Selena Gomez Point Of View
— Então? — o impacto posterior à queda da minha mala sobre o carpete traz consigo o silêncio que reflete a apreensão nos globos azulados da loira.
Sob o meu olhar inquisitivo, Ashley engole o seco, transmitindo toda a sua carência de firmeza para me responder.
— Eu não sabia que ele viria. — reviro os olhos ante à sua justificativa, a loura percebe a minha impaciência, o que aumenta o seu nervosismo com a situação. — Sel, eu juro que não sabia. Mas não era você que não queria estar sempre perto dele?
Ela ergue uma sobrancelha, fitando-me com desconfiança. O meu foco redireciona ao chão, incomodada com aa lembranças que assombram os meus pensamentos.
— Eu estava sendo idiota. — murmuro contragosto.
— Será que vocês não podem passar dois dias convivendo civilizadamente?
Um olhar piedoso é sustentado em sua face límpida, em (força), ela entrelaça as duas mãos e as ergue próximas ao queixo.
— Desde que ele fique longe o máximo possível.
Dois toques secos ecoam, em seguida, giro o corpo na direção contrária à tempo de ver Ryan enfiar metade do corpo para dentro do quarto.
— Posso? — assinto e suponho que Ashley faça o mesmo ao vê-lo adentrar.
O louro não aparenta notar o clima de tensão que se propaga no cômodo, no entanto, o sorriso oprimido estampado em sua face dá indícios de que sua função é transpassar alguma notícia que possa vir a ser desagradável.
— Você vai ter que ficar no quarto com o Chaz. — ele avisa, por fim. — Nós não sabíamos que você iria vir, não tem quartos o suficiente.
— Eu tenho outra opção?
— Ficar com o Justin.
O arrepio que percorre com velocidade a minha espinha não deixa rastros de significados, contudo, a idealização em dividir a cama com o Bieber causa-me um fervilhamento no cérebro, trabalhando em pensamentos conturbados.
Não, definitivamente isso é ruim.
— Eu vou adorar dividir o quarto com o Chaz.
O casal anui com a cabeça, decididos a não questionar a minha resposta.
Sem mais prescrições, rumamos ao andar inferior, onde os dois últimos permanecem.
Por sua visão periférica, Justin nota a minha aproximação e, de imediato, o sorriso desmancha em sua face risonha. A cozinha é banhada pelo silêncio e, evitando algum possível constrangimento, o Butler decide quebrá-lo.
— Somers, a Selena vai ficar no seu quarto. — avisa, enquanto movimenta-se pela cozinha em busca de um copo. — Aproveite, é o máximo de presença feminina na sua cama que você terá em muito tempo.
A brincadeira arranca-nos algumas risadas, ao me aproximar do mesmo, Chaz envolve o braço direito por mei quadril, aproximando-me de seu corpo.
— Que honra ter sido escolhido! — ele brinca ao fazer uma breve reverência.
— A outra opção não era lá muito boa. — provoco, em bom tom. — Eu vou ser a melhor parceira de cama que você já teve na vida.
A gargalhada do moreno desperta o foco das íris carameladas, fitando-nos. Justin possui uma faca na mão, ao mesmo tempo em que a desliza lentamente sobre o pão de forma, pincelando-o com pasta de amendoim. Os nós em seus dedos esbranquiçam conforme o louro pressiona o objeto contra a pele.
— No bom sentido, é claro. — seu olhar redireciona ao meu, acompanhado por um sorriso sarcástico.
— Droga, você matou as minhas esperanças!
— Como se houvesse alguma chance... — Ashley zomba, atirando um pequeno pedaço de miolo de pão em nossa direção.
— A Sel sempre foi a minha cheerleader favorita, acho que agora eu já posso dizer que sempre a achei gostosa. — Chaz justifica abdicando de um tom humorado. — Além disso, agora eu não tenho mais o Bieber enchendo o saco quando falo disso.
Dou risada ao envolver os meus braços por cima dos ombros do moreno, no entanto, ao fazer menção em retrucar a brincadeira, a voz de Justin ecoa em uma entonação áspera por todo o cômodo.
— Você deveria se preocupar sobre isso com o namoradinho dela, agora. — o sarcasmo contido em suas palavras faz-me revirar os olhos.
Justin não faz qualquer esforço para ocultar a sua intenção em me provocar e arrancar alguma reação da minha parte, visto que tenho o ignorado nas últimas semanas. Para a minha infelicidade, a impulsividade domina grande parte do meu corpo, impedindo-me de abstrair sua frase venenosa.
— Ele tem um nome, sabia? — encaro-o semicerrando os olhos, entretanto, o louro ignora a minha expressão desafiadora, transformando um semblante provocativo em raivoso ao travar o maxilar.
— Pouco me importa. — ele resmunga, desdenhoso.
Sinto as veias do meu corpo esquentarem pela raiva que o consome aos poucos, aperto os punhos sobre a pele morna de Chaz, sentindo-o segurar-me, temendo que eu acabe atacando fisicamente seu amigo.
— Você não cansa de ser tão babaca? — questiono-o, libertando as partículas de irritação que se agitam com rapidez. Deduzo uma ruborização do meu rosto ao que a minha pele facial esquenta.
— Então! — a intromissão provém de tom alto e desesperado usado por Ashley, evitando o prosseguimento da troca de farpas. Ao receber as devidas atenções e concluir seu objetivo, a loura sorri de maneira forçada. — Vamos sair? Estou louca para passear pelo bairro.
Ryan e eu estamos prontos para negar, contudo, a provável drama exagerado da mulher seria uma das nossas últimas opções para o dia. Portanto, sem direitos à escolha, acatamos ao pedido silenciosamente.
Alguma parte de mim se sente agradecida, afinal. Não precisar estar, necessariamente, presa à um cômodo junto com Justin diminui, em média, cinquenta porcento das minhas angústias e um passeio por Mammoth Lakes poderia, de fato, me deixar relaxada.
Justin Bieber Point Of View
Para o desgosto de Ashley, todas as suas atividades programadas precisaram ser adiadas por conta do mau tempo, nuvens escuras passam a cobrir o céu, escurecendo toda a cidade com seu indício de chuva forte. Contudo, um possível resfriado debaixo de uma tempestade não nos afastou de conhecer o festival de verão que acontece.
A circulação de pessoas por ruas habitualmente calmas é intensa, o evento parece atrair cada morador de Mammoth Lakes, agitando-os com músicas que se concentram em uma praça central. Porém, embora todo o clima festeiro nos envolva, o espírito consumidor de Ashley nos faz segui-la por alguns minutos por variadas lojas até que tenha piedade de nossos pés doloridos. E, inevitavelmente, mantenho-me próximo à latina, embriagando-me com seu perfume agradável à cada vez em que ela se distrai com algum artefato e perde distância de mim.
Observando-a a de soslaio, a serenidade em seu semblante remete-me à tempos antigos, onde não precisávamos estar dependendo de palavras afiadas para nos defender de acusações alheias. A simplicidade fora tão soberana que eu mal poderia imaginar o que estaria por vir.
— Você pode parar? — a entonação vocal levemente aguda me desperta, posteriormente, o meu olhar cai sobre o amendoado raivoso, sua insatisfação é esclarecida no instante em que a morena recua em um passo.
— O quê? — meus músculos faciais se contraem, transmitindo a minha hesitação em sua atitude.
— Pode parar de ficar me seguindo como uma sombra? — Selena rebate de forma notoriamente incomodada ao cruzar os braços sobre os seios. — Está me incomodando!
— A rua é pública. — defendo-me, beirando à indignação. Ela não demonstra abalo. — Além disso, se você não percebeu, estamos em grupo.
Ela bufa e, devido à sua falta de argumento, dá-me as costas na intenção de prosseguir o trajeto pelas ruas de pedra. Entretanto, o efeito de um lapso do meu orgulho obriga-me a envolver seu pulso em minha mão, puxando-a contra mim. Suas íris pardas se perdem em minha face por poucos segundos antes de aderir a típica camada rigorosa.
Droga, continuar brigando com ela está longe de ser o meu objetivo.
— Selena...
— Justin, eu estou tentando aturar a sua presença mas você não está facilitando... — a morena me corta, de maneira dura e impermeável. Suspiro longamente, embora a minha vontade seja de gargalhar devido à ironia em sua frase.
— Olha só quem fala. — sorrio sarcasticamente, vendo-a revirar os olhos novamente. Reprimo os lábios, receoso em tentar iniciar um assunto que possa vir a acabar em uma briga pior do que a última. — Ouça, eu quero conversar com você.
— Mas eu não, obrigada.
Mais uma vez, ela tenta deixar-me falando ao vento, contudo, ponho-me em sua frente, prendendo-a entre o meu corpo e um poste de luz.
— Ei, espera. — peço e, contragosto, ela se aquieta na mesma posição. — Você falou tudo o que queria, não foi? Acho que eu tenho esse direito também.
— Ah, então tem mais? — ela solta uma risada evidentemente forçada, enquanto seu olhar está preso em qualquer distante ao meu rosto. — Desculpe, eu pensei que você havia dito tudo o que queria na festa.
— É, eu... — a atenção das orbes pardas sobre a minha resposta, causa uma falha em minhas cordas vocais. Faíscam de mágoa se acendem, denunciando o efeito impensado das minhas palavras. — Olha, me desculpa, eu não queria...
— Não queria o que? Ser um completo estúpido e injusto?
Seria tolice imaginar que a morena não seria, no mínimo, hostil com toda a situação. A expressão inquisitiva não obtém qualquer falha, demonstrando o quão árduo será o meu trabalho.
— Merda, eu não sabia que se tratava de uma coincidência! — justifico, determinado de minha quase inocência. — Pensei que você estava tentando me provocar!
— Ah, por Deus, Bieber! Eu tenho mais o que fazer!
A lânguida risada nasal escapa involuntariamente, tamanho o meu deboche por sua afirmação.
— Francamente, Selena, não me faça rir.
Seu semblante severo cede tão rapidamente que se eu não tivesse me abstido em piscar para observar sua reação, não teria notado.
— Olha, isso não me interessa mais. — retruca, ao transpassar o peso de seu corpo de um pé para o outro. — Você não disse que me queria longe? Pois bem, estou cumprindo.
Grunho, irritado com a minha própria estupidez. Merda, o impasse sobre afastá-la ou aproximá-la se torna cada vez mais vívido em mim.
— Eu sei, mas eu não queria dizer exatamen... — Selena, novamente, revira os olhos e, agilmente, desvia de minha barreira e torna a caminhar na direção contrária. — Eu ainda estou falando! Eu não queria dizer daquela forma, eu sei que fui rude e lamento. Mas é que eu...
— Acho que a minha atenção te deixou um pouco prepotente. — profere, enquanto caminha em velocidade comigo em seu encalço. À esta altura, sou incapaz de localizar os outros três que haviam se perdido entre as inúmeras pessoas. — Você realmente achou que eu iria me prestar ao papel de invadir a festa da sua empresa apenas para te irritar?
— Você já fez tanta coisa, não seria de se surpreender...
Ela parece ponderar, no entanto, sua feição permanece irredutível.
— Bom, você estava enganado. Eu nunca perderia o meu tempo com uma merda dessas.
Embora a firmeza em sua voz transmita segurança, não garanto que, de fato, esta não seria uma atitude previsível da morena. Porém, decido evitar contestamentos.
— Então, eu estou aqui me desculpando pelo meu erro. — ela mantém sua atenção reta, como se toda e qualquer palavra minha fosse descartável aos seus ouvidos. — Isso não é o bastante pra você?
Selena cessa seus passos velozmente, à ponto de fazer-me pensar que ela poderia me agredir. Fita-me diretamente, sustentando seu habitual olhar superior.
— Hm, eu não sei. É o bastante pra você?
— Selena, por favor... — esgotado e sem fôlego, encontro-me sem argumentos para prosseguir com a discussão. — Eu estou tentando ficar numa boa com você.
— Era o que eu estava tentando em todo esse tempo. — sarcástica, ela retruca.
— Não, você estava tentando... — o constrangimento que me assombra ao relembrar o êxito que a latina obteve em seu plano faz-me diminuir o meu tom vocal, como se estivesse compartilhando o pior dos fatos. — Me seduzir.
— Ah, é péssimo quando não chegamos aos nossos objetivos, não é? Que pena!
A delimitação da rua se encerra, abrangindo o nosso campo de visão à praça onde se concentram a maior parte das pessoas e, obviamente, onde a sonoridade de nossas vozes é gravemente afetada
— Pare de ser tão orgulhosa! — permaneço seguindo-a, porém, desvio o foco algumas vezes em direções paralelas, no intuito de localizar algum rosto conhecido. — Será que é tão difícil entender que as pessoas erram?
— Eu não sei, me diga você.
Sou atingido pela correlação de suas palavras, permitindo que uma sensação amarga se alastre pelo meu corpo. Atraídos por um mesmo ângulos, deparamo-nos com Ashley e Ryan sob a lona de uma barraca de cachorro quente e, ao notar que não terá uma resposta, Selena faz menção em seguir até o casal.
— A situação é bem diferente. — profiro em baixo tom, contudo, certifico-me de estar próximo o bastante para que ela possa me ouvir.
— É, mas o rancor é a melhor solução, não é mesmo? — ela encara-me pela última vez e o sorriso que ganha vida em seu rosto não permite um deciframento. — O jogo sempre vira, Capitão.
***
A melodia romântica induz a locomoção de algumas pessoas à ficarem mais próximas ao palanque onde uma banda desconhecida reproduz alguns sucessos famosos. Em meio à alguns idosos, observo os meus melhores amigos em uma dança desajeitada, compartilhando risadas cúmplices e comentários sussurrados. As gargalhadas de Ashley dificultam a minha compreensão sobre se tratarem da diversão do momento ou de seu namorado ser um péssimo dançarino.
No instante seguinte, imagino o que Natalie estaria fazendo enquanto poderíamos estar desfrutando de um feriado agradável. Na medida do possível, obviamente. Conhecendo-a tão meticulosamente, reconheceria de longe o seu desconforto com a presença de Selena.
Mas que inferno, essa mulher parece estar entre nós até mesmo intencionalmente.
— Para! Você está comendo o meu lado! — a voz da bendita soa próxima à mim, dividindo um algodão doce com Chaz, ela reclama manhosamente.
Contenho uma risada ao vê-la aderir uma expressão brava, as bochechas inchadas pela nuvem rosa anulam qualquer seriedade em sua face. Ao notar a minha atenção, Selena desiste da luta pelo algodão doce e esfrega as mãos pela roupa, limpando os vestígios de açúcar.
(...)
Um trovão desperta todos os cidadãos que, até então, divertiam-se nas ruas. O anúncio de uma tempestade não demora a ser concretizado e, em poucos minutos, a cidade é atingida por grossos pingos de chuva. Lamentamos a nossa decisão em vir à pé para o centro antes de começarmos a correr de volta à casa.
O limo em alguns trechos das ruas dificulta o nosso trajeto, além da névoa criada pelo impacto da água caindo sobre as pedras. Vez ou outra, os meus músculos vacilam e sou obrigado a cessar os meus passos para recuperar o fôlego que os meus pulmões buscam desesperadamente.
Um grito agudo posterior à mim alerta-me e, ao olhar na direção contrária, assusto-me ao encontrar a morena sentada no chão.
— Selena! — chamo-a, contudo, obtenho unicamente um resmungo como resposta.
Recuo em alguns passos até estar próximo o bastante para enxergar o rasgo em sua calça jeans e o filete de sangue que se forma na região de seu joelho.
— O que aconteceu?
— Não é meio óbvio? — reviro os olhos por sua rebeldia e, ainda assim, estendo a mão para ajudá-la a levantar. Entretanto, a latina recusa.
— Para de fazer doce!
— Não preciso de você! — rebate, enraivecida. Com algum esforço, ela põe-se de pé e o gesto causa-lhe uma careta de dor. — Não era você quem queria distância de mim?
— Selena, por Deus, pare de ser tão dramática! — rogo, exasperando-me. Toda a sua teimosia começa a puxar-me dos trilhos. — Como eu poderia imaginar? Olha, eu sei que te julguei mas é difícil acreditar no que você diz!
Embora a nossa vontade seja, de fato, gritar um com o outro, o som estrondoso da chuva não nos permitiria controlar a sonoridade de nossas vozes. Afasto as gotículas que escorrem dos meus cabelos encharcados, prestes a cegar-me com toda a água.
— Pra mim também é difícil acreditar que você tenha sido tão idiota por puro ciúme! — acusa-me ao apontar seu indicador contra o meu peito.
Pigarreio, sentindo-me levemente baqueado e traído por minhas cordas vocais, que falham arduamente.
— O... O quê?! — devido à nossa proximidade, o meu sussurro não passa despercebido e, de certa forma, praguejo por isso. Sinto-me ridiculamente vulnerável.
— Ah, não faça essa cara! Você sabe do que estou falando.
— Ciumes?! — rio com sarcasmo, movimentando a cabeça em negação. Selena claramente diverte-se com tal afirmação. — Está vendo? Você continua louca!
A fúria da tempestade parece rebater em nós, visto que nos irritamos cada vez mais e, evidentemente, percebo que a batalha não se encerrará tão facilmente.
— Ah, é? Se não foi, por que você deu aquele showzinho todo?
— Eu... É... — gaguejo e, posteriormente, grunho por raiva ao vê-la rir da minha reação desconcertada. Merda, eu não poderia deixar tão óbvio. — Bem, eu pensei que você estava tentando me deixar irritado com aquele cara e...
— O fato de eu estar saindo com o Charlie não tem nada a ver com você!
— VOCÊS VÃO MESMO FICAR DISCUTINDO NA PORRA DESSA CHUVA?
Brava, à alguns metros de distância, Ashley berra chamando a nossa atenção. Encaramo-nos por alguns segundos e, bufando em conjunto, tornamos a caminhar em silêncio de volta à casa de Chaz.
***
Após um banho quente e a persistência da chuva em castigar a cidade, optamos pela opção de vinhos e poker na sala de estar do Somers. Aparentemente aliviada por ter jogado inúmeras acusações na minha cara, o humor de Selena mantém-se estável de ameno durante algum tempo. Contudo, sinto-me estranhamente incomodado com o seu distanciamento, em horas, a morena mal me olha e quando o faz, desvia rapidamente.
Começo a deduzir que, talvez, seu descaso não seja apenas fruto da minha estupidez e sim, de um novo relacionamento em sua vida.
Porra.
— Bieber!
— O que?! — sobressalto com o grito rende aos meus tímpanos, Ryan gargalha e, posteriormente, atinge a minha nuca com um tapa.
— Acorda para o jogo, seu animal!
Acordar...
Talvez eu deva mesmo acordar e tirar essa merda de dúvida, concluo.
O vinho começa a fazer efeito em meu organismo, deixando o meu metabolismo levemente mais lento. Ao decidirmos dar uma pausa para que Chaz retorne com uma nova rodada de anéis de cebola frita, repouso as costas no sofá, causando o relaxamento imediato dos meus músculos.
Quando reabro os olhos, Ashley e Ryan não se encontram mais no cômodo e eu acabo não evitando uma careta ao imaginar o que os dois estariam fazendo. O aroma dos anéis de cebola preenchem a sala, anunciando que o Somers ainda se ocupa em fritá-los, restando unicamente Selena e eu na sala.
Em silêncio, ela mantém sua concentração na tela de seu celular, como se a arte mais interessada que já existiu estivesse sendo exibida ali.
— Então... Você está mesmo com ele? — questiono, antes mesmo que eu possa policiar-me. A latina levanta o olhar ao meu, fitando-me em dúvida.
— Com quem?
— O cara da festa. — ressalto contragosto, descrente de mim mesmo por estar interrogando-a.
— Isso te importa?
— Não. Nem um pouco. — dou de ombros, na tentativa de transparecer casualidade e indiferença. Não parece ter surtido efeito, já que um singelo sorriso ameaça surgir em seus lábios. — É só... Curiosidade.
O silêncio posterior explicita sua vontade em deixar-me sem respostas, entretanto, ainda que eu me sinta um garoto infantil, não controlo uma provocação que arde na ponta da minha língua.
— Me admira você estar com um cara como ele.
— Como assim "cara como ele"? — Selena franze o cenho, agarrando-se à habitual expressão questionadora. — O que você quer dizer com isso?
— Ele parece ser um bananão. — alfineto, divertindo-me com semblante injuriado que se forma me seu rosto esférico.
— Olha só, o Charlie é lindo e é um dos caras mais divertidos que já conheci. Se não, o mais. — garante, no entanto, acredito que toda a exaltação seja apenas com o intuito de me aborrecer.
— Aham, acredito. — debocho, desdenhoso.
— Ei, eu não fico questionando a aparência de girafa filhote da sua esposa.
Ainda que o comentário tenha me ofendido, sinto-me aliviado pelo retorno das provocações, afinal, esta vem sendo a nossa zona de conforto desde que Selena retornara. Devo admitir que estou familiarizado com as nossas discussões.
— Você queria era ser como ela.
— Por que eu iria querer isso?
— Porque...
— Se eu mal preciso estalar os dedos para ter o marido dela enlouquecendo por mim? — a morena põe de joelhos sobre o carpete e engatinha em minha direção, apoiando o tronco em minhas pernas. — Você deveria assumir que está com ciumes do Charlie, seria mais elegante.
— Eu gostaria de saber o que te faz pensar que eu teria ciúmes de você. — sustento firmemente o contato visual, impedindo-a de pensar que há qualquer hesitação de minha parte.
— Eu preciso mesmo responder?
— Por que eu teria ciúmes de alguém que anda implorando para estar comigo? — provoco-a e, impulsivamente, inclino o meu tronco, diminuindo a distância entre os nossos rostos.
— Eu nunca implorei, querido. Se toca. — ela ri de forma debochada.
— Você nem precisaria, o desejo está explícito nos seus olhos.
— E o medo está explícito nos seus. — desafiadoramente, ela anula mais alguns centímetros em nossa distância, sussurrando provocativa contra o meu rosto.
Um olhar perdido direcionado aos seus lábios roliços é o suficiente para que eu recue, completamente encurralado no jogo em que resolvi me meter. Selena sorri com satisfação, notando a minha desistência rápida em comprovação à sua teoria.
— Está vendo? Você não consegue manter a nossa convivência agradável. — acuso, desviando o foco principal do assunto.
— Eu sei que você está fazendo tudo isso para tentar se redimir. — rebate friamente.
— Eu já me desculpei, não tenho muito o que me redimir.
— Nem sempre desculpas são o suficiente.
Suas íris pardas se perdem e, no outro instante, a morena se afasta, voltando à sua posição anterior. Sinto-me corroer internamente pela culpa, ainda que a vontade em questioná-la sobre estar magoada exista, eu não me arriscaria a receber uma resposta falsa.
— Se eu não estiver me rastejando aos seus pés, nada é o suficiente pra você. — alego, convicto do que digo. O egoísmo sempre acabaria por sufocar qualquer outro sentimento da latina.
— Então por que você insiste se sabe que não pode me dar o que eu quero? — em um tom baixo e singelo, ela indaga. Sou incapaz de desviar o olhar, hipnotizado e cativo às pequenas bilhas amendoadas.
Enquanto o silêncio nos engole, lembranças dos anos anteriores percorrem os meus pensamentos, causando a pontada sobre o meu peito que indica todos os danos causados pelos rastros de Selena.
Toda a minha entrega que não obtivera validez, todo o amor que fora descartado na primeira oportunidade. Fria. A maneira na qual ela me encarava no corredor do ginásio era completamente desprovida de afetuosidade. E, ainda assim, estive implorando, mesmo sem escolha. Por tanto tempo, a mesma frieza estivera habitando em mim, amparada por uma solidão melancólica que insistia em desejar, até mesmo, os dias ruins com Selena novamente.
Até encontrar Natalie. Estar com ela é a minha cura de todos os maus tempos. E, desta vez, eu tenho a opção de me negar a perder a coisa mais importante para mim.
— Porque te dar o que você quer, envolve muito mais do que os seus caprichos.
No lugar de uma resposta afiada, observo seu rosto empalidecer e o tronco encurvar-se levemente para frente, enquanto ela pressiona as mãos sobre o estômago. Em um ato ágil, Selena levanta e corre ao andar superior.
Flashback
— Por que você teve que dizer aquilo lá na frente de todo mundo?
A voz da garota soa esganiçada enquanto persegue-me pelos corredores vazios do colégio, ignorá-la me parece impossível, visto que os meus tímpanos imploram por um cessar fogo.
— Selena, eles estavam mexendo com você! O que você queria que eu fizesse? — defendo-me, injuriado com tamanha ingratidão. A morena revira os olhos em um gesto comum de irritação.
— Eu posso me defender sozinha, não quero que pensem que sou a garotinha do capitão!
— E por que não? — a alteração do meu tom vocal indica o quanto me sinto ofendido por sua repulsa em ser vista como minha namorada. — Nós já estamos juntos!
— O fato de ficarmos não significa que estamos verdadeiramente juntos, Justin, por Deus! — ela desdenha, aborrecida. — Eu não quero que me vejam como a garota apaixonadinha que precisa do namorado para defendê-la, até porque, nem isso nós somos.
— Mas...
— Sem mas! Você sempre soube que isso nunca iria rolar, não sei porquê insiste.
O impacto que suas palavras me causam concentra-se em um nó entalado na minha garganta, sem qualquer consideração, Selena me dá as costas e refaz o caminho de volta à região externa do colégio, deixando-me na companhia de uma dor incômoda no peito.
"Eu amei você com um fogo vermelho, agora está se tornando azul, e você diz "sinto muito" como um anjo. É tarde demais para se desculpar." - OneRepublic.
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