1. Spirit Fanfics >
  2. Um alguém especial >
  3. 3

História Um alguém especial - 3


Escrita por: FrancisClay

Notas do Autor


Boa noite meninas...como prometido um capitulo a mais essa semana. O intuito é agilizar o encontro das duas porque sei que estão ansiosas por este reencontro mas pra isso não posso atropelar o texto, como disse anteriormente a história é focada na Marina e vamos combinar que a moça é um poço de confusões... Com isso o encontro está próximo...por favor tenham paciência, vai valer a pena... Bem, vamos a história. Boa leitura.

Capítulo 3 - 3


A Pousada das Margaridas é um hotelzinho bucólico e acolhedor. Foi fundada em 1970 e a decoração mudou muito pouco desde então. Apesar disso, não é um local com cara de velharia. Está mais para um estilo vintage: rústico, chique e atual.

As trinta suítes são disputadas a tapas nos períodos de alta temporada. Muitos nomes de peso já passaram por aqui, inclusive estrangeiros. E eles sempre voltam, o magnetismo desse lugar é latente.

A construção, em estilo colonial, foi totalmente restaurada assim que meu avô colocou as mãos na escritura do imóvel. Poucas foram as alterações na estrutura original e meu pai conta que uma pequena fortuna foi investida para que a Pousada das Margaridas se tornasse um dos pontos turísticos de Paraty.

Um dos lugares que mais gosto é o pátio central, ladeado por jardins de margaridas, duas piscinas e um gazebo incrível, coberto por copas de árvores centenárias. É nesse pedaço de paraíso onde é servido o melhor café-da-manhã ao estilo colonial do estado do Rio de Janeiro.

Ainda no complexo do hotel funciona um restaurante típico, comandado pelo Chef Espírito, um amigo de longa data. O apelido surgiu quando ainda éramos crianças e tem um motivo de ser: Espírito é albino e a alcunha pegou tão logo a inventei. Marcos Paulo é o nome dele, mas acho que nem mesmo a mãe do Espírito se lembra do seu nome de batismo.

Na parte de trás da pousada, seguindo pelo estacionamento, dois sobrados foram erguidos: a casa dos meus avós e a casa do meu pai, uma ao lado da outra. O que as separa é um suntuoso jardim de flores multicoloridas, circundado por um aroma que me remete a infância de imediato.

É bem no centro desse jardim que estou agora, embalando-me para frente e para trás, num balanço de madeira construído pelo meu avô assim que dei os primeiros passos. A corrente range baixinho e sinto cheiro de verniz novo no ar.

Jogo a cabeça para trás e fecho os olhos, capturando os sons dos pássaros e inebriando-me com o odor que se desprende das flores ao redor. Os pés se arrastam no cascalho branco enquanto meus cabelos vêm e vão pelo rosto, acompanhando o movimento do corpo.

— Marina, algo me diz que você veio para ficar. – a voz do meu avô chega mansa e rouca aos ouvidos. – E não estou dizendo isso só pelos milhões de sapatos que lotam o seu carro. – ele limpa a garganta e solta a pergunta: – O que aconteceu em São Paulo?

Paro de me balançar e miro meu avô. Através das lentes de seus óculos, noto olhos azulados interrogativos, aliás, uma herança genética pela qual agradeço todas as manhãs. Nossos olhares são idênticos, com rajadas esverdeadas e douradas.

Respiro fundo e me preparo psicologicamente para a conversa. Sei que meu avô não arredará o pé daqui enquanto eu não desembuchar o que tanto me atormenta.

— Eu não sei qual é o meu problema, vô. Não gosto de me meter em encrencas, mas é impressionante: elas vivem se metendo comigo.

— Tem algo a ver com o Roger? É esse o nome dele, não?

— Não foi só ele. Teve o Alan, o Reinaldo e também o carinha da academia. Todos me traíram, eu só atraio tipos assim para a minha vida. – lamurio-me.

— Vamos nos concentrar na última encrenca. O que aconteceu? – vovô toma assento ao meu lado, encontrando uma tremenda dificuldade em sentar-se no balanço pequeno demais para seu bumbum avantajado.

— Quer mesmo saber? – indago, pesarosa.

— Não me esconda nada.

— Ok. – faço uma pausa para rememorar os detalhes sórdidos. – Roger e eu estávamos juntos há quase um ano. Tínhamos uma reunião importante naquele dia. Um cliente poderoso lançou uma concorrência entre três grandes agências de propaganda da capital.

Era a nossa chance, a minha oportunidade de provar que não sou apenas um rostinho bonitinho e que mereci o cargo de Diretora de Criação.

— Roger é o proprietário da agência, seu chefe, correto?

— Ex-chefe e ex-namorado. – bufo.

— Continue. – vovô incentiva.

—  O  fato  é  que  o  Roger  estava  atrasado  para  a  reunião.  A sala  estava  montada,  minha apresentação pronta e nada do cara aparecer. Quando o cliente chegou, eu quase tive um surto psicótico.

— Não seria a primeira vez. – vovô lança uma gargalhada gostosa no ar, mas logo se recupera. – Desculpe, querida, prossiga.

Forço a memória a trabalhar. A cena se desenrola facilmente em meu cérebro fervilhante. Respiro fundo e dou voz as lembranças, como se tivessem ocorrido ontem:

— A sala do Roger é local proibido para qualquer funcionário da agência. Nem a faxineira pode limpar o lugar sem a prévia autorização do chefão. Nunca soube o motivo de tamanha paranoia, até aquele dia. Acreditava ser TOC ou outra doença mental qualquer.

“O fato é que precisava encontrá-lo e rápido. Ninguém sabia do paradeiro dele e o carro estava na garagem do prédio. Quando ouvi o celular do patife tocando dentro da sala, esmurrei a porta e não houve resposta.

“Pensei que ele estivesse em apuros, que um aneurisma fatal pudesse tê-lo derrubado, afinal, Roger nunca deixava o celular para trás, nem para ir ao banheiro.

“Nesse ponto, mais do que decidida e angustiada, resolvi colocar em prática o lado MacGyver que você me ensinou.

— Arrombou a porta com um grampo de cabelo?

— Dois clipes. – elucido.

— Também funcionam muito bem. – vovô concorda, com um sorriso orgulhoso. – E o que encontrou ao entrar?

— Descobri o motivo daquela sala ser proibida para qualquer funcionário. – entro em devaneios e murmuro: – Que cara maluco.

— Marina? – vovô estala os dedos e volto a narrar.

— Bom, me deparei com um sistema de monitoramento de última geração. Tive a impressão de estar no quartel general da CIA, haviam câmeras fantasmas espalhadas por toda a agência. – explico.

— Impossível detectar? – vovô tira os óculos e limpa as lentes na camisa. – Isso é proibido por lei.

— É, eu sei, mas o fato não tem muita importância agora. O lance foi que, quando me aproximei da mesa suntuosa daquele babaca, dei de cara com um monitor gigante e todas as câmaras estavam transmitindo, inclusive a que ele escondeu na escada de incêndio.

— Por que essa câmera é especial? – vovô coça os olhos e recoloca os óculos. – Ele estava lá? Na escada de incêndio?

— Acredita? Uma reunião mega importante para a empresa iria começar e o filho da mãe estava dando uma com a secretária boazuda dos peitos comprados. – uno as sobrancelhas, em dúvida. –

       Ainda acho que a bunda dela também foi comprada.

— Pegou seu namorado com a secretária na escada de incêndio. – vovô suspira, pensativo. – E o que você fez, Nina?

— Engoli a minha fúria e a profissional entrou em cena. Fui para a reunião e dei o melhor de mim. No meio da apresentação, o cretino apareceu com a maior cara lavada.

— Conseguiu ao menos terminar a sua apresentação?

— Terminei e o cliente curtiu. Mas então, o filho da puta com o ego do tamanho do Empire States resolveu puxar a sardinha para o lado dele, dizendo que a ideia da campanha havia saído daquela cabeça com os primeiros cabelos brancos aparecendo. – minha voz sobe alguns decibéis. – Poxa, vô, a ideia da campanha foi minha! Eu trabalhei semanas com a equipe de criação para bolar as peças mais criativas de que aquela agência já teve notícia! E o canalha simplesmente lança que a coisa toda partiu dele?

— Hum. – vovô une os indicadores na altura do queixo, reflexivo. – Já posso imaginar o final dessa história. Se eu bem conheço meu caldeirão em ebulição, você partiu a cara dele ao meio.

— E encaçapei as bolas também! – dou um soco no ar e então, cerro as pálpebras, arrependida. – Droga, vô, perdi o controle, para variar.

— E o emprego, pelo visto.

— E minhas economias, já que o desgraçado está me processando. O juiz congelou minha poupança até o veredito final.

— Nunca vi a justiça andar tão rápido nesse país. – vovô força um sorriso.

— O pai do safado é o juiz. – revelo, tristemente. – Sacou o meu drama?

— Não conte isso à sua avó. Ela é bem capaz de juntar todos os malandros de Paraty e pagar uma boa grana para finalizarem com esse tal de Roger. – vovô brinca e me arranca um sorriso melancólico. – Nina, esse fulano não merece você.

— E eu, vô? O que eu mereço? – choramingo.

— Toda a felicidade do mundo, meu amor.

Eu só queria um homem para chamar de meu, alguém que não me traísse e fosse um companheiro para todo o sempre.

É pedir demais?

Após me regalar com um risoto de açafrão do além – do Espírito, para ser mais exata –, atiro-me na cama e abro a caixa de fotografias. Amo máquinas fotográficas, mas odeio guardar as lembranças em pen drives ou arquivos no computador. Gosto de imprimi-las para apreciar sempre que tiver vontade. Pensando bem, poderia quem sabe um dia fazer disso minha profissão. Paro por um momento pensativa. Será?? Saio de meus devaneios e olho o relógio. Já passa das nove da noite e nem sinal do papai. Ele é o diretor do único hospital particular de Paraty e trabalhou por anos no setor público, como cardiologista. Ainda atende alguns pacientes, mas só em casos de urgência.

Ligo o computador e o Skype. Vanessa atende com a cara amassada e veios grossos da almofada da sala se desenham em sua pele branca e cheia de sardas. Seu olhar sonolento se fixa no meu e ela boceja alto.

— Dormindo uma hora dessas? Não tem nenhuma balada boa nessa cidade hoje? – incito.

— Que nada. É ressaca mesmo. O Zé e os caras vieram para cá e tomamos todo o estoque de vinho que você deixou. Em sua homenagem, obviamente. – Van rebate, num tom molenga. – Eu não estava a fim de sair, sem você não tem a menor graça.

— Depois eu é que sou a rainha do melodrama. – reviro os olhos.

— Já se instalou? Como estão seus avós? E seu pai?

— Meu quarto está uma zona, não arrumei nada ainda. Estava revendo umas fotos antigas, da época da faculdade. Bons tempos aqueles. – digo, num tom saudosista.

— Algo que valha a pena me mostrar? – Van dá outro bocejo longo. – Porque sério, eu estou vendo duas de você nesse momento. Preciso de um banho frio e cama.

— Lembra quando fizemos uma lista do homem perfeito? – seguro uma folha dobrada entre os dedos. – E então colocamos debaixo do colchão por um ano?

— Não vá me dizer que guardou?! – ela tem um sobressalto.

— Tanto guardei como encontrei dentro da caixa de fotografias. É hilário, eu preciso ler para você.

— Pode ser amanhã, Nina? Estou sem a menor condição. Sabe aquelas velhas surdas que entendem tudo errado? Pois é, sou eu nesse exato segundo.

O barulho da porta da frente atrai minha atenção.

— Van, acho que meu pai chegou. Amanhã eu ligo, tá bom?

— Mande um beijo para o seu velho e gostoso pai. Câmbio final.

                                                                ≈≈≈

Meu pai é daqueles coroas atraentes, com os cabelos levemente grisalhos, barba por fazer e o corpo atlético que arranca suspiros das damas mais comportadas da sociedade.

É sobre seu peito bem trabalhado na musculação que enfio a minha cara depois de despejar toda a tralha que estava engasgada na garganta. Se não chorei no colo do meu avô, estou fazendo o dobro disso agarrada ao meu velho.

Suas mãos alisam meus cabelos desgrenhados e ouço a respiração cadenciada que movimenta seu tórax para cima e para baixo. Depois de um longo tempo, ele resolve perguntar:

— Está apaixonada?

 Eu não sei, acho que sim, e tenho vontade de me suicidar por isso. – retruco.

— Você sempre teve o dedo podre para escolher namorados. Com exceção de....

-  Pai! – dou um salto no sofá, indignada. Isso foi há muito tempo atrás.

— É a verdade, filha. – meu pai me encara com olhos cheios de sabedoria. – Se você só atrai esse tipo de homem, a vida está lhe dando uma chance de aprender com isso. Mas, pelo visto, você ainda não compreendeu o que é necessário para seguir em frente.

— Aprender o que com as traições? A sofrer? A me descabelar? Realmente não estou entendendo o recado. Será que a vida pode ser mais direta? – bufo e cruzo os braços, irritada.

— Isso tudo vai passar, filha, não se preocupe.

Meu pai limpa a garganta e percebo que há uma pergunta entalada, doida para ganhar voz. Já sabendo do que se trata, suspiro profundamente e deixo que ele mude o rumo da conversa.

— Tem falado com a sua mãe?

Demorou para o assunto “sua mãe” entrar em pauta, já estava até estranhando o fato. Aprumo-me e descruzo os braços, trazendo os joelhos para o peito. Falar sobre minha mãe nunca é fácil, ainda mais por não ter superado a sensação de abandono que ela deixou para trás.

— Faz um mês que não falo com ela. – revelo, num fio de voz. – Jura mesmo que não sente raiva? Nem uma pontinha?

— Raiva da sua mãe? – um breve sorriso se desenha nos lábios do meu pai. – Como eu poderia? Sua mãe é um anjo, um espírito livre e aventureiro. Eu sempre soube que um casamento ou mesmo uma filha não a segurariam por muito tempo. E outra, teve a morte dos seus avós, sempre leve isso em consideração ao julgá-la.

— Um casamento eu até posso entender, mas, poxa, ela deveria ter pensado em mim antes de sair pelo mundo em sua jornada espiritual ou sei lá como chamam isso. – rebato, levemente alterada. – E quanto a morte dos meus avós, foi apenas uma desculpa que ela encontrou.

— Não sinta raiva, isso faz mal ao coração. – papai bate em seu próprio peito.

Eu tinha doze anos quando um bando de malucos se hospedou aqui na Pousada das Margaridas. Se vestiam como hippies, falavam sobre dimensões paralelas, seres ascensionados e a busca espiritual rumo a iluminação.

Não entendia bulhufas do que diziam, ainda assim eu gostava de ouvir sobre outros mundos, civilizações mais avançadas e os caminhos sagrados espalhados por todo o globo.

Assim como eu, mamãe ficou fascinada. Sempre foi interessada em tudo o que é oculto, místico, esotérico. Aliás, ela atuava como terapeuta holística e mantinha um consultório até bem frequentado no Centro Histórico de Paraty.

Aplicava Reiki, cromoterapia, utilizava-se de cristais coloridos e me recordo até de uma espécie de mesa com um design bem esquisito. Com a ajuda de um pêndulo e da tal mesa, minha mãe dizia ser possível medir a energia dos chacras de seus pacientes.

O fato foi que, quando os tais malucos tomaram seu rumo após quinze dias na pousada, mamãe caiu em depressão. Queria a todo o custo segui-los, sabe-se lá para Deus onde.

Meu pai ficou alucinado quando ela fez as malas. Meu avós tentaram detê-la, sem sucesso. Eu chorei horrores e me agarrei à barra de sua saia, como uma criancinha birrenta.

Nada surtiu efeito, ela estava decidida.

Depois de raspar toda a herança que seus pais haviam deixado, minha mãe partiu para Machu Picchu, no Peru. Largou o consultório, os pacientes, meu pai e a mim para trás. Ainda não sei como ela teve coragem para tanto.

Vi meu pai envelhecer anos em apenas alguns meses. Mas ele não caiu num poço sem fundo como era de se pressupor. Manteve-se firme e meteu a cara no trabalho, deixando-me por conta dos meus avós. Foram tempos difíceis aqueles, principalmente por minha causa.

Entendam:

Minha mãe me abandonou para buscar a iluminação;

Eu estava entrando na adolescência;

Minha menstruação finalmente havia dado as caras. Que garota de doze anos aguentaria tudo isso numa boa?

Enfim, fiz da vida dos meus avós e do meu velho um inferno. Aprontei todas e mais algumas no colégio, arrumava brigas em qualquer lugar e cheguei ao ponto de fugir de casa por quatro vezes. Passei a odiar Paraty e a pousada. Os turistas me irritavam. A alta temporada era uma tortura e eu jurei que assim que completasse dezoito anos, me mandaria da cidade. E não é que cumpri a promessa?


Notas Finais


Bem...por hoje é isso e ate quinta feira garotas. Bjos...e um pouco de paciência...
Fuiiiiii


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...