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História Tormento - Entre crenças e medo


Escrita por: trishakarin

Notas do Autor


Passando correndooooo :*

Capítulo 27 - Entre crenças e medo


- Que história?

- Antes da maldição.

Manoel riu e virou-se em sua direção.

- Não há história antes da maldição, garota. Eu nasci quando nossa terra já estava amaldiçoada. Quando nosso povo sofreu. Eu nasci no meio da merda - disse ele decepcionado.

- Foi jovem um dia… casou-se… teve uma filha, da minha idade. Me conte.

Lauren sentou-se no chão, estava curiosa sobre a vida daquele homem e conversar com ele o faria abrir uma porta, antes jamais aberta, a caminho de confiar nela. Precisava que ele gostasse da garota, criasse algum vínculo que o fizesse repensar. Os homens daquele local parecem bastante fiéis a suas famílias. Sua mente fechada não lhe dava autorização para raciocinar, mas o coração daquele velho não parecia fechado. Havia algo nos olhos daquele homem que expunha uma dor sem tamanho. Uma decepção exorbitante.

- Para que?

- Porque eu quero entender a história do homem que quer tirar a minha vida.

Ele a encarou surpreso, agachou-se a sua frente, tocando o piso de terra sob seus pés e uma expressão desconfiada e triste tomou conta de seu rosto.

- Eu não quero tirar sua vida - ele a encarou - Eu tenho que tirar. Será que é tão difícil entender isso? Quando faz show sem a menor vontade… deixa de fazer só porque não tem mais vontade?

- É diferente, é meu trabalho.

- Não é diferente… - ele sorriu - Eu sou um homem de Deus e é meu trabalho obedecê-lo. Jurei a esta terra que faria o que ele mandava.

- Quem disse que ele quer que mate?

- Não mato, já disse. Entrego a Deus quem ele escolhe.

- Mas e se não for a ele que está servindo?

- Do que está falando, garota?

Manoel levantou-se furioso, fuzilando-a com o olhar. Claramente falara algo que fugia ao seu padrão. De fato, quando se pega um fanático religioso, por mais que o que façam seja crueldade, mas se for em nome do senhor, como dizem, é para o bem. Sem pensar que podem estar seguindo o rei errado. Lauren desesperou-se com a gafe e apressou-se em consertar.

- Perdoe-me… é que não entendo como matar uma pessoa possa ser obra de Deus.

- Quantas vezes preciso repetir que eu não mato…

- Que entregue a Deus, que seja. Mas quem te disse que isso era obra de Deus? Não está na bíblia.

- A Bíblia? Um livro escrito por pecadores? Deus não fala dessa forma, Deus fala pela natureza. Deus é dono de tudo isso aqui. Quando o primeiro imigrante foi entregue a Deus, nossas terras voltaram a produzir frutos, vegetais, água. Temos tudo o que precisamos em nossas terras tão quentes. Temos praias maravilhosas, repletas de porcos sujos que vem das terras de vocês. O que procuramos limpar, toda a sujeira que trazem a nós.

- Me desculpe, Manoel - Lauren disse baixinho - Eu realmente não sabia dessa crença de vocês…

- Crença? Isso não é uma crença - ele riu - Esse Deus de vocês nos obrigou a agir por ele… ele não é esse santinho que todos vocês pensam que ele é. Ele é um canalha, que quando morrer, quero ficar frente a frente e dizer tudo o que me engasga no peito. Eu não quero te matar. Eu não quero matar a sua amiga. Eu jamais quis matar qualquer pessoa, estou sendo obrigado pela sobrevivência da minha família.

- É estranho, senhor. As pessoas da capital não se importam com imigrantes e suas vidas seguem normalmente. Será que aceitar a condição que te impuseram não seria ir contra o que acredita?

- O que acredito não permite que essa terra brote.

- Olha a vida que o senhor leva - Lauren retrucou - Fica aqui cuidando do lugar como se fosse um criminoso. Deus jamais aceitaria essa condição para ter quem ele quer. Deus leva quem ele acha que está pronto para ficar ao seu lado.

- CALE A BOCA - ele gritou - DEUS NÃO É ESSE FRANGOTE QUE VOCÊ FALA.

Sua respiração alterou-se e Lauren percebeu que era hora de parar. Baixou os olhos, respirou fundo. Não era um pessoa crente, nem mesmo fiel a qualquer religião, mas acreditava em um Deus que com certeza não seria responsável por atrocidades. Manoel seguiu mais uma vez para a porta, saindo e fechando-a a chave logo depois. Os passos ainda podiam ser ouvidos, desaparecendo segundos depois.

No abrigo, Ellen olhava cada espaço a procura de uma frecha que pudesse dar a liberdade. Mas nada foi encontrado, era uma espécie de caverna muito bem aproveitada. Camila estava sentada em um dos cantos, seu rosto já tomado pelo suor. Se não recebessem água durante o tempo que ficassem ali, morreriam rapidamente de desidratação. Ainda algemadas, o desconforto era ainda maior. Ellen subiu os degraus novamente até a grade, procurou por algum dos guardas que José alertou encontrarem-se na parte externa e não havia ninguém. Bateu no metal com a algema e nenhum sinal. Estavam abandonadas ali. A certeza de que aqueles cadeados não seriam quebrados ou abertos era tão grande que eles não se preocupavam em manter a guarda ali. Ellen bateu novamente e dessa vez um homem barbudo apareceu. Os dentes amarelados e o olhar irritado.

- O que você quer? - perguntou agressivamente.

- Precisamos de água - Ellen pediu.

- Não tem água pra vocês - ele riu com desdém.

- Se não nos derem água, estaremos mortas antes do entardecer. Farei questão de matá-la e me matar em seguida. Seu chefe não ficará satisfeito com o que vai encontrar, ainda mais de mim, que tenho informações que ele com certeza ficará feliz em saber.

- Aqui a gente não trabalha pra você, sua puta - disse furioso - Se quiser se matar, se mate, mas não vai ter água para vocês.

- Eu irei esperar por uma hora. Se essa água não vir… você vai esta encrencado.

Ellen desceu sem aguardar qualquer resposta. Camila olhava para a militar com o olhos arregalados e uma expressão preocupada no olhar. Se a mulher havia falado alguma verdade, não poderia aceitar aquela condição, mas rapidamente Ellen explicou.

- Não faria nada com você, Camila - disse - Apenas preciso que ele nos traga alguma bebida ou realmente estaremos encrencadas.

- Não há nenhuma maneira de fugir, há?

- Infelizmente não. Mas daremos um jeito, não se preocupe.

- Ellen - um sussurro soou no canto de pedra. Mas próximo ao telhado.

Ellen olhou para trás surpresa, uma sombra impedia a entrada de luz em um dos cantos, próximo a madeira. Era alto, não alcançaria tão facilmente. Correu até o local, deixado livre por Camila que ao ouvir o chamado levantou-se. Pisou em uma das pedras com uma ondulação externa maior, segurou-se em uma das bases e jogou seu corpo com toda sua força para mais alto, alcançando a madeira que montava o telhado.

- Sarah? É você?

- Sim, meu amor - ainda sussurrando - Preciso ser rápido, o cara que tá de vigília aqui voltará logo.

- Como nos encontrou?

- Eu vi que eles a levaram e pela quantidade de pessoas, não teria a menor condição de protegê-las. Me vi na obrigação de esperar ver o que aconteceria. Vi quando a trouxeram para cá.

- Quantos são? - Ellen perguntou curiosa.

- Muitos, Ellen. Mas eu ouvi que no cair da noite, quase todos seguem para os vilarejos onde moram com suas famílias. Aqueles que não têm família ficam aqui - disse com certeza - Quando a noite cair, prometo tirá-las daí.

- É arriscado. Terá alguém aqui, Sarah.

- Não, eles são bastante descuidados. Não acreditam no erro e não aceitam ordens. Assim que eles derem algum descuido, virei te buscar.

- Precisa ajudar Lauren - Camila pediu - Sabe-se lá o que aquele velho está fazendo com ela.

- Eu irei vê-la agora ao anoitecer. Ela está no centro desse acampamento, seria quase impossível libertá-la tão rápido.

- Mas eu posso cuidar de Camila, mas Lauren encontra-se numa situação muito pior que a nossa, Sarah, você precisa salvá-la.

- Farei isso, não se preocupem. O homem está vindo. Eu te amo, Ellen.

- Por favor, se proteja - Ellen pediu desesperadamente - Esconda-se e fique viva, pelo amor de Deus.

- Farei isso! Cuidem-se.

O som de folhas sendo esmagadas pelos pés de Sarah anunciaram sua partida. Cerca de dois minutos depois ouviu o som do cadeado bater na base de metal. Ellen desceu rapidamente e correu para as escadas avistando o mesmo Ogro com quem falara mais cedo. Ele trazia uma garrafa de dois litros de água nas mãos e seu olhar era de puro orgulho e rancor. Entregou por entre as grades, Ellen pegou apressadamente antes que aquele homem desistisse da ideia e desceu as escadas em direção a Camila.

- Não pense que foi sua ameaça, dona - ele disse irritada - Eu não to muito afim de sentir cheiro podre saindo daí e muito menos ser obrigado a limpar a sujeira.

- Não se preocupe, ninguém saberá o que aconteceu aqui.

- Amanhã seu pescoço estará a venda no açougue, patroa - ele gargalhou - O seu e o da franguinha aí.

Os passos na terra seca soaram firmes, se distanciando com o passar do tempo. Logo o silêncio e apenas o mover das árvores se tornavam notáveis. As vozes de homens distantes disparavam, alertando a presença de diversos deles. Ellen entregou a garrafa de água e Camila a bebeu com a garganta implorando por líquido. Nunca sentira um prazer tão grande quanto aquele. Entregou para Ellen, que fizera o mesmo, mas bebendo apenas o essencial, pois sabia que outra daquela não viria.

Não podia imaginar o que aconteceria dali pra frente, mas confiava sua vida nas mãos de Sarah. Sabia que ela conseguiria resolver tudo e as tiraria daquela situação pouco confortável. Sentou do outro lado, olhando tanto para a grade que as separavam da liberdade, quanto do topo por onde teve contato com Sarah há alguns instantes. Seus olhos ardiam e o cansaço lhe tomou conta.



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