História UnKiss Me - Suga BTS - 11 meses - Declarações Inesperadas

Estava deitado na minha cama, com fones de ouvido, notebook no colo e milhares de lenços de papel ao meu redor. Concentrado nas batidas que eu criava no computador, tenho que dar mais uma pausa pra espirrar e assoar meu nariz pela centésima vez. Inferno de saúde! Inferno de garganta! Inferno de nariz! Maldito tempo que acaba com a minha tranqüilidade. A dor no corpo só piorava a cada minuto, eu já não conseguia sentir o gosto de nada que comia, só de engolir minha própria saliva era um incomodo, meus olhos ardiam e eu sentia mais frio do que se estivéssemos com 10 graus abaixo de zero. Ainda assim eu tinha que terminar meu trabalho, tinha que conseguir fazer aquilo.

O que eu não tinha era idéia de quantas horas já haviam se passado enquanto eu tentava organizar tudo que tinha na minha cabeça pra criar um conteúdo que eu tivesse plena confiança em gravar. Acho que no final das contas a perfeição era algo inalcançável, mas ainda assim difícil de deixar pra trás. Pelo menos eu era livre pra falar a merda que quisesse e aquilo era uma forma de me entender melhor também.

Eu não fazia sentido nem pra mim mesmo.

Rio levemente com aquele pensamento e dou uma pausa na música pra assoar meu nariz de novo. Assim que liberto meus ouvidos dos fones abafados, percebo que meu celular estava aos berros jogado entre os lenços de papel usados. Pego o aparelho e leio “Julia” na tela. Olho o relógio do notebook e constato que eram 2:30 da manhã, então atendo prontamente, já começando a ficar preocupado.

- Onde você ta? – pergunto.

- Aqui no ponto de ônibus do lado do clube. Ta chovendo bastante e nenhum ônibus passou até agora...

- Cadê seu namoradinho?

- Ele não é meu... – ouço ela respirar fundo do outro lado da linha – Ele tem um compromisso importante amanhã. Eu estava treinando e mesmo saindo cedo do vôlei to aqui esperando a mais de uma hora... não queria te incomodar...

- Fica ai que eu já estou indo. Chego em cinco minutos – levanto da cama, deixando o notebook de lado – presta atenção no celular e qualquer coisa me liga.

- Ta bom. Obrigada – responde antes que eu desligue.

Rapidamente pego as chaves sobre o criado mudo, calço um par de tênis, dou um gole longo no xarope pra tosse ou sei lá o que era aquilo e saio em direção a garagem de casa, apertando a toca do meu moletom. Assim que começo a andar com o carro, vejo que vou ter que tomar o máximo de cuidado na direção. Eu estava ficando sonolento, com o corpo cada vez mais pesado e dolorido, cada vez mais frio e a chuva forte só piorava tudo.

Demorei um tempo pra perceber que não estava conseguindo controlar uma tremedeira chata. Ao parar num semáforo eu passo a mão na minha testa, afastando meu cabelo e percebo que estava suando frio.

- Merda! – reclamo comigo mesmo, segurando mais forte o volante.

Porque eu estava parado num semáforo as duas e pouco da manhã? Min Yoongi não poderia ser mais um sinônimo de gênio. Sem ligar pras poucas pessoas andando pelas ruas aquela hora numa quinta feira, eu avanço o sinal, desejando mais do que nunca chegar até ela o mais depressa possível. Era perigoso ficar sozinha num ponto de ônibus tarde da noite. Julia jamais saberia se defender.

Presto atenção nas faixas pintadas no asfalto, contando os minutos enquanto batia os dentes de frio. Quando finalmente me aproximo do ponto próximo ao clube, Julia imediatamente reconhece meu carro, era a única pessoa ali num raio de quilômetros. Eu estaciono próximo a guia e ela corre pela chuva, contornando o veiculo e sentando-se no banco do passageiro.

- Obrigada Yoongi, eu não sabia mais pra quem ligar e estava morrendo de frio – ri um pouco sem graça.

- Não se preocupa – dou um sorrisinho de merda, comprimindo os lábios e volto a ligar o carro.

Nem estava fazendo aquilo de propósito, é que além de tudo a minha cabeça também estava começando a dar sinais de enxaqueca de novo. Eu não estava bem mesmo nem pra fingir pra ela, como sempre fazia. Em poucos minutos de silêncio no caminho de volta, podia sentir o olhar dela me analisando minuciosamente.

- Sua gripe piorou muito. Você não para de tremer.

- Isso não é nada – dou de ombros – Sempre fico gripado quando o tempo muda assim. Amanhã vou estar melhor.

Só pra me contradizer, uma crise de tosse infernal começa a me incomodar. Sério, pra que eu tomei aquela merda de xarope se não adianta de nada? Mesmo assim Julia não se manifesta mais até chegarmos em casa. Ela só fica me encarando fixamente. Enquanto eu troco de marcha, viro o volante, guardo o carro na garagem, desligo o motor, abro a porta e me esgueiro pra fora. Eu estava me sentindo pior do que num reality show. 

Não queria ser rude nem nada do tipo, mas eu precisava desesperadamente da minha cama naquele momento, então tento subir as escadas sem tropeçar nos meus próprios pés. Antes de pisar no terceiro degrau, Julia corre na minha frente e coloca a mão na minha testa.

- Você ta queimando de febre. É melhor ir no médico.

- Não vou agüentar dirigir, preciso deitar – falo baixo, piscando os olhos devagar.

- O que você ta sentindo? 

Ela passa meu braço sobre seus ombros e me ajuda a subir as escadas até o final.

- To sentindo que vou morrer com essa droga de dor no corpo, dor de garganta, dor de cabeça e tudo que eu tenho direito.

Entramos no meu quarto e finalmente posso deitar na minha cama. Julia não deixa eu me cobrir, apenas sai do quarto correndo e volta com uma caixinha de remédios em mãos. Enquanto media minha temperatura com o termômetro ela arrumava a cama, tirando os lenços e guardando o notebook. Mesmo com os olhos pesados e ardendo, eu não ia conseguir dormir com aquela dor no corpo me esmagando.

- Vou fazer uma sopa pra você.

- Não estou com fome – faço uma careta.

- É bom tomar alguma coisa quente. Um chá então...  de alho, limão e mel.

- Hein? Chá de alho? – minha careta piora ainda mais – Eca Julia!

Ela ri minimamente e eu esboço um sorriso dolorido, que provavelmente me fez parecer ridículo.

- Vai te ajudar bastante... o alho vai melhorar sua circulação e aumentar sua resistência, o limão combate infecções e é rico em vitamina C, já o mel além de adoçar a receita vai te ajudar a fortalecer o sistema imunológico, é expectorante também... tem um monte de outros benefícios, você vai ver. Vai melhorar rapidinho.

- Essa vai ser sua receita pros seus pacientes? – tiro o termômetro.

- Por que não? Não posso ignorar essas receitas caseiras. São saudáveis e realmente ajudam. É ainda melhor por serem cem por cento naturais – pega o termômetro da minha mão e checa a temperatura – Está com 39 e meio. Não se cubra até que eu volte.

Dou uma risadinha fraca, seguida por tosses irritantes. Ela estava querendo parecer bem profissional. Ficava ainda mais bonitinha dando ordens daquele jeito, querendo cuidar de mim. Tive a impressão de fechar e abrir os olhos por um instante e Julia já estava ali de novo, sentada na beirada do colchão, próxima de mim.

- Senta e bebe devagar tigrão – me estica o chá.

- Tigrão de novo? – reviro os olhos.

- Desculpa... Yoongi.

Me esforço pra ficar sentado na cama, mas acabo parando no meio do caminho. Julia ajeita o travesseiro sob a minha cabeça assim que eu pego o chá e experimento. Não era a pior coisa que eu já tinha tomado, dava pra aguentar.

- Você não devia ter saído pra me buscar nesse estado.

- E você deve pensar muito pouco de mim, pra achar que eu deixaria você sozinha na rua as duas da manhã e debaixo de chuva.

- Eu nunca sei o que esperar de você.

Tomo mais um pouco do chá a encarando, mas ela desvia o olhar e brinca com as próprias mãos apoiadas no colo. Então estico minha mão livre, cobrindo as dela inteiramente.

- Eu gosto de você... – falo com a voz rouca e ela me encara incrédula – de verdade.

Julia sente minhas mãos geladas, minha palma suada, conta mentalmente quantas vezes meu peito subiu e desceu devagar enquanto eu respirava, lê cada um dos sinais do meu rosto, pra enfim perguntar:

- Mas...?

- Mas? – repito confuso.

- Senti que tem um “mas” nessa frase, alguma coisa que você precisa terminar de dizer.

- Eu gosto de você de verdade, mas... não do jeito que você gosta de mim.

- O que isso quer dizer? – ela franze o cenho.

- Que eu não sei se sou capaz de gostar de você o tanto quanto você gosta de mim. Não sei... amar alguém assim...

Ela balança a cabeça em concordância e abre a boca num “aaaah, entendi” mudo. Suas mãos estavam imóveis embaixo da minha.

- Isso não quer dizer que eu não pense em nós dois... que eu não te veja com outros olhos... que eu não queira me aproximar de você – acaricio sua mão levemente – Não é como se eu pudesse mudar tudo que eu sinto de uma hora pra outra também e fosse começar a escrever num diário como eu não posso viver sem você daqui pra frente. Mas eu estou sendo sincero, sempre vou ser sincero com você...

- Eu sei, essa é uma das suas maiores qualidades Min Yoongi. Obrigada pela sua sinceridade – ela da um tapidinha de leve na minha mão, acariciando brevemente.

No segundo seguinte seu celular vibra no bolso do casaco que estava usando e ela o retira de lá para ler uma mensagem que eu não consigo ver. Julia abre um sorriso grande pra tela do aparelho e depois balança a cabeça em negativa. Eu sabia muito bem quem era pra ela ficar daquele jeito. 

- Ei... – volta a atenção pra mim – toma esse remédio – me entrega um comprimido que havia tirado de dentro da caixa de remédios – termina de beber o chá todinho e tenta dormir um pouco, está bem? Eu volto daqui a pouco pra checar sua temperatura de novo.

Fala como se eu fosse uma criança antes de se levantar da minha cama. Julia afofa mais uma vez meu travesseiro, passa os dedos pelos fios de cabelo na minha testa e logo em seguida sai, tomando o máximo de cuidado pra encostar a porta. Por algum motivo eu sinto uma frustração e o chá agora parece bem amargo apesar do mel. Parecia que a nossa conversa tinha sido interrompida e eu não tive chance de me expressar da maneira como deveria.

Ou talvez tive chances de mais...