História Video Games - Morena

Angelina

Acredito que todos estamos predestinados a encontrar alguém para amar infinitamente, da mesma forma que estamos condenados ao fim inevitável: se foder.

É, isso é o que eu acredito, e tudo bem se você não quiser acreditar, mas antes de revirar os olhos e balançar a cabeça em desdém, apenas continue lendo.

Helena e Páris. Romeu e Julieta. Jack e Rose.

Porque comigo seria diferente? Quero dizer, não insinuando que vou morrer em Tróia, ou envenenada ou de hipotermia… Talvez eu nem morra aos 18… mas será que meu final amoroso será trágico?

Nathaniel e Jesse Humphrey. Posso adiantar que pelo menos esses dois transformaram minha vida na Exphire University bem… interessante.

— # —

O banco é confortável, porém velho. O ônibus meche se sacolejando e produzindo barulhos irritantes conforme passa por cima de pistas desgastadas e esburacadas. Escuto o assovio da porta se abrindo quando ele para em mais um ponto, cessando a chatice do sacolejar. Estou sentada no penúltimo banco do canto esquerdo, solitária, até ouvir passos ritmados se aproximando.

— Acho que não podem Hamsters por lá, morena — olho por cima do ombro, surpresa. Ele morde o lábio inferior e dá um sorriso de canto. — Hã… posso me sentar?

Levanto a sobrancelha também, mas sorrio, afinal.

— Quem te disse isso? — indago. — Senta aí.

Ele enfia a mala no bagageiro e se joga ao meu lado. Um perfume suave e gostoso me faz suspirar sem perceber. Meu Deus, o perfume dele é, como diria Alyssa, minha melhor amiga, um tesão.

— Sou Jesse Humphrey e você é — ele abre um sorriso grande analisando minha mala ao lado da dele. — Angelina Campbell.

— Muito esperto — digo. — Minha mãe insistiu para colocar esse… papel? É, foda-se, papel nela, com meu nome, endereço e telefone, para o caso de eu perdê-la.

— É sempre bom prevenir — ele agora fitava a gaiolinha no meu colo. — Macho ou fêmea?

— Macho — respondo.

— Uau — ele crispa os lábios. — Qual o nome desse carinha?

— Hamster.

Ele assente com a cabeça, então para, confuso.

— Hamster. Espera aí, você tem um hamster que se Hamster — coça o queixo. — É isso?

Sorrio.

— Legal, né? Eu sei. É que quando Alyssa me deu no natal achei que ele tivesse cara de Hamster.

Jesse sorri.

— Bem, de qualquer jeito, isso não vai poder ficar no alojamento, não. É proibido bichos por lá.

De repente o ônibus começa a se mover, e a ganhar velocidade. Ótimo, quanto mais rápido eu sair daquele ônibus, melhor.

— Ah, qual é! Por que não me avisaram antes?! — exclamo.

— Se você quer mesmo saber, acho que não tem problema —ele esfrega as mãos, com um brilho no olhar e se recosta no banco. — Vamos adorar um assadinho de hamster chamado Hamster.

Fuzilo-o com o olhar.

— Isso seria crime contra os animais — chio, mas dou um sorriso.

Jesse retribui. Seus cabelos são de um castanho mel, o rosto é encovado e seus olhos são cinzentos. Como Alyssa diria “Ah, eu pegava um deus desses”. Me sinto ansiosa quando penso em revê-la.

— Estou brincando, morena — tento me sentir indiferente ao novo adjetivo que ganhei, mas não funciona exatamente. Sinto um calor subir por meu pescoço ao vê-lo me analisar descaradamente. — Novata ou voltando de férias?

— Novata — respondo. — Vou cursar letras.

O sorriso dele se estende.

— Bem, somos colegas, acho — diz, tirando os fios que caiem na testa. 

— Sério? Letras também?! Uau! Que coincidência! — dou uma risadinha.

Quero dizer, quais as probabilidades de conhecer um cara no ônibus que vai cursar o mesmo que eu?

— Legal — diz ele, me fitando.

Ficamos conversando até o restante da viagem. Jesse é… “oh, adorável!” como Alyssa diria.

— # —

O ônibus estaciona uma hora e meia depois. Minhas pernas doem um pouco, minha coluna também (especialmente minha coluna) mas sorrio para Jesse quando ele desce e fica observando eu sair também. Meu Deus, o sorriso dele é bonito e a forma suave que ele olha para as coisas é contagiante. Uma das coisas que eu mais odeio sobre mim e que logo logo vai ficar mais óbvio é que eu tenho certa facilidade de ser feita de otária, principalmente porque para mim me apegar bastam umas palavras simpáticas, uns sorrisos doces. E Jesse está seguindo o roteiro perfeitamente. Aos meus 18 anos, acho que por no mínimo eu já deveria ter aprendido. Fala sério, parece até que eu gosto de me ferrar. Só que, e daí? Talvez Jesse seja diferente, porra. E agora eu já pelo menos conheço alguém além de Alyssa na Exphire.

— É engraçadinho a forma que Hamster corre nessa roda — ele aponta o dedo para a gaiola na minha mão.

— Hamster gosta de malhar — falo e enfio o dedo dentro da grade, tocando o pelo macio dele.

Descemos do ônibus. A estação está lotada. Algumas pessoas encostadas em colunas da parede, observando a chegada de outras. Procuro por Alyssa na multidão, mas adivinhem! Não a encontro.

— Que droga, aquela vagabunda deve estar atrasada, como sempre — resmungo.

Jesse ri.

— Vagabunda? Quem? — pergunta. -- Quanto carisma.

— Minha amiga — esclareço. — Acredite, ela bem deve estar se agarrando com alguém nesse instante.

— Uou. Pode vir comigo, se quiser. Meu irmão vem me buscar com o carro. Só… tente não se importar com… bem… hm… a personalidade maravilhosa dele. Ele é um cara quase legal.

Fico imaginando como seria esse irmão dele. Olha, vou falar a verdade, se for tão gostoso quan… Ah, esqueça, não pense que sou sempre tão safada assim. Só às vezes, mas por favor, quem nunca é?

Por que não aceitaria?! Ligo para Alyssa mais tarde, provavelmente ela não vai se importar. Além do mais, estou gostando de ficar perto de Jesse, sei lá, ele tem uma vibe boa.

 Sigo ao lado de Jesse, tentando acompanhar seus passos longos.

— Ah, já ia me esquecer de perguntar: gosta de um baseado? Porque você gostando ou não, Nathan vai te oferecer e te fazer levar. O cara é bem persuasivo, morena.

— Não faz mal, adoro — respondo. Cara, que tipo de pessoa é o irmão de Jesse?!

— Ah, lá estão eles — encostados na parede, está um cara corpulento, bonito demais a ponto de todas as garotas espiarem (e os garotos também). Imediatamente reconheço o ar babaca naquele garoto, como os da época do ensino médio. Ele tem uma maçã na mão e a come enquanto seus olhos se perdem por mim.

Mas não é exatamente ele que eu vejo primeiro. Ao lado dele tem uma garota branca com enormes cabelos ruivos. É claro que é irmã deles, ou pelo menos namorada de Nathan. Mas não é Nathan que ela beija quando Jesse e eu chegamos.

— Caramba, Jess, estava com saudade — ela cola os lábios nos deles, enquanto Jesse a fecha na parede com os braços.

Desvio o olhar, sem entender porque estou tão decepcionada. É claro que eu deveria saber. Homens bons ou são gays ou já estão namorando, não é assim que Alyssa costuma falar? É por isso que ela se diz livre, leve e solta. O resto é tudo babaca.

Olho Nathan e sinto meu rosto queimar. Droga, ele tem mesmo que ficar me encarando desse jeito?

— Hm… Ignorem esses trouxas. Vem, vamos para o carro que vou te oferecer uns baseados. E meu Whatsapp — fala Nathan. — Sexo só no alojamento, é que infelizmente esses dois vão com a gente na picape. Ah, meu nome é Nathaniel. Mas para você é Nathan.

Ele dá um sorrisinho e morde a maçã.