"Torne-se alguém que prefira ser ferido a ferir os outros..."
Você já sentiu como se toda a sua vida fosse uma mentira?
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- " Prefira ser ferido a ferir os outros"? É sério que você vive com essa ideia? - A mulher a minha frente afagou o meu rosto e deu a volta na cadeira onde eu estava preso, indo atrás e se apoiando em meus ombros.
- Foi o que a minha mãe me ensinou..... Por isso....
- "Por isso" ..... Você vai viver seguindo essa ordem pra sempre?
- ......
Minha mãe sempre foi gentil.... Acho que só não me senti sozinho, sendo filho único morando numa casa apenas nós dois, graças a minha mãe e aos vários livros que meu pai deixou.
Ela era uma pessoa ótima. De verdade. De verdade mesmo! Trabalhava, cuidava da casa e não incomodava ninguém....Nunca fez cara feia para os outros, minha mãe era igualmente gentil com todos. Era o meu orgulho.
- O "mestre" chegou.... - Ela falou se afastando repentinamente.
- Hã? - Acordei dos meus devaneios.
- Até mais.....
A mulher que eu conhecia muito bem sumiu e logo o " mestre" do qual ela falara entrou na sala. Era sempre assim..... Sempre que o efeito da injeção passava, o Yamori me alimentava.... Ele esperava as partes machucadas se regenerarem. Logo que elas voltavam ao normal ele aplicava a substância e isso se repetia.
Tantas e tantas vezes, os dedos dos meus pés eram arrancados como se fossem unhas ou cabelo.
"Os humanos eram tão fracos assim?"
Eu senti que ele estava me ensinando a ser um monstro......De verdade.
Acordei num salto. Eu estava ofegante e suado.....Puxei a coberta dos meus pés e os olhei, esperando não ver meus dedos.... Mas.... Estranhamente eles estavam lá...... Aquilo foi um sonho? Meu cabelo branco era a prova de que não foi. Aquilo eram memórias.... Memórias de um passado não muito distante.....
Me sentei na cama e passei a mão pelos meus cabelos...... Olhei o relógio e vi que eram 4:00 da manhã. Eu estava com problemas para dormir de novo...... Resolvi me levantar e fazer um café, quem sabe isso não me acalmaria?
Fui para a pequena cozinha do meu "esconderijo" e preparei o café, enquanto eu derramava a água quente pelo pó uma memória veio a tona.....
" - Eu não consigo colocar a água quente do jeito certo.... O gerente disse para eu pedir que você me ensinasse....
- Tsc.... Mas que saco.... - Touka-chan retorceu o rosto em uma careta de puro desânimo - Presta a atenção....
- Desculpa.... E.... Obrigado! - Eu sorri de leve e voltei meus olhos no que ela fazia.
- É assim... Tem que abafar direito....
Ela derramou a água direto na xícara e muita espuma e café transbordaram para fora.
- Pode derramar? - Perguntei.
- Pode... Dá um ar mais refinado. Pronto.
- Puxa! - Falei maravilhado com a maestria dela.
*****
- Um café? Só um minuto! - Eu pedi pro cliente aguardar e fui fazer o café do jeito que a Touka-chan me ensinou.
- Não é assim Kaneki-kun.... - A voz do gerente se fez presente - Não pode derramar tanto....
- Hã? Ah..... - Eu fiquei confuso.
- Você aprendeu direitinho com a Touka-chan? - Ele me perguntou e eu olhei pra Touka que parecia estar segurando o riso.
- D-desculpa.... - Eu sorri - Ela me ensinou, mas acho que ainda não peguei o jeito!"
Naquela época eu preferia ser ferido do que ferir.... Touka-chan tinha me ensinado errado de propósito......
- Onii-chan? - Aquela doce voz me tirou dos meus devaneios, e eu me virei para ver quem era, não que eu não soubesse.
- Hinami-chan.... O que está fazendo acordada a essa hora? - Dei um sorriso de leve.
- Eu estava dormindo, mas aí senti o cheiro do café.... E escutei os passos do onii-chan....
- Você está ficando realmente boa em escutar! - Eu sorri - Mas por ora, volte a dormir....
- Si-sim! - Ela sorriu e foi em direção aos quartos.
******
Mal amanheceu e Tsukiyama apareceu no lugar, trazendo consigo vários girassóis, os pendurando pela casa toda.
- Onii-chan, onii-chan!! O Tsukiyama-san chegou!!
- É.... Eu percebi.... - Falei olhando pro girassol na cabeça de Hinami.
- Bonjour! - O arroxeado entrou na cozinha e colocou um girassol na minha cabeça - Ficou magnific Kaneki-kun! - Ele sorriu.
Se fosse outra época eu coraria e me afastaria, mas eu nem liguei.
- Tsukiyama-san, o que faz aqui?
Ele ficou sério e seu tom mudou.
- Tenho assuntos particulares a tratar com você mon amour..... - Ele me encarou, esperando minha resposta.
- Ok..... Vem.... Vamos no meu quarto....
Ele me seguiu e eu tranquei a porta atrás de mim.
- O que quer?
- Eu descobri informações sobre o CCG..... Parece que eles virão investigar essa área.... Alguém andou fazendo bagunça demais por aqui.... - Não sabia se ele estava se referindo ao meu quarto ou as redondezas do esconderijo.
- E o que propõe para fazermos? - Eu estalei um dos dedos.
- Como sabia que eu ia propor algo? - Ele me encarou sorrindo divertido com a situação e eu não respondi - Proponho que fiquem na minha casa.
- Sua casa? - Soltei uma risada abafada.
- Qual é a graça?
- Você acha mesmo que vamos cair nessa? Que eu vou cair nessa?
- Cair nessa o que? - Ele se levantou da cama e me encarou de braços cruzados.
- Você quer me levar lá pra fazer um banquete! Provavelmente deve haver centenas de ghouls nos esperando para uma "recepção calorosa", estou errado?
- Sim. Está! Eu não quero mais te devorar.... Já achei outra coisa melhor que envolve você vivo.
Eu não quero saber do que ele está falando, pelo menos não agora..... Suspirei cansado e o olhei apreensivo:
- Tudo bem.... Quando nós iremos? - O fitei.
- Hoje a noite, a investigação será amanhã de manhã.... E tente não deixar rastros Kaneki-kun.... - Ele se levantou e parou em frente a porta, esperando que eu a abrisse.
Eu sorri.
- Pode deixar Tsukiyama-san - Eu abri a porta pra ele passar e ele o fez.
Por um momento.... Apenas por um momento.... Eu tive a impressão de ter tido um pequeno vislumbre dentro de mim.... Um vislumbre de algo que eu não sabia explicar.... Algo que envolvia o Tsukiyama-san.....
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