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História Uma Estranha no Paraíso - Não maltrates meu coração


Escrita por: Marii_Rafaela e mari_rafaela_2

Notas do Autor


Oi gente, tudo bem?



Aqui vai mais um capítulo.

David irá fazer novamente o que é especialista com a Biju: maltratar seu coração :(
O amor dos dois vai passar pela maior prova que já tiveram até hoje. E só vai sobreviver se for realmente verdadeiro.
Bem, eu espero que gostem!

Capítulo 26 - Não maltrates meu coração


Fanfic / Fanfiction Uma Estranha no Paraíso - Não maltrates meu coração

Após uma quente chuveirada, visto uma calça velha de pijama e uma camiseta que ganhei de David quando ele estava na sexta série.

Quando sai do banheiro, David estava sentado em minha cama. Vê-lo ali no meu quarto ainda parecia surreal demais para mim. Talvez eu nunca me acostumasse realmente com aquilo. Acho que passei tempo demais acreditando que nosso destino não era ficar juntos, e por esse motivo a sensação de estar com ele ainda era nova, fresca e terrivelmente amedrontadora.

-Lembra dessa camiseta? – Falo quando ele levanta os olhos diretamente para meus peitos. Ele sempre seria o moleque de 14 anos por quem me apaixonei.

-Lembro sim – Ele umedece os lábios com a língua. Fico paralisada com aquela visão – O seu corpo que mudou um pouco – Ele arqueia a sobrancelha e me puxa para perto de si.

Nossos corpos se chocam e eu sinto um arrepio percorrer os nervos entre minhas pernas.

-Sério mesmo que você está me chamando de gorda? – Ponho as duas mãos na cintura reclinando-me sobre ele.

-Fala sério, Biju – Ele sorri, a lateral dos lábios repuxando-se – Você é gostosa. Gostosa demais!

Nossa conversa sem futuro é interrompida pelo toque do celular de David. Ele franze o cenho ao encarar o aparelho.

-Não vai atender? – Sento-me na cama, David me acompanhando em seguida. – Quem é?

Ele sibila o nome de Dudu e revira os olhos.

-Ele me ligou o dia inteiro. – Sua voz cansada denuncia aborrecimento – E eu o ignorei o dia inteiro. – Ele dá de ombros.

-Só por causa de mim? – Falo ressentida – Não devia fazer isso com ele.

-Até saber se você estava bem, eu não queria falar com ninguém – Conclui David com sua voz rouca.

Envolvo minhas pernas nas dele, criando um lampejo indecente em seu rosto.

-Ligue pra ele – Praticamente ordeno. Ele solta uma lufada de ar e retorna a ligação para Dudu, com cara feia. – Obrigada – Falo com ironia.

Ele belisca minha coxa e eu solto um gritinho de dor.

-Alô, Dudu. – Ele respira fundo para buscar paciência – O que houve?

Observo seu rosto mudar. O maxilar cerrado e os olhos que se contraem me preocupam.

-Eu estou indo.

Ele desliga e guarda o celular no bolso. Começa a acariciar meu joelho, olhando para o chão.

-O que aconteceu? – Pergunto com as mãos em seu rosto. Ele me olha e vejo uma tristeza desmedida em seu olhar.

-A Sara... – Ele pigarreia e eu me contraio na cama. Sinto meus músculos enrijecerem. – Ela... Ela me enviou uma mensagem hoje mais cedo, mas eu ignorei. – ele bufa, balançando a cabeça com descrença – Ela queria me dizer que perdeu o irmão de criação.

-O-o que...? – Minha boca se abre e as palavras somem no ar. Eu não sabia que ela tinha um irmão de criação. Sempre achei que fosse filha única.

Como se soubesse dos meus pensamentos, David começa a falar.

-Seus pais adotaram um garoto, quando ela ainda era praticamente um bebê. Eles eram bastante apegados. Fazia alguns meses que ele sofria com uma doença que os médicos não descobriam a cura.

-Eu... Eu sinto muito, amor.

-Eu preciso ir... Tenho que... – Ele paralisa e me fita com os olhos injetados.

-Claro... Vá. Ela precisa de você.

Ele esboça um sorriso e beija minha testa.

-Eu te amo. – Seus olhos fulguram os meus. Deus sabe o quanto eu era louca por aqueles olhos. – Me espere, amor. Eu...

-Não. Vá; ela precisa de você. Fique o tempo que precisar, David.

-Eu te amo – ele repete. Aquilo parecia uma longa e dolorosa despedida. Mas não quis mencionar naquele momento. Só o deixei ir.

 

*

Acompanhamos de perto a evolução e recuperação das crianças resgatadas. Era difícil não se envolver emocionalmente, principalmente com a intensidade dos fatos. Algumas crianças pararam de falar. O trauma era grande demais.

Fran e eu estávamos fazendo anotações do caso, quando Bruno irrompeu pela sala, eufórico.

-Vocês não sabem o que eu acabei de ouvir!

Levanto o olhar para ele. Ás vezes só era preciso ter bons colegas para fazer seu dia deslanchar. E aquele dia estava sendo simplesmente terrível.

David não me ligava desde o dia anterior. Simplesmente não retornava minhas ligações. Visualizava minhas mensagens, mas não respondia.

Qualquer outra garota ciumenta ficaria possessa. Mas eu só queria saber se ele estava bem. Se Sara estava bem. Eu amava meu irmão, e a possibilidade de o perder era devastadora. Eu sabia qual era a sua dor.

-O que? – Pergunto olhando o rosto de Narciso de Bruno. A pele escura se contrastava com os dentes branquíssimos.

-Lembram de um caso que ficou arquivado por falta de provas, sobre uma possível rede de prostituição infantil?

Meus sentidos foram imediatamente ativados. Eu havia estudado aquele caso com afinco, e quando o juiz ordenou arquivar, eu quase surtei.

-Não me diga que... – Mal pude terminar a frase, tamanha a minha empolgação.

-Encontraram o suspeito. Sujeito perigoso, membro de uma poderosa máfia de tráfico humano. – Quando ele diz isso, sinto os pelos de meu braço se arrepiar – O doutor Greg está quase conseguindo o caso. E se ele conseguir, vai selecionar os melhores advogados para irem com ele.

Fran reprime um gritinho. Bruno se senta ao nosso lado e começa a tagarelar.

-O covil do cara não fica aqui. Parece que ele tem se escondido na América Latina.

Engulo em seco. Era egoísta, mas sabia que se eu fosse selecionada para o caso, isso seria um regresso no meu relacionamento com David.

Fran me encara com uma expressão conhecida. Ela sabia ler meu rosto. Talvez soubesse das minhas preocupações.

-Relaxa, gata – Ela fala quando Bruno sai – O David tem que ser muito idiota pra terminar com você se você pegar esse caso.

Sorrio pra minha secretária maravilhosa, que em pouco tempo se tornou minha amiga.

-Aceitar esse caso significa viver sob sigilo total em um país totalmente desconhecido – Falo mascando um chiclete que Fran havia acabado de me oferecer – Significa viver sem contato com ninguém, a não ser da agencia internacional e FBI.

Ela sorri e tira uma mecha de meu cabelo do rosto e delicadamente coloca atrás da orelha.

-E isso significaria por um fim á uma das maiores organizações mafiosas do planeta – Ela me lembra, como se aquilo justificasse tudo. Mas, realmente, justificava.

Sorrio em resposta e volto-me novamente ao caso. Ela faz o mesmo, devolvendo o sorriso e fazendo anotações em sua agenda.

No fim do dia eu já estava quase entrando em colapso nervoso. Precisava desesperadamente de notícias de David.

-Dê um espaço a ele – Hugo fala sentando-se ao meu lado no sofá. Já era tarde da noite e nós estávamos compartilhando um balde de pipoca carregado de manteiga. – Ele vai te ligar.

-Não é justo, isso. – Falo com a boca cheia – Eu entendo que o cara era amigo dele. E entendo que...

-Biju! – Hugo me interrompe – Ele está se culpando por ter ignorado a Sara completamente quando ela tentou contar pra ele que o irmão morreu. Ele estava completamente concentrado em encontrar você!

-Então agora a culpa é minha! – Grasno, soltando pedacinhos de pipoca triturada. Hugo faz cara de nojo – Então eu fico ausente por estar arriscando minha vida para salvar criancinhas sequestradas e ela vira a coitadinha da vez?

 Hugo me encara com o cenho franzido. Depois segura minha mão e a esfrega na dele. Era um gesto completamente estranho, vindo dele, que não costumava demonstrar muito carinho.

-Heleninha. Não tem com o quê se preocupar. Ele ama você. Só dê um tempo a ele. Sabe como ele lida com as perdas.

-Sei – Solto um grunhido seguido de um muxoxo. – Vou deitar. – Falo dando um beijo na testa de meu irmão. – Hey! Você ainda não me contou sobre sua garota misteriosa!

-No tempo certo eu direi. – Ele fala com um ar sábio, mas era pura encenação.

Reviro os olhos e sigo trotando até meu quarto.

Penso em David a noite toda. Ele estava magoado e ressentido. Eu o entendia. Nunca perdi alguém tão próximo, mas trabalhei e convivi com pessoas que morriam cedo demais. Crianças que não suportaram ferimentos graves, mulheres vítimas de agressão, e muitos outros casos. Eu lidava com a vida e a morte constantemente. Talvez fosse isso que me tornasse tão firme com perdas na vida hoje em dia.

Eu precisava dar tempo a ele, mas não conseguia deixar de me magoar com o fato de ele estar me ignorando e consolando a outra. Era egoísmo de minha parte, mas era a verdade. Meu lado humano, meu coração gritava, sedento por respostas. Minha mente dizia pra eu ficar bem, e esperar o tempo que fosse; dar espaço pra ele.

 

*

No dia seguinte o sol me acordou com um carinho inestimável. Eu havia esquecido de fechar a cortina, por isso fui acordada pela luz da manhã. Dei uma rápida olhada na rua. Eu não morava exatamente no melhor bairro de Paris, mas ainda assim a vista era magnífica.

Me espreguiço e entro no banheiro para tomar uma ducha rápida. O pensamento voou no exato momento em que a água quente escorreu pelo meu corpo. David.

Aquela distancia já estava me machucando. Eu não conseguia acreditar que depois de tanto tempo, mesmo numa situação tão delicada como aquela, ele ainda conseguia me machucar.

Me arrumo de acordo com meu humor. Saia cinza, blusa de botão cinza e sapato preto. Faço um coque rígido no cabelo e encaixo meus óculos no rosto. Era bom poder usar óculos porque eu não me dava ao luxo de me maquiar.

Francine foi a primeira a perceber meu péssimo humor, tentando fazer uma piada com meu visual “dark”. Esbocei um sorriso torto e forçado em sua direção e entrei imediatamente em minha sala, fechando a porta.

Trabalhei o dia inteiro, olhando a cada cinco minutos para meu celular.  Nada de respostas. Enviei um bom dia para David, perguntando pela milésima vez se ele estava bem, e ele ainda não havia respondido. Comecei a me preocupar de verdade, achando que ele tinha sofrido um acidente ou algo pior.

No horário de almoço, liguei para Dudu, que me disse que ele estava parcialmente bem, ainda muito abalado, e estava de luto. Sara ainda estava hospedada em sua casa, e sem perceber, Dudu deixou escapar que estavam próximos, compartilhando sua dor peculiar.

Engoli o choro e a raiva. Eu sentia repulsa por mim mesma, ao sentir ciúmes de uma garota que acabara de perder um ente querido. Mas não conseguia deixar de pensar em David e ela juntos, abraçados e se tocando.

Meu ânimo não teve trégua, e se abalou ainda mais quando uma semana inteira se passou e eu ainda estava sem nenhum contato com David.

Decidi tomar as rédeas da situação. Dei a ele mais de cinco dias de luto. Eu era sua noiva, porra.

Coloquei um vestido preto, tentando ter respeito ao seu luto. Usei uma sapatilha baixa e fiz um rabo de cavalo. Comprei flores no meio do caminho. Fui até sua casa com meu próprio carro.

David havia me dado uma chave extra pouco depois de pedir minha mão em casamento. Eu ainda estremecia ao pensar em nossa vida de casados. Eu não havia confessado pra ninguém antes, mas agora mais do que nunca eu me sentia insegura em relação a ele. Em relação a nós. Dez anos haviam se passado e David pra mim era o mesmo garoto bronzeado que cheirava a pecado e sedução. Os olhos eram um mar cheio de promessas e sonhos, e qualquer garota podia se perder neles.

Senti um aperto familiar no peito ao tocar na maçaneta. Meus instintos se aguçaram. Senti o coração ricochetear quando ouvi uma voz angustiada chorando.

Abri a porta bem devagar, me sentindo uma pessoa má ao invadir o território dos dois. Eles estavam em um ambiente particular, em meio á dor efêmera que a morte de um amado causara.

Meu campo de visão se encheu imediatamente com a imagem dos dois abraçados. David afagava o alto da cabeça dela, que com longos cabelos cobriam-lhe as costas. A passos lentos, adentro a sala gigantesca. Num canto quase escuro, os dois se acariciam. No começo achei aquilo completamente normal. Até que vi o rosto dele, do meu David se inclinando para tomá-la num beijo. Não era um beijo de consolo. O beijo não dizia “ei garota, sinto muito por seu irmão morto!”. Era um beijo... Quente. Vivo.

Quando se deu conta, tarde demais, David se desvencilha de seus braços. Atordoado me vê parada, com flores estúpidas nas mãos.

Meus olhos cederam à angustia e turvaram minha visão. Joguei as flores em direção a David, mas elas atingiram o chão, se espatifando aos seus pés.

Quando vi já estava correndo, desci as escadas com uma pressa desmedida.

-Helena!

O rosnado de David reverberou o pequeno ambiente. Xinguei-me mentalmente por não ter descido de elevador e ter escolhido as escadas de emergência.

-Helena, pare!

Minhas pernas começam a ceder, ardendo em brasa. Mas eu não ia desistir. Ele não me alcançaria. Eu não deixaria aquele patife me ver daquele jeito. Eu sei que ele tentaria se redimir, e meu coração idiota e traiçoeiro daria ouvidos a ele.

Dou graças quando alcanço as portas duplas que levam até a rua, mas tropeço num amontoado de sacos de lixo. Eu tinha esquecido que saí pelas portas laterais, que dava para a rua dos fundos.

Caí humilhantemente com a cara nos sacos fofos. As mãos fortes de David me puxam de volta. Ele tenta me abraçar, mas desfiro um tapa ardente em seu rosto. Pelo tempo que tive para fazer isso, vislumbrei a dor em sua face de anjo. Ele estava devastado.

-Lena... Por favor. – Ele pareceu fazer um esforço enorme para proferir aquelas palavras. Doía. Doía demais vê-lo daquele jeito.

-Tudo bem então. – Minha voz trai minha confiança. Seus dedos tocam a lágrima solitária que escorre pela minha bochecha. – Explique.

-E-eu... Eu só... – ele estava sem palavras. Um soluço forte e audível soou de seu peito. Ele estava fazendo aquilo de novo. Estava partindo meu coração. Era sua especialidade.

-Você nunca vai mudar, David.

-Biju... Por favor, não diga isso! – Ele aperta meus pulsos com suas mãos e lágrimas gordas começam a descer de seus olhos.

-Eu acho que nunca vou ser boa o bastante pra você. Sempre terá alguém no meio. Sempre serei a que fica no escanteio. Você nunca vai me tratar como eu mereço.

Se ele soubesse como foi difícil proferir aquelas palavras. Se ele soubesse o arroubo que tomou meu coração naquele momento...

-Não, Biju. Não diga isso...

-Vocês estavam se agarrando! Que bela forma de consolar um ao outro, não! – minha voz subiu sete oitavas e beirava ao desespero.

Seu rosto se avermelhou, as veias em seu pescoço pularam furiosamente.

-Biju... – Ele implorava. Nem mesmo tinha palavras para se explicar.

-Eu sempre soube que faria isso de novo. Sempre. Achei que não termos conseguido adotar a Emma tinha sido um fato ruim. – Cuspo as palavras com violência – Mas foi bom. Foi um sinal. Você e eu nunca teríamos dado certo – Vocifero e aproveito o fato de ele ficar paralisado para sair correndo.

Pego o primeiro ônibus que passa na avenida. Sigo completamente derrotada. Eu não sabia, mas a dor de ter meu coração destroçado pela segunda vez por David Luiz era ainda mais intensa.

Um lampejo acende em minha mente. Desço do ônibus e vou direto para o escritório. Era sábado, mas eu sabia que o doutor Greg estava lá.

A porta de sua sala está aberta.

Ele está lá, vestido num traje casual. Camisa polo engomada e calça jeans cara. Os cabelos caindo nos olhos, enquanto de cabeça baixo ele analisava um caso de muitas páginas.

Parei por um segundo para admirar o homem que havia me introduzido ao mundo da filantropia.

Ele levanta o olhar e encontra o meu. Tira os óculos que repousavam em seu anguloso nariz e sorri.

-O que aconteceu? – Ele pergunta, com ar paterno. Eu devia estar com uma aparência devastada.

-Preciso da ajuda do senhor.

Ele faz um gesto com a mão, para que eu me sente ao seu lado.

Arrasto a cadeira e me sento. Tento controlar as lágrimas. Ele não podia ver que meus motivos eram emocionais. Precisava demonstrar que era digna daquele caso.

-O senhor já designou alguém para o caso da pornografia infantil no México?

Ele sorri, os olhos brilhando como duas esferas.

-Você sabe que sim. – Ele tamborila os dedos na mesa de madeira maciça e me dirige um olhar orgulhoso – Sabe que desde o começo você seria a escolhida.

O nó que se aperta em meu peito é grandioso, obsceno. Era um misto de alegria e imensa dor. Eu estaria longe por tempo o suficiente para esquecer David. Mas o medo que me tomou foi avassalador. Ele também se esqueceria de mim?

-E quando eu vou? – Quero saber.

-Em alguns dias. Precisamos deixar tudo acertado. Seu visto, o passaporte. E você receberá instruções de segurança. Fará um curso intensivo de três dias de defesa pessoal. Vai aprender a usar uma arma. Vai conviver com um policial praticamente 24 horas por dia. – ele arqueia uma sobrancelha quando fecho a cara em reprovação – e vai mudar de identidade.

-O que? – Quase rosno.

-Você viverá sob perigo iminente. Sabe disso. Se vai trabalhar nesse caso, precisa obedecer todas as regras. Você colocará  fim a uma máfia poderosa.

O conforto em ouvir aquelas palavras não mudaram em nada o meu medo.

-Você vai conseguir, Lena. Você é a minha melhor. – Ele abre uma gaveta e começa a remexer sem parar, até que seus olhos lampejam quando encontra algo – Eu ia te mostrar isso mais tarde – Ele me entrega um envelope rechonchudo – Mas agora sei que está preparada.

Fosse o que fosse ele conseguiu enxergar em meus olhos. A dor. O motivo de eu querer ir pra longe.

-Você está pronta, Biju. – ele fala com firmeza – Chegou a sua vez.

 

*

Dias depois, eu me sentia preparada. Meu coração estava despedaçado. Mas por fora eu estava inabalável. Aprendi a usar uma arma, e ganhei porte legal. Se algum filho da mãe descobrisse a nossa investigação e tentasse fazer qualquer coisa comigo eu não hesitaria em atirar.

Hugo estava devastado, tentando me fazer mudar de ideia. Ligou para meu pai no Brasil, deixando minha família no mesmo estado devastado que ele.

-Você tem noção do que eu estou indo fazer no México? – Perguntei tantas vezes mas nunca obtive resposta.

A verdade era que todos eles sabiam que o que estávamos fazendo era um feito grande. Desmembrar e destruir uma poderosa rede de pedofilia e tráfico humano era o caso mais especial que a Greg. Advocacia já pegou em anos.

*

Seis meses. Esse fora o tempo estimado para nosso trabalho no México. Seis meses vivendo na clandestinidade. Fingindo ser uma vendedora de flores, num bairro caótico do novo México. Vivendo com um policial e advogado que para todos os efeitos era meu marido. Correndo o risco de morrer todos os dias. Vivendo sob a vigilância de todas as agências internacionais de poder, com escutas e grampos, com uma vida controlada pelo poder. Tudo isso para salvar crianças que foram sequestradas e forçadas a se prostituir. Tudo isso por mães que não vivem desde que seus filhos foram arrancados de suas mãos.

 

Abro o passaporte que me foi entregue há duas semanas atrás. Minha foto está estampada na identificação, mas o nome é totalmente desconhecido. Rosa Gonzalez. Esse seria meu nome enquanto eu estivesse lá. Sozinha. Vivendo apenas com um desconhecido cujo objetivo era o mesmo que o meu. Prender um poderoso mafioso, traficante de órgãos e licitador de menores para pornografia infantil. Meu estômago embrulhou quando me lembrei desse homem vil. Eu faria o que fosse, até mesmo arriscar minha própria vida para colocá-lo atrás das grades. Se sua prisão custasse a minha liberdade, eu a daria de bom grado. Valeria a pena morrer por uma causa tão nobre.

Meu coração se abalou levemente ao pensar na vida que eu poderia ter ao lado de David. Os dias intensos e felizes que teríamos juntos. Por um segundo apenas, pensei em como seria se eu não fosse uma das filantropas da Greg. Advocacia. Como poderia ser meu futuro, com uma vida normal, esperando pelo meu homem em casa no final de um dia. O segundo passou rápido como uma bala, e logo eu estava imersa em minha nova vida. Minhas mãos tremulam ao segurar o passaporte.

Olho ansiosamente pela tela de indicação de embarque, e as palavras piscam. Meu voo acabara de abrir embarque. Era a minha vez. Carrego a única mala que levo e vou em direção aos portões. É quando vejo quem está lá me esperando.

Um soluço vindo do âmago de minha alma tremula meu corpo inteiro. Ele está lá, com o rosto afundado em angustia visível.

-O que veio fazer aqui? – Pergunto não reconhecendo minha própria voz.

-Eu... – Reparei nas grandes olheiras abaixo de seus olhos – Eu falei com o Hugo mais cedo. Ele disse que você não o deixou trazer ao aeroporto...

-David. – Fecho os olhos e os abro novamente – Eu não queria despedidas. Nada de drama.

Ele brinca com o cordão do seu moletom, ainda sem jeito pra me encarar.

Ah, David! Se você soubesse o quanto eu estou sangrando por dentro!

-Por favor, Biju. Não vá. Fique. O Greg tem outros milhões de advogados que podem fazer isso. Por favor, fique comigo. Vamos nos casar...

-Agora é tarde, David. – Falo com amargura na voz.

-Não, Biju... – Ele funga, exasperado. – Não faça isso consigo mesma! Eu não... Não faça isso para ficar longe de mim!

-Você acha mesmo que estou indo por sua causa? – Vocifero – Você é mesmo um sujeitinho presunçoso e arrogante, hein! – Ele segura meu braço, mas eu solto com facilidade – Adeus, David.

Dou as costas. Ele grita meu nome.

-Sabe, David – Me viro para encará-lo  - Agora você está livre. Pode ficar com ela.

-Não, não, não Helena! Eu não quero a Sara!

-Você não sabe o que quer. É uma criança mimada que sempre teve o que queria. Obrigada por me lembrar que você e eu nunca teríamos chance... Adeus.

Se ele me chamou, nem sequer consegui ouvir. Minha cabeça estava a mil.

Embarco e procuro pelo meu assento. No assento ao meu lado estava um homem de aparentemente dois metros de altura e seus trinta e poucos anos. Ele tinha os olhos fechados, e estava sentado no meio. Meu assento era o da janela. Precisei pigarrear para acordá-lo.

-Oi, Rosa. – Ele abre os olhos e sorri. Encaro seus enormes olhos verdes brincalhões, como um cachorro labrador. Ruguinhas apareceram ao redor de seus olhos. – É um prazer!

-Você é...? – Consigo me sentar e praticamente dou aleluia por estar dentro do avião. O encontro com o David quase havia me desmoronado. Eu precisava pisar em solo mexicano e beber muita margarita pra ficar de porre e esquecer que eu o amava tanto que chegava a doer.

-Antonio Bento. – Ele estende a mão – Mas a partir de agora, sou Alejandro Gonzalez. Seu marido.

-Prazer, Alejandro. – Aperto sua mão e me afundo na cadeira. Coloco os fones de ouvido e a primeira música que começa a tocar é amaldiçoada.

E acaba sempre tudo igual, ninguém esquece no final

E as férias viram só recordação

Você no seu mundinho e eu rindo do que aconteceu

Foi só mais uma história de verão...

Quando o avião decolou e cada vez mais subia, e as pessoas ficaram do tamanho de formiguinhas lá embaixo, eu suspirei, deixando o pesar de meu coração se apertar até quase me deixar sem ar. Eu estava deixando para trás o homem que eu amava e continuava me destruindo. Eu realmente esperava superá-lo. Nem que eu tivesse que sofrer por mais dez anos.


Notas Finais


Podem conferir minha primeira fic, por favor?

https://spiritfanfics.com/historia/cinderela-em-paris-2426734

Beijos!♥♥♥


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