História Tormento - As visitas de Lauren começam

Camila havia adormecido e permanecia deitada no sofá da sala de espera até que o dia amanheceu. O sol invadia o salão principal pelas imensas portas de vidro que separavam a parte externa do interior do prédio. Haviam quatro seguranças parados a porta e a garota havia notado um acúmulo de pessoas do portão do estacionamento para fora. As entradas estavam sendo impedidas. Fãs e jornalistas começavam a juntar-se ali e logo sairia de controle. Talvez o vídeo não fosse uma ideia tão boa assim.

A cantora levantou-se e seguiu até o elevador. Não sabia quantas pessoas poderiam ficar no quarto com Lauren, mas sabia que precisaria informá-la sobre o que estava acontecendo do lado de fora e prepará-la para possíveis assédios. Apertou o número três e sentiu a cabine impulsionar-se para cima. Não demorou muito e já estava no andar, bem movimentado por conta das enfermeiras e médicos que circulavam, agora com mais quantidade e frequência. A madrugada naquele lugar era notoriamente calma. Atravessou o longo corredor até alcançar a última porta, bateu suavemente na porta, a fim de alertar sua entrada e quando colocou a cabeça para dentro, avistou a mãe de Lauren adormecida na poltrona ao lado da cama e cantora desperta, como quem não dormira a noite toda.

- Bom dia - Camila disse sem saber que tom de voz usar.

Sussurrou por achar mais conveniente, tendo em vista que sua mãe adormecia ao seu lado. Atravessou o quarto em sua direção e sorriu ao notá-la mais corada. O rosto de Lauren estava melhor, isso estava claro, porém sua expressão era fechada e não havia oportunidade nem mesmo de Camila sonhar em esquecer o tipo de conversa que haviam tido anteriormente. Era outra mulher ali a sua frente.

- Bom dia, Camila.

Camila. Lauren jamais a chamava de Camila com aquele tom de voz. A seriedade em seu rosto e a falta de delicadeza que vinha mostrando durante os dias na fuga do México eram tão doloridas que Camila preferia sair dali correndo e nunca mais voltar.

- Eu só vim alertá-la de uma coisa. Eu acabei fazendo um vídeo ontem. Um jornalista resolveu aparecer aqui na madrugada e acabou causando um pouco de tumulto.

- Como assim?

- Ele disse que nosso sequestro e a divulgação de nossas mortes foram forjadas a fim de vender mais discos e promover a banda.

- Como é? Quem é esse idiota?

- A Sarah e a Ellen colocaram ele pra correr. Foi até divertido! Mas antes que ele acabasse divulgando esse tipo de notícia, achei mais conveniente fazer um vídeo ao vivo para que todos entendessem melhor a história. Quero dizer, não disse tudo, disse somente o básico e o necessário para que sossegassem. A Ellen me ajudou!

- Tudo bem. E o que devo ficar alerta?

- Bom, acabou que já têm pessoas lá fora querendo nos ver.

- Nossa.

- Talvez outras pessoas apareçam, mas o hospital já colocou mais seguranças na portaria para…

Alguém havia batido suavemente na porta. O quarto estava levemente escurecido, pois as janelas continuavam fechadas e o ambiente estava iluminado somente pelas pequenas frestas de luz que escapavam pelas cortinas. Camila e Lauren viraram para o lado olhando para a porta e a mesma se abriu. Uma garota magra, levemente alta entrou, os cabelos esvoaçantes e um tremor em suas mãos. Ela atravessou o quarto apressadamente quando avistou Lauren e praticamente saltou sobre sua cama.

Camila a encarava surpresa acreditando ser uma fã, mas pela expressão de Lauren, ela sabia muito bem de quem se tratava. Nesse instante o coração de Camila disparou, embora não soubesse ainda de quem se tratava, sentia ali a tensão se acumular no rosto de Lauren, antes que a garota segurasse e puxasse para si, selando seus lábios.

Camila sentiu as lágrimas invadirem seus olhos e ali, naquele instante, todas as suas dúvidas haviam sido esclarecidas. Não havia dificuldade em Lauren lidar com a situação, mas sim lidar com o fato de terem voltado a uma realidade pela qual não sabiam se voltariam um dia. A garota sabia que possivelmente morreria no México e por conta disso libertou-se, porque não imaginava que passaria por aquilo e agora estavam ali, juntas e distantes ao mesmo tempo. Tudo o que havia vivido com a colega acabaria se tornando uma história de terror, incluindo o relacionamento que nascera entre elas.

Percebendo que já não cabia mais sua presença dentro daquele quarto, embora Lauren permanecesse encarando-a, ainda que seus lábios estivessem colados aos da garota, Camila deu alguns passos para trás enquanto densas lágrimas escorriam pelo seu rosto e seu corpo segurassem os soluços de seu pranto contido. A cantora deu as costas e deixou o quarto.

Lauren sentia seu coração disparar e quando Lucy afastou-se dela, olhou para o lado avistando sua mãe ainda adormecida, por mais incrível que pudesse parecer, a mulher sequer abrira o olho para verificar toda aquela movimentação. Olhou para trás, vendo que a porta estava fechada e que sua colega de trabalho havia deixado o quarto, quando enfim, olhou Lauren com os olhos marejados.

- Eu nem estou acreditando - deixou que as lágrimas escorressem e claro, Lauren sabia do que se tratava - Eu não consigo acreditar nisso.

- Como soube?

- Meu amor, quando você foi sequestrada, eu simplesmente entrei em pânico. Quando anunciaram que haviam encontrado seus corpos, eu juro que quis me matar. Eu não podia acredita que depois de uma briga, você resolveu morrer - as lágrimas escorreram e a agonia em sua voz a elevou, fazendo a mãe de Lauren despertar.

- Lucy, querida - Clara disse preguiçosamente - Já amanheceu? Graças a Deus, vou atrás do médico saber quando que posso te levar para casa, meu anjo.

A mulher beijou o alto da testa da filha e em seguida de Lucy, deixando o quarto. Lucy sorriu docemente, antes de voltar a olhar a cantora, que ainda a encarava com o olhar vazio e distante. Alguma coisa despertou dentro de si e ainda não sabia explicar bem o que era. Sabia apenas que seu coração partiu ao ver as lágrimas no rosto de Camila, mas ao mesmo tempo sentia-se destruída vendo Lucy daquela maneira.

- O que aconteceu, Lauren? - perguntou visivelmente preocupada, pronta para escutar o que quer que fosse - O que aconteceu lá?

- Como soube de tudo?

- De tudo o que?

- Como soube que eu estava aqui?

- A mãe de Camila está falando com os parentes e amigos, acabaram me avisando e aqui estou. Lá fora está o maior inferno, muitos fãs e a imprensa quer entrar a qualquer custo, mas a direção do hospital está impedindo a entrada deles por hora. Parece que teve alguma confusão com jornalistas e eles estão barrando a maioria deles.

Lauren silenciou-se e voltou a fitar a parede, como vinha fazendo costumeiramente até aquele momento. Sua cabeça parecia querer explodir e parecia que seu funcionamento não estava lá nas melhores condições. Lucy pareceu notar e sentando-se na cama, tomou sua mão, segurando-a com firmeza enquanto com a mão livre tirava o fio de cabelo que caia pelo seu rosto com delicadeza.

- O que aconteceu lá, Lauren?

- Não sei se quero conversar sobre isso agora, Lucy - disse ela distante.

- Eu preciso entender o que aconteceu. Você sumiu por dias, meu amor. Eu achei que estivesse morta, eu estive em seu enterro, eu quis morrer quando…

- Você quis morrer? Eu quase morri, Lucy - disse com arrogância - Eu quase morri, literalmente. Por qual razão você quis morrer?

- O que aconteceu com você? Parece outra pessoa, Lauren.

- Eu… eu não sei o que está acontecendo, eu preciso de um tempo… eu…

De repente as lembranças tomaram conta de sua mente e como uma bomba, todo o momento em que foram pegas na área embaixo do palco e levadas para tão longe, onde sequer saberiam como voltar, desde a fuga, os esconderijos, a fome, a sede, a sujeira. O sol quente, a chuva raza, desde o olhar apreensivo e o beijo doce em Camila. Fechou os olhos enquanto os mesmo eram tomados por lágrimas densas. Jamais sentira algo como aquilo por ninguém, nem mesmo por Lucy que por tanto tempo fora sua parceira, até que seu trabalho tornou-se um problema.

- Eu sei o que precisa, amor.

Lucy aproximou-se da garota, tocou seu rosto suavemente, aproximou-se com os lábios sedentos, tocou delicadamente com os seus, beijou-a com doçura, uma doçura que Lauren relembrou com carinho. Não havia nada de errado com Lucy, não havia rancor, nem mesmo mágoa. O término, pouco antes do show no México fora amigável e unicamente pela agenda de shows da garota. Um relacionamento era algo bastante complicado e difícil ser mantido quando uma das partes nunca está presente. O assédio de fãs ou outros famosos causava certa insegurança e a mídia constantemente em cima, querendo saber tudo sobre elas, causava desespero, quando os empresários insistem pelo sigilo. Ninguém sabia sobre Lauren, embora a garota não se preocupasse em ocultar, apenas não afirmava aos quatro cantos.

O beijo inicialmente tão saudoso e doce, agora tornou-se ardente. A mão de Lucy lhe tocava a nuca, fazendo-a intensificá-lo ainda mais. Com os olhos cerrados, as lembranças que vinham na mente da cantora nem de longe eram semelhantes as da parceira. Sua língua sedenta, quente, mas tão diferente, o frio na barriga lhe causava saudade e de repente uma confusa na mente, que a fizera interromper o beijo anunciando uma falta de ar.

- Eu achei que fosse morrer - disse entre lágrimas encarando Lucy com angústia - Eu achei que fosse morrer lá, Lucy. Por isso fiz tudo o que fiz - soluçou fazendo uma expressão de dor - Por isso fiz tudo o que fiz…

Lucy tocou seu rosto com carinho, puxando-a para um abraço apertado, tomando-a em seu seio, sentindo seu coração bater, como um grito que a trazia de volta a realidade, como se houvesse saído de um pesadelo.