atrás das costas, mas sou impedido quando, de supetão, seus dedos acariciam meu pulso, que ainda segura. Levanto o rosto em um pulo e, para piorar meu estado que já beira o catatonismo, sinto sua palma quente tocar meu ombro ao que fica na ponta dos pés e, carinhosamente, beija minha bochecha, que fica formigando

Porra...

- Vou ser paciente, Yoongi. - Hipnotizado, tremendo e chocado, escuto com devoção quando sua voz macia diz tudo aquilo que queria ouvir a noite inteira. - Vou esperar para conhecer você, no ritmo que você preferir.


Notas Finais


[*Na Coreia, os nomes tem duas sílabas: a primeira é o nome da GERAÇÃO, ou seja, se a protagonista tivesse irmãs, todas elas teriam o nome iniciado em "Bon", assim como sua mãe tem irmãos iniciados em "Jeong", e assim vai; a segunda, é como se fosse o seu verdadeiro nome. É por isso que os coreanos costumam se apelidar na última sílaba: Jeongguk (Gukkie)/ Namjoon (Joonie).

O nome da protagonista é Bon-Hwa, o da mãe dela é Jeong- Hwa. A mãe deu a ela a segunda sílaba igual como uma forma de dar a ela o mesmo nome que o seu. Entendem?]

ENFIM, VINTE ANOS NA CARA DESSA PIRADONA

O que acharam do capítulo de hoje, meus amores?

Eu só queria dizer que sou completamente apaixonada pelo meu bebê Yoongi. Vocês gostam das narrações dele?

ENFIM!!!!!!

Me digam o que acharam e me perdoem o atraso rsrsrs

Vejo vocês na semana que vem uwu <3


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