Pelo menos agora eu posso dizer que já te deixei molhada
Encontrei a Alice encostada na porta do vestiário masculino, mexendo no celular com uma expressão de malandragem que com certeza coincide com a do Hitler tramando a morte de milhões de pessoas. Batizei essa expressão dela de “dia do juízo final”. Ou seja, de acordo com os meus cálculos: vai dar muita merda. Ao cubo. Tirei meus fones de ouvido.
— Alice. Tá fazendo o quê aqui? — perguntei.
— Oi pra tu também. Eu tô bem, ótima, e você? Muito obrigada por perguntar, você é tão gentil, um cavalheiro...
— Gracinha.
— Tô esperando o Ryan. Ele tava no banho — apontou pro vestiário com a cabeça —mas foi falar com o diretor e depois a gente vai pra algum lugar…
— Ryan? Ryan meu melhor amigo?
— Tem algum problema?
— Tem.
— Qual?
— Todos
Ela revirou os olhos.
— Claro.
— Por que tu tá flertando com meu melhor amigo?
— Por que tu beijou aquela nojenta? E “flertando”? Quem usa esse tipo de vocabulário? — Eu ri da irritação dela. Ela colocou a mão na cintura. Cocei o queixo.
— Ah qual é, eu fiquei com aquela menina, caindo de bêbado, diga-se de passagem, o que é muito importante, aí você ficou magoada comigo e agora quer descontar em mim saindo com o meu melhor amigo? Quanta maturidade.
— Talvez, mas só talvez isso não tenha nada a ver com você. Já parou pra pensar que alguma ação minha seja baseada em um desejo meu e não uma simples reação a algo que você fez? Quanto ego.
— Cuidado.
— Com?
— Ciúmes é sintoma de paixão — respondi.— E ela não era nada nojenta. Eu acho.
— A calcinha dela era o quê? Vermelha? E não tô com ciúmes.
— Ela não tava usando calcinha. Não, pera… Falei algo errado? Desculpa… É que parece ciúmes. Mas só parece. — Ela massageou as têmporas com as pontas dos dedos e respirou fundo. O que, imagino eu, ajudou muito a não me esganar ali mesmo. Cruzei os braços sobre o peito. — Tu nem curte o Ryan, Alice. Já até esculhambou pra mim as putarias que ele apronta.
— Corrigindo: eu nem conheço ele. Minha mãe sempre dizia pra não julgar um livro pela capa…
— Ele não é o teu tipo — eu disse.
— Eu não tenho um tipo — ela rebateu.
— Tem sim. Todo mundo tem um tipo.
— E qual é o meu tipo?
— Eu sou o teu tipo.
— Quem disse?
— Eu disse.
— E desde quando a tua palavra é a verdade absoluta do mundo?
Sorri. Ela ficou sem graça.
— Por que cê tá com esse sorriso estúpido na cara, campeão?
Odiava esse “campeão” dela.
— Porque acabei de reparar que gente sempre acaba entrando em uma discussão, não importa o assunto. — Deu pra ver que ela segurou um sorriso.
— É que você é irritante.
Me preparei pra discutir, mas de canto de olho vi o Ryan se despedindo do diretor e vindo pro rumo do vestiário.
— Tem mais alguém aí dentro? — olhei pra porta.
— Não… Por quê?
Empurrei Alice pra dentro do vestiário, e quando ela tentou resistir, joguei-a pra cima do meu ombro.
— Você até que é bem leve — comentei.
— Não me diga, campeão.
— É que faz tempo e que quem ficava por cima era eu… Aí eu esqueci.
Ela encheu minhas costas de tapas e eu chutei a porta de um dos banheiros e empurrei-a pra dentro. Tirei o celular da mão dela e o coloquei dentro da minha mochila, junto com meus fones e atirei-a em um dos armários. Alice encostou-se na parede do banheiro e fez uma careta quando eu fechei a porta atrás de mim. Colocou a mão sobre o peito e fez uma expressão de dor.
— Calma. Você me trouxe aqui porque pretende me matar afogada, acertei? — direcionou o olhar pro chuveiro.
— O chuveiro não é o melhor lugar pra isso, a gente devia ter ido pras piscinas lá de trás…
— Na verdade — respondi, dando um passo à frente —, tava pensando que a gente podia tomar algo juntos. Tipo um banho — encarei o chuveiro. — Boa ideia, não?
— Nem sequer pense nisso, Bieber— ela mencionou meu sobrenome como um alerta.
— Por que não, Waldorf? — devolvi. Ela deu um tapa na minha mão quando fiz menção de ligar o chuveiro.
— Meu cabelo tá bonito hoje.
— Quem te disse?
— Nossa.
— Seu cabelo tá bonito sempre. Ficaria bonito até se você raspasse.
— Seu jeito de tentar consertar as coisas é muito doentio, só avisando.
Ouvi um barulho de porta abrindo e a voz do Ryan ecoando.
— Alice?
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