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História Túmulo de Sangue - Nossa canção


Escrita por: Caus

Notas do Autor


Peço perdão pela enorme demora em postar esse capítulo, é que estou sem pc e sem acesso a internet. Então a coisa ficou bem complicada mesmo. Ainda assim, prometo que o próximo será postado em menos de 15 dias, pra compensar.

Capítulo 8 - Nossa canção


É uma noite fria, onde nuvens pesadas pairam sobre cabeças tensas. Do alto da sacada de seu quarto, o casal olha para o céu, como se dele esperasse respostas.

— Uma tempestade está para cair sobre nossas cabeças. — diz Aurora, para o homem ao seu lado — Você teme por nós?

— Temer? Gostaria de dizer que não, mas sabe que não somos assim um com o outro. Sou um homem de armas, já acostumado a colocar a vida nas mãos de Deus, enquanto o peito fica exposto a facas, tiros e flechas. — segurando em suas mãos delicadas. — Meu único medo é não vê-la de novo. É encontrar meu fim longe dos seus braços, seu olhar, seu sorriso...

Ele beija as mãos da amada com ternura, que se apoia em seu peito, como se buscasse segurança e paz, diante da separação iminente. Ele a abraça forte em resposta, seus olhos refletindo amargura.

— Tivemos que ir tão longe da última vez! Foi tanto sangue para fazer os tratos corretos, alianças com os líderes das malditas tribos mais para dentro. Foram quase três anos da minha vida com a cara na lama, andando até minhas botas estragarem, comendo e bebendo qualquer coisa que me caísse nas mãos, lutando até o último grão de pólvora, gota de suor e de sangue. Vendo bons homens morrerem e homens maus prosperarem... tudo para preservar um pouco de paz! E então, menos de um ano depois, vai tudo por água a baixo!

O homem se afasta dela, apoiando-se na grade da sacada, o peso do mundo nos ombros.

— Sabia que era apenas questão de tempo até ter que lutar de novo, só pensei que teríamos mais tempo! Quem sabe três a cinco anos de paz, antes que o fogo queimasse nosso paraíso.

Ela o abraça por trás, ciente que ele não quer que suas lágrimas sejam vistas.

— Meu Ângelo, meu amado, o Gênesis já nos ensina que o paraíso não foi feito para durar. Você, que foi agraciado com um anjo em pessoa como esposa, mais do que ninguém deveria saber disso, não?

Ele deixa escapar um sorriso ao ouvir isso, e a beija com carinho. Ao longe, tornam-se visíveis as dezenas de tochas brilhando na escuridão, famílias fazendo preparativos para enviar seus homens, aproveitando a última noite no lar. Marchando, lenta e inexoravelmente rumo a uma nova aventura. Rumo a matança.

 

...

 

A jovem acorda de má vontade, ainda com aquela sensação de nostalgia. Outro sonho com ele. O terceiro aquela semana. Ela leva as mãos a face, enquanto respira profundamente, tentando afastar-se daquele mundo onírico e abraçar a realidade. Por mais amarga e tediosa que seja.

Alice não compreende, desde que parou de vê-lo os sonhos começaram a vir. Fragmentos apenas, as vezes uma fala, um sorriso, um beijo especialmente bom...e agora, uma conversa completa. Sonhos cada vez mais vívidos, como se fossem lembranças recuperadas. Obviamente, uma conclusão que não faz sentido, e por isso mesmo descartada por uma mente como a dela. Um psicólogo é um cientista, não um místico ou charlatão. Quando Freud lançou seu clássico “A Interpretação dos Sonhos”, o que ele propunha não era desvendar revelações de uma força superior, previsões do futuro ou visões do passado. Era apenas um método para o autoconhecimento dos seus pacientes, uma tentativa de decifrar aquilo que o próprio inconsciente revelaria através dos sonhos. E o pior é que ela nem é adepta da psicanálise, para início de conversa.

— Como se sente sobre esses sonhos? — pergunta sua psicoterapeuta, sentada em uma cadeira de frente para a cadeira dela. Uma profissional e velha conhecida, a quem a psicóloga de tempos em tempos recorre, quando sente que precisa cuidar de si mesma.

— Não sei dizer com certeza. — responde, após alguma hesitação. — Durante o sonho, a sensação é muito boa, um clima de paz e tranquilidade, sabe. Mas depois que eu desperto, depois que percebo que nada foi real...

— Que o Arthur do seu sonho não existe na sua vida.

— É, ele não existe. É só uma projeção, eu sei, só o Arthur que eu quero que exista. — olha para os pés, pensativa e triste. — Um cara que eu acreditei que fosse real, mas que se mostrou tão falso quanto esses meus sonhos.

— Mas enquanto você sonha, ele permanece com você, não é verdade? — a mulher de cinquenta e tantos anos pergunta, com olhar sereno e postura calorosa.

— É. Nos sonhos ele continua comigo, nos sonhos ele é o homem que eu preciso que ele seja. No sonho.

Alice está frustrada. Tem feito de tudo para seguir sua vida, se dedicando totalmente ao trabalho, para não ter sequer tempo livre para conseguir pensar nele. Primeiro ela começou oferecendo sessões extras em outros dias para os clientes que deixou na mão quando ficou sem sair de casa, depressiva. Depois, resolveu começar a atender clínica de famílias e casais, para além da terapia individual, que sempre fez. Não bastasse isso, assim que os sonhos começaram, decidiu voltar ao atendimento com sua terapeuta dos tempos da universidade, uma excelente profissional e ser humano. Entupida de trabalho como está, realmente tem pouco tempo para pensar no homem que partiu seu coração...até que dorme. E sonha. Os sonhos são uma tortura, pois logo ela se pega suspirando por coisas que ouviu de um Arthur que habita em sua mente, e não do Arthur real. Não bastasse isso, nos sonhos o nome dele é diferente: Ângelo, porém é sem dúvida o seu Arthur. Já era difícil para ela se esquecer dos momentos que teve com ele, não precisava de mais momentos imaginários.

— Garota, sempre com ele e com roupa de época e tudo? Isso tá na cara que é coisa de outras vidas! — decretou, Tati, após Alice finalmente compartilhar seus sonhos repetidos. — Você devia ir num daqueles caras que trabalham com regressão, tipo, “terapia de vidas passadas”.

Alice não conseguiu deixar de rir daquela ideia sem cabimento.

— Para ele usar hipnose e eu sair acreditando que lembrei do que quer que ele queira que eu lembre? Nem sonhando.

— Você tem que ter a mente mais aberta para essas coisas, miga. — dizia a morena, enquanto comia um hambúrguer com três carnes, que mal cabia na boca. — Faz que nem eu: domingo na missa católica, segunda no centro espírita, terça no culto evangélico, quarta na mãe de santo e quinta no grupo budista.

— Ué, e sexta e sábado?

— Fim de semana é farra liberada! Se eu não fizer minhas merdas, vou pagar penitência pelo que?

A verdade é que Alice era esperta demais para acreditar naquilo. Hipnose é algo real, reencarnação não. Se tem uma coisa que detesta é gente supersticiosa, e ela jamais se rebaixaria ao nível delas, acreditando em qualquer bobagem. Nada de enriquecer picaretas ou dar pulinhos no mar na virada de ano. O problema é que mesmo sabendo de tudo isso, os sonhos continuam lá, testando seu ceticismo e capacidade de ignorá-los. Sonhos que a atraem cada vez mais para um certo alguém, sonhos que lhe fazem se fazer aquela terrível e perigosa pergunta: mas, e se for real?

É uma noite chuvosa de domingo, quando a jovem vestindo um casaco com capuz caminha pelas ruas, observando o fluxo de pessoas que se dirige para alguma igreja. Alguns de carro, embora a maioria a pé. Ela sempre soube que a maior parte do povo é religioso, ainda que raramente com uma moral coerente aquilo que acredita. Se o povo adora ir a igrejas, pensa ela, é por terem mais medo de demônios que de gente. O que é um erro básico, e sinal de ingenuidade infanti, considerando qualquer relato sobre o quão demoníaco um serial killer pode ser.

De volta a casa, e após comer o cachorro quente que comprou na barraca da esquina, pode voltar a usar seu conjunto de camisola e pantufas, caminhando lentamente em direção à mesa do computador, ao lado da cama onde uma gata mia freneticamente, como se estivesse na final de um concurso de música.

— Surtou, Fiona? — enquanto afaga o pescoço da amiga com pelos. — Desse jeito vou te encher de Rivotril, hein! Claro, só depois de tomar minha dose.

Ela liga o computador e entra na internet, acessando uma dezena de páginas enquanto confere as últimas mensagens da amiga pelo bate-papo do Facebook, comentando como estava se divertindo com o judeu naquela noite. Com certeza se divertiu, já que até dormiu lá, Alice conclui. Então assiste ao vídeo enviado por ela:

“— ... e as buscas pelos dois irmãos prosseguem sem maiores resultados. Já faz quase um mês desde que a família contatou as autoridades, e sabe-se que a última vez que foram vistos foi na praia de Copacabana. Oficialmente, a polícia prefere não comentar sobre o suposto aumento vertiginoso no número de desaparecimentos nos últimos meses. A maioria jovens de classe média ou alta, rapazes e garotas. — diz o repórter do telejornal.

— ...meu pai disse que a patroa dele tá super preocupada, já que a filha também evaporou. Novinha, meio maluca mas nunca sumiu assim, sem dar notícias por mais de uma semana. — fala Tati, agora através do Skype, sua imagem ocupando a metade da tela do computador. — Tô te falando pra ficar ligada, tem algum maníaco por ai pegando gente, e um Barbiezinha como você é presa fácil. Sem falar que você tá bem lerdona últimamente.

— Do jeito que eu ando, ele me faria até um favor se me tirasse desse mundo cruel. — Alice suspira. — Mas eu sou esperta, então não se preocupe com isso.

— Credo, miga, vira essa boca para lá!

Elas riem, até serem interrompidas pelo som alto da gata silvando para ninguém. Até que ela se arrepia, e sai correndo pela porta entreaberta.

— Que foi isso, menina!? — pergunta Alice, assustada e indo atrás do animal.

A janela do Skype não foi fechada, e Tati continua lá, só que distraída. Por um instante ela olha para onde a amiga se senta, acreditando ter visto um vulto por meio segundo na tela. Enquanto a garota encara mais atentamente a imagem do quarto, vê a loirinha retornando para o assento em frente a ela, com uma gata assustada no colo.

— Que foi garota, está com uma cara estranha, aconteceu alguma coisa?

— Nem... acho que sua gata viu fantasma, hein. — responde a jovem, um pouco tensa. — Melhor você ir para missa enquanto pode, miga.

Elas riem novamente, só que uma delas com um sorriso tenso. E as duas ignorantes, quanto ao assassino imortal que se escondia no quarto de sua amada. A observando das sombras, como se assim ganhasse as forças de que necessitava para manter-se mais tempo sem ela.

 

...

 

Vanessa observa enquanto Arthur retorna de seu passeio solitário. Sua caçada própria.

— O que foi dessa vez, hã? Um viciado em crack, um pivete da Central do Brasil? — ela zomba, sentada num bonito banco que comprou recentemente.

— Sangue é sangue, e isso não é da sua conta. — Arthur responde, enquanto tira o casaco e se senta no sofá, ligando a tv. — Já lhe disse isso.

— Mas que homem honrado, um verdadeiro exemplo de bom cidadão. — passa o dedo em seu pescoço e sussurra em seu ouvido. — Você não é um justiceiro, querido, é só um assassino em série diferente. Ficar bebendo sangue de ralé, não vai mudar isso.

Ele fecha a cara e a afasta, irritado, enquanto diz:

— Como deve ter visto, a polícia já está desconfiada do seu padrão de mortes. É hora de ser mais discreta, não vou participar de sua busca incessante por beleza para ser ceifada.

Ela caminha lateralmente numa parede, graças a seu dom sobrenatural.

— Certo, continue mentindo para mim, continue se sacrificando por seu romance adolescente! Só se lembre que a vida dos humanos é muito curta, e que você vai se arrepender de ter desperdiçado tempo com isso... quando a juventude dela passar. — diz ela, enquanto fica de ponta a cabeça no teto, face a face com seu amor.

 

Chega disso! — diz, aborrecido. Sabendo que o que ela diz é verdade.

Serra de Jacarepaguá, Rio de Janeiro.

 

Já é noite avançada quando Vanessa guia o possante vermelho pela sinuosa estrada. Ao seu lado, o dono do carro e alvo de seu interesse, usando roupas casuais como as dela, e olhando para a densa mata cortada pela estrada. O casal decidiu caçar por outras bandas, carregando consigo apenas as roupas do corpo, cartões de crédito, dinheiro para o suborno de alguma autoridade eventual e uma bolsa com ferramentas adequadas para se livrar de corpos e evidências.

A imortal observa silenciosa ao seu antigo amante, imerso nos próprios pensamentos, enquanto contempla a vasta área verde, com olhos de um animal noturno.

— Acho uma boa ideia estender nosso território, ao menos até você resolver suas coisas e sairmos de vez dessa cidade. — Ela fala, olhos na estrada. — Além disso, respirar novos ares lhe fará bem, além de sempre podemos fazer uma parada rápida e dar umazinha no mato, claro.

Ele ignora a brincadeira, depois responde:

— ...isso pode levar algum tempo. Tenho vários negócios aqui, e não é nada rápido ou prático resolvê-los antes de mudar de identidade de novo. Contratos, bens, uma série de coisas no nome de Arthur Cartro, que precisam ser, ou repassadas a minha nova persona, ou liquidadas.

Ela tenta, mas não consegue disfarçar o aborrecimento pelas desculpas dele.

— Negócios, do tipo: Alice? — Pergunta, apertando com força o volante. — Essa sua obsessão pela patricinha sem sal ainda vai condená-lo, e a mim também.

— Eu controlaria a língua se fosse você. — Ele a encara, olhar ameaçador.

Ela dá uma risada, então responde:

— Esse é o problema, meu querido. Você sempre foi precavido, meticuloso, agora ai está você, se expondo a riscos. Quanto tempo mais pretende enrolar nessa maldita cidade, somente para poder observar sua mortal a distância? Parece que se esqueceu do quanto me arrisquei vindo atrás de você, do quanto nós nos arriscamos permanecendo aqui, sabendo que... — A frase é bruscamente interrompida por um furgão cinza que se choca contra o carro. O impacto é pelo lado da motorista, e forte o suficiente para fazer o veículo mudar de direção, sair da estrada e por fim, capotar!

O casal se esforça para resistir aos impactos sucessivos de um carro rolando ladeira à baixo, com vidros quebrando e lataria amassando em uma queda que não parece ter fim. A estrada era cheia de curvas perigosas, com poucos carros circulando quando o furgão apareceu e aos poucos se aproximou, como se quisesse ultrapassar o carro esportivo. Se não estivesse discutindo, conseguiria reagir mais rápido, pensa ela, enquanto sente a dor do corpo se chocando vez após vez, concluindo que mesmo para alguém como eles, o cinto de segurança teria feito diferença. Quando tudo termina, o carro para de rodas para cima.

Após alguns momentos se recuperando da sensação de vertigem e confusão, Arthur arromba a porta do seu lado e começa a puxar sua companheira para fora. Ele tem alguns cortes e hematomas superficiais, coisa que o poder do seu corpo morto logo irá curar. Ela por outro lado, tem grossos cacos de vidro encravados nos braços e costas, além de vários cortes e hematomas menores, mas ainda parece estar em condições razoáveis de reação. Enquanto a motorista começa a ser retirada daquele veículo de ponta a cabeça, ele ouve sons de movimentos rápidos e respiração forte descendo até eles. Vanessa geme de dor, enquanto se escora no que restou do carro e começa a arrancar os cacos que penetraram seu ombro.

Arthur sente o perigo, e se dá conta que a caçada começou, ainda que não saiba quem exatamente o está caçando.


Notas Finais


Sei que tinha prometido o Issac em ação contra os vampiros nesse capítulo, mas senti que precisava explorar outros pontos antes. Então, altas emoções no próximo capítulo.


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