Eliza tinha acabado de chegar à praia e estava armando o tripé quando avistou o vulto se aproximar. A atitude determinada da mulher deixou-a perplexa, até que descobriu quem era. Lexa. Ela desceu à praia e subiu a pequena duna, parando diante dela e bloqueando a vista.
— Tenho uma coisa para lhe dizer.
— Não quero ouvir.
— O problema é seu, pois vou dizer de qualquer maneira. Não tem o direito de se intrometer em minha vida particular e dizer-me que espécie de ser humano sou. Nem mesmo me conhece.
As palavras de Eliza haviam a atormentado durante a noite inteira. E ela descobriu, através da galeria, onde podia encontrá-la. Nem mesmo tinha certeza do por que foi até ali, mas sabia que precisava fazê-lo.
— Que direito tem de fazer qualquer julgamento a meu respeito?
— Absolutamente nenhum. Mas não gosto do que vejo.
Eliza parecia fria e distante, enquanto trocava a lente da câmara.
— E o que exatamente vê?
— Uma casca vazia. Uma mulher que não se importa com coisa alguma, a não ser com o seu trabalho. Uma mulher que não se importa com ninguém, não ama nada, não dá nada, não é nada.
— O que você sabe sobre o que sou, sobre o que faço, como me sinto? O que a faz pensar que é toda-poderosa para saber de tudo? — Eliza a contornou e focalizou a câmara na duna seguinte. — Faça o favor de me escutar!
Lexa estendeu a mão para a câmara e ela a empurrou, virando-se para a morena, dominada por uma fúria intensa.
— Por que não sai de minha vida?
Como fez nos últimos dois anos, desgraçada! Pensou mas não falou.
— Não estou em sua vida! Estou apenas tentando comprar alguns trabalhos seu. É tudo o que quero! Não quero os seus julgamentos sobre a minha personalidade, minha vida ou qualquer outra coisa! Quero apenas comprar algumas de suas malditas fotografias!
Lexa estava quase tremendo, de tão furiosa. Mas Eliza simplesmente passou por ela, e foi até o portfólio que estava sobre uma manta na areia. Abri consultou uma ficha e depois pegou um cartão de memória, e jogou no peito de Lexa.
— Aqui está. É seu. Faça o que bem quiser com essas fotos. E agora me deixe em paz.
Sem dizer mais nada, Lexa virou bruscamente e voltou para o carro estacionado à beira da estrada.
Eliza não virou a cabeça para a olhar, concentrando-se em seu trabalho. Ficou na praia até não haver mais claridade suficiente para continuar a trabalhar. Voltou para o seu apartamento, preparou alguns ovos mexidos, esquentou um café e comeu. Depois, foi para o laboratório. Foi deitar às duas horas da madrugada e não atendeu quando o telefone tocou. Mesmo que fosse Niylah, ela não se importava. Não queria falar com ninguém. E ia voltar para a praia às nove horas daquela manhã. Ligou o despertador para oito horas e adormeceu no instante seguinte. Libertara-se de alguma coisa lá na praia. E tinha de ser franca consigo mesma: mesmo que a odiasse, pelo menos a viu. De uma estranha maneira, isso era um alívio.
Na manhã seguinte, ela tomou um banho e vestiu-se em menos de meia hora. Estava usando roupas de trabalho surradas. Tomou um café enquanto lia o jornal. Deixou o apartamento na hora que havia prevista, alguns minutos antes das nove horas. Já estava pensando no trabalho ao descer apressadamente a escada, acompanhada por Lucky. Foi somente quando chegou lá embaixo que levantou os olhos e soltou uma exclamação de surpresa. No outro lado da rua havia um enorme cartaz, montado num caminhão, dirigido por Lexa Woods. Ela estava sorrindo ao observá-la. Eliza sentou-se no último degrau e começou a rir. Lexa era mesmo doida. Pegou a fotografia que ela lhe deu, mandou ampliar e montou no caminhão, depois a levou até a porta dela. Ela estava sorrindo ao sair do caminhão e se aproximar de Eliza, E ela ainda estava rindo quando Lexa se sentou no degrau a seu lado.
— Está gostando?
— Acho que você é doida.
— É possível. Mas não ficou bom? Pense só como os seus outros trabalhos vão ficar, ampliados e montados nos prédios do centro médico. Não seria sensacional?
Lexa é que era sensacional, mas Eliza não podia dizer isso.
— Vamos tomar um café e aproveitaremos para conversar.
Naquela manhã, Lexa não estava disposta a receber um não como resposta. Ela adiara todas as reuniões, reservando a manhã inteira para Eliza Taylor. E a loira achou a determinação dela comovente ao mesmo tempo que divertida.
— Eu deveria dizer não. Mas não vou dizer isso.
— Assim é melhor. Posso te dar uma carona?
— Naquilo?
Eliza apontou para o caminhão e começou a rir novamente.
— Claro. Por que não?
E assim as duas entraram na cabina do caminhão e seguiram para o Cais dos Pescadores, a fim de tomarem o café da manhã. Os caminhões eram uma paisagem familiar ali e ninguém ia se impressionar com uma fotografia daquele tamanho.
Surpreendentemente, o café da manhã transcorreu de modo agradável. Ambas suspenderam a guerra, pelo medos até que o cafezinho final foi servido.
— E então, consegui persuadi-la?
Lexa parecia muito segura de si mesma, enquanto a contemplava, sorridente, por cima da xícara.
— Não. Mas reconheço que foi um momento dos mais agradáveis.
— Imagino que eu deveria sentir-me grata por esses pequenos favores, mas não é o meu estilo.
— E qual é o seu estilo? Pode dizer, em suas próprias palavras.
— Está querendo dizer que me dá uma chance de explicar, ao invés de ficar dizendo o que sou?
Lexa falava em tom divertido, mas havia uma ponta de amargura em sua voz. Ela chegara perto demais do problema com alguns dos seus comentários no dia anterior.
— Está certo, vou te dizer. Sob certos aspectos, você tem razão. Vivo para o meu trabalho.
— Por quê? Não tem mais nada em sua vida?
— Não. A maioria das pessoas bem sucedidas provavelmente não tem. Não há lugar para isso.
— O que é uma estupidez. Não precisa trocar a sua vida pelo sucesso. Algumas pessoas têm as duas coisas.
— Você tem? .
— Não inteiramente. Mas talvez algum dia eu possa ter. De qualquer forma, sei que é possível.
— Talvez seja. E talvez meu estímulo já não seja o que era antes.
Os olhos de Eliza se abrandaram quando ela ouviu tais palavras.
— Minha vida mudou consideravelmente nos últimos anos. Não realizei nenhuma das coisas que planejei. Mas... tive algumas boas compensações.
Como me tornar a presidente da Woods, só que Lexa ficou constrangida de dizer.
— Entendo. Presumo que não é casada.
— Não, não sou. Não tenho tempo. Nem interesse.
Essa era ótima! Portanto, no final das contas, provavelmente havia sido melhor que não tivessem mesmo casado.
— Dá a impressão de que nada a atrai.
— No momento, é isso mesmo o que acontece. E você?'
— Também não sou casada.
— Quer saber de uma coisa? Apesar de toda a sua condenação ao meu modo de vida, não é tão diferente assim. Está tão' obcecada por seu trabalho quanto estou pelo meu, igualmente solitária, igualmente encerrada em seu pequeno mundo. Então por que é tão exigente comigo? Isso não é justo.
A voz de Lexa era gentil, mas tinha um tom de censura
— Desculpe. Talvez você esteja certa.
Era muito difícil discutir aquele problema. E depois, enquanto Eliza pensava no que ela acabara de dizer, sentiu a mão de Lexa na sua. Foi como uma faca a penetrar em seu coração. Ela puxou a mão, com uma expressão angustiada nos olhos. Lexa parecia novamente infeliz.
— Você é uma mulher muito difícil de compreender
— Creio que tem razão. Há muita coisa que seria impossível explicar.
— Deve tentar algum dia. Não sou o monstro que parece imaginar.
— Tenho certeza de que não é.
Ao olha-la, tudo o que Eliza queria era chorar. Era como dizer adeus para Lexa. Era saber, novamente, o que ela nunca poderia ter. Mas talvez ela compreendesse melhor agora. Talvez finalmente fosse capaz de largá-la. Com um pequeno suspiro. Eliza olhou para o relógio.
— Tenho de ir trabalhar agora.
— Cheguei por acaso mais perto de um sim como resposta à nossa proposta?
— Infelizmente, não.
Lexa detestava ter de admitir mais seria forçada a desistir. Sabia agora que ela jamais mudaria de ideia. Todos os seus esforços haviam sido em vão...
Ela era uma mulher obstinada. Mas gostava dela. E estava surpresa ao descobrir o quanto, no momento em que ela baixava a guarda. Havia nela uma suavidade e uma ternura que a atraíam intensamente, como há anos não se sentia atraída por ninguém.
— Acha que eu poderia convencê-la a jantar comigo esta noite, Eliza? Não poderia ser uma espécie de prêmio de consolação, já que não consegui o que queria?
Eliza riu baixinho ao ver a cara dela e acariciou a sua mão.
— Bem que eu gostaria, mas neste momento não será possível. Infelizmente, terei de viajar.
Oh, diabo! pensou Lexa. Estava realmente perdendo a luta, um round depois do outro.
— Para onde vai?
— Vou voltar ao leste. Para cuidar de alguns problemas pessoais. Eliza tomou a decisão na última meia hora. Mas sabia agora o que precisava fazer. Não era uma questão de enterrar o passado, mas sim de desenterrá-lo. E ela tinha certeza agora. Tinha de se curar do passado.
— Telefonarei para você da próxima vez que vier a São Francisco. Espero ter melhor sorte.
Talvez. E talvez também, a esta altura, eu já seja a Sra. Niylah Cooper. Talvez eu já esteja curada. E não terá mais qualquer importância. Absolutamente nenhuma.
Voltaram em silêncio ao caminhão e Lexa a deixou no prédio em que ela morava. Eliza quase não falou ao se despedir. Agradeceu pelo café da manhã, sacudiu lentamente a cabeça e subiu para seu apartamento. Lexa perdeu. E observando ela se afastar, sentiu uma imensa tristeza. Era como se tivesse perdido algo muito especial. Não sabia muito bem o quê. Um negócio, uma mulher, uma amiga? Alguma coisa. Pela primeira vez em muito tempo, ela se sentiu insuportavelmente só. Dando a partida no caminhão, voltou para o hotel.
Assim que entrou no apartamento, Eliza ligou para Niylah.
— Esta noite? Ora, querida, tenho uma reunião.
Ela parecia desconcertada e estava com pressa, atendendo ao telefone entre duas reuniões.
— Então venha depois da reunião é importante. Vou viajar amanhã.
— Para onde? Por quanto tempo!
Niylah estava agora preocupada.
— Te explico quando chegar aqui. Esta noite?
— Está bem, está bem. Por volta das onze horas. Mas isso é realmente absurdo, Eliza. Será que não pode esperar?
— Não.
Esperara por dois anos e ela foi doida em deixar assim por todo esse tempo.
— Está certo. Eu vou te ver esta noite.
Niylah desligou apressadamente. Eliza telefonou para uma companhia aérea, a fim de reservar a passagem, depois foi ao veterinário para acertar a estada de Lucky.
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