História Undercover - Feel me

• Jasmine Maddox

Perdi a conta de quantos babás tive durante a semana que precisei de repouso. Valerie, Lacey e Travis dormiram na minha casa todos os dias e os meus outros amigos passavam a tarde inteira aqui. Eu não podia reclamar, afinal, eu amava quando eles cuidavam de mim desse jeito, mas foi como se eu tivesse quebrado uma das pernas. Nunca recebi esse tipo de atenção antes, nunca nem gostei de ser tratada como a donzela em perigo; era um pouco estranho. A preocupação de todos aumentou depois de dois pontos terem sido estourados e eu precisar ir correndo para o hospital carregada e cheia de dor. Teria que faltar no colégio pelo resto da semana por não poder fazer esforço com o braço machucado e pela falta de disposição por conta dos analgésicos para a dor. Nossa, como doía. Estava dormindo o dia inteiro e sem vontade de fazer nada, então inventei de não tomar os remédios recomendados; a dor era o suficiente para eu querer gritar de madrugada. Travis estava dormindo na poltrona do meu quarto, como se fosse um vigia e ficou desesperado ao me ver quase chorando de dor. Sabia que era a falta dos analgésicos, então sabia que deveria tomar todos do jeito que o médico havia mandado. Odeio ser dependente dos outros para uma simples tarefa que use os braços. Aquela garota maluca queria realmente me machucar, não foi apenas para me afastar.

- Eu não quero ser demitida. Sabe o quanto eu adoro trabalhar lá? - reclamei novamente quando me impediram de ir a hamburgueria. Já era sexta-feira, e eu queria parar de vegetar na minha cama.

- Eu falei com o Joe e ele entendeu o que rolou. Quem não entenderia? - Valerie respondeu. - E pode sentar novamente.

- Deus, como eu odeio estar dependente. - murmurei emburrada.

- Não fica de bico de novo. - Travis bagunçou meu cabelo. - Todo mundo vem aqui a tarde, você vai se distrair.

- Sai fora.

- Ela ainda está na fase da negação. - Max disse e enquanto todos riram, eu joguei uma almofada nele com o braço que eu podia mover. 

- Negação do que? Se estivesse qualquer fase, eu estaria na da raiva.

- Em relação ao Warner, ué. - Valerie disse como se fosse óbvio. - Não quer ficar perto porque sabe que ele já beijou sua irmã, né? Eu entendo.

- Ele já transou com ela enquanto eu estava em casa. - falei, como se fosse um absurdo. Realmente era. 

- Não transei, não. - Travis disse, sério. - Você acha mesmo que eu faria isso com...

- Tem pessoas aqui. - o interrompi.

- Não seja por isso. - Valerie levantou do sofá e ela, Lacey, Max e Nolan saíram da sala. Revirei os olhos.

Travis me encarava de uma forma que nunca tinha visto antes, mas permaneci com a minha melhor cara de tédio.

- Eu não transei com ela. Desde que eu te conh...

- Não me venha com esse papo que não dorme com ninguém desde que me conheceu. Fica feio até pra você.

- Você está impossível hoje. E eu não falei que não dormi com ninguém desde que te conheci. Não dormi com a Alexia desde que te conheci.

- Porque ela é uma chata, imoral, irritante, egoísta e... - parei de falar ao ver um sorrisinho ridículo em seus lábios. - Eu odeio você, Warner. Odeio muito.

- Não é possível que isso seja só TPM. Antes de ontem você até me abraçou!

- Eu ainda estava dopada por causa da anestesia de refazer os pontos e agora eu estou em mim. Você estava sendo um imbecil comigo, Warner. - estava preparada para colocar tudo o que eu estava sentindo para fora. - No dia que meu pai me levou até o aeroporto, eu só conseguia pensar em você. Cheguei na minha casa após saber que ficaria e estava saindo do quarto naquele dia para ir até a sua casa. - balancei a cabeça. - Você me conhece. Sabe que eu entenderia os seus planos, que eu aceitaria terminar se fosse para algo tão importante... aliás, não tem como terminar o que nunca começou.

- Minnie, eu...

- Você o que? Sério, se for pra dizer alguma coisa que não mude nada entre nós, então não fale nada. Só levante sua bunda daí e volte para a sua casa. - falei. - Agradeço mesmo por você ter cuidado de mim todos esses dias. Você sabe o que eu sinto por você, mas eu não consigo ficar perto de você desse jeito.

- Você conseguia antes.

- É, quando éramos amigos. E fazíamos coisas de amigos. Não quero ser só sua amiga de novo. Não faria bem para nenhum de nós dois e seria ainda mais difícil.

- Você está certa. Eu...

- Olha quem chegoooou! - ouvi a voz da Scarlet e ela entrou com Grace, Jordan, Wyatt e Sierra.

- Oi! - levantei do sofá para abraçá-los. - Joe deu uma folga hoje?

- Nos deixou sair mais cedo hoje. E o cedo dele é oito da noite. - Jordan disse e eu ri, me aproximando para abraça-lo.

- Alguns amigos seus estavam estacionando o carro. - Grace disse e eu olhei pela janela.

Leon, Parker, Sophie e Melanie entraram logo depois. Ah, como eu amava essa bagunça! Depois de dias trancada dentro de casa, vendo apenas os mesmos rostos e em silêncio, estava tendo um pouco de barulho. Não demorou muito para os meus amigos do trabalho interagirem com os meus amigos do colégio e eu sabia que Valerie e Scarlet se identificariam logo de cara; elas são muito parecidas. Leon deu a ideia de pedirmos pizza e mesmo sem fome alguma, concordei com todos. Eu podia morar nessa casa, mas ela estava muito longe de ser minha. 

- Jazz, vem cá. - Scar fez um sinal e eu franzi o cenho enquanto ia até ela. - Me pediram para te entregar isso. - ela mostrou um pedaço de papel amassado. 

- Meu Deus, mesmo eu faltando no trabalho aquele cara continua mandando bilhetes bizarros? Por que ele não diz logo de uma vez quem é? 

- Caras misteriosos são sexy. 

- Poderia ser ainda mais sexy se eu tivesse um nome. Ou um rosto. - falei e ela riu enquanto dizia para eu abrir logo. - Eu sei que você já leu, Scar. 

- Não li, não! Foi enquanto eu estava saindo e eu não sou tão curiosa assim. - levantei as sobrancelhas para ela. - Tá legal. Sou sim. 

- Claro que é. - ri e desamassei o pedaço de papel. 

"Fiquei sabendo do que aconteceu com você. Senti falta de te ver durante essa semana, os dias nem tiveram tanta graça. 

Melhoras para o seu ombro e espero te ver aqui semana que vem, Jasmin."

- Ele é um fofo, vai! - Scarlet disse. 

- Eu só estou preocupada como ele descobriu que eu machuquei o meu ombro. - falei. Como ele sabia da minha vida assim?

- Nós estávamos falando disso o tempo todo lá. Vários clientes perguntaram por você, inclusive o coroa que te deu uma gorjeta de duzentos dólares. 

- E aquela garota que conversei por horas na semana passada? Ela era demais. 

- Essa também! Qual o nome dela mesmo? 

Paramos para pensar. 

- Paris! - lembramos ao mesmo tempo. - Isso. O nome dela é Paris. 

- Bem original. 

- Com certeza. 

- E esse menino? Ele vai ficar nesse mistério até quando? Hello-ou, você não vai se apaixonar por ele só por algumas palavras em três bilhetinhos. - Scar disse. 

- Da próxima vez que alguém me entregar um bilhete, vou manda-lo me levar até a fonte. Isso está me irritando um pouco no meio de tudo isso. 

- Boa! - ela levantou a mão e fizemos um high-five. 

Voltamos para a sala, onde todos estavam e mesmo estando feliz de estar com todos aqui, o meu ânimo para falar qualquer coisa se igualava a zero. Eu sabia que isso não duraria; que esses dias livre do meu pai e da Alexia eram limitados. Eles voltariam no domingo e a minha vida voltaria ao normal; sendo monótona, cansativa e enchendo um pouco mais a minha paciência, até o ponto que eu explodir. O meu emprego não poderia pagar nem as três primeiras mensalidades da minha faculdade e já cheguei a pensar que estava fadada a permanecer presa nessa casa, à eles. Deve ser algum tipo de karma, não é possível. 

- Scarlet estava mostrando mais um bilhete do seu futuro amor? - Valerie perguntou, sentando ao meu lado. 

- Um bilhete, sim. Do meu futuro amor, não. 

- O que ele disse? - ela perguntou e eu entreguei a ela. Valerie estava amando isso, o sorriso não saiu de seu rosto. - Eu ainda nem o conheço, mas já adoro. Você precisa descobrir quem é. 

- Eu quero descobrir quem é, mas essa enrolação está me cansando. Me diz, quantos bilhetes ele vai me mandar até querer dizer o seu nome? 

- Quem está te mandando bilhetes? - Travis se intrometeu, ficando entre a Valerie e eu. 

- É o que eu quero saber. 

- Você nunca foi romântico assim, Warner. - Valerie o provocou, balançando a cabeça. Travis empurrou sua cabeça de leve. - Não adianta fazer isso. Você continuar deixando a Jazzy escapar pelos seus dedos como areia. 

- Você está bem filosófica hoje. - Travis respondeu com humor e ela mostrou a língua antes de ir até o Leon. 

- Ela não está errada, sabia? - falei enquanto olhava para a televisão. Senti o olhar de Travis sobre mim. - Não vou te esperar para sempre sem um motivo aparente. 

- Eu ainda vou te mostrar os motivos, Minnie. Você precisa confiar em mim. - disse baixo, com o rosto perto do meu. Encarei sua boca involuntariamente. 

- Viu? Não dá, Warner. Como você quer que eu seja sua amiga? Que eu fique perto de você sem querer te agarrar? Não dá. - voltei a olhar para frente e pude ouvir sua risada baixa. - E nem com essa sua risadinha. Saí de perto de mim. 

- Concordo com você. - ele sussurrou no meu ouvido e me repreendi por ter ficado arrepiada. 

- Se eu não estivesse com a porra do ombro desse jeito, Travis... 

- O que você iria fazer? 

- Nem queira saber. 

- Na verdade eu quero. 

- Pra você ficar excitado e ninguém poder te aliviar? Ah, não vou fazer isso com você. - fiz beicinho e ele levantou as sobrancelhas com um sorriso descarado.

- Tô de pau duro só de te ouvir sussurrando. 

- Você tem problema de ejaculação precoce então? 

Não contive o sorriso ao vê-lo gargalhar com a minha resposta. Não dava mesmo com ele; apenas o modo que ele sorria me deixava maravilhada, quem dirá a sua risada espontânea. Não conseguia parar de admira-lo e aos poucos, sua risada foi se acalmando até o momento em que ele também ficou me encarando de uma forma diferente. Sua mão foi até o meu rosto e fechei os olhos com o carinho na bochecha, abrindo-os logo depois para pegar cada parte disso. Não teríamos mais momentos assim depois que Alexia voltasse e ele também sabia. 

- Sobe lá comigo. - sua voz soou baixa. 

- Não. - balancei a cabeça. - Não mesmo. Estou muito satisfeita com a parte fofa e sem a safadeza. 

- Quem disse que estou pensando em safadeza? Só quero ficar sozinho com você. Percebeu quantas pessoas tem aqui? 

- Várias. - dei de ombros. - Mas não vou subir. 

Sua expressão de decepção me deixou um pouco triste e me aproximei para dar um selinho insignificante em seus lábios. É pouco, mas o que tem pra hoje. 

- Jazzy, seu celular está apitando aqui. - Grace disse. - Quer que eu leve aí? 

- Por favor!

Grace trouxe o meu celular e agradeci antes de ver quem era. 

Brad: Oi, linda. Queria ir te visitar hoje... você está em casa, né?

Jasmine: Oi, Brad! Estou sim. Pode vir, se quiser. Tem bastante gente aqui. 

Brad: Ih... amanhã você vai estar sozinha? Seus amigos não gostam muito de mim. 

Jasmine: Vou ficar sozinha só no domingo. "Sozinha" já que meu pai e Alexia estarão aqui. Pode vir hoje mesmo ou segunda. 

Brad: Vou segunda. Pode ser? 

Jasmine: Sim. Beijos! 

Deixei o celular de lado um pouco aliviada por Brad não vir hoje. Eu sabia que poderia ter discussões se ele viesse e não quero ver outra briga desnecessária. Minha vida já estava um caos o suficiente, não tinha espaço para isso. 

As pizzas chegaram alguns minutos depois e eles foram pegando cinco dólares de cada um para pagar o entregador, enquanto Valerie e eu estávamos na cozinha conversando. Como a maioria preferia comer sem prato e talheres, apenas pegamos os copos e guardanapos. 

- Quando você vai fazer a prova da bolsa, Jazzy? - Nolan perguntou sentando ao meu lado. 

- Semana que vem. 

- E você está de olho em quais faculdades? 

- Yale, WMU, NYU e FUI. 

- Qual a preferida? 

- Yale, claro. Na Flórida ainda é muito perto da Georgia, então quanto mais longe melhor. - respondi. - Você sabe que eu jogava vôlei lá em Paris, né? - Nolan assentiu. - Então, como eu ia para outras cidades jogar em competições, tenho bastante créditos. Acho que isso vai me ajudar também, mesmo que eu tenha estudado apenas o último ano aqui em Atlanta. 

- Espero mesmo que você consiga sair daqui. - ele fez carinho no meu cabelo e eu assenti com um sorriso, desejando o mesmo.

- Já contou para Scarlet que foi você quem mandou o bilhete? - perguntei sorrindo. 

- Não. "Eu gosto de caras mais velhos". - disse com uma voz fina, na intenção de imita-la. Soltei uma risada. 

- Você é muito maduro, Nolan. - dei duas batidinhas em seu ombro e fez uma careta para mim, me fazendo rir ainda mais. - Por que não chama ela pra sair? 

- É a primeira vez que falo com ela. - disse como se fosse óbvio. - E a Sierra percebeu que eu estava afim e deu uma indireta, sem falar o meu nome. Por isso que ela disse que gosta de caras mais velhos. 

- Besteira. É muito melhor um cara que te faça rir o tempo todo do que um que não tenha tempo para você. - falei. - Aliás... esqueceu a Summer, Nolan? 

- Meu coração é igual coração de mãe, Jazzy. Sempre cabe mais uma. 

- Você é um idiota. - falei, rindo e empurrei seu ombro. 

A campainha tocou e franzi o cenho por não estar esperando mais ninguém. Valerie abriu a porta e me olhou por cima do ombro com os olhos arregalados. 

- Já volto. - falei para o Nolan e fui até a porta. 

- Resolvi vir hoje. - Brad disse com um sorriso e tinha flores em sua mão. 

Fiquei alguns segundos sem saber como reagir, mas Brad se aproximou para me dar um beijo. Eu esperava que fosse na bochecha, mas pareceu um cumprimento de namorados e aquilo me assustou um pouco. Ele acha que estamos juntos? Não estamos, certo? Eu acabei de dar um selinho no Travis! 

- Obrigada pelas flores. - agradeci, abrindo um sorriso. - Pode entrar. 

Brad entrou e Valerie fechou a porta, ainda me encarando incrédula. Quase a mandei tirar essa expressão de assustada. 

- Fique com ele enquanto eu vou deixar as flores na cozinha. - sussurrei para Valerie, que assentiu. 

Todos olharam para Brad de uma forma desconfortável - menos Scarlet, Grace, Sierra, Wyatt e Jordan que não o conheciam. A minha vontade era de pedir para ele ir embora apenas para não passar por isso. Travis estava na cozinha quando fui deixar as flores em um vaso e mesmo que ele não tenha dito nada, conseguia perceber sua irritação só pela forma que ele respirava.

- Vocês estão juntos? - o ouvi perguntar. 

- Não sei. Se soubesse não teria tido conversa nenhum com você, quem dirá aquele beijo inocente. 

- Não é ele que você quer. - pude senti-lo se aproximar, mas permaneci de costas. 

- E se for? Não quero alguém que seja inconstante. Você é tão inconstante, Warner. - me virei para ele. - Não quero ficar desse jeito. Não quero metade de você, do seu tempo ou dos seus sentimentos. 

Não acho que ele já tenha reparado, mas eu tenho necessidade de receber carinho e atenção de quem diz sentir algo por mim. Depois que a minha mãe morreu, eu não conseguia o afeto tão intenso quanto o dela e a falta do vínculo paterno, sempre me fez um pouco de falta. Me tornei uma pessoa carente por crescer no meio de tudo isso e sentimentos pela metade sempre me deixam pela metade. Não aguento ver quem eu gosto perto e, de uma hora para outra, tão longe. Isso me desestabiliza completamente e mesmo que eu tenha aprendido a não ser tão frágil em relação as pessoas, quando mexia com o lado romântico do meu coração tudo parecia desmoronar. Valerie não está no lado romântico, mas eu sabia que ela não me deixaria por nada nesse mundo e, se deixasse, ficaria mais perdida do que fiquei quando cheguei na França. Sentir tudo isso por Travis, alguém inconstante e que não sabe lidar com o que está sentindo, é tão perigoso. 

- O que eu sinto por você não é nada inconstante. - sua voz me despertou dos pensamentos e o encarei. 

- Então prove. - deixei as flores no vaso e voltei para a sala. 

Katie não estava aqui por motivos óbvios e mesmo que eu - e até ela - fale que não foi Brad quem fez aquilo com ela, não adiantava nada. Talvez se eles conversarem possam ficar por perto sem trocar alfinetadas e olhares de desprezo.