1. Spirit Fanfics >
  2. Um Futuro Escrito em Gelo e Fogo >
  3. Sangue da Lua

História Um Futuro Escrito em Gelo e Fogo - Sangue da Lua


Escrita por: crownprincess

Notas do Autor


Depois de uma eternidade (porque 84 anos é pouco), capítulo novinho pra vocês! Boa leitura!

Capítulo 16 - Sangue da Lua


Fanfic / Fanfiction Um Futuro Escrito em Gelo e Fogo - Sangue da Lua

Ned começou a suspeitar que algo estava errado quando escutou o barulho ensurdecedor das trompas atravessaram as grossas paredes de mármore e pedra que revestiam Correrrio enquanto ele, Brandon, Robert, Ethan Glover, Elbert Arryn, Jeffory Mallister e Kyle Royce regressavam para o salão principal após sentirem a brisa fria dos rios sob a lua. Sua desconfiança se confirmou quando viu Sor Arthur Dayne e Sor Oswell Whent, ambos irmãos juramentados da Guarda Real, parados ao lado de um homem alto e esguio, cujos cabelos prateados caíam como uma torrente de água abaixo dos ombros.

Inicialmente, Ned não pôde acreditar na ousadia do Príncipe Rhaegar, que sempre fora tido como um homem reservado e sério; mas quando seus olhos recaíram sobre Lyanna, a expressão de puro terror que estampava o rosto da irmã lhe trouxe à realidade. A garota, que sempre tivera uma pele naturalmente alva, estava mais branca ainda e parecia um fantasma pela falta de cor em sua tez. Seus olhos cinzas estavam tão escuros que pareciam negros, maiores que nunca, talvez pelo choque que ela sentia.

A sensação de que aquilo já havia acontecido era angustiante, e Ned então percebeu que a cena nada mais era do que um eco do que ocorrera em Harrenhal quando Rhaegar Targaryen fora indelicado o suficiente para coroar Lyanna como Rainha do Amor e da Beleza. Ele não teve chances de impedir que o Príncipe desrespeitasse a irmã antes, mas desta vez não iria ficar parado vendo a coisa toda se desenrolar. Sem esperar Brandon, Robert ou os outros rapazes, Ned atravessou o salão e se pôs do lado de Lyanna, de forma protetiva.

― Lorde Eddard, é bom vê-lo novamente. ― Rhaegar lhe disse e sua voz metálica ecoou pelo silencioso salão.

― O que Vossa Alteza está fazendo aqui? ― Ned perguntou, sem fazer rodeios.

O rapaz sentiu os olhos do pai lhe perfurarem pelo modo rude com o qual se portou, mas ele não se importava. Jon Arryn lhe ensinara a respeitar e acatar ordens dos seus superiores, mas pouco se importava com protocolos naquele momento. A única coisa importante era sua irmãzinha, que parecia aterrorizada demais para sequer respirar.

― Como eu ia dizendo a Lorde Hoster e Lorde Rickard, vim prestigiar o casamento do seu irmão, afinal de contas não é todos os dias que duas famílias tão importantes como os Stark e os Tully se unem. ― o Príncipe respondeu.

Antes que Ned pudesse replicar, viu os outros rapazes entrarem novamente no salão, e à frente deles vinha Robert. O Baratheon, que geralmente era sorridente e alegre, tinha uma expressão dúbia estampada no rosto, quase impossível de ser lida.

― Que surpresa vê-lo por aqui, primo. ― Robert falou.

Rhaegar virou-se e então encarou o Senhor de Ponta Tempestade.

― Digo o mesmo, primo. Não sabia que estaria por aqui. ― ele respondeu.

― Vou me casar em breve com a filha de Lorde Stark, então não é surpresa que eu esteja aqui. Estou com minha família, Alteza. ― Robert lhe disse ― E por falar em família, como estão Elia e as crianças?

Ned não conseguia ver o rosto de Rhaegar, mas percebeu quando seu corpo adotou uma postura mais rígida. O rapaz temia que o melhor amigo e o Príncipe iniciassem um briga no meio do salão, e ficou tão absorto na tensão que pairava que assustou-se quando sentiu uma pequena, fria e trêmula mão envolver seus dedos.

― Me tire daqui, Ned. Por favor... ― Lyanna lhe sussurrou.

Ele encarou a irmã e viu que os olhos brilhavam como se ela estivesse a ponto de chorar. Ned segurou a mão dela com firmeza e assentiu com a cabeça, decidido a afastar Lyanna de uma possível confusão, e a puxou para que saíssem pela lateral do salão.

― Para aonde vão? ― Catelyn, que estava próxima a eles, perguntou baixo o suficiente para não chamar a atenção de mais ninguém.

― Lya não está se sentindo bem. ― ele replicou simplesmente.

Guiando Lyanna e escutando as vozes de Robert e Rhaegar ecoarem pela câmara, Ned tentou passar entre os homens de forma discreta, mas falhou miseravelmente. Todos os olhos caíram na irmã, pois muitos deles deveriam estar pensando o mesmo que o próprio Ned: o Príncipe de Pedra do Dragão havia ido até Correrrio atrás da Loba de Winterfell. Mas ele não se importava com os olhares ou com os bochichos, e escoltou Lya para fora do salão e levou-a até o quarto que ela ocupava.

Ele trancou a porta para que ninguém espiasse ou tentasse escutar a conversa dos dois e a indagou sem delongas.

― O que acha que Rhaegar veio fazer aqui?

Contudo, ao invés de responder, Lyanna arregalou os olhos e as orbes escuras o encararam com um terrível medo que ele jamais vira antes. Ela, então, se inclinou e colocou as mãos sobre os joelhos, despejando um líquido viscoso pela boca. Ned apressou-se para apará-la e segurou-lhe os cabelos enquanto ela vomitava.

Quando enfim terminou, Lyanna estava mais pálida do que antes e seus lábios não tinham cor alguma; ela tremia e segurava a sua mão de forma vacilante, como se tivesse medo de cair. Ned a guiou até a cama e a fez sentar, esperando até que ela dissesse algo.

― Me desculpe por isto... Eu não... ― ela enfim falou.

― Não há do que se desculpar, você está nervosa e pessoas fazem isso quando se exasperam. ― Ned tentou acalmá-la, mesmo que o fedor acre do vômito agredisse seu olfato.

― Você acha que as pessoas perceberam que eu estava... Nervosa?

Os olhos negros lhe encaram e ele respirou fundo, pronto para mentir apenas para não deixá-la mais sobressaltada.

― Todos os presentes estavam focados em Robert e Rhaegar, tenho certeza que sequer notaram nossa ausência.

Lyanna cerrou os olhos, como ela sempre fazia quando desconfiava de algo ou de alguém; mas logo a incredulidade deu lugar à apreensão e ela agarrou sua mão com força.

― Acha que eles vão brigar? ― a irmã perguntou, deixando escapar seu lado de menina ingênua ― Robert odeia o primo depois do que aconteceu em Harrenhal, não? Ele tenta disfarçar, mas eu sei...

Ned passou a mão que Lyanna não agarrara pelos cabelos escuros dela, disposto a tirar qualquer temor do seu coração.

― Robert é impulsivo, mas não cometerá nenhuma loucura. Tudo ficará bem, Lya.

A garota assentiu, como se tentasse convencer a si mesma que ele falava a verdade.

― Chamarei um dos servos para limpar essa bagunça. ― ele olhou rapidamente para a poça de bile que jazia no chão ― Você deve descansar, Lya. Amanhã poderá passear pelo rio para espairecer a cabeça e...

Lyanna tremeu ao escutá-lo.

― Não sairei deste quarto enquanto ele estiver aqui.

Ned aproximou-se da irmã e fitou os olhos aterrorizados.

― O que Rhaegar fez com você? Ele a machucou ou faltou-lhe com respeito? Porque se isto aconteceu, nós devemos falar com o pai e...

― Quero ficar sozinha. ― ela o interrompeu ― Estou cansada, Ned.

O rapaz suspirou pesadamente e depositou um demorado beijo na testa da irmã.

― Não hesite em me chamar se precisar de alguma coisa, sim?

Lya aquiesceu e lhe abraçou. Ned depositou um demorado beijo na fronte da irmã, que ainda tremia pelo nervosismo. Levantou-se e deixou-a sozinha, indo em direção ao salão onde o festim ocorria e viu que o Príncipe Rhaegar sentava-se na mesa de honra ao lado de Lorde Tully e Lorde Brynden – mas nem o pai, Brandon e muito menos Robert estavam lá.

Antes que pudesse ser visto por alguém, ele foi até os aposentos onde instalaram o senhor seu pai e soube que seu palpite estava correto quando escutou vozes elevadas e alteradas brandirem através das paredes. Sem pedir licença, entrou no quarto e encontrou os três, que imediatamente se viraram para encará-lo.

― Onde estava, Eddard? ― o seu pai perguntou, como uma voz grave.

Ned sabia que Rickard só lhe chamava pelo nome quando estava irritado, e por sua expressão, era possível saber que naquele momento a afirmativa nunca havia sido tão verdadeira.

― Estava com Lyanna. Ela não se sentia bem, então a levei até o quarto e lhe fiz companhia. ― o rapaz respondeu.

― Ótimo, é bom mantê-la afastada dele.

O pai evitou evocar o nome do Príncipe, mas Ned sabia que falava de Rhaegar.

― Como ela está? ― foi a vez de Robert indagar.

Naquele momento, Ned viu algo que jamais vira ao longo dos anos em que conhecia o Baratheon: ódio. O melhor amigo sempre fora afetuoso – talvez até demais em alguns momentos – e pouco sério, mas naquele momento o Stark deu-se conta que Rhaegar havia conseguido enfim despertar sua fúria.

― Nervosa. ― Ned admitiu ― Quis se retirar do grande salão assim que viu o Príncipe... Acho que por medo, talvez.

O rosto de Robert se contorceu em desgosto, e o azul cristal das suas íris pareceu se solidificar pela raiva, e por um instante Ned temeu que ele fizesse alguma loucura.

― Vê o que aquele maldito faz? Ele chega aqui como se fosse o senhor do castelo e intimida a minha Lyanna! A pobre sente tanto medo que se esconde como se fosse uma criminosa, enquanto ele banqueteia ao lado de Lorde Tully! ― Robert explodiu e o ódio que sentia agora era palpável.

Ned abriu a boca para tentar argumentar, mas Brandon foi mais rápido.

― Apesar de Lya não ser sua... ― ele encarou o Baratheon, lhe dirigindo um olhar um tanto desconfiado ― Eu concordo com você. Rhaegar pode ser o herdeiro do Rei, mas isso não lhe dá o direito de vir aqui incomodar minha irmã.

― Ela deve partir comigo e com Ned. Vamos até o Ninho da Águia encontrar Jon Arryn e de lá partimos para Ponta Tempestade para nos casarmos o mais rápido possível! ― Robert disse, com a voz firme e decidida.

O pai finalmente se levantou da poltrona e encarou os três rapazes à sua frente de forma séria.

― Antes de Lyanna ser irmã ou prometida de vocês, ela é minha filha e eu decido o que fazer em relação a ela. ― Rickard começou a falar ― Você a tomará como esposa na data prevista, mas até lá ela ficará ao lado da família para acompanhar o casamento do irmão.

― Se ela não pode ir, eu fico para a cerimônia. Assim que Brandon e Catelyn estiverem casados, Lyanna partirá comigo para Ponta Tempestade. ― Robert tentou argumentar.

A expressão do pai tornou-se mais estoica ainda ao escutar o Baratheon.

― Jon Arryn precisa de você e Ned no Ninho da Águia... E ademais, o que as pessoas pensarão se mudarmos os planos preestabelecidos e levarmos Lyanna para longe ou se plantarmos Lorde Baratheon ao seu lado como um cão de guarda? ― ele encarou longamente os rapazes.

― Pensarão que estamos tentando escondendo algo. ― Ned respondeu após hesitar.

― Exato. Todos os Sete Reinos sabem que o Príncipe sente certo... Encantamento por Lyanna. ― o pai disse, escolhendo as palavras para não despertar a ira do Senhor de Ponta Tempestade ― Como é de se esperar, ela se sente acuada e intimidada pela atenção que Rhaegar lhe dá, e depois do que aconteceu hoje, também será de conhecimento geral que ela não corresponde a estes sentimentos.

― Mas pelo visto o próprio Rhaegar parece incapaz de se dar conta disto. ― Robert replicou amargamente.

― Ele é o futuro Rei, tem uma esposa e dois filhos, mais cedo ou mais tarde se dará conta de que qualquer tentativa de se aproximar de Lyanna será frustrada e que deve voltar para a família e para os deveres de herdeiro da coroa. ― Rickard respondeu ― Não posso lhe dar ordens, Lorde Baratheon, mas em breve será esposo de minha filha e como tal, parte da nossa família. Peço que, por tais motivos, se contenha e não faça nada que enfureça o Príncipe ou o Rei. Assim como você. ― ele fitou Brandon.

Os dois rapazes se encararam, mas logo assentiram.

Ned percebeu que o pai ficara satisfeito com a conclusão da conversa e despachou os jovens; no entanto, pediu que o filho mais novo permanecesse enquanto Brandon e Robert se retiravam do local.

― Desejo saber mais uma coisa, Ned. ― ele declarou.

― Se puder, lhe ajudarei com todo o prazer. ― o rapaz disse, tentando parecer tranquilo.

― O que sua irmã fez e disse depois que saíram do banquete?

Ned juntou as mãos e respirou pesadamente.

― Lya estava nervosa e tremia muito, houve inclusive um momento no qual ela vomitou... Disse que não pretendia sair do quarto enquanto o Príncipe estivesse aqui.

O pai cerrou os olhos e passou os dedos pela espessa barba castanha.

― Ela vomitou?

― Acho que pelo nervosismo ou pelo vinho que tomou... A bebida não deve ter lhe caído muito bem.

Rickard sentou-se novamente na poltrona e encarou o fogo que trepidava na lareira.

― Mandarei um meistre para examiná-la. ― ele disse por fim ― Pode voltar para o festim, filho.

Depois de acenar com a cabeça, Ned saiu do quarto do pai, mas estava cansado, e principalmente sem vontade alguma de voltar para a festa. A única coisa que desejava era descansar, mesmo que parecesse que este seria uma das poucas coisas que não faria nos próximos dias.

 

***

 

A noite havia sido horrível e mesmo tendo conseguido dormir um pouco, Lyanna sentia-se exausta. O borrão confuso e emaranhado que se formava em sua cabeça sobre os acontecimentos ocorridos nas últimas horas fazia seu estômago se contorcer pelo nervosismo e ansiedade que tomavam conta do seu corpo.

Por um breve instante, logo após despertar, pensou que tudo tinha sido um terrível pesadelo, mas soube que tudo tinha de fato ocorrido quando a sua dama de companhia apareceu, contando o quão maravilhoso o Príncipe estava ao tocar sua harpa no banquete. Seu coração acelerou e as lembranças de Harrenhal faiscaram em sua mente, lhe recordando que ela própria havia se apaixonado por Rhaegar quando ele tocou uma maldita canção que lhe arrancou lágrimas – e foi impossível não pensar que pelo menos mais uma garota deve ter caído de amores por ele na noite passada durante sua performance.

Lyanna sentiu raiva de si mesma ao perceber que seu coração batia mais rápido pelo ciúme causado por aquele pensamento. Parecia uma criança estúpida, dividida entre o medo que sentia da situação em que se encontrava e das consequências que teria que encarar e pelo encantamento que sentia por Rhaegar. Se pudesse, Lyanna fugiria dali, sairia correndo de volta para Winterfell apenas para não ter que encará-lo novamente, pois seu corpo tremia com as lembranças que invadiam sua cabeça. As noções do perigo e do que era correto tornavam-se pálidas e desbotadas em relação à lembrança do toque de Rhaegar, assim como a noite na qual Lyanna entregou-lhe sua virgindade.

A garota sacudiu a cabeça, tentando afastar aqueles malditos pensamentos de si. Ela era uma Stark e seria tão forte e firme como o gelo se fosse necessário; ergueu o tronco e sentou-se à beira da cama antes de escutar rápidas batidas contra a porta do quarto; desconfiada, a garota levantou-se e caminhou até a estrutura de madeira.

― Quem é? ― ela perguntou com a mão sobre o ferrolho.

― Catelyn e Lysa. ― uma voz alta e cadenciada lhe respondeu do outro lado.

Depois de girar a estrutura de ferro que trancava porta e abri-la, Lyanna deu de cara com a futura cunhada acompanhada da irmã mais nova.

― Podemos entrar? ― Catelyn indagou.

― Bem, a casa é de vocês, então...

Ela deu espaço para que as garotas entrassem no cômodo e logo fechou a porta atrás de si. Lyanna sentiu os dois pares de olhos azuis lhe fuzilando e permaneceu em silêncio até que Catelyn tentou iniciar uma conversa:

― Brandon me contou que não se sentia bem e teve que abandonar o festim... Então viemos até aqui para checarmos se está melhor...

― Fico grata pela preocupação, mas foi apenas um desconforto passageiro. Já me sinto mais disposta. ― Lyanna mentiu.

― Pois não parece, sua cara está horrível! ― a Tully mais nova lhe disse, com uma expressão de desdém escancarada.

― Lysa! ― Catelyn virou-se em direção a irmã, dando-lhe um olhar de reprimenda.

A petulância impressa no breve sorriso que se formou no lábio de Lysa demonstrou que ela desejava provocar as outras duas jovens.

― Desculpe... ― ela ergueu os braços roliços em uma posição defensiva ― Mas eu entendo como deve ter sido desagradável ver o Príncipe invadindo uma comemoração familiar depois da afronta que ele cometeu.

Catelyn lançou outro olhar repreensor à irmã.

― Não me dou ao direito de ter sentimentos em relação às atitudes e decisões de Sua Alteza. ― Lyanna retrucou de maneira cortante.

― Sequer lhe incomoda o fato dele a ter em tão pouca estima a ponto de ser capaz de lhe ofender diante de toda a nobreza? Porque todos acham que o Príncipe tinha segundas intenções ao lhe nomear Rainha do Amor e da Beleza... E agora ele aparece aqui, logo quando quase todos os Starks estão presentes... ― Lysa tentou lhe provocar ainda mais.

O sangue de Lyanna ferveu, e todos os conselhos do pai e de Ned para que pensasse antes de falar foram esquecidos.

― Se ele tem segundas intenções, o problema não é meu. Sua Alteza deveria estar em Porto Real ao lado da esposa e dos filhos, e eu lhe diria isto se tivesse algum tipo de intimidade com ele... Mas você poderia dizer isto ao Príncipe, Senhora Lysa, já que aparentemente tem o hábito de se meter onde não é chamada!

O rosto redondo da Tully adquiriu uma coloração quase tão vermelha quanto os fios dos cabelos que o emolduravam.

― Tão selvagem quanto o irmão mais velho, não é? ― Lysa cerrou os dentes enquanto falava ― A causa desse comportamento deve ser o sangue dos Primeiros Homens presente na sua família!

A Stark cerrou o punho, esforçando-se para não perder o controle.

― Seria uma pena se eu fizesse com você o mesmo que Brandon fez com Mindinho, não seria? ― Lyanna se aproximou-se dela e lhe encarou de forma ameaçadora, pronta a avançar na garota se fosse necessário.

― Não fale de Petyr! ― Lysa tremeu de ódio ― Não ouse chamá-lo por este apelido!

Catelyn colocou-se entre as duas e puxou a irmã para longe de Lyanna, segurando seu braço enquanto lhe passava um sermão.

― Você está louca? Os Starks são nossos convidados e em breve serão minha família! Não pode despejar suas besteiras em cima deles!

Lysa debatia-se, e conseguiu livrar-se de Catelyn com dificuldade.

― Vai ficar do lado dela e contra mim, Cat? Eu sou sua irmã! ― a garota disse.

A noiva de Brandon rolou os olhos e puxou Lysa em direção a porta.

― Desculpe-me por isto. ― ela disse à Stark ― É melhor que a deixemos descansar.

Lysa finalmente saiu do quarto, quase empurrada pela irmã; contudo, Catelyn parou no momento que atravessava a porta e virou-se a cabeça em direção à Lyanna.

― Quase ia esquecendo... Vamos fazer um passeio nas barcaças no rio à tarde. ― ela disse, com os olhos verdadeiramente convidativos ― Os seus irmãos e Robert também irão, se quiser se juntar a nós...

Apesar de ter dito para Ned que não sairia de seus aposentos enquanto Rhaegar estivesse em Correrrio, Lyanna tinha ciência que dificilmente conseguiria ficar confinada por tanto tempo. Era livre e aventureira demais para ficar confinada e isolada, e tinha saudades de estar em contato com a natureza, sentir o vento bater em seus cabelos... Claro, havia alguns contratempos – como a presença de Robert –, mas tinha certeza que conseguiria superá-los.

― Estarei lá. ― a nortenha respondeu simplesmente.

 

***

 

As barcaças estavam ancoradas na margem do Ramo Verde, aguardando para serem ocupados pelos jovens membros da nobreza westerosi. Lyanna podia ver tanto vários rostos conhecidos – como os garotos Glover, Arryn, Mallister e Royce, todos amigos de seus irmãos –, quanto outros tantos que ela jamais havia visto, ou pelo menos notado. Dirigiu-se rapidamente pra o local onde Ned, Brandon, Catelyn e Robert estavam, segurando a barra do maldito vestido que comprimia seu tórax e impedia que respirasse direito.

― Aí está ela. ― Brandon disse, apontando para a irmã ― Estávamos esperando por você, e ficamos gratos por ter achado que somos dignos de sua presença.

Você com toda a certeza não é digno. ― ela arqueou a sobrancelha esquerda enquanto lhe respondia ― Mas não seria justo quebrar a promessa que fiz a Catelyn e não aparecer.

Bran riu ao escutar a réplica da irmã.

― Está vendo com o que terá que lidar, Robert?

O noivo gargalhou alto.

― Lyanna é uma peça rara, tenho sorte de tê-la ao meu lado.

Robert deu alguns passos e passou o braço ao redor da cintura da Stark, puxando-a para perto de si.

Foi possível escutar alguns passos afofarem a grama, indicando que alguém se aproximava; Lyanna viu então o pequeno e adorável menino de cabelos ruivos vir em direção ao grupo, carregando um pequeno amontoado de flores vermelhas nas mãos.

― O que faz aqui, Edmure? ― Catelyn perguntou ao irmão.

Os pequenos e vivos olhos azuis viraram-se para Lyanna e ele estendeu as rosas em direção a ela.

― Vim lhe trazer isto, minha Senhora. ― ele lhe disse ― Disseram-me que foi coroada uma vez como Rainha do Amor e da Beleza... Então achei que deveria lhe fazer uma coroa nova.

Lyanna então pôde perceber que as rosas vermelhas estavam dispostas em um círculo. O corpo de Robert enrijeceu ao seu lado e a garota notou que o noivo ficou terrivelmente tenso ao se dar conta do que acontecia.

― Posso coroá-la? ― Edmure perguntou.

Instintivamente, Lyanna assentiu e ajoelhou-se até ficar da mesma altura que o garoto. Ele pôs a coroa vermelha sobre sua cabeça e sorriu ao perceber que o artefato coube perfeitamente.

Uma sensação estranha tomou conta do coração de Lyanna, como se aquela cena fosse uma repetição do que ocorrera em Harrenhal. O pobre Edmure agiu sem culpa e era inocente, mas o ar ficou palpavelmente mais pesado depois de sua atitude.

― Já terminou, Edmure? Estamos atrasados e precisamos ir. ― Catelyn interferiu, apontando para a barcaça que aguardava os jovens.

Lyanna colocou-se de pé novamente e só então reparou na pomposa embarcação, maior que todas as outras, esculpida em madeira vermelha e decorada com ricos tecidos de um azul profundo que exibia um belíssimo bordado prateado. Era possível ver desenhos em alto relevo encravados na madeira vermelha, imitando trutas iguais ao símbolo da Casa Tully.

O menino despediu-se e correu para dentro do castelo, sumindo de maneira tão rápida como tinha aparecido. Os jovens então se dirigiram para o rio e Brandon e Catelyn foram os primeiros a entrar no barco, sendo seguidos por Lyanna e Robert e, por fim, Ned. Os jovens sentaram-se nos bancos que ficavam sob o estofo azul suspenso e Lyanna sentiu o coração acelerar quando enfim a embarcação se moveu. O barulho das pequenas ondas que batiam no casco de madeira causadas pela trepidação lhe deu uma incrível sensação de liberdade, assim como a brisa leve, porém refrescante, que fazia seu cabelo flutuar em um emaranhado castanho.

― Onde está sua irmã? ― ela escutou Brandon perguntar para a noiva ― Pensei que ela viesse.

― Lysa não se sentia bem. ― Catelyn respondeu de maneira curta.

Provavelmente não se sentia segura ao seu lado, Lyanna pensou.

O irmão mais velho passou os dedos de forma delicada pelo rosto da Tully e em seguida depositou um tenro e demorado beijo em sua testa. Era notável que os dois estavam apaixonados e definitivamente formavam um belo casal, Lyanna pensou; e talvez por isso fosse tão estranho ver Ned ao lado dos dois, alheio ao fato de que na verdade era ele o esposo de Catelyn em um futuro obscuro...

― Você fica linda com coroas de flores na cabeça. ― Robert, que estava ao seu lado, lhe disse ― Seu pai me disse uma vez que você seria uma boa rainha, e acho que ele estava certo, no final das contas.

Lyanna encarou o noivo, confusa.

― Não desejo ser rainha. ― ela respondeu ― Desejo apenas ser eu mesma.

Robert sorriu e colocou sua mão sobre a de Lyanna.

― Sou um grande sortudo... Enquanto os outros a desejam, sou eu quem irá tê-la como esposa.

Lyanna percebeu uma leve mudança na voz e na expressão de Robert, e soube de imediato quem eram os outros aos quais ele se referiu; o par de olhos claros como o céu azul, de repente escureceram terrivelmente e fizeram um estranho e incômodo arrepio percorrer a espinha da garota.

 

***

 

A comemoração que se seguiu não foi tão pequena como ela desejava. A falta de apetite e as náuseas não permitiram que Lyanna aproveitasse os bolos e chás servidos tão cuidadosamente por seus anfitriões, e o terrível barulho das vozes se misturando no jardim do castelo faziam suas têmporas arderem e pulsarem.

Era possível escutar o nome de Rhaegar sendo pronunciado e sussurrado entre as conversas enquanto uns poucos olhares se voltavam em direção à Stark, o que a deixava profundamente irritada. Lyanna odiava a necessidade que as pessoas tinham de falar e inventar coisas sobre a vida uma das outras, e sentia-se sufocada por estar no meio delas. Decidiu sair dali, e com o máximo de descrição possível, afastou-se da confusão de pessoas.

Lyanna caminhou até uma fonte que ficava próxima a um dos arcos da muralha do castelo e observou as águas descerem pela pedra cinzenta na tentativa de clarear os pensamentos. O que aconteceria a seguir? O que poderia fazer para mudar as coisas, e principalmente o terrível futuro que aparecia em suas visões? Começou a pensar nos filhos de Ned, e em como em pouco mais de duas décadas eles seriam os últimos sobreviventes da família. Nem ela, os irmãos ou o pai estariam vivos, e a mais terrível ironia era que, mesmo tendo o dom da vidência verde, Lyanna não fazia ideia de como partiriam desta vida em direção à morte.

Suspirou profundamente, e de repente a coroa de flores rubras em sua cabeça pareceu pesar de um modo estranho, como se os pensamentos em sua mente se expandissem. Havia tantas coisas para ver, mas tão pouco tempo...

― Pensei que demoraria mais tempo para que pudéssemos ficar sozinhos...

A conhecida voz cortou o ar e Lyanna sentiu seu corpo enrijecer ao dar-se conta que estava próxima às suas costas. Seus músculos paralisaram, e seus ossos tremeram, e mesmo que ela não tivesse forças para confirmar de quem se tratava, sabia que era Rhaegar.

― O que está fazendo aqui? ― ela indagou, ainda sem se mover, tentando utilizar seu timbre mais forte para tentar esconder o nervosismo.

― Vim vê-la. ― o Príncipe respondeu da maneira mais natural possível ― Sinto sua falta.

Lyanna escutou os passos sobre a grama, e fechou os olhos. Não queria encará-lo, não podia. Tinha vergonha, e principalmente medo... Sobressaltou-se quando sentiu os dedos tocarem sua pele e passearem por seu rosto, indo da bochecha e descendo até o queixo, em seguida subindo em direção aos lábios. Então abriu as pálpebras e viu as orbes índigo lhe fitarem de um modo tão intenso que a fez desejar mais ainda algo que ela sempre quis... Mas sacudiu a cabeça, tentando afastar aqueles malditos pensamentos que rondavam sua cabeça desde a noite em que dividiram a cama.

― Não deveria ter vindo, Brandon ou Robert lhe matariam se soubessem as suas intenções.

Após dar alguns passos cambaleantes para trás, Lyanna encarou a expressão enigmática de Rhaegar.

― Já me disse isto antes, e até agora estou esperando um dois tirar minha vida. ― ele disse ― E valeria a pena morrer por você, juro que não me importaria. Eu iria de bom grado para os sete infernos se esse fosse um preço por apenas alguns minutos ao seu lado e...

― Não diga bobagens! ― Lyanna o interrompeu ― Eu lhe disse que o que aconteceu naquela noite jamais irá se repetir!

Rhaegar sorriu, mas de uma forma melancólica e triste, o que fez o coração da garota se contrair em seu peito.

― Eu tentei odiá-la após o ocorrido... De verdade, repassei em minha cabeça tudo o que você me disse milhões de vezes, tentei utilizar cada palavra como uma arma para sentir raiva ou qualquer outro tipo de sentimento que causasse repulsa. Depois de alguns dias, vi que seria impossível e então passei a me concentrar em tentar desejá-la menos, não pensar tanto em você o quanto eu penso... Inclusive, eu estava indo em direção a Porto Real quando me dei conta que... ― ele suspirou pesadamente ― Não consigo, simplesmente não consigo me manter longe. Eu sequer me importo com o que as pessoas andam falando, com os murmúrios de que eu estou ficando louco como o meu pai... A única coisa que me importa é você, e provavelmente os Deuses me punirão por isto, mas não consigo evitar.

A sinceridade cortante na voz de Rhaegar fez com que Lyanna desejasse se jogar nos braços dele pedir para que ele a tomasse mais uma vez, mas por mais impulsiva que fosse, sabia que não poderia fazê-lo.

― Eu não...

A voz morreu em seus lábios e ela não conseguiu dizer o que deveria. Contudo, a chama que ardia em seu peito agora era uma labareda que queimava suas veias de forma vertiginosa e avassaladora...

― Lyanna?

Outra voz, desta vez uma feminina, a chamou. A garota percebeu que Catelyn Tully caminhava lentamente em sua direção, vindo diretamente da confusão que ela tentara evitar. Lyanna deu alguns passos para trás, afastando-se de Rhaegar assim que avistou a cunhada.

― Vossa alteza. ― a noiva de Brandon fez uma delicada vênia em direção ao Príncipe ― Perdoe-me por interrompê-los, mas preciso da ajuda de minha futura irmã em alguns assuntos... Não se importa, não é mesmo?

Rhaegar pareceu ligeiramente atordoado pela abrupta interrupção, mas logo se recompôs.

― De forma alguma, minha Senhora.

Catelyn sorriu e então caminhou até Lyanna e entrelaçou seu braço direito ao braço esquerdo da Stark.

― Obrigada, e nos vemos em breve, meu Senhor. ― ela lhe disse, e então puxou Lyanna para longe dele.

A nortenha não protestou, e mesmo confusa, seguiu a outra. As duas garotas caminharam em silêncio até que estivessem em uma distância considerável de Rhaegar.

― Precisa de minha ajuda em quê? ― Lyanna enfim perguntou.

― Oh querida, eu apenas quis lhe livrar dele. ― Catelyn respondeu ― Brandon me contou que sua família não ficou satisfeita com o que aconteceu em Harrenhal e em como você ficou envergonhada com a ousadia do Príncipe... Pensei que ele a estivesse cercando mais uma vez e decidi interceder... Fiz mal?

― Não... ― Lyanna respondeu, sem muita firmeza.

Seus malditos sentimentos eram conflitantes e a faziam ficar mais confusa ainda, pensou.

Catelyn lhe sorriu.

― Bom, então fico mais tranquila. Mas, pensando bem, acho que realmente preciso de sua ajuda...

― Em que?

― Preciso que ocupe o lugar de anfitriã para mim por alguns instantes. Bem, eu sei que você é uma convidada, mas em breve seremos da mesma família, então... Por favor?

― Não sou a melhor pessoa indicada para isto. ― Lyanna lhe disse com sinceridade ― Mas se faz questão... Você demorará muito?

― Apenas alguns minutos. Acho que meu sangue da lua desceu e preciso trocar a roupa íntima. ― Catelyn lhe disse, timidamente ― Mas se os Deuses forem bons comigo, talvez eu não tenha esse problema daqui a alguns meses.

― Como assim?

― Você sabe, depois que eu e Brandon casarmos...

Lyanna fez uma careta, ainda sem entender o que ela queria dizer com aquilo.

― Jamais lhe disseram o que acontece depois do casamento? ― Catelyn perguntou, abismada.

― Eu sei o que acontece, apenas não entendi o que sangue da lua tem a ver com isto.

Sua mãe morreu quando Lyanna estava no quarto ou quinto dia de seu nome, então jamais teve do seu lado alguém que lhe desse explicações a cerca de assuntos femininos, mas sabia bem até demais o que acontecia entre um homem e uma mulher entre quatro paredes.

― Quando uma mulher fica grávida, o sangue da lua para de descer... E eu espero ter um bebê nos meus braços o mais rápido possível assim que me casar com o seu irmão.

O que Catelyn acabara de lhe dizer fez Lyanna pensar. Tentou puxar pela memória, mas não conseguia se lembrar quando o seu sangue da lua desceu pela última vez... Sua viagem até Correrrio durou uns dois meses graças à vontade do pai de parar em quase todo castelo que visse pela frente, e a garota tinha certeza que o fluxo não apareceu em nenhuma dessas ocasiões. Talvez a última vez fora quando ainda estava em Winterfell? Antes da chegada de Rhaegar? Antes de...

Lyanna sentiu seus olhos saltarem e seu corpo congelar ao se dar conta que seu último período aconteceu antes de se deitar com Rhaegar. Se mulheres grávidas não tem seu fluxo, ela poderia estar...?

― Volto o mais rápido que eu puder. ― Catelyn lhe disse.

Só então ela se deu conta de que já estavam no interior do castelo, tamanho o choque na qual estava imersa. A cunhada despediu-se e caminhou corredor à dentro, sem ao menos saber que havia feito uma terrível descoberta que mudaria tudo.


Notas Finais


Meus amores, me perdoem por essa demora imensa! Não pude postar no mês passado por conta da quantidade absurda de coisas que eu tô tendo que fazer na faculdade/estágio, além de ter tido um bloqueio terrível nesse último mês. Porém, consegui finalizar o capítulo nesse feriado e tô postando pra vocês hoje. Esse foi, inclusive, um capítulo que se passou em poucas horas na cronologia da estória e não teve taaaaantas coisas assim (além do bb sendo descoberto), mas é muito, muito importante para a percepção do povo de Westeros sobre a relação da Lya e do Rhaegar. Perceberam como o Ned (sdds) acha que a irmã tem medo?
Enfim minha gente, não vou escrever textão dessa vez porque tô morrendo de sono por ter varado a madrugada pra conseguir postar, mas queria deixar um beijinho pra todo mundo que comentou capítulo passado e agradecer a força que vocês sempre me dão. Eu fico muito feliz pelo carinho que recebo de cada uma de vocês, de verdade!
Prometo que próximo capítulo vai ter coisas do futuro (acho que 80% do capítulo vai ser no período de tempo Jonerys) pra compensar a falta nesse, ok? Não esqueçam de me fazer feliz e deixarem os comentários lindos e fofos que vocês sempre deixam, e me avisem se houver algum erro no texto. Beijinhos e até logo!

http://futurogf.tumblr.com/


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...