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História Tudo que há é poesia - Maquiagem do ser


Escrita por: realisse

Notas do Autor


Eu sumi de novo? Enfim, eu tava viajando e só voltei ontem. Eu quero postar logo e eu sei que eu ainda tenho que responder comentários e eu vou fazer isso hoje mesmo (depois que eu cortar e descolorir meu cabelo)

Deixando minha vida de lado, ao capítulo.

Capítulo 10 - Maquiagem do ser


Baekhyun pousou sua xícara vazia dentro da pia, abrindo a geladeira logo depois. Havia um último pedaço de cheesecake guardado para ele em um pote de plástico, e Baekhyun não hesitou em comê-lo naquela mesma manhã.

Não era mais manhã, no entanto. Baekhyun tinha acordado depois de meio-dia, as atividades na noite anterior na companhia de Jimin durando mais do que o planejado. Aquela experiência fora única, o álcool, e o doce, e os lábios apagando as preocupações de Baekhyun, apagando a culpa.

Mas tudo aquilo voltava naquele momento. Baekhyun ainda conseguia sentir a dor em seu antebraço, mesmo não vendo os cortes. Ele sabia que eles existiam, ele sentia sua existência. E Baekhyun sentia-se sujo. Agora ele se arrependia pelos movimentos ritmados da lâmina.

Baekhyun precisava se esconder. Mais uma vez.

Era uma sorte o fato de que o inverno estava próximo, pois assim Baekhyun podia usar camisas de mangas compridas sem se preocupar. Ele sabia que era mais inteligente fazer cortes em suas pernas, mas o que estava feito, estava feito. Além disso, seus pais trabalhavam naquele dia, deixando Baekhyun, Baekbeom e Hyoyeon sozinhos em casa. Aquilo era um grande alívio. O casal provavelmente aproveitaria seu tempo juntos, e Baekhyun seria deixado em paz.

“Oi, Baekhyun.” Hyoyeon disse, entrando na cozinha e surpreendendo o garoto.

“Oi.”

Hyoyeon serviu-se com um copo d’água em silêncio, pousando o copo vazio dentro da pia logo depois. Ela encarou Baekhyun por certo tempo, como Baekbeom costumava fazer quando eram crianças. Aquele olhar repressor, mas ao mesmo tempo amável. No fundo, Baekhyun não gosta de ser olhado dessa maneira.

“Você voltou tarde ontem.” Ela diz, e Baekhyun sabe que não é uma pergunta, mas responde como se fosse uma.

“Aham.” Ele diz, levando a última garfada do doce aos lábios. “Acabei encontrando um... um amigo. E o tempo voou.”

“Eu fiquei preocupada.” Ela fala, e Baekhyun percebe que não se irrita com aquilo. Se sua mãe dissesse aquilo, Baekhyun só ignoraria a mentira da mulher.

“Desculpa.” Baekhyun sorri. “Não vai acontecer de novo.”

“Você sabe que não precisa me prometer esse tipo de coisa, certo?” Hyoyeon pergunta.

Baekhyun ri de leve e coloca o prato dentro da pia junto com as outras vasilhas. Ele realmente não se importa com as palavras que saem de sua boca no segundo seguinte. Elas são a verdade, afinal.

“Você é a única que merece.” Fala, ódio pela sua família por trás de simples palavras. Ele se vira para deixar a cozinha.

“Baekhyun!” Mas Hyoyeon o chama, e ele se vira de volta.

“Sim?”

“Tem algo...” Ela faz uma breve pausa. “Tem algo que você quer me contar, por acaso?”

“Hã... não?” Ele responde confuso. “O que eu teria para contar?”

“Qualquer coisa.” Hyoyeon sorri. “Você sabe que pode confiar em mim para qualquer coisa, não é.”

“Eu confio.”

Eles trocaram sorrisos breves, e Baekhyun olhou fundo nos olhos da garota. Baekhyun não sabia porque, mas ele parecia ser um ponto fraco de Hyoyeon. Ela parecia querer protegê-lo do mundo. E a atenção e preocupação eram boas, mas ao mesmo tempo estranhas.

“Você quer que eu cozinhe algo para você de almoço?” Ela perguntou.

“Não, não precisa. Eu vou comer algo mais tarde... Você e o Baekbeom já comeram?”

“Sim, fomos em um restaurante próximo há pouco tempo.”

“Bom, eu vou para meu quarto agora, ok?”

“Ok.”

Baekhyun subiu as escadas com calma, ignorando a dor em seu peito. Baekhyun sentia-se ainda mais culpado pelos cortes em seu braço, sentia-se ainda mais fraco. Porque quando pessoas se importavam era pior, porque quando elas se importavam elas se decepcionavam.

Se ninguém se importasse, Baekhyun não sentiria nenhuma culpa. Quando ninguém se importa os cortes só são lembretes da sua invisibilidade.

Baekhyun subiu as escadas tentando não sentir a dor em seu braço, em seu peito. Doía demais.

~*~

Protegido pelo calor de suas cobertas, Baekhyun pousou seu notebook sobre seu colo, observando seu reflexo disforme na tela enquanto o aparelho ligava. Para expulsar os pensamentos ruins de sua mente e substituí-los por assuntos mais prosaicos, o garoto procurou ver filmes já vistos diversas vezes, aqueles que ele amava, decidindo primeiramente pelo francês ‘Le fabuleux destin d’Amelie Poulain’.

Tal filme sempre fora uma terapia para Baekhyun, as cores e as músicas e os sorrisos... Toda a produção o encantava e o acalmava, e Baekhyun se pegou sorrindo diversas vezes. Ele também, no entanto, chorava junto com a protagonista suas lágrimas silenciosas.

Baekhyun não sabia dizer se suas lágrimas eram estritamente por causa do filme francês.

Após o término do filme, Baekhyun continuou com sua pequena maratona, apreciando a Nouvelle Vague com os filmes de Godard. Ele assistiu ‘Pierrot le fou’ primeiramente, murmurando algumas falas com os atores. Baekhyun partiu para ‘À bout the souffle’ logo depois, perguntando-se como seria viver dentro de um dos filmes do diretor.

Às vezes, tudo que Baekhyun queria ser era uma garota de cabelos curtos que ama roupas listradas e foge com assassinos.

Ao fim dos três filmes, o relógio ao lado de sua cama marcava quase seis da tarde, quando o sol começaria a se por. Baekhyun não tinha comido nada desde que tinha acordado, uma xícara de café e um pedaço de cheesecake sendo suas únicas refeições no dia. Seu estômago reclamava pela falta de comida, vazio e dolorido. Apesar disso, Baekhyun não sentia uma fome real, ele sentia que vomitaria qualquer coisa que comesse.

Colocando o notebook desligado de lado, Baekhyun espreguiçou-se debaixo de suas cobertas, ouvindo os pequenos estalos em seus ossos. O garoto pegou seu celular negligenciado, então, ignorando todas as notificações de redes sociais e focando-se nas recém mandadas mensagens de Taehyung.

Taehyung:

Ei, quer conhecer o Jungkook???

A gente está em uma cafeteria com muito tempo para gastar!!!

Vem, estou louco para vocês se conhecerem yaaay!!!

Baekhyun não hesitou em responder imediatamente, percebendo que já havia algum tempo que Taehyung lhe mandara a mensagem.

Baekhyun:

Eu adoraria! Mas vocês ainda estão aí?

E eu também não quero ficar segurando vela aí para vocês, ok?

Seu celular vibrou instantaneamente com a resposta do primo.

Taehyung:

Estamos aqui, claro. Eu disse que temos muito tempo para gastar.

Você não vai segurar vela. Eu quero que vocês se conheçam.

E outra, pode gastar o tempo que quiser. A gente te espera.

Baekhyun:

Ok, vou tentar ser rápido.

Pode me mandar o endereço??

Baekhyun não esperou pela resposta do outro, rapidamente saltando da cama e dirigindo-se ao banheiro. Ele se perguntou brevemente porque as pessoas sempre o faziam correr para encontrá-las, mas Baekhyun rapidamente deixou tais pensamentos de lado. Afinal, ele não podia deixar Taehyung e seu precioso namorado mofando em um café por causa dele.

Em tempo recorde, Baekhyun estava fora do banheiro, corpo limpo e seco, mas cabelos levemente molhados. Baekhyun vestiu-se rapidamente com uma calça jeans apertada e azul clara e um suéter rosa e confortável, ajeitando seu cabelo em frente ao espelho ainda embaçado. O garoto, por fim, calçou seus all star pretos rapidamente, guardando o que precisava nos bolsos da calça.

Assim que Baekhyun abriu a porta da frente pronto para sair, ele deu de cara com o rosto cansado de sua mãe, bolsa jogada displicentemente sobre seu ombro após um longo dia de trabalho. Ela olhou as roupas do filho longamente antes de entrar na casa, suspirando fundo.

“Onde você está indo?” Ela perguntou, massageando as têmporas com calma.

“Encontrar o Tae e o namorado dele.” Baekhyun disse sinceramente.

Sua mãe levantou uma sobrancelha, mas assentiu da mesma forma.

“Diga para Hyoyeon não se preocupar comigo.” Baekhyun disse, fechando a porta atrás de si.

E se Baekhyun notou confusão nos olhos da mãe, ele não pensou sobre isso.

O café que Taehyung e Jungkook estavam ficava no centro da cidade, facilitando o trajeto para Baekhyun. O garoto pegou um metrô com facilidade, ficando em pé perto da porta já que aquele era o horário que todos saíam de seus trabalhos, deixando os metrôs lotados. Vez ou outra, Baekhyun se perguntava se um dia ele também se espremeria naquela lata de sardinha por um salário.

As ruas estavam cheias e iluminadas por luzes artificiais. Baekhyun encontrou o café com rapidez, encontrando a dificuldade, no entanto, em entrar no lugar. A cafeteria estava lotada, uma grande fila em frente ao balcão principal e várias pessoas saindo com seus copos de papel, pastas de negócios debaixo de seus ombros e celulares em seus ouvidos.

Quando Baekhyun finalmente entrou no estabelecimento, ele percebeu que as mesas também estavam cheias de clientes, o som de xícaras contra pires e conversas cotidianas preenchendo o local. Passando seus olhos rapidamente pelas pequenas mesas, Baekhyun reconheceu o recente laranja dos cabelos de Taehyung, aproximando-se da mesa no fundo tênue do café.

Ele parou antes de alcançá-los, no entanto. Baekhyun observou o casal por alguns segundos, antes que eles percebessem sua presença. Seus sorrisos eram totalmente diferentes, mas de alguma forma pareciam idênticos. Jungkook tinha os cabelos castanhos e lisos, pareciam macios ao toque sempre que ele o afastava de sua testa.

Baekhyun resolveu aproximar-se, então, sorrindo genuinamente, mas ainda assim incerto. Taehyung encontrou seus olhos e explodiu em um sorriso diferente, levantando-se de sua cadeira.

“Demorei muito?” Baekhyun perguntou, abraçando o primo.

“Não.” Taehyung respondeu radiante. “Eu e Jungkook nem vimos o tempo passar. E por falar em Jungkook, hora das apresentações!”

“Não precisa, hyung.” Jungkook disse, um sorriso pueril em seu rosto. “Não tem como eu não conhecer Byun Baekhyun.”

Baekhyun riu de leve, estendendo sua mão para Jungkook em mais um ato incerto, mas Jungkook ignorou a mão, abraçando-o com força. O abraço havia sido repentino, mas Baekhyun abraçou o garoto de volta.

“Bom, não tem como eu não conhecer Jeon Jungkook também.” Baekhyun disse ao fim do abraço, sentando-se a frente do casal. “Tae só fala de você.”

“Acho que o mesmo vale para você.” Jungkook respondeu.

“Eu odeio interromper esse ping pong de palavras entre vocês...” Taehyung começou. “...Mas que tipo de roupa é essa, Baek?”

Baekhyun olhou para baixo, inconscientemente ajeitando o suéter rosa. Ele olhou de volta para o primo que sorria provocador.

“Isso é a coisa mais sugar baby que eu já vi você usando.” Taehyung explicou. “E olha que você ama essas cores pasteis e etc... Daqui a pouco você está saindo com caras de quarenta anos e chamando eles de ‘Daddy’.”

“Não, obrigado.” Baekhyun disse. “Para de transformar tudo naquelas fanfics bizarras que você lê.”

Jungkook começou a rir com o comentário, e Taehyung colocou uma feição triste em seu rosto, recebendo um sorriso vitorioso de Baekhyun. Então uma garçonete aproximou-se da mesa deles, perguntando o que queriam, apesar da mesa já ter copos e xícaras vazias.

Foi então que Baekhyun percebeu que ele estava realmente com fome. Talvez fosse o café, com todos os aromas e sabores, mas tudo que Baekhyun queria era um prato recheado de panquecas.

“Eu quero mais um Americano, por favor.” Jungkook pediu.

“Um Mocha. Duplo chocolate.” Taehyung disse. “Obrigado.”

“Latte grande e panquecas tradicionais, obrigado.” Baekhyun pediu. A garota anotou seus pedidos e limpou a mesa, saindo logo depois. “Eu estou com fome.” Ele explicou.

“Tá vendo, Baek? Você não está segurando nenhuma vela.” Taehyung disse, e Baekhyun riu de leve.

“Nunca se sabe.” Baekhyun deu de ombros. “Eu faço isso o tempo todo para meus amigos.”

“Deve ser uma merda.” Jungkook comentou.

“Não é tão ruim, na verdade.” Baekhyun disse. “Eu acho que Luhan e Sehun são o tipo de casal que não aguenta não encostar no outro.”

“Jungkook e eu somos o tipo de casal que não mostra afeição em público.” Taehyung disse, olhando com afeição para o namorado.

“Hyung, afeição é uma coisa, e sugar a cara do outro em público é outra.” Jungkook explicou, arrancando risadas de Baekhyun.

“Falando em sugar caras...” Taehyung começou, apoiando os cotovelos na mesa. “O quão ativo você está nessa área ultimamente, Byun Baekhyun?”

“Se satisfaz sua curiosidade, eu beijei um cara ontem.” Ele respondeu, divertindo-se com o choque no rosto do primo.

“Quem?”

“Um... Um amigo. Distante.” Baekhyun explicou, meias verdades por trás de suas palavras. “A gente se encontrou por acaso, compramos uma garrafa de bebida e... bom, foi só um beijo.”

“Para alguém que escreve poesia, você é horrível para descrever cenários, Baek.” Taehyung replicou assim que a garçonete voltava com seus pedidos.

Os três tomaram os primeiros goles de suas bebidas em silêncio, Baekhyun experimentando suas panquecas ainda quentes e oferecendo pedaços ao casal. Jungkook tomou mais um gole de seu americano, pousando a grande xícara na mesa e limpando sua garganta.

“Bem,” O garoto começou. “eu não sei como começar essa conversa, Baekhyun, mas o Tae pediu para eu conversar com você. Sobre gênero, essas coisas.”

Baekhyun rapidamente olhou para o primo, surpreso com a nova informação. Taehyung tentou esconder seu rosto em sua xícara, tomando goles do café por falta de algo melhor para fazer.

“Eu fiz mal?” Taehyung perguntou. “Você tá bravo comigo, Baek? Eu sei que eu não tinha esse direito, mas você parecia tão perdido quando me contou e, às vezes, é bom falar com alguém que sente as mesmas coisas. Eu nem tinha direito de contar para ele que você é gênero fluido. Desculpa, Baek.”

“Tae, eu não estou bravo com você.” Baekhyun disse, pousando sua mão sobre a do primo. “Eu só estava surpreso, é isso. Na verdade, eu acho até bom que você tenha dado as notícias ao invés de mim.”

“Porque?” Jungkook perguntou.

Baekhyun coçou a nuca nervoso.

“Eu fico inseguro quando tenho que dizer, mesmo quando sei que a pessoa vai me apoiar e me amar da mesma forma.” Baekhyun pausou, tomando um gole do café. “É difícil. As únicas pessoas que sabem são vocês dois e o Luhan. E eu quero tanto falar com o Sehun e o Soo, mas-“

“Então fale com eles.” Jungkook respondeu simplesmente. “Eu sei que não é fácil, mas nessas horas o que importa é confiança e aceitação.”

“Nunca parece ser a hora certa.” Baekhyun falou, voz baixa e melancólica.

“Não há uma hora certa.” Jungkook disse, dessa vez pousando sua própria mão sobre a de Baekhyun. “Isso é sobre você.”

Eu nem sei mais o que eu sou.

Mas Jungkook parecia ler sua mente por meio de sua mão.

“E eu sei que muitas vezes a gente se perde.” Jungkook disse. “A gente se perde dentro de nós mesmos, dentro desses rótulos... E é por isso que é importante se abrir, dizer o que somos. Porque assim sempre haverá olhos nos procurando e mãos nos salvando quando nos perdermos.”

Baekhyun quase queria chorar, as palavras de Jungkook eram tão doces quanto a calda sobre as panquecas, eram tão certas quanto o aroma de café na manhã ou no final da tarde. E aquilo tudo trazia lágrimas ao seus olhos.

“Eu acho que ele é o poeta aqui.” Taehyung brincou, aliviando a tensão. Baekhyun estava realmente agradecido porque o nó em seu peito desafroxou um pouco com a risada que ele libertou.

“Eu acho que vou roubar seu namorado, Tae.” Baekhyun provocou, e Taehyung abraçou o braço do namorado com força e possessividade.

“Aposto que você já está super desconfortável com essa conversa,” Jungkook recomeçou, e Baekhyun negou com a cabeça, mostrando que não estava desconfortável. “mas posso te fazer mais uma pergunta?”

“Vá em frente.” Baekhyun respondeu.

“Pronomes?” Jungkook simplesmente disse.

“Huum, isso é complicado.” Baekhyun falou. “Eu não cheguei a pedir para ninguém para me chamar por pronomes femininos, mas às vezes eu odeio quando me chamam de ‘ele’. É ridículo, mas às vezes eu falo com meu reflexo. No fim, sempre é algum sentimento diferente ao longo do dia. É tão confuso, eu não sei o que quero.”

“Eu sei como é, mas deve ser ainda mais difícil para você.” Jungkook respondeu. “E o negócio do reflexo eu fiz isso milhões de vezes. Você não tem que ter medo do próprio reflexo.”

“Como você se tornou essa pessoa tão confiante e, sei lá, foda?” Baekhyun inquiriu sorrindo.

“Bom, você quer saber um pouco da minha história?” Jungkook perguntou de volta, e Baekhyun assentiu animado.

“Acomode-se na sua cadeira, Baek.” Taehyung brincou.

“Não é tão longo assim, hyung. E eu vou resumir.” Jungkook replicou. “Eu me descobri há um ano, mais ou menos. Mas, por vezes, eu sempre sentia que havia algo de errado comigo. Quando eu entendi o que era ser trans e refleti sobre meu próprio ser, eu me libertei completamente. Minha irmã foi a primeira pessoa a notar as mudanças, o fato de que eu larguei meus vestidos e passei a usar roupas largas para esconder meus peitos. Nós dois sempre fomos próximos, então foi fácil contar para ela. Mas mesmo assim eu sempre tive medo de contar para meus pais. No fim, eles entenderam... Fico feliz que eles sempre foram mais liberais. E bom, eu também sofro com inseguranças, mas tudo isso melhorou...” Jungkook olhou rapidamente para Taehyung. “E há alguns meses, eu fiz a cirurgia para tirar meus peitos e eu vou à academia... Logo eu vou ser muito mais masculino do que o Tae.”

“Que mentira!” Taehyung discordou. “Você sempre foi mais masculino do que eu. Você toma todos esses Americanos amargos e todos os meus cafés ou tem chocolate ou chantilly. Você podia continuar usando seus vestidos que você continuaria sendo mais masculino do que eu.”

O casal sorriu entre si, e Baekhyun sentiu um sorriso involuntário formando-se em seu rosto.

“Eu estou feliz por você, Jungkook.” Baekhyun disse, ganhando a atenção do casal. “Por vocês dois.”

Taehyung sorriu largo e Jungkook corou, desviando seus olhos do menino mais velho. Os três garotos continuaram conversando displicentemente, bicando cafés e roubando pedaços de panquecas.

“Vou ao banheiro, hyung.” Jungkook disse, então, levantando-se de sua cadeira. Taehyung assentiu e o garoto afastou-se.

“Ele te chama bastante de ‘hyung’.” Baekhyun comentou.

“É, eu acho que é uma forma de ele constantemente se lembrar.” Taehyung respondeu, olhando brevemente para a entrada dos banheiros.

“Se lembrar de que?”

“Se lembrar de que ele é um garoto de verdade.” Taehyung explicou. “Garotas chamam homens mais velhos de ‘oppa’ e garotos chamam homens mais velhos de ‘hyung’. Eu acho que ele se afirma e se fortalece mais toda vez que ele me chama de ‘hyung’.”

Baekhyun só assentiu silenciosamente, incerto sobre o que dizer exatamente. Mas era notório como Jungkook transformara algo tão comum em uma palavra para lutar.

“Ele é tão especial.” Taehyung recomeçou. “Às vezes, acho que não sou o suficiente para ele.”

“Claro que é, Tae.” Baekhyun o confortou. “Ele está ao seu lado por um motivo. Você é suficiente para ele. E ele é suficiente para você.”

~*~

Nevou durante o natal. Baekhyun observou os pequenos montinhos de neve que se agrupavam em sua janela, contrastando com o grande cenário branco que a nevasca formava a sua frente. Baekhyun bateu de leve contra o vidro da janela, mas a neve permaneceu intacta.

“Baekhyun?” Baekbeom chamou, recostado na porta do quarto do irmão. “Alguns parentes já chegaram, mamãe vai servir o jantar em breve. Vamos?”

“Ok.” Ele respondeu sem desviar os olhos da neve imóvel. “Eu já vou.”

Baekhyun ouviu os passos de Baekbeom afastando-se e suspirou fundo. Ele afastou-se da janela e pegou o presente de Baekbeom dentro de seu armário, descendo as escadas com calma. Havia parentes espalhados pela casa, mas ainda assim o lugar parecia estranhamente vazio para Baekhyun. A decoração natalina era mínima e discreta, e Baekhyun não sentia mais aquele prazer infantil em relação a data.

À meia noite, os familiares trocaram presentes, Baekhyun entregando o seu a Baekbeom e recebendo outros do irmão e dos pais. A ceia estava rica e a mesa animada com conversas, mas Baekhyun se vira perdido no meio de tantas palavras. Ele respondia seus parentes brevemente, focando-se na comida a sua frente.

Baekhyun realmente não sabia dizer o que era o sentimento vazio em seu peito, mas estar no meio daquelas risadas familiares o sufocava. O garoto sentia-se um intruso dentro da própria casa, sem Taehyung ali para encher sua mente de informações bobas e alegres.

Baekhyun voltou para seu quarto o mais rápido possível, assim que sua taça de vinho ficou vazia e seu prato de sobremesa limpo. Ele despediu-se rapidamente de seus parentes, abraçando seus poucos presentes e subindo as escadas de madeira.

Assim que ele entrou em seu cômodo, Baekhyun soltou seus presentes no chão, pulando em sua cama e aproveitando a solidão do lugar. Ali era tão silencioso, sem conversas e risos, e Baekhyun, aos poucos, sentia-se como uma pessoa de novo.

O travesseiro tirava seu ar aos poucos, mas Baekhyun recusava mover seu corpo, respirando fundo nas cobertas limpas e aromatizadas com lavanda. Se ele parasse de pensar, Baekhyun poderia dormir ali, nas mesmas roupas, por cima das cobertas, em uma posição horrível...

Mas um leve bater na porta o impediu de cair no sono.

Baekhyun gemeu fundo em sua garganta e girou na cama, levantando-se com preguiça. Ele abriu a porta, revelando Hyoyeon parada ali, um sorriso inseguro em seus lábios.

“Vem, entra.” Baekhyun chamou, quebrando o silêncio e abrindo mais a porta.

Hyoyeon o seguiu para dentro, observando o quarto em silêncio. Pela primeira vez, Baekhyun sentia-se constrangido pela sua bagunça. Talvez.

“Desculpa pela bagunça.” Ele se desculpou. “É só que-“

“Não precisa se desculpar, Baekhyun.” Ela disse. “Seu quarto é bem excêntrico.”

“Obrigado.” Baekhyun coçou a nuca. “Eu acho.”

“Enfim.” Hyoyeon começou, estendendo um pequeno embrulho preto em sua direção. “Eu comprei isso para você.”

Baekhyun pegou o presente, surpreso pelo ato da garota e envergonhado por não ter nenhum presente para ela. Por falta de palavras, Baekhyun abriu o embrulho em silêncio. A pequena caixa revelou um delineador e um corretivo, e Baekhyun não sabia mais se ele devia agradecer ou se desculpar.

“Eu não sei se você tem o costume de usar maquiagem, mas...” Hyoyeon disse, mas Baekhyun interrompeu-a com um abraço, ainda segurando seus presentes com força.

“Eu amei, Hyoyeon.” Baekhyun falou. “Muito obrigado.”

“Fico feliz.”

Baekhyun terminou o abraço, afastando-se da outra e observando o delineador e o corretivo em suas mãos. Ele mordeu seu lábio apreensivo e olhou para Hyoyeon, encontrando um sorriso doce em seu rosto. Ele se sentia tão culpado naquele momento.

“Eu acho que seus olhos vão ficar maravilhosos com um fino delineador.” Hyoyeon comentou.

“Eu não comprei nada para você.” Baekhyun disse, desviando seus olhos novamente.

“Não tem problema.” Hyoyeon replicou. “Afinal, eu te fiz uma surpresa.”

E assim uma ideia surgiu em sua mente. Baekhyun gentilmente guiou Hyoyeon até sua cama, fazendo-a se sentar sobre as cobertas bagunçadas. Ela o olhou confusa, mas Baekhyun sorriu, pousando seu presente ao lado da mulher.

“Fica aqui.” Baekhyun instruiu. “E feche seus olhos.”

“Ok.” Ela fez o que pedido.

“Sem roubar!” Baekhyun avisou, afastando-se de Hyoyeon e dirigindo-se a sua estante de livros.

Ele estudou os títulos que tinha, vendo o que não tinha lido e o que já tinha lido e relido. O livro de capa azul clara isolado em um canto chamou sua atenção, e Baekhyun pegou o livro, voltando para perto da cama.

“Posso abrir?” Hyoyeon perguntou, um sorriso pueril em seus lábios.

“Não, ainda não.”

Baekhyun rapidamente pegou uma fronha de travesseiro, embrulhando o livro de forma rústica e corrida. Ele, então, colocou-se em frente a Hyoyeon, sorrindo de leve.

“Pode abrir.” Baekhyun disse por fim.

Hyoyeon abriu os olhos aos poucos, focando-os no embrulho improvisado de Baekhyun. A risada liberta pela garota era divertida e contagiante, e logo Baekhyun ria com ela. Ela, por fim, livrou o livro da fronha, revelando Lolita de Vladimir Nabokov. Baekhyun não sabia dizer se tinha sido uma boa escolha, mas o sorriso discreto de Hyoyeon o deixava mais confiante.

“Lolita.” Ela disse, estudando o livro.

“Você já leu?” Baekhyun perguntou preocupado.

“Não.” Hyoyeon respondeu. “Uma amiga comentou sobre o filme comigo, mas eu também nunca cheguei a assistir.”

“Espero que tenha sido uma boa escolha.”

“Tenho certeza de que foi.”

Então Hyoyeon levantou-se da cama, aproximando-se da porta. Ela sorriu para Baekhyun que retribuiu seu sorriso igualmente. Eles trocaram despedidas breves silenciosamente, expressões similares em seus rostos. Baekhyun, sempre sozinho naquela casa, sentia que agora tinha uma aliada ali. Uma amiga.

Hyoyeon estava prestes a descer as escadas, quando Baekhyun disse, recostado contra a porta:

“Vem conversar comigo sobre o livro qualquer hora.”

“Eu venho.” Hyoyeon sorriu. “A gente pode te maquiar também.”

“Fechado.”


Notas Finais


O Jungkook é a Hyoyeon são uns amores 💞💞
Por hoje é isso aí, pessoas. Mais tarde eu respondo os comentários!!


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