Levi permanecia sentado no confortável sofá de couro há quase uma hora. O corpo inclinado para frente, os cotovelos apoiados nas coxas musculosas e os dedos a movimentarem-se de forma nervosa e constante. Olhava fixamente para o maço de cigarros que jazia em cima do tampo de vidro da mesinha de centro. Olhava e era como se a embalagem o encarasse de volta, chamando por seu nome.
Exatamente um ano e dois dias sem fumar. Um ano e dois dias sem tragar as substâncias tóxicas que entorpeciam seu corpo e que, em momentos de angústia como aquele, causavam extremo alivio. Tinha acostumado-se a viver sem, mas se fosse por conta própria, jamais teria parado. Pretendia morrer sendo fumante e achava que estava tudo bem assim.
Acontece que quando se fica noivo de um homem que tem inúmeros problemas respiratórios e séria intolerância a cheiros fortes, como o do cigarro que empesteava a casa toda, fica difícil continuar fumando. Era um ultimato, na realidade. Se escolhesse o cigarro, não teria Eren. Se escolhesse Eren, não teria o cigarro.
E, claro, seu coração enxerido já tinha escolhido o rapaz de olhos verdes por conta própria, transformando o tão necessário e desejado cigarro em mera segunda opção. E mesmo diante da intensa abstinência que a falta da nicotina e das outras tantas mil substâncias causava, viu-se lentamente deixando de ser fumante.
A casa já não carregava o cheiro forte e característico; os cinzeiros foram os primeiros a serem descartados. Seus dedos já não eram mais tão amarelados e até já conseguia sentir que respirava bem melhor. O cigarro deixou de ser presença certeira naquele ambiente, assim como Eren.
O causador de toda aquela mudança, o garoto de olhos verdes e sorriso expressivo, tinha partido logo cedo, alegando que o amor que sentia não era correspondido com a intensidade que esperava e almejava. Afirmava que Levi estava quase sempre distante; que sentia que o sexo tinha se transformado na única experiência real trocada entre eles.
Eren tinha gritado, à plenos pulmões, que precisava sentir que ainda existia amor, e Levi só conseguia pensar no quanto deixar de fumar tinha sido uma grande prova do tal amor, que seu noivo tanto dizia não existir. Para o inferno com a saúde e todos aqueles avisos sobre os tantos malefícios que rodeavam o vicio! Embora soubesse dos perigos, nenhum deles tinha feito a menor diferença em sua decisão.
Namorados chegaram e partiram; amigos insistiram e insistiram, tal e qual como os familiares fizeram. Quando Levi desenvolveu uma pneumonia, o médico advertiu incisivamente, afirmando, de todas as maneiras possíveis, que a morte bateria em sua porta mais cedo se continuasse a viver daquela maneira. Tantos e tantos motivos para que sentisse vontade de largar o bendito vício, porém nenhum deles surtira efeito.
E então, num belo dia, surgiu Eren, trazendo consigo rinite alérgica e sinusite crônica. Intensa intolerância a qualquer cheiro forte, desde perfumes à sabonetes, passando por temperos como canela e cravo. Tudo mudou desde então, o rapaz chegou e o cigarro se foi. Agora o cigarro havia voltado, mas Eren não.
Diante da lamentável situação e da tristeza imensurável que esmagava o peito, Levi só conseguia pensar que se tivesse escolhido o fumo, teria um companheiro fiel que o seguiria até a morte, contudo, havia escolhido Eren e agora não tinha mais ninguém. E se a solidão já não era mais tão intensa quanto fora poucas horas atrás, era por conta do cigarro que agora mantinha entre os dedos, acendendo nervosamente com o isqueiro preto.
O suposto ex viciado observou a fumaça escapar pela ponta, embriagando-se com o odor intenso. Jogou o corpo para trás, apoiando-se no encosto do sofá. Sua boca abria e fechava, enquanto a ansiedade tornava-se insuportavelmente presente. Não tinha fumado ainda, por enquanto apenas passeava pelas lembranças que o simples ato de segurar o cigarro trazia.
Em uma época mais amena e feliz, se sentisse vontade de ceder a tentação e acabasse acedendo o tal “tubinho branco”, Eren diria alguma bobagem sem sentido que trouxesse alguma distração e Levi deixaria de fumar. Acabaria rindo, mesmo que discretamente, e deixar o desejo de lado tornaria-se bem mais simples.
Se falasse sobre o quanto seus lábios sentiam-se solitários e que sofriam com a falta de algo, Eren o beijaria fervorosamente, fadando o cigarro ao esquecimento. E se tudo isso não fosse suficiente para que a abstinência passasse, mais caricias seriam trocadas apaixonadamente, sairiam para qualquer lugar, assistiriam à algum filme ou cozinhariam juntos.
Tudo que estivesse ao alcance seria feito para que o cigarro não conseguisse retornar e o vicio converteria-se em apenas mais uma lembrança ruim. Contudo Eren já não estava mais por perto e, no fim das contas, era ele quem sempre afastava a abstinência e a vontade de fumar, afinal.
E agora que segurava o cigarro entre os dedos, olhando para ele, percebia que, mesmo com a partida do jovem rapaz, a vontade de fumar já não existia. O maldito garoto, além de ter ido embora, havia levado o vício junto consigo e o que ficava para trás era um Levi duplamente abandonado.
Um Levi que não sentia falta alguma do fumo, mas que sentia extrema falta de Eren. Acontece que o cigarro estava ao alcance de suas mãos, seu ex noivo não. O cigarro estava ali e continuaria a estar sempre que precisasse. O cigarro destruiria seu corpo lentamente, faria mal à sua saúde, mas, por outro lado, sabia que ele acalmaria sua angústia, dissiparia parte da solidão e traria aconchego.
E, à cima de tudo, o cigarro jamais o abandonaria e era por isso que Levi voltaria a fumar e continuaria fumando até morrer. Continuaria fumando mesmo que uma voz distante, oculta bem no fundo de sua mente, dissesse que essa era uma péssima escolha a se fazer. Continuaria fumando simplesmente porque o cigarro aliviaria a abstinência que a falta de Eren causava.
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