1. Spirit Fanfics >
  2. Ruídos de Saturno >
  3. Estratégia

História Ruídos de Saturno - Estratégia


Escrita por: souhamucek e Jeleninhaz

Notas do Autor


Hello, hello!
Aqui estamos nós de novo com mais um capítulo fofo e escrito com muito carinho ♥
Mais uma vez, precisamos frisar o quão feliz estamos com todos os comentários e incentivos. Vocês são maravilhosos!
Sobre o capítulo, só tenho duas observações a fazer:
► Os elementos físicos apresentados serão explicados nos parágrafos seguintes, não se preocupem;
► Portadores de autismo tendem a ter intolerância ao glúten (proteína do trigo) e caseína (proteína do leite), o que os promove agitação e dificuldade de concentração.
Boa leitura!!

Capítulo 3 - Estratégia


Fanfic / Fanfiction Ruídos de Saturno - Estratégia

F = m . a

Força é o produto de sua massa com a aceleração. Isso é o que diz a fórmula. Consigo lê-la, é fácil visualizá-la. O problema está no modo como é aplicado. As perguntas são difíceis, confusas. Encaro as palavras e desespero-me. A questão está muito além da fórmula. Talvez muito além de mim.

Este é meu problema: não consigo entender o que o enunciado pede; ao contrário de papai, quem esbanja anseio pela resposta. Não sei como responder. Não mesmo.

— Ande, querido. — apressa-me. — "Caso haja um livro sobre a mesa. Sabendo que a força atraída pela Terra é de 10N, qual será a força exercida pela mesa sobre o livro?" — repete as mesmas palavras de minutos atrás.

A força da mesa contra o livro me serve como incógnita, todavia o peso da cobrança sobre os meus ombros pode ser facilmente calculada. Sei a resposta: é infinita. Minhas mãos suam, inquietas. Os olhos intensos e verdes de meu pai me espiam, o que me acelera ainda mais. Ele sabe como resolver, é engenheiro, eu não, sou só um garoto.

— Shawn, concentre-se. — respiro fundo, na tentativa falha de expulsar a ansiedade. — Lembre-se de que o livro está sendo equilibrado sobre a mesa. Sabe a resposta, basta pensar um pouquinho.

— N-não.

Meu coração dispara, quando percebo o quão fuzilado sou com apenas um olhar.

— Não o quê? — o timbre é ríspido.

— Não sei. — devolvo-o, com receio.

— Preste atenção! — espalma a mão sobre o livro aberto. — Um livro sobre a mesa. A Terra atrai por 10N. Qual é a merda da força exercida pela mesa?

Minhas mãos tremem. Papai está bravo comigo. Não tenho culpa. Isso é confuso. Newton me parecia um homem sábio, porém o que ele tenta me ensinar não é absorvido. Respeito a inércia, a velocidade das coisas, mas elas não são para mim. Não são. Nunca serão. Meu interior ferve.

— Não sei. — grito. — Eu não sei. — fico de pé, impaciente. — Não sei. — fecho o livro, sem aviso prévio. — Nem quero saber. — saio de frente à mesa e agacho-me no chão. — Não quero.

— Levante-se, Shawn. — murmura entredentes.

Observo meu pai se erguer e caminhar na minha direção. Abraço as pernas com força e rumo os olhos para a cama impecavelmente arrumada. Conforme ele diz algumas coisas as quais me esforço em ignorar, subo o olhar para os pôsteres mas paredes e tento me distrair de alguma forma. O zumbido das palavras em meu ouvido incomoda. Permito que a garganta liberte um grito estridente.

Silêncio. Tudo o que eu quero é silêncio. Viajo mentalmente pela galáxia sobre a cama e estaciono-me na imagem de Saturno. Os anéis me fascinam, esta é a beleza que me acalma. Por um instante, sinto que estou ali, sentado sobre os aros, apreciando a quietude, enquanto tudo se desfaz. Estou a salvo, pleno. Preencho os pulmões de ar, prendo-o meramente e liberto-o, esvaziando-me dos sons.

Desço os meus olhos para o pai de pé. Ele está com os braços cruzados, mas os trejeitos de fúria cederam aos de preocupação. Seus lábios sorriem. Apenas assinto. Estou calmo. Acredito que sim.

— 10N. — interrompe o vácuo de ruídos.

— Como? — apoio o queixo sobre os joelhos.

— Como o livro estava em equilíbrio sobre a mesa, a força sobre ele era zero... só igualar à força da Terra. — concisa, em tom sensato.

De fato, não era difícil. Eu só precisava pensar um pouco mais. No entanto, naquele momento, "pensar um pouco mais" me pareceu perturbador.

— Está agitado hoje. Comeu pão? — nego com a cabeça. — Tomou leite pela manhã? — contrario-o outra vez.

— Fiquei com medo.

Percebo a testa se franzir.

— Medo de você me achar... burro.

— Shawn, claro que não.

Ele se agacha ao meu lado e envolve meu corpo com os braços. Minha cabeça recosta em seu ombro, enquanto as mãos acariciam as minhas pernas encolhidas. Devido à proximidade, escuto o coração dele pulsar. Um som bom, pacífico. Agarro um pouco do tecido de sua camisa e dedilho a textura.

— Você é muito inteligente, Shawn. — balbucia, levando uma das mãos ao meu cabelo fino. — Tenho muito orgulho de você.

— Mesmo?

— Eu queria ter uma paixão tão forte quanto a sua pelo espaço. — meus lábios se esticam em um sorriso contido.

— É forte. — insisto.

— Eu sei que sim.

Ficamos alguns minutos nessa posição. O ritmo do coração tranquilo de meu pai embala o silêncio e dita a velocidade do meu. Nossa conversa rebobina na minha cabeça. Papai reconhece a importância do espaço para mim, ele não me acha burro. Não sou burro. Papai sabe das coisas. Sabe de mim.

Uma sequência de toques na boca interrompe nossa melodia quieta. Mamãe coloca o rosto para dentro do quarto e sorri para nós dois abraçados no chão.

— Shawn, vamos à psicóloga? — reviro os olhos, mas afirmo com a cabeça. — Está na hora. Venha!

Os braços do pai me libertam. Levantei-me e recolho o livro de física revirado sobre o piso. Arrumo-o sobre a mesa e penso por alguns instantes.

— 10N. — papai me sorri. — Porque está equilibrado.

— Muito bem, Shawn!

Caminho até a minha mãe, ela apoia as mãos em meus ombros largos. Juntos, seguimos para pegar o carro na garagem.

Ora ou outra ela confere o visor do rádio. Estamos em tempo. A rua varia rapidamente, o trânsito está a meu favor. Ou estaria contra mim? Poucos minutos bastam até chegarmos ao prédio onde fica o consultório. O carro para em frente à portaria, e eu desço.

A mão pequena de minha mãe se despede. Entro, não tardando a pegar o elevador. Oito andares. Como os planetas. Encaro meu reflexo no espelho e torno a ver em qual dos setores estou. Oitavo. A entrada metálica se abre. Sem enrolar, caminho para o lado de fora, atravessando o corredor de olhares à sala da porta branca. Meus pés param.

Suspirando, de modo frustrado, agarro a maçaneta que me levará consultório a dentro. Todas as vezes em que isso acontece, penso em como seria se eu não entrasse. Presumo que as tediosas perguntas feitas ali valham muito menos que algumas horas dedicadas ao aprendizado que recebo nos livros de astronomia. Porém, minha mãe enxerga algo bom no tempo gasto com a terapia, sendo assim, não me vejo disposto a contrariá-la.

A próxima ação me surpreende, quando, ao contrário de todas as vezes, a porta branca se abre sem a ajuda do movimento que estava prestes a fazer. Na fresta, vejo a Dra. Patricia sorridente. Aperto os punhos, minhas mãos suadas revelam a confusão. Isto não faz parte da costumeira rotina de todos os dias. É estranho. Sou eu quem sempre abro a porta, é a primeira vez em que ela vem me receber.

— Boa tarde, Shawn! — os lábios envelhecidos se esticam um pouco mais. — Fiquei muito satisfeita com a consulta passada! Finalmente, tivemos nossa primeira conversa. — ainda estranhando, balanço a cabeça em concordância.

Seu corpo se afasta minimamente para o lado, como um convite silencioso para que eu entre. Meus pés caminham devagar até o sofá escuro. Não gosto de mudanças. Elas não estão incluídas em minha vida, o que me faz crer que não são positivas. Nenhuma delas.

Após uma falha tentativa de obter conforto no sofá, volto a ouvir a voz da psicóloga, revelando mais surpresas. Bem mais do que eu gostaria.

— Pensei um pouco sobre a pequena evolução que conseguimos e lembrei dos seus gostos pelo espaço. — rumo meus olhos aos azuis acinzentados, curioso. — Quero que conheça alguém.

Perco as ações. O suor insiste em banhar as palmas de minha mão.

— Não se assuste, ela também está aqui para ajudá-lo. — meu coração pulsa de forma mais acelerada, com a confusão de informação simultâneas. — É minha filha. Ela é estudante de astrofísica. Sendo assim, conhece bastante a respeito dos planetas, astros, ..., conversamos sobre o assunto e concluímos que será bom compartilhar esse conhecimento.

Céus! Mais uma desconhecida?

Inquieto, viro o pescoço para o lado, procurando abafar a sensação sufocante que me atinge. Prendo o olhar à janela em fuga, mas tal ação é falha. Muito falha. Pois, no segundo em que bato os olhos em um canto afastado do consultório, tudo congela.

Uma mulher jovem sorri, olhando diretamente na minha direção. De imediato, reconheço: esse não é o sorriso que estou acostumado a receber de estranhos.

Seus cabelos loiros são longos, brilhosos. Embora dra. Patricia tenha a pele envelhecida, sua filha possui alguns traços. O nariz é pequeno, fino e delicado, enxergo pequenas sardinhas pela extensão das bochechas. É diferente, um diferente bom.

A cor dos olhos das duas também se parece, no entanto, há uma mudança gritante naquela. Por mais que seja azul, existe um brilho diferenciado. O olhar reluz como as próprias constelações. Não tenho contato direto com mulheres que não sejam da família ou médicas, contudo, permaneço fixo no pensamento de que ela seja a mais bonita das que já vi. A moça sorridente dá alguns passos à frente, vindo em minha direção.

Respiro fundo e colo as costas no sofá, receoso pela presença incógnita.

— Shawn, essa é minha filha, Iris.


Notas Finais


Muito obrigada por lerem até aqui! É sempre uma honra ♥
Com muito amor,
Lali e Jess

Ps. Jess e eu começamos outra shortfic com o Chãozinho, essa é mais dark, chama-se Disfarce Invisível e fala sempre Síndrome de Estocolmo (se apaixonar pelo sequestrador).
► Disfarce Invisível • https://spiritfanfics.com/historia/disfarce-invisivel-9197476
▶ Conheça Amputado (escrita por Lali) • https://spiritfanfics.com/historia/amputado-7215366
▶ Conheça Hurdle (escrita por Jess) • https://spiritfanfics.com/historia/hurdle-8473781


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...