História Written in the Stars - Momentinhos que me fazem sorrir

Rin Kagamine - 2 de Abril de 2016, Tóquio, Japão.

A claridade daquela manhã ensolarada de primavera atravessou a janela diretamente para meus olhos, fazendo com que eles ardessem até eu criar coragem para abri-los de uma vez. Acordar cedo nunca foi uma das minhas atividades favoritas — em outras palavras, era um porre.

Pisquei diversas vezes, tentando me acostumar com a claridade do ambiente. Espreguicei-me, bocejei e ergui meus braços para cima, na intenção de me alongar. Franzi o cenho quando percebi que não estava no meu quarto, e sim no do meu irmão.

Por que será eu havia dormido ali? Ou melhor, há quanto tempo eu não entrava nesse lugar? Estava consideravelmente diferente do que eu me lembrava — ainda me recordava perfeitamente daquele quarto com a beliche que dividíamos, os cobertores amarelos e os brinquedos espalhados. Sorri com a lembrança. Já faz vários anos...

Levantei-me da cama de Len e arrumei-a. Contraí os lábios, fazendo com que eles se chocassem entre si, franzi os olhos e arfei pelo nariz. Era difícil esconder a saudade que eu sentia daquela época, porém, jamais iria admitir isso de novo, meu irmão agiu de um modo muito babaca comigo.

Voltei a me questionar do motivo de ter passado a noite naquele ambiente. Sonolenta, minha memória falhava um pouco. Havia ido a um encontro com o Yuuma mais cedo, chegando, os meninos – Kaito e Oliver – estavam em casa. Íamos comer pizza, mas não lembro de experimentá-la. Tenho quase certeza que em algum momento entre esses que mencionei, acabei capotando na sala, caído no sono sem nem perceber. O que era justo, já estava há alguns dias com meu sono desregulado, graças as conversas em meio a madrugada com o Hiro.

Poxa, preciso regular meu sono, antes que isso comece a atrapalhar meus estudos...

Nunca fui uma aluna exemplar, no nível da Luka, pelo menos, mas sempre tirei notas boas. Acabava me destacando um pouquinho mais em exatas do que matérias mais teóricas, essas eu acabava sendo um verdadeiro desastrinho. E é claro que várias noites mal dormidas em seguida, afetariam não só meu humor, como também meu desempenho, então era melhor eu me cuidar um pouco mais quanto a isso.

A grande pergunta agora, era como eu havia parado ali no quarto de Len. Não me lembrava de ter subido as escadas e muito menos vindo para cá. Comecei a pensar na possibilidade de algum dos meninos ter me levado para lá. Além de nunca nem ter conversado direito com Oliver, ele era menor que eu, por isso acredito que não tenha sido ele. Len e eu estávamos novamente brigados, então duvido muito que fora ele. Então, meu último palpite foi para Kaito, definitivamente não posso deixar de agradecê-lo.

Fui para o meu quarto e percebi que ainda estava com o vestido rosado da noite anterior, então tirei-o, coloquei ele no cesto de roupa suja, e entrei no banho. Deixei a água escorrer entre os fios do meu cabelo enquanto pensava na bagunça de maquiagens que havia deixado na pia do banheiro ontem – e me lamentando sobre ter que arrumar aquilo tudo mais tarde.

Saí do banho, arrumei minhas coisas e vesti uma camiseta um pouco grande demais para mim, branca e cor-de-rosa que ia até a metade das minhas coxas, junto a um shortinho preto legging, por baixo, uma roupa bem simples para passar o fim de semana em casa mesmo.

Peguei meu celular antes de descer as escadas para comer algo. Vi duas notificações de mensagem na página inicial – eram de Gumi.

Cenourita-Gumi: Amiga, tenho novidades!

Cenourita-Gumi: Não posso te contar agora, mas não me deixa esquecer depois plmdds. É importante :) Bjs

Ri da mensagem da minha amiga imaginando o que viria a ser. Engraçado ela não ter me xingado mais por conta de eu não ter comparecido na festa do pijama de tradição dela (tradição esta que só tinha acontecido ano passado, claro). E antes de concluir meus pensamentos, senti o celular vibrar na minha mão – era a minha amiga de cabelo verde de novo.

Cenourita-Gumi: P.S: não estou mais tãaao puta assim contigo por vc não ter ido na festa do pijama ontem a noite. Só quero te dar um soco no rosto agora, antes eram dois :)

Revirei os olhos e não respondi a mensagem, porém, mesmo assim dei risada mentalmente de Gumi. Eu definitivamente amo o jeitinho dessa vaca. Deixei meu celular em cima da cama, e finalmente desci para o andar debaixo.

Os três garotos continuavam na sala, porém, agora somente dois deles encontravam-se acordados. Um deles era Shion Kaito, que naquele momento parecia concentrado comendo o resto que sobrara da pizza do dia anterior. Len, por sua vez, estava esparramado no sofá, com o controle na mão, passando aleatoriamente pelos canais da televisão. O menino desacordado era Oliver, deitado num colchão e descoberto, ele praticamente roncava.

— Olha só! — Exclamou Kaito ao me ver — A cinderela finalmente acordou. — Completou rindo.

Revirei os olhos, acompanhado seu riso.

— Kaito, seu conhecimento em contos de fada me surpreende — Ri levemente — Você devia saber que quem é dorminhoca é a bela adormecida.

— Você entendeu o que eu quis dizer, nanica.

Ri mais uma vez.

— Outra coisa, acho que a bela adormecida aqui é o Oliver. — Apontei para o garoto adormecido. Kaito olhou para ele e riu, concordando. — A propósito — Mudei o assunto, sentando-me no sofá, aproximando-me dele e tocando seu ombro — Obrigada por ter me levado lá para cima ontem, acabei capotando do nada — soltei uma pequena risada.

Naquele momento, percebi o rosto de Len virar, mudando da direção da TV para a minha e de Kaito. O garoto maior franziu a testa e disse:

— De nada — Falou, porém, parecia ter acontecido que eu não estava sabendo. Ele abriu a boca para falar mais alguma coisa, mas Len cortou-o antes que pudesse começar:

— Ei, Rin, sobrou pizza de ontem na geladeira, se quiser pegar para tomar café da manhã.

Assenti sorrindo. Sim, estava chateada com Len, mas fala sério, ele me ofereceu pizza, quem fica triste com pizza por perto?

Abri a geladeira, peguei uma fatia de pizza de pepperoni, coloquei no prato e levei ao micro-ondas. Deixei esquentando por um minuto, enquanto esperava, ouvi uma vozinha fina surgir do topo da escada e se aproximar de mim cada vez mais.

— Rin! Rin! Rin! — Yuki exclamou ofegantemente pela correria. — O papai ligou. — Contou. — Falou para irmos para a casa da nossa avó mais tarde, disse que vamos jantar lá. Mandou você e o Len fazerem algum doce para levarmos lá.

Suspirei. Doce com Len. Acho que ganharia mais fazendo sozinha.

Tive uma manhã preguiçosa. Voltei para o meu quarto e passei boa parte do dia na minha cama, maratonando animes em meu celular.  Debaixo da coberta e com carinha de cansaço – algo irônico, pois não havia feito praticamente nada – resolvi me levantar, e cumprir minha única tarefa do dia.

Ia fazer um bolo de chocolate, algo que não fosse tão complicado e fosse suficientemente gostoso para aquela noite. Comecei a pegar os ingredientes no armário e na geladeira, separando-os em cima do balcão.

— O que está cozinhando? — Vi meu irmão parado na frente do balcão. Ele me encarava, parecia um pouco sério, os olhos estavam fixos em mim, o queixo levemente abaixado pela nossa diferença de altura e os lábios entreabertos.

— Bolo — Respondi friamente — Papai mandou.

— Se não me engano, essa ordem foi para nós dois, não foi? — Assenti cabisbaixa.

— Foi — Respondi — Mas pode deixar, eu fico tranquila aqui fazendo.  

— Jamais — Comentou ele sorrindo de canto, parecia brincalhão, por algum motivo. — Se eu deixar esse bolo nas suas mãos é capaz de você queimar tudo.

Meus olhos arderam.

— O bolo não vai queimar, seu bocó — Xinguei-o com toda minha fúria.

Ele riu com o canto dos lábios, dando a volta pela bancada e se posicionando atrás de mim. Cruzei os braços, mal-humorada. Senti um leve arrepio quando senti seus braços passarem pela minha cintura. O que esse garoto está fazendo?

Olhei para trás, vendo-o por cima de meus ombros, ele não me olhara de volta até então, apenas movia suas mãos, em direção as minhas, tocando-as gentilmente, causando-me um pequeno formigamento conforme ele passava seus dedos pela extensão das minhas pequenas mãos. Atravessou-as e tomou de mim o ovo que eu segurava, afastou-o alguns centímetros e o quebrou no canto da bancada, abrindo-o na tigela verde que se encontrava na minha frente.

Ao perceber que eu o encarava, Len direcionou seu olhar para mim. Estávamos a poucos centímetros de distância, e seus braços envoltos na minha cintura, era algo que em um primeiro momento me assustou, já que há um bom tempo nossa proxêmica não era íntima.

Respirava forte, nós dois em silêncio. Queria dizer algo, mas simplesmente não saia nada, apenas continuava a encará-lo por trás de meus ombros. O tempo parecia ter parado naquele momento, e o mesmo tanto que aquela situação me incomodava, eu também não queria me afastar dali. Não sei quantos segundos passamos naquilo, talvez até minutos, mas só acabou quando ele afastou a casca de ovo, deixando-a de lado, e mudou a direção de uma das suas mãos, aproximando-a lentamente de meu rosto, tocando minha face com a costa dos polegares, pressionando ali, e esfregando de modo delicado.

 — Tinha farinha nas suas bochechas — Riu — Depois ainda diz que é uma boa cozinheira e que não vai queimar o bolo.

Minhas bochechas esquentaram de raiva. Afastei-o com meus cotovelos e peguei um fuê – aquelas colheres próprias para bater bolo – e voltei para o lugar onde eu estava.

— Com licença — Pedi de modo educado, Len encarou-me, dessa vez confuso, porém se afastou. — Vou fazer o bolo mais gostoso que você já comeu. — Disse desafiadora e convencida.

Ele riu.

— Está me desafiando, Kagamine Rin?

— Talvez. — Respondi sorrindo de canto. Por mais que odeie admitir, aquela competição foi muito divertida. Foi uma correria e nunca chegamos em um resultado certinho de quem fizera o melhor bolo, mas acabamos com duas sobremesas muito gostosas para a noite.

Na hora de limpar a bagunça, Len me perguntou enquanto lavava a louça:

— Então, Rin. você está a fim de assistir alguma coisa comigo hoje a noite, lá na casa da nossa avó? Meio que como uma oferta de paz.

Eu suspirei.

— Eu ainda estou chateada com você, Len. — Abaixei a cabeça, sacando um prato e guardando-o no armário. — Não acho justo fazer isso comigo mesma, você me magoou bastante.

Ele assentiu.

— Sei que fiz porcaria, também entendo se você não quiser falar comigo tão cedo, é seu direito. Só saiba que te considero muito, independente do que eu tenha falado aquele dia.

Meu irmão fechou a torneira, aproximou-se de mim, inclinou-se sobre mim, afastou as mechas do meu cabelo da minha testa, e depositou um pequeno beijo ali, ação que tirou um sorrisinho tímido de mim. Segundos depois ele voltou para sua tarefa e terminamos de arrumar as coisas em silêncio.

De noite, fomos até a casa da nossa avó. Foi uma visita normal, quando chegamos, meu pai já estava lá, ajudando sua mãe a preparar o jantar. Vovó ficou muito contente em nos ver, fazia um tempo que não íamos para lá. Comentou o quanto tínhamos crescido – mesmo que eu tenha exatamente a mesma altura de alguns anos atrás.

Conversamos bastante, rimos, e é claro, comemos bastante. Mais tarde, optamos por passar a noite lá mesmo. Era uma casa aconchegante, mas ao mesmo tempo pequeninha, o que significava que eu e meus irmãos dividiríamos o quarto. Arrumamos nossos futons e fomos nos deitar. A mais nova de nós três optou por ficar no meio, enquanto eu fiquei na ponta próxima a porta e Len na mais próxima da janela.

Mal eram 22 horas e Yuki estava dormindo. Len e eu, por outro lado, parecíamos estar nos revirando a horas na cama. Entediada, e sem muito para fazer, resolvi me conectar no aplicativo móvel daquele joguinho, para entrar no chat e conversar com Hiro. Sorri quando vi que ele estava online. Mandei uma mensagem e poucos minutos depois vi uma reposta.

Joguei uma almofada em Len quando ouvir o celular dele apitar. Poxa, deixe no silencioso, temos uma pirralhinha dormindo do nosso lado. Cobri a minha cabeça com a coberta pensando na possibilidade de a claridade também incomodá-la. Era muito divertido passar a noite conversando com Hiro, riamos bastante e tínhamos bastante assunto. Mas, não conseguia deixar de pensar onde aquele garoto se encontrava naquele momento, era estranho que eu estava falando com um garoto que podia ser de qualquer lugar do Japão. Porém, mesmo assim aquele momentinho me fazia sorrir.