Um dia após o réveillon estávamos todos reunidos na sala de jantar, eu, papai, mamãe, Carl, Sara, Glória e Nicky degustando um almoço maravilhoso, conversando, rindo, coisas que família fazem quando se reúnem. Por alguns segundos fizemos silêncio , todos ao mesmo tempo, e este mesmo silêncio foi quebrado por uma pergunta nada discreta feita pelo meu irmão dirigida a mim.
- Mana como tá indo a paquera? - ele perguntou depois de colocar um pedaço de carne na boca. Todos os olhares se direcionaram para mim.
- Não sei do que você tá falando. - Meu coração disparou, foi aquela mesma sensação de quando a mãe chega e fala:Precisamos conversar. Tentei parecer o mais calma possível.
- Da sua paquera que pulou a janela do seu quarto esses dias - ele riu.
- Que história é essa. - meu pai perguntou
- Você está sonhando - Nicky riu.
- Ué cabeça oca essa você não me contou. - ela me olhou e riu com sarcasmo.
- Cala boca Nicky não entra na onda - falei um tanto séria e brava.
- Ok ok, mas depois quero saber dessa história - gargalhou
- Nicky - fui firme.
- Parei
- Maninha se não é verdade porque tá bravinha? - ele coçou o queixo.
- Isso é verdade filha? - Minha mãe me perguntou.
- Não é verdade, Carl tá fazendo só pra me irritar- menti, mas naquela mesma tarde minha saberia a verdade.
- Carl deixa sua irmã em paz. - minha mãe falou
- Mas é verdade mãe, eu não estou brincando, não vejo problemas dela namorar- tomou um gole de vinho. - eu fico feliz que ela tenha alguém.
- Carl deixa sua irmã em paz - Agora foi a vez de Sara chamar sua atenção. Mas meus pais não se deram por satisfeito, Glória apenas me olhava, Nicky e meu querido irmão riam da situação, e eu estava tonta com tantas perguntas vindas dos meus pais
- Mãe, pai eu já falei, não tem paquera nenhuma, eu nem saio de casa como vou paquerar. Carl você me paga, seu idiota - bufei.
- Deixa seu irmão, ele só tá divertindo um pouco. - Nicky tentou amenizar.
- Isso não é diversão Nicky, é minha vida. Quer saber perdi o apetite, vou pro meu quarto. - levantei, peguei o andador.
- Querida termina seu almoço.
- Estou satisfeita pai. - Sai andando em direção ao meu quarto.
- Mouse vou com você. - Nicky se levantou e me acompanhou.
Por trás de mim eu ouvia meu pai e minha mãe chamando a atenção de Carl. Entrei no meu quarto, fechei a porta e sentei na beirada da cama, Nicky sentou ao meu lado.
- Que história é essa? - ela me abraçou.
- O que ele disse é verdade. - Acabei sorrindo da situação. Contei toda a história pra Nicky, sem detalhes é claro, mesmo ela insistindo.
- Deus tá vendo você esconder as melhores partes de sua amiga. - ela riu
- Vai se fuder - empurrei-a.
- Ok, você pelo menos pensa em contar pra eles, ou vai viver como uma adolescente abrindo a janela pra ela ou tendo encontros escondidos na calada da noite em um beco qualquer.
- Vou contar na hora certa, apesar de não saber qual será a reação deles, mas não quero que saibam dela agora, a situação ainda é complicada. - suspirei.
- Quanto tempo estão nesse lenga-lenga? - ela fitou-me.
- Um ano eu acho - franzi o nariz.
- Eu não entendo, vocês se amam, estão juntas, e porque ela não deixa essa mulher de vez, ela tem rabo preso ou o que? - colocou a mão em minha perna.
- Tem uma criança envolvida - suspirei mais uma vez.
- Verdade, eu sempre me esqueço do bebê - ela arregalou os olhos e fez um bico - É difícil, mas se ela está com você é porque as coisas entre elas já acabaram.
- Eu sei disso, ela sabe disso, mas Sylvie… A questão é que ela está usando a garota pra afastar a Alex de mim.- inclinei a cabeça para trás.
- Chantagem? - semicerrou os olhos.
- Exatamente, coisa do tipo, você fica com ela e esquece nossa filha.
- Que situação difícil - ela me olhou perplexa.
- E é por isso que eu não quero que eles saibam, não enquanto estivermos nessa bola de neve gigante - Baixei o olhar.
- Não desista dela nunca por causa disso ok?
- Nunca, eu a amo e não vou perdê-la fácil assim.
- Olha pra mim - ela segurou meu queixo. Eu a olhei, com os olhos marejados - Coloque na sua cabeça que tudo vai da certo, que esse é só mais um obstáculo dentre todos que você já passou e ainda vai passar- ela me envolveu com seus braços e me apertou em um abraço.
- Eu estou tentando pensar o mais positivo possível, nunca imaginei que o amor fosse assim, eu a quero tanto. - beijei sua bochecha - To parecendo uma idiota não é?
- Igual aquelas garotinhas que acham que encontrou o seu primeiro e ficam toda serelepes - ela sorriu
- Não é pra tanto - soltei dos seus braços.
- Não, mas é quase - gargalhamos.
Era quase fim de tarde quando Nicky se despediu de mim e foi embora, tomei um banho quente e demorado, desejei minha banheira, mas ainda não era hora de voltar pro meu antigo quarto. Coloquei um pijama quente, peguei meu celular pra ligar pra Alex, a última vez que falamos foi ontem a noite, ela estava um pouco agitada, ela não me disse, mas pude perceber pelo seu tom de voz. Eu andava de um lado pro outro, puxando ainda um pouco da perna, eu não consegui falar com ela, o telefone dava fora de área ou desligado, preocupada, eu não queria estar, mas eu estava e muito. Eu tentava mais uma vez ligar quando minha mãe entrou no quarto e eu nem percebi por estar completamente distraída.
- PIPER! - Ela exclamou assustada. E eu quase caí pra trás de tanto susto. - O que está acontecendo aqui? - ela perguntou se mostrando completamente incrédula. Eu não consegui me expressar, a voz ficou presa na garganta, meu corpo travou.
Minha mãe se aproximou - Pode por favor me explicar o que está acontecendo aqui? - ela segurou em meus braços. Eu ainda demorei alguns segundos para processar o que acabara de acontecer, engoli seco e então consegui pronunciar as primeiras palavras.
- O que quer que eu diga? - minha voz vacilou.
- Pode começar falando sobre você estar andando.
- É, estou andando, não foi pra isso que pagaram fisioterapia?
- Foi, mas não precisa ficar na defensiva, era o que nós mais queríamos- ela me abraçou e beijou minha bochecha. - eu estou muito feliz, quando isso aconteceu?
- Tem mais o menos um mês. - relaxei um pouco.
- Porque mentiu, e não nos contou sobre isso? - Ela parecia confusa, e com razão.
- Foi necessário, eu quis contar, mas tem outras coisas - respirei fundo.
- Querida, você mentiu e agora eu quero saber o motivo, e eu não vou sair desse quarto até você me contar.
- Mãe por favor, entenda eu não posso falar, não agora - caminhei até minha cama e sentei.
- Eu só quero entender o motivo, porque não encontro nenhum pra justificar seu comportamento, você não é assim. - ela puxou a cadeira que fica encostada no canto do quarto e sentou de frente pra mim e segurou minhas mãos. Olhei pra ela com pesar, meu coração aguçou. - Estou esperando Piper.
- Estou apaixonada - meus olhos fixaram nos dela. Eu poderia mentir, dizer qualquer coisa, mas acho que nada justificaria eu ter omitido sobre minha condição
- Mas isso não é motivo pra você mentir ou fingir uma situação, ai que você tinha que estar andando pra todo lado mesmo. - ela deu meio sorriso.
- Você tem razão, não é, mas neste caso é o único jeito - Não pude conter as lágrimas. Chorei pela situação que eu estava, pela preocupação de não conseguir falar com Alex, eu estava tão vulnerável.
- Quer chamar a atenção dele, quer que ele sinta pena e fique com você? Esse não é o jeito certo de começar um relacionamento - Ela limpou minha face com o polegar.
- Não é ele, e não começamos um relacionamento assim, se eu estou fingindo é pra mantê-la aqui, ao meu lado o máximo de tempo possível, pelo simples motivo de eu não poder tê-la, a hora que eu quiser - Mais uma vez ela me olhou confusa, meu coração se espremeu dentro de mim.
- Do que você está falando, não estou entendendo onde você quer chegar - Ela se afastou, encostando totalmente na cadeira, ela estudava minhas expressões.
- Não é um homem, é uma mulher linda - suspirei.
- Mulher?
- Sim mãe, eu amo Alex Vause, estou perdidamente apaixonada por ela - sorri em meio às lágrimas. - Ela é razão por eu ter escondido isso de vocês, ela é a razão em todos os sentidos por eu estar de pé.
- Filha, você não pode fazer isso, é doentio manter alguém assim. - ela balançou a cabeça negativamente.
- Não mãe, não é desse jeito que você está pensando, o que eu sinto por ela não é possessivo, ela também me ama, nós nos amamos e estamos juntas. - coloquei a mão no peito.
- Ela está te ajudando nessa farsa, eu não posso acreditar que eu estou ouvindo isso? É antiético. - Minha mãe me olhava como se eu fosse uma maluca.
- Pelo amor de Deus mãe, ela não é desse tipo, ela não sabe que eu estou andando, eu fiz isso sozinha.
- Meu Deus Piper, o que está acontecendo com você. - ela coçou a testa.
- Mãe eu a amo, olha pra mim. - coloquei minhas mão sobre as mãos dela.
- Filha ela é casada, eu não posso acreditar que vocês estão vivendo assim.
- Elas moram juntas, mas não vivem como casal.
- Piper - ela fechou os olhos e molhou o lábio inferior com a ponta da língua. - Como, me explica isso?
- É de fachada, tipo alguns amigos do papai, sabe como é.
- Jesus - passou a mão pelo cabelo. - Quando isso aconteceu?
- Posso dizer que foi a primeira vista, eu e ela.
- Eu quero saber quando começaram - ela fez uma pausa. - Quando começaram a se relacionar.
- Mais ou menos 1 ano, não sei dizer ao certo, foi tão tumultuado.
- Meu Deus Piper, a história do carl é verdade?
- Sim, ela veio me ver de madrugada e pulou a janela. - Sorri.
- Você acha isso engraçado, mas é insano.
- Não tem nada insano nisso, você não faria o mesmo pelo papai se estivessem na mesma situação que eu?
- Não sei, e seu pai é um homem, talvez eu contaria a meus pais e as coisas talvez seriam diferentes.
- Então esse é o problema, se Alex fosse um homem tudo bem, mas como ela é mulher é insano. - Levantei da cama - ÓTIMO Carol, quero ficar sozinha agora pode ser? - mostrando a saída.
- Filha não foi isso que eu quis dizer - ela se levantou e me abraçou por trás.
- Não, você não queria, imagina se quisesse falar então - me afastei dela.
- Desculpa eu falei sem pensar no calor do momento - ela se colocou na minha frente. - Sua felicidade sempre foi o mais importante e isso não vai mudar por estar apaixonada por uma mulher. Quero ouvir toda a história, pode me contar?
- Não sei se devo - fui em direção a janela.
- Deixa eu te entender, por favor. - ela se colocou ao meu lado.
Acabei cedendo ao pedido dela. Sentamos em minha cama e eu contei desde o início, falei sobre Sylvie, Brooke, falei da chantagem e minha mãe disse que isso era loucura, que as coisas não deveriam ser assim, falei do amor e de tudo que eu aprendi com ele, dos sorrisos, das lágrimas, das coisas lindas, falei de Alex e do quão maravilhosa ela é, de como ela me faz feliz e do quanto ela me faz sentir a mulher mais linda e sortuda desse mundo,apesar das dificuldades envoltas ao nosso relacionamento, de como o sorriso dela faz o meu dia mais lindo mesmo em meio a uma tempestade. O semblante da minha mãe ficou mais leve e eu pude ver um leve sorriso brotando de seus lábios. Falei de como eu tinha medo de perdê-la, de como doía toda essa situação.
Eu chorei como uma criança, chorei por estar preocupada, chorei pelo amor lindo e injusto, chorei por não ter ela ali do meu lado, por toda a situação... Minha mãe me envolveu em um abraço e beijou o topo da minha testa. Ela disse que o amor era assim mesmo e que se não fosse assim, não seria amor, eu senti a ternura que transbordava daquelas palavras que saiam de sua boca, por um momento eu me senti segura em meio a toda tormenta.
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