História Tormento - Uma conversa fez-se necessária

Lauren encarou Camila com certa curiosidade. Havia um silêncio entre as duas, o rosto agora limpo, os cabelos penteados, fugiam da imagem que vinha tendo nos últimos dias. Nem mesmo elas sabiam quanto tempo haviam passado na floresta, mata, seja lá o que fosse. Isso não era mais importante, os dias não eram mais importantes, mas voltar a vida real, voltar a sua história antiga, não parecia mais encaixar.

- Me sinto uma mulher que acabou de acordar de um coma e que tudo ao seu redor não parece mais encaixar-se em minha vida - Lauren disse deixando as lágrimas rolarem - Tudo o que vivemos, parece se encaixar melhor. Não que eu queira voltar para lá, mas eu não sei o que fazer.

- O que está te machucando tanto, Lauren? Eu juro que estou tentando entender, mas não consigo.

- Sei que ficou chateada com a presença de Lucy, eu sei disso. Eu também ficaria em seu lugar - Camila baixou os olhos visivelmente decepcionada - Nós realmente havíamos terminado antes de chegarmos ao México…

- Escute - Camila interrompeu - Fico agradecida pela confissão, sei que não seria hipócrita o suficiente em dizer que terminaram sem isso ter acontecido e conhecendo você como conheço, tenho certeza que não teria me beijado se não tivessem terminado…

- Eu teria te beijado - Lauren disparou - É claro que eu teria te beijado, Camila.

- Estaria traindo sua namorada - chocou-se.

- Como saberia? Eu senti uma necessidade absurda de sentir seus lábios, de sentir seu corpo. Eu me vi completamente apaixonada por você e não teria te beijado caso tudo aquilo não houvesse acontecido, claro que teria terminado ou conversado antes com Lucy. Mas pelo amor de Deus, Camila. Lá eu nem sabia se estaria viva e eu não poderia morrer sem saber que o que sentia era recíproco. Eu voltei pra cá - disse exaltando-se - Eu voltei com vida para cá e eu sinceramente não sei o que fazer. Parece que contos de fadas têm que acabar assim. Nós duas deveríamos ter morrido mesmo e nossa história jamais acabaria.

- Quem disse que tem que acabar?

- Não será a mesma coisa.

- O que? Quer fugir de homens loucos que querem dar um tiro no meio de nossas testas? É isso que quer? Quer aquele tipo de envolvimento? Lauren, eu posso te beijar aqui, posso te beijar em meu quarto. Eu posso fazer amor com você em cima de uma cama, eu jamais trocaria isso para viver em fuga. Eu não queria morrer, jamais quis. Você quis?

- Eu não quis morrer… eu só…

- Lauren… eu sei que está visivelmente mais abalada com tudo que eu, mas sinceramente, está na hora de colocar os pés no chão novamente e encarar tudo o que está acontecendo. O que fez com Lucy está errado e sabe tão bem quanto eu. A garota realmente gosta de você e veio correndo pra cá assim que soube. Ela está aqui com você e tenho certeza que ficará ao seu lado todo…

- Você esteve tão ao meu lado quanto ela, Camila - cortou Lauren revoltada - E não existe má vontade da minha parte em nada do que aconteceu. Será que não enxerga isso?

- Eu sei que não existe. Mas caramba, Lauren. Não foi fácil pra mim tampouco e eu não consigo tentar ficar bem. Eu vou superar tudo, você vai superar tudo.

- Eu cuidei de você Camila - gritou Lauren sentindo seu peito rasgar de dor - EU CUIDEI DE VOCÊ O TEMPO TODO.

Camila parou tudo o que pensava e tudo o que passava por sua cabeça. Claro que cuidou, sabia muito bem disso, mas a arrogância em sua voz era fora do comum. Como poderia ter levantado a voz daquela maneira e agido assim? Lauren parecia ter percebido a reação da jovem e ficou estática encarando-a, sentindo sua respiração descompassada e seu abdômen, recentemente costurado doer.

- Eu cuidei de você - respirou fundo - Eu não consegui dormir, relaxar, eu precisava te manter viva e agora não preciso mais. Agora você está bem e cada vez mais longe de mim.

- Eu estou longe de você? Pelo amor de Deus, Lauren, você que está me mandando para longe de você, será que não vê isso?

- Você me quis porque eu cuidei de você. Isso tem um nome, quando nos apaixonamos por aquele que nos protege. Não porque amamos a pessoa, mas porque nos sentimos seguros…

- Ah, cala a boca - irritou-se Camila - Você acha mesmo que eu só quis estar com você por estar em perigo? Vai mesmo esquecer tudo o que se passou naquela cidade? Tudo o que aconteceu antes de chegarmos ao show e sermos levadas pra longe? Olha Lauren, se você quer mesmo ficar com esse jogo, acreditar nessa idiotice que está pensando, é melhor eu nem me meter mais. Se não acredita que meu sentimento foi puro desde o início, eu sinceramente não posso fazer nada. Fiz tudo o que pude para estar do seu lado, cuidar de você, estar presente até mesmo quando sua namoradinha entrou na jogada. Eu estou aqui, dando tudo de mim por você, dando até o que não tenho mais. Não passou por toda aquela porcaria sozinha, nós passamos por tudo isso juntas, se você me protegeu, muito obrigada, mas eu tenho certeza que fiz o mesmo por você e você não vai ignorar isso, não vai mesmo.

Camila olhou para cima, como quem buscava forças para continuar falando, evitando ainda que as lágrimas tomassem seu rosto em uma enxurrada sem limites. Respirou fundo como se há muito não o fazia, baixou os olhos encarando um Lauren surpresa, com tanta irritação que sentia os olhos tornarem-se vermelhos, assim como sua pele, que esquentava rapidamente. Entendia o lado da amiga, claro que entendia, mas da mesma maneira que não estava conseguindo lidar bem com as coisas, Lauren precisava entender que não estava sendo nada fácil para ela tampouco.

- Eu espero que você fique bem e se recupere rapidamente - disse Camila com a voz mais calma - Porque eu sinceramente estou caindo fora, estou desistindo de tentar lutar para estar com você. Volte a sua vida como ela era antes, esqueça tudo o que vivemos, enterre aqueles dias. Consigo te compreender, Lauren, não pense que estou sendo egoísta. Eu sei o quanto foi difícil para você, mas se não consegue separar as coisas, eu também não consigo ficar indiferente. Eu me apaixonei por você! E eu não posso simplesmente deixar isso de lado, portanto não será tão fácil como pensa.

Lauren ficou em silêncio. Não por não ter nada a dizer, não era isso, mas porque simplesmente os gritos e as palavras pareciam se prender em sua garganta com tamanha força que já não tinha mais. Viu a garota seguir pausadamente até a porta do quarto, parar enquanto sua mão trêmula pressionava a maçaneta, rezando e esperando por um chamado, por palavras de afeto. Talvez um pedido de desculpas? Camila sequer olhou para trás, embora esperasse que a voz da amada disparasse. Nada aconteceu. Não fora impedida de abrir a porta e levar seu corpo para a parte externa e fechar a porta atrás de si. Ainda esperou frente ao quarto, encostada na parede, chorando baixinho percebendo que tudo o que havia enchido seu coração de alegria, agora a despedaçava com tanta dor, que curvou-se para frente.

- O que houve querida? - Clara aproximou-se de Camila carinhosamente, tocando-lhe o rosto.

Camila ergueu os olhos olhando-a. Os mesmos olhos de Lauren. Aquele tom tão vibrante e chamativo. Demorou-se alguns segundos, que pareceram horas, olhando para aquela mulher, que curiosa, pegava em seu ombro tentando acalentá-la.

- Aconteceu alguma coisa com Lauren? - desesperou-se.

- Não - prontamente respondendo, engolindo uma dor que lhe torcia o coração - Não, ela está bem. Tudo o que aconteceu ainda…

- Ah, querida, entendo, claro que entendo. Tudo ficará bem, logo voltarão a vida normal e tudo isso não passará de uma triste passagem na história de vocês.

Uma triste passagem. Talvez fosse isso que passava pela cabeça de Lauren, mas Camila já nada mais poderia fazer, a não ser entregar ao tempo que ele mesmo tomasse uma decisão e encontrasse a solução. Dizem os bons ventos, que a quando o final não é feliz, é porque ainda não acabou. Um velho ditado, talvez, mas que Camila precisava apoiar-se para não enlouquecer.

Sorriu para a mãe de Lauren e caminhou pelos corredores. Entrou no elevador apressada, querendo fugir dali, sair correndo. Ir para o mais longe possível da garota que simplesmente torturava seu coração. Quando as portas de metal do elevador se abriram, os olhos baixos e desanimados de Lucy, que tinha o corpo curvado, visivelmente abalados com os últimos acontecimentos, por impulso deram um passo para frente e quando percebeu a presença de Camila, assustou-se.

- Desculpe… eu…

- Não precisa pedir desculpas, Lucy - disse Camila firme - O que fazia no segundo andar? - perguntou curiosa.

O segundo andar era responsável pela psiquiatria do hospital e tendo em vista os olhos vermelhos da garota, logo notou que havia algo de errado com ela. O elevador apontava a chegada ao térreo, onde encontrava-se o salão de espera. Ainda que seu corpo a impulsionava para longe, queria poder ajudá-la. Ela queria a mesma mulher que Camila e isso já era razão para inimizades. Mas Lucy não tinha culpa, a garota sequer sabia da relação entre as duas e jamais imaginaria que Camila havia tido qualquer tipo de envolvimento com a colega de trabalha. Era extremamente compreensível a dificuldade de Lucy em entender a razão de tanta rispidez por parte de Lauren.

- Não estou muito bem - disse ela com a voz rouca.

- Quer conversar?

Lucy levantou os olhos surpresa. Não tinha qualquer tipo de amizade ou vínculo com nenhuma integrante do grupo. Lauren sempre mantivera isso bem separado. Seu trabalho jamais se misturaria com sua vida pessoal e talvez isso levou ao término delas. Não poderia jamais acompanhá-la em shows ou até mesmo acalentar-se sabendo que a garota não paqueraria fãs em encontros. Jamais saberia, porque Lauren jamais permitiu esse tipo de aproximação.

- Talvez… - olhou curiosa para Camila, que não alterou sua postura - Se realmente for uma oferta de coração.