História Um Ano Nem Tão Incrível Assim - Sou Famosa!

Eu estava dormindo, já que todos os filmes disponíveis do avião são mais entediantes do que assistir a uma tartaruga em uma corrida. Mas, fui acordada pelo ronco de Rafael. Já que ele me acordou, vou acordá-lo também.

   - Acorda Rafael. Você está roncando!

   Eu disse sussurrando e o cutucando para acordá-lo.

   - Oi? O que está acontecendo? Onde é que estou? Ei! Eu não ronco!

   - Ronca sim! E me deixa passar, a não ser que queira que eu faça minhas necessidades em você!

   - Você me acordou para isso? Seria muito mais fácil e conveniente para você passar por cima de mim!

   Apenas ignorei e fui em direção ao final do corredor, ao banheiro. Estava ocupado, então, apenas esperei. Praticamente todos os passageiros estavam dormindo, com minha exceção, a da pessoa que estava no banheiro e Rafael.

   Eu estava mexendo no celular quando ouvi um pequeno barulho da porta se abrindo e me assustei um pouco. Mas minha expressão de assustada se desfez e passou a ser de encantamento.

   Quando a porta se abriu, de lá saiu um garoto mais alto do que eu, de pele levemente bronzeada, cabelos escuros, curto nas laterias, e alto com um topete charmoso na parte de cima. Olhos castanhos esverdeados. Por um minuto fiquei até com inveja daquela pele bronzeada. A minha é completamente pálida. Preciso mesmo pegar sol.

   Ops! Tarde demais para perceber que estava de meia ao invés de usar um sapato.

   - Uau.

   Foi o que ele disse. Não sei se foi ao olhar para mim ou ao se deparar com uma pessoa que tem cada um dos olhos de duas cores diferentes. Acho que foi pelas duas coisas. Ufa! Não percebeu a ausência de meus sapatos.

   - É... Posso entrar?

   Eu disse um pouco tímida.

   - Ah! Claro, claro. Pode sim, é... Licença.

   É, ele é americano.

   Ele disse isso um pouco nervoso e balançando a cabeça. Parecia estar se forçando a parar de pensar algo. Acho que quando já estávamos de costas um para o outro, ele me olhou mais uma vez, pois tive a estranha sensação de estar sendo observada.

   Quando cheguei à minha poltrona, fiquei sabendo que Rafael havia assistido a cena, pois assim que me sentei ele falou:

   - Já esqueceu o Leo, irmãzinha?

   - Cala a boca garoto! Você sabe muito bem que não éramos namorados, e quando eu o quis, ele me tratou feito um lixo! Tenho um ideia! Toda vez que você mencionar o nome dele ou qualquer coisa relacionada a ele eu te dou um soco no estômago.

   - O.k. Trato feito.

   Rafael respondeu com um sorriso malicioso nos lábios.

  Apenas assenti com a cabeça.

   Depois desse breve diálogo, algumas horas mais se passaram e finalmente chegamos ao aeroporto. Já estávamos exaustos de ficar sentados.

   Rafael e eu não estávamos com muitas malas, queríamos comprar tudo lá. Então, ficamos no aeroporto durante uns quinze minutos aguardando vovô chegar para nos levar à sua casa. Quando menos esperávamos, apareceu um senhor com cabelo grisalho – para falar a verdade, só descobri que era um senhor com uma idade um pouco mais avançada devido às madeixas grisalhas --, um pouco alto e bem... Estiloso.

   Era o vovô Müller! Ele estava com uma calça jeans, uma blusa branca, um cardigan preto por cima e óculos escuros. Agora já sei de quem herdamos o estilo roqueiro de ser. Demorei um pouco para perceber que estava boquiaberta.

   Se estivéssemos no século passado, todos iriam julgá-lo dizendo que aquelas vestimentas não eram, digamos, adequadas para alguém de sua idade, eu acho, apesar de ele ter apenas 49 anos. Mais uma vez, obrigada Deus, por fazer com que, as pessoas não pensem mais assim.

   Eu que estava de óculos escuros, os tirei para ver melhor. Rafael fez o mesmo.

   - Jade, em boca aberta entra mosquito.

   Rafael disse rindo da minha cara.

   - Cala a boca! É o vovô!

   - O que? É sério? Uau.

   Rafael disse tão admirado quanto eu.

   Quando vovô nos viu veio andando o mais rápido possível em nossa direção. Rafael e eu nos entreolhamos e fomos em direção dele também. Foi incrível rever o vovô. Na última vez que o vimos, foi quando tínhamos doze anos de idade, que foi quando ele fez um show no Brasil.

   - Como vocês cresceram! E olhem só! Vocês também escutam rock? Adoro essas bandas! Que saudades eu estava dos meus netinhos!

   Ele tentou falar em português, se enrolou um pouco, mas conseguiu. Percebi seu esforço para de comunicar e, acho que Rafael também, pois ao responder-lhe, falou tudo em inglês, assim como eu fiz.

   - Também sentimos saudades vovô!

   Respondemos em coro.

   - Então quer dizer que agora senhor é o astro do rock, Eduardo Müller?

   Indagou Rafael sem rodeios.

  - Sim, sou eu mesmo. E vocês? Quem são? São os filhos das minhas queridas filhas?

   Vovô falou brincando. Rimos. Saímos do aeroporto e colocamos novamente os óculos.

   Quando chegamos ao estacionamento do aeroporto, nos deparamos com vários paparazzi, jornalistas e muitos, muitos flashes. Parece que vovô ficou bem famoso ao virar ator e músico. Colocamos as malas em seu devido lugar e entramos no carro. Ficamos nos bancos de trás, já que a futura esposa do vovô estava ocupando e banco de passageiro na frente.

   - Desculpa a demora crianças. Tive um problema com o trânsito.

   - Sem problemas.

   Respondeu Rafael.

   - Que indelicadeza a minha! Crianças, essa aqui é Mary, minha noiva, iremos nos casar daqui três meses. Mary, esses são Jade e Rafael. Essas são as crianças que vivo falando para você.

   Não sei por que meu avô só fica nos chamando de criança. Tudo bem, eu ainda assisto desenho animado e coisas do tipo, mas isso não conta! Tenho quinze anos e daqui a alguns meses faço dezesseis.

   - Como são adoráveis! Dá até vontade de apertar as bochechinhas deles! Parecem tão macias!

   Rafael e eu nos entreolhamos com uma expressão de pânico. Tudo menos aquilo! As bochechas não, pelo amor de Deus.

   - Obrigada, a senhora também parece ser adorável! Adorei seu cabelo!

   Mary, assim como meu avô não parecia ser mais velha. Eu daria a eles uns quarenta anos a eles e não quarenta e nove que é a idade que eles têm, em média. Mary tem os cabelos ruivos e olhos azuis. E sardas, ela tem sardas, assim como eu. Aparentemente ela também gosta de rock, mas só escuta os de batidas mais leves como Sweet Child O' Mine do Guns n' Roses.

   Meu avô sempre foi bem radical e esportista. Minha falecida avó sempre foi mais calma. Mas, como dizem, os opostos se atraem. Porém, fico feliz por ele ter encontrado alguém que faça as mesmas coisas que ele junto a ele, e não de platéia. Apesar de não ter conhecido minha avó, minha mãe sempre me contava dela.

   - Ah, obrigada querida. Pelo que vi você tem cabelos enormes! Adorei os seus também.

   Apenas assenti com a cabeça e agradeci. Nunca soube o que responder as pessoas que não conheço. Então, um silêncio se fez.

   - Então, Rafa, trouxeram o que eu falei?

   Meu avô quebrou o silêncio.

   Apenas olhei para Rafael. Eu não fazia ideia do que estavam falando.

   - Sim vovô. Trouxemos.

   Rafael respondeu.

   - Vocês estão muito cansados?

   - Não. Nós dormimos no avião.

   - Ah que bom! Porque agora, vocês irão andar de skate! Se quiserem é claro! Ih! Desculpa! Esqueci de perguntar como foi a viagem?

   - Foi ótima! Mas, o Rafa disse que a pista vai ser inaugurada daqui a três semanas!

   - Rafael! Eu falei isso com você três semanas atrás! Hoje, nós iremos inaugurá-la! E vocês quem vão cortar a faixa de inauguração! Mas somente depois do almoço o.k queridos?

   - O.k. Mas é sério que nós vamos cortar a faixa de inauguração?

   - É isso aí! E vocês vão estreá-la também! Robert, o prefeito, meu melhor amigo, faz questão disso!

   Um sorriso radiante se fez em meu rosto.

   - Vovô, pode fazer uma pergunta?

   - Claro querida!

   - Por qual motivo ele mandou construir uma pista de skate?

   - Porque lá, assim como vocês, há várias pessoas que praticam o esporte. E uma das primeiras melhorias que fez na cidade quando se tornou prefeito foi construir uma pista para a molecada. Partia-o coração ver aquelas crianças andando de skate pela calçada. Eles precisavam de um lugar mais adequado!

   Não respondi nada. Pois, pelo espelho, vovô viu minha reação de felicidade e fez um sorriso orgulhoso.

   Meu Deus! Mais pessoas para andar de skate! Estou cada vez gostando mais dessa cidade.

   Durante o caminho para a casa de vovô, ele colocou música para ouvirmos. Mas foi praticamente em vão. Poucos minutos depois, Rafael e eu já estávamos dormindo. Tenho o sono um pouco leve, então, pude ouvir meu avô dizendo: "isso é porque não estavam cansados." E deu uma risadinha.

   Chegamos em casa.

   A casa do vovô é bem grande e espaçosa. São três andares, o último é um terraço meio aberto, acho que vou gostar de observar as estrelas de lá, e para minha alegria tem animais! Tem um cachorro, um papagaio e uma gatinha linda.

   No primeiro andar, fica a cozinha, a sala de estar onde tem uma TV e onde podemos assistir filmes e coisas assim, a copa, um banheiro para visitas e um escritório, com uma lousa, uma mesa e uma cadeira aparentemente confortável. E um banheiro para as criadas.

   No segundo ficam os quartos, uma TV que é acompanhada por um sofá que, pelo o que vovô disse é onde podemos jogar vídeo games, outro escritório que, por sua vez é menor que o outro, se não me engano, é onde Rafael e eu iremos fazer as nossas tarefas de casa, pois, no lugar de uma cadeira a mesa, são duas, uma de cada lado. Parece ser bem confortável, pois, a mesa fica ao lado de uma grande janela que, por ela entra a luz do sol. E três banheiros, uma para mim, outro para Rafael e, por fim, um na suíte de meu avô e sua esposa. 

   Ainda no primeiro andar, tem a garagem, uma piscina, um lugar que o pequeno cachorro possa brincar e uma área para churrasco, que, além da churrasqueira tem uma mesa gigante onde podemos almoçar e uma bancada que parece de um barzinho com algumas cadeiras em volta.

   Nessa área de convivência tem alguns quadros de pessoas que foram grandes estrelas do rock como Slash, Kurt Cobain, Axl Rose e Elvis Presley. Acho que são os favoritos do vovô.

   Enfim, a casa de vovô é muito agradável de viver.

   Essa viagem já havia sido programada há algum tempo. Então, vovô mandou reformar os quartos para nós. O meu quarto é inteiro branco, com algumas fotografias minhas em porta-retratos, alguns pôsteres de minhas bandas favoritas, uma cama maravilhosa com um jogo de lençóis de galáxia! Ao lado da cama tem um pequeno criado mudo onde tem um relógio despertador. Não havia reparado antes, mas, ao apagar as luzes, no teto há adesivos fluorescentes que, no escuro brilham como estrelas. Há também uma enorme estante de livros, com os meus favoritos. Lá tem também livros infanto-juvenis que fizeram sucesso de algumas escritoras há alguns muitos anos atrás. Amei! Quero ler todos!

   No quarto de Rafael é basicamente a mesma coisa, porém, no lugar de estrelas no teto, ele tem um aquário personalizado de navio pirata em cima de uma estrutura que parece que fora enterrado no local. Fiquei até com inveja daquele aquário. E seu jogo de lençóis é preto e branco. E em sua estante de livros há entre vários outros uma coleção clássica de Harry Potter. Vovô disse que fez muito sucesso também. Eu já havia ouvido falar, mas não cheguei a pesquisar sobre, quero ler também! 

   Vovô disse que as criadas iriam se responsabilizar pelas malas, então depois de nos mostrar os quartos, voltamos para o primeiro andar para almoçarmos. O almoço não foi nada muito pesado. Foi um espaguete, com molho de tomate e queijo parmesão por cima. Meu prato favorito. Não comi muito porque logo depois seria a inauguração da pista de skate. Vovô disse que eu e Rafael iríamos estreá-la. Por tanto, não poderíamos nos encher demais, caso contrário, aquele dia seria um grande desastre.

   Quando estávamos chegando ao local da inauguração, quase não conseguimos passar devido à grande quantidade de gente.

   Dentro do carro, eu estava mexendo em minhas redes sociais, quando vi uma foto minha junto a meu avô e Rafael. Em várias páginas e sites de fofoca! Nas legendas estavam escrito: "netos do Eduardo Müller chegaram à cidade em grande estilo. E há boatos que irão estrear a nova pista de skate da cidade."

   Meu Deus! Sou famosa!

   Fui ler a matéria e estava escrito assim: "Jade Müller e Rafael Müller, são os únicos netos do senhor Eduardo Müller. Eles irão passar um período de dois anos com a gente. E, além de nos prestigiar com a presença, irão estrear a nova pista de skate na cidade. São considerados irmãos devido a um grande fenômeno que é raro de se acontecer. Suas mães ficaram grávidas juntas e deram a luz a essas lindas crianças no mesmo dia. Eles têm um charme nos olhos. São metade verde e metade azul. Simplesmente incrível não é mesmo? Em tão pouco tempo, esses lindos adolescentes, ganharam o coração de muitos da cidade."

   Eu estou simplesmente maravilhada e espantada! Como as pessoas descobriram tão rápida da minha história? Era para ser algo pessoal. Já não é, agora, mais de sessenta mil pessoas sabem! Não sei quem contou, mas pisou feio na bola comigo.

   - Vovô, não sei se já viu essas matérias a respeito de nossa chegada mas, foi você que contou de sermos praticamente irmão e outras informações pessoais.

   Perguntei com uma ponta de tristeza em minha voz.

   - Oh minha netinha, me desculpa! Fui eu que contei. Eu realmente não sabia que ficaria triste.

   Ele respondeu com um tom de voz triste.

   Rafael passava a mão em meu ombro, como se fosse um sinal de "não fique assim, maninha".

   - Mas, para compensar esse meu erro, que tal amanhã passearmos a barco?

   - Sério? Você promete?

   - Prometo!

   - Eu teria aceitado somente o pedido de desculpas, mas já que você prometeu terá que cumprir.

   Falei com um sorriso malicioso nos lábios.

   - Com que você aprendeu isso hein? Garotinha esperta!

   Ele disse entre risos.